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ENVELHECIMENTO ATIVO: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade, Exercícios de Enfermagem

O foco da Organização Mundial de Saúde (OMS) no Envelhecimento Ativo foi estabelecido logo depois que me tornei responsável pelo programa mundial de Envelhecimento e Saúde da OMS, em 1994. A intenção era identificar as características e refinar a linguagem de uma nova abordagem ideológica quanto ao envelhecimento. Parecia- -me essencial adotar uma visão que garantisse às pessoas idosas uma participação continuada em questões sociais, econômicas, espirituais, culturais e cívicas e não simplesment

Tipologia: Exercícios

2017

Compartilhado em 11/07/2017

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Baixe ENVELHECIMENTO ATIVO: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade e outras Exercícios em PDF para Enfermagem, somente na Docsity! ENVELHECIMENTO ATIVO: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade CENTRO INTERNACIONAL DE LONGEVIDADE BRASIL O Centro Internacional de Longevidade Brasil (ILC-Brasil) é um shink-tank independente sediado no Rio de Janeiro, inaugurado em 2012. Sua missão é propor ideias e diretivas para políticas públicas intersetoriais, voltadas ao envelhecimento populacional, fundamentadas por pesquisas e práticas internacionais, de modo a contribuir para o Envelhecimento Ativo. O Centro enfatiza o desenvolvimento e a troca de conhecimento, à recomendação de políticas baseadas em evidências, a mobilização social e a construção e o fortalecimento de redes internacionais com foco no Brasil e no estado do Rio de Janeiro. OILC-Brasil é um dos membros da Global Alliance of International Longevity Centres (Aliança Global de Centros Internacionais de Longevidade [ILC-GA]), um consórcio internacional com status consultivo junto à Organização das Nações Unidas e representação em 17 paises, constituído por África do Sul, Alemanha, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Estados Unidos, França, Holanda, Índia, Israel, Japão, Reino Unido, República Dominicana, República Tcheca, e Singapura. Os Centros funcionam tanto de forma independente quanto colaborativa. O escritório central se localiza em Nova lorque e seus atuais Co-Presidentes são a Baronesa Sally CGreengross ILC-UKje o Dr. Alexandre Kalache (ILC-Brasil). Centro Internacional de Longevidade Brasil (International Longevity Centre Brazily Avenida Padre Leonel Franca, 248, Gávea — Rio de Janeiro (RJ) — 22.45 11-00) — Brasil. AGRADECIMENTOS O objetivo deste relatório é atualizar o documento histórico Marco Político do Envelhecimento Ativo, publicado em 2002, pela Organização Mundial de Saúde (OMS)1. Esta atualização é produto do Centro Internacional de Longevidade Brasil (ILC-Brasil) e foi escrita pela Dra. Louise Plouffe, ex-Coordenadora de Pesquisa do ILC-Brasil e atual Diretora de Pesquisa do ILC-Canadá, em colaboração com Ina Voelcker, Coordenadora de Projetos do ILC-Brasil, sob a direção geral de Alexandre Kalache, Presidente do ILC-Brasil. Somos gratos pelas informações fornecidas pelas seguintes organizações integrantes da Aliança Global de ILCs: ILC-África do Sul, ILC-Argentina, ILC-Austrália, ILC-China, ILC-França, ILC-Índia, ILC-Israel, ILC-Japão, ILC-Países Baixos, ILC-Reino Unido, ILC-República Dominicana, ILC-República Tcheca e ILC-Singapura. Além disso, gostaríamos de agradecer ao ILC-Canadá pelo generoso apoio ao fornecer o tempo necessário a Louise Plouffe para que finalizasse o relatório. Apreciamos o tempo e a expertise dedicados ao relatório pelos indivíduos a seguir: Sara Arber (Universidade de Surrey, Reino Unido), Alanna Armitage (Fundo de População das Nações Unidas [UNFPA]), Jane Barratt (Federação Internacional sobre Envelhecimento [IFA]), Carolyn Bennett (Parlamento Canadense, Canadá), Ana Charamelo (Universidade da República, Montevidéu, Uruguai), June Crown (ex-presidente da Faculdade de Saúde Pública, Colégio de Especialistas em Saúde Pública, Reino Unido), Denise Eldemire-Shearer (Universidade das Índias Ocidentais, Jamaica), Vitalija Gaucaite Wittich (Comissão Econômica das Nações Unidas para a Europa [UNECE]), Karla Giacomin (NESPE/FIOCRUZ-UFMG), Dalmer Hoskins (Departamento de Seguridade Social dos Estados Unidos), Irene Hoskins (ex-presidente da Federação Internacional sobre Envelhecimento [IFA]), Norah Keating (Associação Internacional de Gerontologia e Geriatria [IAGG], Canadá), Nabil Kronfol (Centro para Estudos sobre Envelhecimento, Líbano), Silvia Perel Levin (representante de Genebra da ILC-GA), Joy Phumaphi (Aliança dos Líderes Africanos contra a Malária), Mayte Sancho (Fundação Matía Instituto Gerontológico, Espanha), Kasturi Sen (Faculdade de Wolfson (cr), Universidade de Oxford, Reino Unido), Alexandre Sidorenko (Centro Europeu para Políticas de Bem Estar Social e Pesquisa, Viena, Áustria), Terezinha da Silva (Mulher e Lei na África Austral, Moçambique), Derek Yach (Fórum Econômico Mundial [WEF]), Yongjie Yon (Universidade do Sul da Califórnia), Maria-Victoria Zunzunegui (Universidade de Montreal, Canadá). Somos gratos pelo recurso de pesquisa (E-26/110.058/2013) da FAPERJ (Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro), agência de financiamento à pesquisa do estado do Rio de Janeiro, que tornou possível a realização deste relatório. Além disso, agradecemos a generosa contribuição financeira da Associação Americana de Aposentados (AARP) bem como da Bradesco Seguros. Gostaríamos também de agradecer o apoio da Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro por meio do Instituto Vital Brasil (IVB) e do Centro de Estudo e Pesquisa do Envelhecimento (CEPE) que apoia o nosso Centro desde o começo. E por fim, mas não menos importante, gostaríamos de agradecer a toda a equipe do ILC-Brasil, incluindo Silvia Costa, Márcia Tavares, Diego Bernardini, Elisa Monteiro e Yongjie Yon (Associado ILC-Brasil) que contribuíram substancialmente para a produção deste relatório bem como todos os demais membros do conselho do ILC-Brasil (Ana Amélia Camarano, Claudia Burlá, Egídio Dorea, José Elias S. Pinheiro, Laura Machado, Luiza Fernandes Machado Maia, 1 Título da tradução brasileira: Envelhecimento Ativo: uma Política de Saúde Marília Louvison, Rosana Rosa, Silvia Regina Mendes Pereira, Israel Rosa, João Magno Coutinho de Souza Dias Filho e Fernanda Chauviere) pelo apoio contínuo ao ILC-Brasil. O ILC-Brasil pretende que a Revisão do Envelhecimento Ativo funcione como um processo interativo de consulta contínua através do qual parceiros credenciados serão encorajados a contribuir com novas evidências e práticas. Se estiver interessado em fazer parte desse processo, por favor, entre em contato: info@ilcbrazil.org Esperamos que você aprecie a leitura e faça bom uso deste Marco Político. PREFÁCIO À EDIÇÃO BRASILEIRA O foco da Organização Mundial de Saúde (OMS) no Envelhecimento Ativo foi estabelecido logo depois que me tornei responsável pelo programa mundial de Envelhecimento e Saúde da OMS, em 1994. A intenção era identificar as características e refinar a linguagem de uma nova abordagem ideológica quanto ao envelhecimento. Parecia- -me essencial adotar uma visão que garantisse às pessoas idosas uma participação continuada em questões sociais, econômicas, espirituais, culturais e cívicas e não simplesmente a ativida- de física e uma vida profissional mais longa. No entanto, o catalisador para o desenvolvimento do Marco Político do Envelhecimento Ativo somente aconteceu alguns anos mais tarde, com a Assembléia Mundial das Nações Unidas sobre o Envelhecimento, em 2002. A Política de Saúde foi o resultado de um longo processo que começou com os preparativos para 1999 – quando a OMS celebrou o Dia Inter- nacional do Idoso, no Ano Internacional do Idoso orquestrando uma mobilização global que percorreu o mundo e contou com a participação de milhares de cidades e milhões de pessoas no que foi possivelmente o maior ato simultâneo internacional de promoção à saúde: o “Abraço ao Mundo para o Envelhecimento Ativo”. Encorajado pelo apoio mundial amalgamado pelo evento, a OMS deu início a um amplo processo consultivo para questionar paradigmas existentes e desenvolver políticas em torno da ideologia do Envelhecimento Ativo. Oficinas e seminários envolvendo entidades acadêmicas, governamentais e da sociedade civil foram realizadas em todas as regiões que levaram a uma conferência no Centro para o Desenvolvimento da Saúde da OMS em Kobe, no Japão. Quinze anos se passaram desde que o trabalho preliminar em Envelhecimento Ativo foi realizado. Muito se aprendeu e muitas evidências novas foram apresentadas durante esse período. Dado que o conceito de Envelhecimento Ativo provou influenciar tanto as políticas e as agendas de pesquisa em todo o mundo, entendi que uma das prioridades do recém-formado Centro Internacional de Longevidade Brasil (ILC-Brasil) seria revisitar o documento como um todo. Foi um grande privilégio para nós do ILC-Brasil, desde a criação, poder contar com a Dra. Lou- ise Plouffe. Sua realocação, do Canadá para o Brasil, foi por si só um testemunho da filosofia do Envelhecimento Ativo. Ela desenvolveu novas habilidades (entre elas uma nova língua) e se reinventou em um contexto completamente novo onde pode continuar a fazer contribuições valiosas. Sua principal tarefa nesse novo contexto era trabalhar na revisão do Envelhecimento Ativo. Eu não tinha dúvidas de que ela desempenharia a tarefa com absoluto êxito. Tínhamos trabalhado juntos na OMS para lançar a aplicação mais clara da abordagem do Envelhecimento Ativo, o Guia Cidade Amiga do Idoso (2007), a pedra fundamental do movimento das Cidades e Comunidades Amigas do Idoso que se expande globalmente cada dia mais. Ela tinha um histórico acadêmico robusto e vinte anos de experiência na coordenação de políticas de envelhecimento para o Governo Federal do Canadá. Louise começou por uma revisão bibliográfica abrangente. Adicionamos à Revisão novos conceitos e ideias desenvolvidos durante meus anos como Thinker- A Resposta ......................................................................................................................84 Recomendações de Políticas Chave ..............................................................................85 Conclusão .....................................................................................................................102 REFERÊNCIAS ....................................................................................................................103 INTRODUÇÃO A publicação de título original Active Ageing: A Policy Framework, que na tradução para português foi denominada Envelhecimento Ativo: Uma Política de Saúde (1), produzi- da em 2002, pela Organização Mundial da Saúde (OMS), se destaca por ser um marco político internacional. A concepção desse “Marco Político do Envelhecimento Ativo” foi uma contribuição à segunda Assembleia Mundial sobre o Envelhecimento, abrangente e inovadora, que inspirou e norteou o desen- volvimento de políticas públicas em todos os âmbitos governamentais: estadual, nacional e regional. Desde o seu lançamento, o Marco Político do Envelhecimento Ativo serviu como base para a elaboração de políticas em vários países e estados, incluindo Austrália, Nova Zelândia, Suécia, Grã-Bretanha e EUA (2); Canadá (3); Singapura (4); Espanha (5); Portugal (6); Costa Rica (7); Chile (8); Brasil (9); Québec (10) e Andaluzia (5). No nível intergover- -namental, a Comissão Europeia declarou 2012 o Ano Europeu do Envelhecimento Ativo e da Solidariedade entre Gerações (11). A Comissão Econômica das Nações Unidas para a Europa, juntamente com a Comissão Europeia, desenvolveu um Índice de Envelhe- cimento Ativo que consiste em 22 indicadores que monitoram até que ponto o Envelheci- mento Ativo está ocorrendo na Europa (12). Envelhecimento Ativo é o conceito que per- meia os Princípios da OMS para Unidades de Atenção Básica à Saúde Amigas do Idoso (13) e o Guia Cidade Amiga do Idoso (14). Permeia também a Rede Mundial da OMS de Cidades e Comunidades Amigas do Idoso que tem como objetivo tornar cidades, comunida- de, estados e nações mais acessíveis e mais inclusivos para o idoso e para todas as faixas etárias ao longo da vida (14). Além disso, os princípios do Envelhecimento Ativo serviram de estrutura para recomendações para melho- rar a preparação e a resposta a emergências e crises humanitárias que abarquem as necessi- dades e contribuições dos idosos (15). Resultado de dois anos de oficinas e discus- sões com especialistas externos, governos e organizações não-governamentais, o Marco Político do Envelhecimento Ativo representou uma mudança significativa de paradigma2. Deixando de lado o foco restrito à prevenção de doenças e o cuidado à saúde, a OMS passou a defender a meta do Envelhecimento Ativo, definido como “o processo de otimização das oportunidades de saúde, participação e segurança, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida à medida que as pessoas ficam mais velhas” (1). A linguagem impõe limitações inevitáveis, fazendo-se ressalva ao termo “ativo”, que acabou sendo escolhido em detrimento de outros que podem pare- cer ter um sentido menos inclusivo, como “saudável”, “bem-sucedido”, “produtivo” e “positivo”. A intenção era claramente chamar a atenção para a participação em questões sociais, econômicas, culturais, espirituais e cívicas - e não somente em atividades físicas e econômicas. Desta forma, o conceito estabe- leceu não só objetivos de saúde, mas também de participação e segurança, uma vez que os três estão intrinsecamente ligados. O Marco Político foi projetado tanto para indivíduos quanto para grupos populacionais. A intenção era possibilitar que as pessoas realizassem seu potencial de bem-estar físico, social e mental ao longo de toda vida e que participassem na sociedade de acordo com suas necessidades, desejos e capacidades - ao mesmo tempo, lhes fornecendo proteção, segurança e cuidado adequados quando necessário. O relatório 2 Foram realizadas oficinas na Argentina, no Brasil, em Botsuana, no Chile, em Hong Kong, na Jamaica, na Jordânia, no Líbano, na Malásia, nos Países Baixos, na África do Sul, na Espanha e na Tailândia. Foram particularmente úteis uma série de oficinas conjuntas com o UK Faculty of Community Health. Especialistas de todas as regiões foram designados para fornecer evidências e modelos de boas práticas e minutas circularam pelo meio acadêmico e por organizações não-governamentais de países desenvolvidos e em desenvolvimento. O apoio do Governo Canadense foi vital. Introdução • 13 estruturou o envelhecimento de acordo com uma perspectiva de curso de vida para criar a base para um continuum de políticas para otimizar a qualidade de vida desde o nasci- mento até a morte e encorajar o engajamento de todas as faixas etárias. Outro avanço foi construir o Envelhecimento Ativo no âmbito do modelo de promoção à saúde (16) como base para a ação coordenada em múltiplos setores de políticas. A OMS ancorou o Enve- lhecimento Ativo em uma abordagem baseada em direitos, fundamentada pelos Princípios das Nações Unidas para o Idoso (17), e não uma baseada em necessidades. As questões fundamentais que o Marco Polí- tico do Envelhecimento Ativo aborda são tão relevantes hoje quanto eram em 2002: Como podemos ajudar as pessoas a se manterem independentes e ativas à medida que envelhecem? Como podemos fortalecer as políticas de promoção de saúde e prevenção, especialmente aquelas direcionadas ao idoso? Uma vez que as pessoas estão vivendo mais, como se pode melhorar a qualidade de vida na velhice? O grande número de idosos irá levar à falência nosso sistema de saúde e de seguridade social? Como melhor equilibrar o papel da família e do estado no que diz respeito ao cuidado de pessoas que precisam de assistência à medida que envelhecem? Como podemos reconhecer e dar apoio ao grande papel de cuidadoras que as pessoas desempenham à medida que envelhecem?3(1) O Marco Político do Envelhecimento Ativo, entretanto, tem mais de 13 anos e é necessário atualizá-lo para que continue a ser referência para os tomadores de decisões. Desde a publi- cação do Marco Político, algumas questões, como os direitos do idoso, o prolongamento da vida profissional, a aprendizagem ao longo da vida, a qualidade de vida de idosos frágeis e dependentes e daqueles que estão no final da vida, se tornaram mais proeminentes. A resi- liência surgiu como construto de desenvolvi- mento que pode tornar mais claro o processo do Envelhecimento Ativo e há novos dados e novas pesquisas a serem explorados. O en- velhecimento precisa ser examinado mais de perto no contexto de outras tendências impor- tantes, como a urbanização, a globalização, a migração, a inovação tecnológica, assim como as mudanças climáticas e ambientais. Além disso, a crescente desigualdade, entre as regiões e dentro delas, precisa ser aborda- da de forma mais abrangente no contexto do envelhecimento populacional. Em conjunção com essas questões, há também o surgimento de um forte movimento internacional que re- conhece e busca reforçar os direitos humanos específicos do idoso. Esta publicação, com seu amplo escopo e foco nos determinantes do Envelhecimento Ativo, busca reforçar tanto as iniciativas anteriores quanto as atuais da OMS e complementar e agregar valor ao Relatório Mundial sobre Envelhecimento e Saúde 2015. 3 As citações em destaque foram retiradas de fontes que fundamentam este trabalho, como o Thinkers in Residence Report 2013, intitulado A Revolução da Longevidade (21), de Alexandre Kalache. 14 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade Figura 1. Proporções da população acima dos 60 anos: no mundo e por região, 1950-2050 (Fonte: UNDESA 2013 (19)) mais do que entre 1950–1955 (19). A expec- tativa realista é de que ultrapasse a marca dos 70 anos nos próximos anos e de que em meados deste século chegue a 77 anos. O número de anos adicionais tem sido particu- larmente dramático em determinados países. Durante as últimas três décadas no Brasil, por exemplo, os bebês nascidos ganharam, a cada ano, quatro meses e 17 dias de expectativa de vida, o que totaliza um bônus de 12 anos de vida em uma única geração (22). Enquanto a expectativa de vida ao nascer está aumentando (Fig. 2), as pessoas na sexta, séti- ma e mesmo na oitava década de vida também se beneficiam do aumento da longevidade. Por exemplo, um alemão de 60 anos hoje em dia tem cerca de quatro anos mais de expectativa de vida do que um sexagenário em 1980 (23). No Brasil, a expectativa de vida para uma pessoa de 80 anos aumentou de 6,1 anos em 1980 para 8,6 anos em 2010 (24). Os grupos populacionais mais velhos, e aqueles acima dos 80 anos em especial, estão crescendo proporcionalmente mais rápido do que qualquer outra faixa etária. Esse processo está ocorrendo mais rapidamente em países de baixa e média renda do que nos países de alta renda, onde a transição demográfica já está mais estabelecida. As pessoas acima dos 80 anos representavam 14% da população idosa mundial em 2013, mas irão constituir 19% dessa população até 2050 (19). Embora ainda seja uma pequena minoria da popula- ção, espera-se que o número de centenários cresça dez vezes, de cerca de 300.000 em todo o mundo em 2011 para 3,2 milhões até 2050 (18). Vivendo mais com boa saúde e com defici- ência. No âmbito mundial, tanto a expectativa de Seção I: A Revolução da Longevidade • 17 vida quanto a expectativa de vida saudável aumentaram, sendo esta última de forma mais lenta. A cada ano ganho em expectativa de vida, 10 meses desse ano adicional serão vividos com boa saúde (26). Em 2010, a expectativa mundial de vida saudável ao nascer era de 59 anos para homens e 63 anos para mulheres (Tabela 1). Isso representa um aumento de quatro anos em média desde 1990; 4,2 anos para homens e 4,5 anos para mulheres (26). Independentemente da idade, as pessoas po- dem esperar viver mais com boa saúde; uma mulher de 60 anos em 2010 podia esperar ter 17 anos com boa saúde; ou seja, 1,7 anos mais do que uma mulher da mesma idade em 1990 (26) (Tabela 1). No entanto, devido ao fato de o aumento da expectativa de vida saudável ser menor do que o da expectativa de vida em geral, muitas pessoas também vão experimentar um período mais longo de incapacidade do que há 20 anos. Essas mudanças demandam que repensemos radicalmente o curso de vida e que questione- mos premissas há muito estabelecidas sobre as definições de aposentadoria e de cuidado Figura 2: Expectativa de vida ao nascer 1950-55 a 2010-15 (Fonte: Nações Unidas 2013 (204)) Tabela 1. Expectativa mundial de vida sau- dável por idade, em 1990 e 2010 (Fonte: Salomon et al. 2012 (26)) na velhice. Diferenças regionais. Ainda que numerica- mente já haja um maior número de idosos nas regiões menos desenvolvidas do mundo, a proporção de idosos é maior nas regiões mais 18 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade desenvolvidas. Japão, Alemanha e Itália têm as maiores proporções de idosos hoje (19). No entanto, é importante mencionar que o maior crescimento proporcional de idosos ao longo das próximas décadas irá ocorrer nos países menos desenvolvidos (19). Dos dois bilhões de idosos no mundo em 2050, quase 80% estarão nesses países (19). A expectativa de vida difere de forma marcan- te entre países de renda mais alta e mais baixa. A expectativa de vida ao nascer varia de cerca de 56 anos em alguns países de baixa renda até cerca de 83 anos no Japão (19). Em idades mais avançadas, as diferenças regionais são ainda consideráveis: um japonês de 60 anos pode esperar viver mais 26 anos, enquanto que uma pessoa de 60 anos da Serra Leoa pode esperar viver somente 11 anos mais (19). Embora os números variem muito entre os pa- íses da CIS (Commonwealth of Independent States [países do antigo bloco soviético]), a expectativa de vida nesses países não aumen- tou tanto quanto nos países da União Européia (UE). A expectativa de vida ao nascer na CIS em 2008–2009 era de 69 anos, comparado com uma média de 76 anos na UE (27). Após o colapso da União Soviética, a expectativa de vida ao nascer em muitos dos países da CIS até mesmo caiu (27). Na Rússia, esse declínio persistiu por 15 anos até 2005 (27). Há também desigualdades bastante significa- tivas de expectativa de vida ao nascer dentro dos países. Na Inglaterra, por exemplo, pesso- as que moram nos bairros mais ricos têm em média mais sete anos de vida do que as pes- soas que moram nos bairros mais pobres (28). As diferenças regionais também são aparentes com relação à expectativa de vida saudável (29). Nos países de renda alta, há evidências de que o tempo de vida com incapacidade esteja diminuindo. Em países de baixa renda, o tempo de vida com deficiência não só não diminuiu, como pode ter aumentado devido ao aumento dos riscos de doenças crônicas. A feminização do envelhecimento. Há mais mulheres idosas do que homens idosos, em- bora esse padrão seja complexo e mutável. No âmbito mundial, as mulheres vivem 4,5 anos mais do que os homens (18). Em 2013, para cada 100 mulheres acima dos 60 anos havia 85 homens. Aos 80 anos, a proporção era de 100 mulheres para 61 homens (19). A expec- tativa de vida dos homens está alcançando a das mulheres nas regiões mais desenvolvidas e é provável que se alcance uma proporção mais equilibrada de homens e mulheres na população idosa nas próximas décadas. Nas regiões menos desenvolvidas, onde as con- dições sociais e econômicas das mulheres são, muitas vezes, menos favoráveis, há uma proporção menor de mulheres para homens do que nas regiões mais desenvolvidas, embora haja grandes variações. Em alguns países da Ásia Ocidental (por exemplo, Paquistão, Qatar e Emirados Árabes Unidos), há mais idosos do que idosas (30). A ONU prevê que a atual proporção entre sexos nas regiões menos desenvolvidas se manterá estável (31). O envelhecimento é uma questão de de- senvolvimento. A expectativa de uma vida mais longa é uma conquistada civilização e representa grande potencial para o desenvol- vimento humano geral. Com sua experiência coletiva e habilidades, a crescente população de homens e mulheres idosos é um recurso precioso para as famílias, as comunidades, a economia e a sociedade como um todo. É fato que a participação ativa desses indiví- duos na sociedade é cada vez mais essencial para compensar o declínio da proporção de jovens. Não conseguir incluir completamente os idosos em estratégias de desenvolvimento humano faz aumentar as chances de que so- fram as consequências de doenças passíveis de prevenção, pobreza, negligência e abuso. Os riscos concomitantes, para as famílias e para a sociedade como um todo, incluem o fardo da dependência, custos insustentáveis para os sistemas de saúde e de seguridade social e perda de capacidade produtiva. Ne- nhum país pode se declarar completamente preparado para a revolução da longevidade. Seção I: A Revolução da Longevidade • 19 dos níveis de poluição atmosférica e ao calor extremo, que constituem risco à saúde (38). A infraestrutura não acompanha o número de pessoas que chega às cidades. No âmbito global, um em cada três habitantes das cidades mora em favelas ou em áreas invadidas, que se caracterizam por saneamento inadequado e pela falta de água e de alimentos seguros para o consumo, acesso insuficiente a serviços e moradias superlotadas e de má qualidade (37). A população urbana pobre de todas as idades apresenta maior risco de contrair doenças infecciosas e desenvolver doenças crônicas. Está também mais sujeita a lesões acidentais, ao crime e à exclusão social (37). A população que migra para as áreas urbanas está particularmente mais sujeita à pobreza e às más condições de moradia (39). Uma característica importante de muitas cidades - que teve início nos países de ren- da mais alta na década de 1950 - é o rápido crescimento das comunidades residenciais de densidade populacional mais baixa nos subúrbios das cidades. Nesses subúrbios há uma maior proporção de baby boomers e de gerações de adultos que os precederam do que de jovens (40). Os subúrbios tendem a oferecer moradias mais espaçosas e áreas comerciais centralizadas. O uso do carro particular predominou no projeto de tais áreas residenciais e a tendência é de que haja menos transporte público e menos recursos para deslocamento de pedestres do que nos centros urbanos. A distância entre os vizinhos e a ausência da confusão urbana que fora o principal atrativo da vida nos subúrbios pode se tornar um fator limitante e de isolamento na velhice. As cidades cada vez maiores nos países menos desenvolvidos estão agora passando pela “expansão dos subúrbios” - o rápido crescimento de comunidades de baixa densidade demográfica na periferia, apresen- tando muitas das características já citadas. Ao mesmo tempo em que as cidades crescem, as comunidades rurais estão sendo esvaziadas. A migração dos jovens para as cidades resulta em proporções cada vez maiores de idosos que “envelhecem nos locais onde sempre viveram” nessas áreas rurais. Em 2005, em regiões mais desenvolvidas, as pessoas acima dos 60 anos constituíam 23% da população rural e 19% da população urbana (30). Não há projeção em nível global, mas os dados regionais mostram aumento significativo de idosos nas áreas rurais. A previsão para a Inglaterra, por exemplo, indica que a maioria dos distritos rurais pode esperar que a popula- ção de residentes acima dos 50 anos aumente em 47% entre 2003 e 2038. Espera-se que o aumento nacional neste mesmo intervalo de tempo seja de 35%, com crescimento maior da população acima dos 65 anos (41). A concentração rural de idosos é uma tendên- cia significativa também nas regiões menos desenvolvidas (42). Na China, as pessoas acima dos 65 anos representavam 9,3% da população rural e 6,9% da urbana em 2008 (43). Até 2030, a distribuição passará a ser de 21,8% e 14,7%, respectivamente (43). O lugar onde as pessoas moram influencia profundamente a mobilidade, a participação, o apoio social e o bem-estar. A distribuição de idade da população afeta sobremaneira o planejamento comunitário e urbanístico, os recursos, a produtividade e os serviços. Har- monizar o “envelhecimento” e o “lugar” cria oportunidades, mas ignorar a demografia no planejamento urbano cria barreiras e acentua riscos. Globalização. A globalização se refere a uma economia global cada vez mais integrada e a um mundo altamente conectado, com crescente fluxo transnacional de bens, infor- mações, ideias, capital e serviços, bem como de migrantes (32). Resulta da urbanização e dos avanços dos meios de transporte, de comunicação e da tecnologia organizacional (44). Hoje em dia, as informações são trans- mitidas muito mais rapidamente. Pessoas com experiências diversas, de todo o mundo, estão conectadas via Internet e viajam em maior número. Redes sociais - incluindo famílias - ultrapassam as fronteiras entre países e 22 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade continentes. Bens e serviços, inclusive ali- mentos e cultura, são produzidos em massa, vendidos em massa e disseminados em massa, resultando em uma homogenização global dos produtos. Essas transformações econômicas e sociais têm muitas implicações num mundo que está envelhecendo. Mudanças de imagem e de pa- peis sociais associados à velhice e inovações eficazes para vencer desafios comuns podem se disseminar rapidamente. A presença visível de idosos vivazes e plenamente engajados em muitos países pode fazer com que se questionem os estereótipos. O conhecimento tradicional, as habilidades e as experiências de vida dos idosos, entretanto, podem também ser desvalorizadas pela constante demanda por novas informações e competência tec- nológica. Além disso, a saúde e a segurança dos indivíduos e da população estão sujeitas aos riscos econômicos, sociais e de saúde em nível global. A expansão global dos alimentos processados e dos produtos do tabaco contribuíram para a epidemia mundial de doenças crônicas e as condições de trabalho e os benefícios vão minguando à medida que as multinacionais baixam os custos de produção (45). Amea- ças antes locais se tornam, cada vez mais, globais, como a proliferação das doenças transmissíveis e a crise da escassez de água e de alimentos (46). “Uma nova dinâmica está surgindo no que diz respeito ao que precisa ser solucionado nos níveis global e nacional, o que é público versus o que é privado e como a saúde é valorizada no nosso mundo em processo de globalização”. (404) Migração. Embora os indivíduos e os grupos tenham sempre migrado em busca de seguran- ça ou de melhores oportunidades, tanto a mi- gração internacional quanto a nacional vêm se tornando características pronunciadas da nova realidade global. Em 2013, havia 232 milhões de migrantes internacionais, número maior do que os 175 milhões de 2000 e do que os 154 milhões de 1990 (47). O número de pessoas que migram dentro do seu país é mais de três vezes maior: a estimativa era de 763 milhões em 2005 (48), o que representa, aproximada- mente, uma em cada 10 pessoas no mundo. As tendências recentes de migração, que ocorrem em todas as regiões do mundo, se relacionam com o envelhecimento populacional de várias formas. Por exemplo, muitas mulheres mi- gram das Filipinas para trabalhar cuidando de idosos em países desenvolvidos, muitas vezes deixando seus filhos aos cuidados dos avós idosos. Um grande número de migrantes do pós-Segunda Guerra está envelhecendo em seus países de adoção (49). Na cidade de Nova Iorque hoje, por exemplo, 45% de todas as pessoas acima dos 65 anos são imigrantes (50). Até 2030, esse número terá aumentado em 35% e, consequentemente, a maioria das pessoas acima dos 65 anos será “estrangeira” (50). Ao mesmo tempo, migrantes mais ve- lhos que chegaram depois estão se deparando com os desafios de se ajustar à sociedade que os acolheu. A percepção comum é de que os migrantes são principalmente adultos jovens. Muitos migrantes internacionais são adultos jovens, mas, em 2010, 17% deles estavam acima dos 60 anos (51). Isso significa que a estrutura etária da população migrante pode ser tão envelhecida quanto, ou até mais, do que a do país que a recebe. Pesquisas em vários países europeus preveem um aumento tanto do número quanto da proporção de migrantes mais velhos (52). A migração está afetando profundamente as estruturas familiares, as economias locais e as infraestruturas de serviços. Obviamente, a partida dos filhos adultos pode deixar os familiares mais velhos com menos apoio na velhice. Os pais que deixam os filhos para trás podem fortalecer o papel social dos avós Seção I: A Revolução da Longevidade • 23 cuidadores nas famílias e nas comunidades, mas enfraquecer o laço filial entre o genitor ausente e os filhos, relação importante para garantir o apoio aos pais mais tarde. Familia- res mais velhos podem migrar para junto de seus filhos adultos, se afastando da cultura e da comunidade familiares e comprometendo, portanto, sua independência e segurança. A produtividade econômica das comunidades com altas taxas de emigração de adultos jo- vens diminui, tornando vulneráveis o varejo e serviços locais. Em alguns países de renda alta, a proporção de idosos estrangeiros é particularmente pronunciada. Na Austrália, em 2006, por exemplo, 20% das pessoas com 65 anos havia nascido em outros países, predominantemente os de língua não inglesa (53). Em Israel, ao final de 2011, a grande maioria das pessoas acima dos 65 anos (82%) era de imigrantes de outros países, e uma porcentagem signi- ficativa (25%) deles era de sobreviventes do Holocausto (54). A migração pode ser um evento disrupti- vo (55) com implicações de curto e longo prazo para o envelhecimento. Várias sub- -populações sentem o impacto da migração, incluindo: • um enorme número de migrantes mais ve- lhos que envelhecem em terra estrangeira (por exemplo, trabalhadores migrantes aposentados da Espanha, Itália, Grécia e Turquia que migraram para a Alemanha nas décadas de 1950 e 1960); • os que migram na velhice em busca de uma melhor qualidade de vida (por exemplo, cidadãos americanos aposentados que se mudam para o México ou para o Panamá, ou cidadãos do norte da Europa que se mudam para países do Mediterrâneo); • idosos que retornam ao país de origem (por exemplo, Grécia, Itália, Espanha e Portugal) e descobrem que o mesmo mudou radicalmente desde que partiram, tornando-se estrangeiros em sua terra na- tal; • idosos que vão atrás dos filhos adultos que migraram para outro país (por exem- plo, chineses mais velhos que se mudam para se juntar à família na Austrália ou no Canadá), ou que se unem às famílias em cidades do mesmo país; • idosos que precisam escapar de conflitos ou de desastres naturais. Evidências se acumulam mostrando que a migração desencadeia um complexo grupo de desafios tanto para as gerações mais velhas quanto para as mais novas das famílias (56) e para as sociedades, que estão se tornando mais heterogêneas, cultural, social e eco- nomicamente (57). Entre os atuais esforços para compreender e responder à diversidade trans-cultural e aos riscos a que estão expostos os migrantes idosos, é importante mencionar a conferência bienal “Ageing in a Foreign Land”, em Adelaide, na Austrália, e o pro- tocolo de pesquisa em políticas “Ageing in a Foreign Land” (58), desenvolvido na New York Academy of Medicine. A revolução tecnológica. As inovações tec- nológicas sempre transformaram a maneira como as pessoas vivem e trabalham ao longo da história da humanidade, mas as transfor- mações contemporâneas ocorrem exponen- -cialmente mais rápidas e exercem mais influência do que nunca (59,60). A incrível evolução e disseminação das tecnologias da informação e da comunicação facilitaram a difusão de inovações em muitas outras áreas. De 2005 a 2011, o número de assinaturas de telefonia móvel no mundo para cada 100 pes- soas aumentou de 34 para 86 e a porcentagem de indivíduos que usa a Internet mais do que dobrou, de 16% para 33% (60). Em menos de uma década, o Facebook alcançou mais de um bilhão de usuários ativos e, em sete anos, o Twitter registrou mais de 500 milhões de usuários (46). Os contatos sociais se criam e se mantêm apesar da distância geográfica e da mobilidade reduzida. Redes pessoais 24 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade econômico e da globalização. Essas macro- -tendências aumentaram os principais riscos conhecidos para doença crônica, incluindo o sedentarismo, o consumo de alimentos não saudáveis e a exposição à poluição atmos- férica, tabagismo e consumo excessivo de álcool. O envelhecimento populacional em si é também um fator, uma vez que as pessoas estão vivendo tempo suficiente para que as e 24% relata ter três doenças (78). Ao mes- mo tempo, muitos desses idosos estiveram expostos a uma alta prevalência de doenças infecciosas quando mais jovens. No entanto, as doenças infecciosas não de- sapareceram e muitos países em desenvol- vimento apresentam alta prevalência tanto de doenças infecciosas quanto de doenças crônicas (79). Em países como a Guatemala, El Salvador, Quênia e a República Demo- crática do Congo, por exemplo, as doenças crônicas têm alta incidência e somam-se às doenças infecciosas, de alta prevalência, muitas das quais se tornaram mais resisten- tes aos antibióticos (80). O risco de morrer de uma doença infecciosa específica é mais alto para os idosos porque seu sistema imu- nológico mais fraco os faz mais suscetíveis. Além disso, apresentam resposta imunológica menos intensa à vacinação. As principais do- enças infecciosas entre os idosos, nos países menos desenvolvidos, incluem a malária, as infecções respiratórias agudas, as diarreias, a tuberculose e o HIV/AIDS (81). Pobreza e desigualdade. De acordo com aná- lises do Índice de Desenvolvimento Humano, a maioria dos países apresentaram aumentos significativos de desenvolvimento humano avaliado através de uma combinação de ren- da, educação e saúde ao longo das últimas décadas (84). Os níveis de pobreza absoluta diminuíram. No âmbito global, 14,5% da po- pulação de todas as idades era pobre em 2011 (85) - tomando como referência a medida de linha de pobreza do Banco Mundial de USD 1,25 por dia. Duas décadas antes, essa porcen- tagem era mais do que o dobro (86). As desi- gualdades na saúde diminuíram, levando-se em consideração o aumento da expectativa de vida ao nascer, e, no entanto, as desigualdades na educação não se alteraram (84). Há, entretanto, uma pobreza relativa severa e crescente se considerarmos a desigualdade de renda. O Coeficiente de Gini mede a igualdade de distribuição da riqueza de um país numa escala de 0 a 100, onde 0 indica a igualdade Tabela 2. Principais causas de morte no mundo; 1990 e 2013 (Fonte: Kassebaum et al. 2014 (75)) doenças crônicas se desenvolvam. Os riscos comportamentais à saúde estão resultando no surgimento de doenças crônicas também entre os adultos jovens, aumentando o risco de deficiência severa na velhice e de morte prematura. Países menos desenvolvidos estão vivendo um aumento vertiginoso das mortes por doença crônica, enquanto que, nos países desenvolvidos, a taxa de mortalidade vem se mantendo estável (76). De acordo com a OMS (77), as mortes por doença crônica irão au- mentar em 15% no mundo entre 2010 e 2020, mas os maiores aumentos, de 20%, ocorrerão na África, Mediterrâneo Oriental e Sudeste Asiático. Nos países menos desenvolvidos, 29% das mortes por doença crônica ocorrem nas pessoas abaixo dos 60 anos, comparado com 13% nos países mais desenvolvidos (77). A grande maioria dos idosos tem doenças crônicas e muitos têm múltiplas doenças. Nos Estados Unidos, 92% das pessoas acima dos 65 anos têm ao menos uma doença crônica Seção I: A Revolução da Longevidade • 27 perfeita e valores mais altos mostram o grau de concentração de riqueza nas mãos de poucos. As Tabelas 3 e 4 mostram os dez países mais igualitários e os dez onde há maior desigualdade em termos de renda e gasto com consumo. De acordo com uma análise realizada pela Oxfam, sete em cada dez pessoas no mundo vive em países onde a desigualdade econômi- ca aumentou durante as últimas três décadas (88). Aí estão incluídos países da Organiza- ção para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) onde a desigualdade de renda vem aumentando de forma constante desde a década de 1980 (89). Nesses últimos países, os 10% mais ricos da população ti- nham 9,5 vezes a renda dos pobres em 2014, comparado com sete vezes a renda na década de 1980 (89). Nos países em desenvolvimen- (Fonte: Banco Mundial 2015 (87)) Tabela 3. Dez países com a distribuição de riqueza mais igualitária (Fonte: Banco Mundial 2015 (87)) Tabela 4. Dez países com a distribuição de riqueza mais desigual to, a desigualdade de renda aumentou em 11% em duas décadas (1990-2010) (84). No âmbito global, o quintil mais rico da população possui mais de 70% da renda global, enquanto que os 20% mais pobres têm que se sustentar com somente 2% (90). A metade inferior da população mundial - 3,5 bilhões de pessoas - possui o mesmo que as 85 pessoas mais ricas do mundo, que poderiam confortavelmente se acomodar em um ônibus de dois andares. (405) É importante continuar a investir em saúde para reduzir as desigualdades persistentes entre nações, entre homens e mulheres, e entre grupos sociais, mas é possível reduzir consideravelmente a desigualdade tanto de renda quanto de educação. Houve tentativas significativas de reduzir a desigualdade de renda em algumas regiões. Alguns países da América Latina - ainda a mais desigual em termos de renda - apresentaram certo progres- so através de uma abordagem universal de política pública que incorpora transferências de renda aos pobres e um foco na proteção ao trabalhador. Com o crescimento da insegurança financeira acima das pressões ambientais, examinar e combater as desigualdades se torna ainda mais importante. O aumento da desigualdade de renda ficou no topo da lista das dez principais tendências com que o mundo se depara em 2015 de acordo com o Fórum Econômico Mundial (91). A OCDE mostra ainda que a desigualdade de renda impede o crescimento 28 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade econômico e recomenda aumentar a redistri- buição de renda para reduzir a desigualdade e promover a prosperidade (89). Conforme relatado pelas Nações Unidas (ONU), as desigualdades de renda entre ge- rações em termos de taxas de pobreza relativa revelam um cenário variado (Fig. 4) (25). Apesar de haver variações consideráveis, a maioria das taxas de pobreza são mais altas em idosos do que na população em geral, na maior parte das regiões do mundo (25). Na África Subsaariana, a população idosa é tão pobre quanto ou ligeiramente mais pobre do que as outras gerações. Em alguns países da América Latina (Argentina, Uruguai e Bra- sil), a introdução das pensões universais não contributivas para idosos reduziu a taxa de pobreza na população idosa a níveis signi- ficativamente inferiores às da população em geral. Os países da OCDE apresentam uma gama de cenários, mas em cerca de metade deles, há mais idosos do que jovens pobres - especialmente se considerarmos pessoas aci- ma dos 75 anos. Em alguns países, os idosos estão em situação melhor do que os adultos jovens e do que as famílias com filhos, cujas taxas de pobreza aumentaram.4 Em outros, o rápido aumento dos salários dos trabalhadores jovens deixou os idosos em situação compa- rativamente pior. Alcançar a justiça social no contexto da Revolução da Longevidade requer políticas que se adaptem às mudanças das condições econômicas para dar suporte a todas as gerações de maneira equânime. Garantir a segurança econômica da popula- ção idosa continua a ser uma política global prioritária - não somente pelo bem-estar dos próprios idosos, embora esse seja o objetivo primeiro - mas também porque a renda rece- bida pelos idosos beneficia outras gerações da família (92). Evolução dos direitos humanos. A compre- ensão e a aplicação dos direitos humanos fundamentais evolui à medida que as socie- dades mudam. Desta forma, houve grande evolução ao longo do último século, mas ainda há muito a ser feito. Os séculos XX e XXI foram marcados por uma progressão de reconhecimentos de direitos humanos de sub- -grupos populacionais específicos que foram formalizados em convenções e declarações da ONU. Fundamentados na Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU (1948), tratados adicionais foram adotados por Estados-Membro da ONU para oferecer 4 A crise financeira de 2008 teve maior impacto sobre o emprego e o bem-estar econômico dos adultos jovens e de meia-idade do que dos idosos nos países mais desenvolvidos (151). Seção I: A Revolução da Longevidade • 29 SEÇÃO II: REPENSANDO O CURSO DE VIDA Um Curso de Vida mais Complexo Como os indivíduos alocam o tempo e que pa- peis desempenham ao longo da vida depende, em grande parte, da sociedade em que estão inseridos. A longevidade, juntamente com outras tendências importantes, está remode- lando o curso de vida de formas complexas e diversas. Ao mesmo tempo, a vida das pessoas tanto nos países de baixa como nos de alta renda está cada vez mais diferente. Nas sociedades pré-industriais que ainda ca- racterizam muitos países de baixa renda hoje em dia, é comum que as crianças frequentem a escola somente até a puberdade e logo de- pois assumam as responsabilidades da vida adulta. A maioria dessas crianças faz parte da mão-de-obra informal e não recebe, portanto, benefícios ou pensões. As mulheres podem trabalhar fora também, acumulando a grande responsabilidade de cuidar das crianças e de outros familiares, inclusive parentes idosos dependentes. Homens e mulheres continuam a trabalhar enquanto forem física e mental- mente capazes, contribuindo para o sustento da família da forma como podem. A velhice costuma ser definida pela incapacidade e pela dependência. Ao longo do século XX e até os dias de hoje, a velhice nas sociedades industrializadas tem SEÇÃO II: REPENSANDO O CURSO DE VIDA sido o produto da aposentadoria formalizada. A origem dessa construção social é o sistema previdenciário de Bismarck, introduzido em 1889. Esse sistema fornecia uma pequena pensão aos trabalhadores acima dos 70 anos de idade - numa época em que a expectativa de vida do homem ainda estava abaixo dos 40 anos (97). A aposentadoria formal que foi então introduzida por vários governos em todo o mundo causou profundas mudanças em como percebemos a idade (98). Uma vez que o fator determinante para deixar a força de trabalho deixou de ser a incapacidade e passou a ser a idade, essa passou a ser asso- ciada à incapacidade, de modo independente da capacidade funcional do indivíduo (98). Especialmente para os homens, isso levou a um “curso de vida normativo padronizado cronologicamente” (99). O padrão passou a ser caracterizado por um curto período de aprendizagem até o fim da adolescência, um período longo de trabalho (não raro para o mesmo empregador) e, na maioria das vezes, um período muito curto de aposentadoria, dada a baixa expectativa média de vida (Fig. 5). Para as mulheres não empregadas na força de trabalho, a “aposentadoria”, quando acon- tecia, era um evento menos formal: o papel de cuidadora da família se esvaziava quando os filhos saíam de casas, mas ela continuava a ser responsável pelas tarefas domésticas. O curso de vida passou a ser dividido em três fases distintas - aprendizagem, trabalho 34 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade tão que os aposentados tenham sido o grupo que obteve o maior aumento no tempo de la- zer ao longo do último século (104). O tempo de lazer aumentou para outras faixas etárias também, mas somente em algumas horas por semana e de forma desigual. Os homens con- seguiram mais tempo livre do que as mulheres (105), assim como os trabalhadores com ní- veis de escolaridade mais baixos em compa- ração com os de nível universitário (104). Nos países mais desenvolvidos, e talvez nas elites profissionais dos países menos desenvolvidos, as políticas dos locais de trabalho se tornaram um pouco mais adaptáveis à necessidade dos empregados altamente qualificados de flexibilizar a distribuição das horas limitadas de lazer. Exemplos disso são as semanas de trabalho comprimidas e os períodos sabáticos pagos pelo empregado. Um Curso de Vida mais Longo, Individualizado e Flexível À medida que o século XXI avança e o curso de vida mais longo passa a estar sujeito à maior complexidade de variáveis intercor- rentes e, às vezes, recorrentes, os limites do modelo de curso de vida de três estágios vão inevitavelmente se tornar ainda mais mal de- finidos (Fig.7). A aprendizagem irá continuar a predominar nas primeiras décadas de vida, mas provavelmente não cessará. O treina- mento contínuo no emprego e certificações e cursos de curta duração para se manter em dia com as mudanças tecnológicas e conceituais, cada vez mais rápidas, precisarão acompanhar as pessoas ao longo de toda a vida. A apren- dizagem baseada no trabalho pode começar mais cedo. O compartilhamento das tarefas de administração da família e da casa entre os casais continuará a ser negociado (99). Pes- quisas em países mais desenvolvidos preveem que uma divisão mais igualitária do trabalho entre homens e mulheres em casa irá se de- senvolver (106). A tendência de se ter uma vida profissional mais longa provavelmente se manterá, mas mais pessoas se aposentarão de forma mais gradual e individualizada (104). Em vez de concentrar-se na fase pós-apo- sentadoria, o tempo de lazer poderá se tornar muito mais bem distribuído ao longo de um curso de vida muito mais flexível que esteja mais alinhado com as necessidades e prefe- rências individuais. É muito provável que a vida se torne muito mais variada e dinâmica. As pessoas irão aprender, cuidar, trabalhar e devotar tempo a atividades recreativas ao lon- go de toda a vida com muito menos atenção à idade cronológica. As instituições precisam se adaptar às transformações culturais inerentes à Revolução da Longevidade, mas também os indivíduos devem se preparar para esses anos adicionais de vida que irão requerer maior versatilidade. A Revolução da Longevidade tem impactos retroativos ao longo do curso de vida - além do simples fato de enfrentar uma velhice mais longa. “A vida está ficando mais parecida com uma maratona do Seção II: Repensando o Curso de Vida • 37 Figura 7. Curso de vida de homens e mulheres no futuro (Fonte: Adaptado de Kalache 2013 (21)) 38 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade que com os 100 metros rasos. Precisamos ajustar o passo para o longo percurso.” (21) Muito do nosso comportamento individual está diretamente relacionado com as nossas expectativas sobre os anos de vida que restam. As decisões relacionadas aos investimentos em capital humano, economias e consumo (107), nosso comportamento com relação à saúde e o planejamento para a aposentadoria (108) são influenciados pela percepção do tempo que nos resta de vida. Até mesmo as escolhas no que diz respeito às relações sociais podem também ser influenciadas por essa percepção (109). Subestimar a duração da velhice pode levar a um planejamento insuficiente (108). O aumento da expectativa de vida, em para- lelo com outras tendências sociais e demo- gráficas, está mudando a estrutura familiar e as relações intergeracionais. Mais gerações, mas menos representantes de cada uma delas, estão simultaneamente presentes e engajados na sociedade. À medida que os limites dos estágios do curso de vida se tornam mais porosos e variáveis, as faixas etárias, antes contrastantes, passarão a ser menos separa- das do que no passado. Adultos mais jovens e mais velhos assistirão as mesmas aulas na universidade e participarão do mesmo trei- namento para o emprego. Empregados de diferentes idades ocuparão cargos em níveis “júnior” e “sênior”. Uma maior flexibilidade na divisão do tempo livre e do trabalho re- munerado possibilitará que mais adultos de todas as idades se engajem nas atividades de lazer e no trabalho voluntário, tão vitais para o capital social. Interações pessoais regulares e significativas com pessoas de diferentes idades começarão a desestruturar estereótipos e discriminação por idade, originados pelo contato limitado (110). Com uma transição mais fluida entre o trabalho remunerado e a aposentadoria e a boa saúde por mais tempo, a política de bem-estar social deixará de se focar nos benefícios arbitrários ligados à ida- de, direcionando esforços para programas que respondam a necessidades sociais e de saúde prementes ao longo da vida. A transferência de riqueza entre gerações beneficiará netos e bisnetos, além dos herdeiros diretos, que têm maior chance de estar bem estabelecidos quando os pais venham a falecer (106). Uma vida mais longa e saudável e a mudança dos modelos de curso de vida em muitos países fazem com que o papel e a imagem dos idosos sejam redefinidos. Ao mesmo tempo, é neces- sário lembrar que essa “nova era da velhice” que está se desenvolvendo ainda não se aplica a vida da maioria das pessoas nas regiões menos desenvolvidas, cuja vida continua a ser mais restrita ao trabalho e ao cuidado. Os Gerontolescentes Estão Transformando a Sociedade - de Novo Durante o período de crescimento econômi- co nos países de alta renda após a Segunda Guerra Mundial, os jovens passaram a se dar ao luxo de permanecer mais tempo estudan- do antes de começar a trabalhar. À medida que essa prática se tornou mais comum, o termo “adolescência”, usado pela primeira vez no final do século XIX (111), surgiu para descrever essa nova fase de transição, com duração de quatro a cinco anos, entre a infância e vida adulta. Conforme a Revo- lução da Longevidade ganha impulso, uma fase de transição contemporânea vai sendo engendrada, delineada mais por marcadores funcionais do que pela idade. Muitos observa- dores consideram que represente um estágio do desenvolvimento humano singular e sem precedentes. Foi também chamada de “final da meia idade” por alguns, em referência à manutenção da saúde e das atividades da meia idade e de anos “encore” para enfatizar a ideia de segunda chance e de novos dire- cionamentos para engajamento significativo. Foi também chamada de “gerontolescência” (21) para nos lembrar que a grande geração do baby boom, que atualmente a define, é também a mesma coorte que criou e definiu a construção social de “adolescência”. Essa Seção II: Repensando o Curso de Vida • 39 O australiano Frank Kelly foi pai de seis filhos, fisioterapeuta, dançarino de salão, veterano da força aérea e contribuiu enormemente para a comunidade onde vivia. Ao longo da vida, sempre acreditou ser um homem de sorte, mesmo durante sua difícil jornada final, quando desenvolveu demência. Desde o final da década de 1970, Frank foi a vários funerais de amigos e conhecidos e refletia abertamente sobre o fim da vida com a família. “Esta é minha hora de morrer e vocês precisam entender isso.” 42 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade SEÇÃO III: ENVELHECIMENTO ATIVO | - PROMOVENDO A RESILIÊNCIA AO LONGO DO CURSO DE VIDA ”O que você deseja para si mesmo à medida que envelhece? Como gostaria de envelhecer? Onde gostaria de morar? O que gostaria de fazer? As respostas para as perguntas acima são praticamente universais: as pessoas dizem que gostariam de envelhecer com boa saúde, no conforto do lar, passando tempo com amigos, família e celebrando a vida.” (21) Definição e Princípios O conceito de Envelhecimento Ativo da OMS captura essa visão positiva e holística do envelhecimento e a utiliza tanto como aspiração individual quanto como meta de políticas. Aplica-se igualmente a indivíduos e sociedades. A formulação inicial identifi- cava a saúde, a participação e a segurança como componentes fundamentais do Envelhecimento Ativo. O conceito foi ainda mais refinado (21) com a adição da aprendizagem ao longo da vida como outro componente, conforme promulgado pela Conferência Internacional de Envelhecimento Ativo em Sevilha em 2010 e subsequen- temente refletido em diretrizes políticas para a província espanhola de Andaluzia (121). Os indivíduos que estão envelhecendo ativa- mente aproveitam as oportunidades que sur- gem ao longo da vida para alcançar e manter a saúde, uma ocupação rica em significado, relações sociais, novas habilidades, conheci- mento e necessidades materiais. No nível pes- soal, esses são recursos, ou tipos de “capital”, que quando acumulados ao longo do curso de vida, passam a ser os fundamentos para o O Envelhecimento Ativo é o processo de otimização de oportunidades para a saúde, a aprendizagem ao longo da vida, a participação e a segurança para melhorar a qualidade de vida à medida que as pessoas envelhecem. SEÇÃO III: ENVELHECIMENTO ATIVO - PROMOVENDO A RESILIÊNCIA AO LONGO DO CURSO DE VIDA bem-estar físico, mental e social em todas as idades. Quanto mais cedo esse acúmulo dos capitais vitais de saúde, geração de renda, redes sociais e conhecimento começar, melhor (122). Todos são interdependentes e se refor- çam mutuamente. A saúde é universalmente reconhecida como o requisito mais essencial para a qualidade de vida. A capacidade de participar de todas as esferas de atividade - trabalho, diversão, amor, amizade, cultura - depende, em grande parte, de ter saúde física e mental. A participação, por sua vez, contribui para uma boa saúde. A aprendizagem é um recurso renovável que melhora a capacidade de se manter saudável e de adquirir e atualizar conhecimentos e habilidades para permane- cer relevante e melhor assegurar a segurança pessoal. Quanto mais saudável e instruído se é em qualquer idade, maiores as chances de se participar plenamente na sociedade. Saúde e conhecimento são, portanto, fatores chave para o empoderamento e a participação plena na sociedade. Ter todas as necessidades bási- cas materiais e de saúde supridas e se sentir seguro de ameaças externas são pré-requisitos para o bem-estar em qualquer idade, mas ganha maior relevância em determinadas situações (por exemplo, durante períodos de doença, desemprego e na velhice). O quarto pilar do Envelhecimento Ativo, a segurança confere o sentimento de estar protegido, em um sentido amplo - da negligência, da pobreza extrema, do abandono e da falta de cuidado quando esse se faz necessário. O Envelhe- cimento Ativo é um processo contínuo, um investimento de vida que se estende por toda 44 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade que tiveram ótimos hábitos de saúde na meia idade (132). Além disso, há muitas evidências dos benefícios advindos da adoção de estilos de vida mais saudáveis, mesmo em idades bastante avançadas (133) - confirmando a máxima de que “nunca é tarde demais”. A importância da saúde mental e social para o Envelhecimento Ativo é frequentemente negligenciada. A saúde mental positiva é uma característica constante das pessoas de maior capacidade funcional de todas as idades. Evidencia-se por alguns traços distintos como auto-estima, a perspectiva positiva de vida, relações pessoais satisfatórias e habilidade de lidar bem com estresse (134,135). A saúde física e mental influenciam uma à outra, tanto positiva quanto negativamente. Apesar de a prevenção da doença e da deficiência serem a primeira linha de ação, o tratamento, o apoio e o cuidado são acompanhamentos necessários à reabilitação e à preservação da qualidade de vida. As mudanças fisiológicas e funcionais, juntamente com o impacto de fatores externos ao longo do tempo, acabam por levar a maior ou menor deficiência. O cuidado apropriado e oportuno que minimiza as perdas beneficia indivíduos, famílias e a sociedade como um todo (136). Uma Abordagem de Curso de Vida. O argu- mento do Envelhecimento Ativo ao longo do curso de vida com foco na saúde funcional foi apresentado graficamente por Kalache e Kickbusch (137), e pela OMS (1), com aprimoramentos de Kalache (21) para melhor incorporar o papel da promoção e da reabili- tação para o Envelhecimento Ativo (Fig. 8). Capacidade funcional ao longo do curso de vida. A Figura 8 mostra a trajetória da capaci- Figura 8. Abordagem do curso de vida em relação ao Envelhecimento Ativo (Fonte: Adaptado de Kalache e Kickbusch 1997 (138) e OMS 2002 (1)) Seção III: Envelhecimento Ativo - Promovendo a Resiliência ao Longo do Curso de Vida • 47 dade física funcional ao longo do curso de vida desde o nascimento. A capacidade funcional aumenta e chega ao ápice no começo da vida adulta. É nesse ponto que a força muscular e as capacidades ventilatória e cardíaca estão em nível ótimo. Depois desse ponto, haverá declínio inevitável da capacidade funcional. A taxa de declínio é claramente influenciada pela idade, mas a afetam muito mais o estilo de vida e as variáveis externas, inclusive o acesso aos serviços de saúde - que podem ser modificadas. Se a predominância dessas condições pessoais e externas for favorável, a taxa de declínio será muito gradual e a pessoa continuará a ser capaz de realizar as atividades do dia-a-dia durante a velhice. Esse ideal de capacidade funcional robusta e sustentada leva à “compressão da morbidade” (139), na qual o inevitável declínio e a invalidez são comprimidos em um espaço muito curto de tempo imediatamente anterior à morte. Uma vida longa e independente com boa saúde é a conclusão ideal do modelo do Envelhe- cimento Ativo (ver Fig. 11 para possíveis trajetórias de fim da vida). Análises recentes das tendências de morbidade na população dos Estados Unidos e de outros países de alta renda (140) sugerem que a compressão da morbidade esteja de fato ocorrendo. Outros estudos, entretanto, indicam que esse ganho de expectativa de saúde nos países de alta renda está ameaçado pelo aumento do seden- tarismo e da hipernutrição, levando a altas taxas de obesidade. No entanto, é importante mencionar que a compressão da morbidade não é, de forma alguma, o que ocorre com a vasta maioria da população dos países menos desenvolvidos (81). Indivíduos que crescem pobres, subnutridos ou em bairros desfavorecidos e violentos, com poucas oportunidades educacionais, não alcançarão a capacidade funcional ótima. Sua capacidade funcional irá cair rapidamente durante uma vida caracterizada por empregos mal remunerados ou desemprego, circuns- tâncias de vida estressantes e poucas opções de saúde. Terão propensão para desenvolver doenças crônicas na meia idade e se tornar incapacitados antes de alcançar a velhice. Na ausência de reabilitação e cuidado, ficarão cada vez mais doentes, mais incapacitados e em situação de risco extremo, até que morram, prematuramente - seguindo a linha amarela do gráfico. O limiar da dependência. O limiar da depen- dência é o nível de impedimento no ambiente que transforma uma limitação funcional (como a visão diminuída ou um joelho en- rijecido pela osteoartrite) em dependência ou deficiência. Um limiar alto aumenta a dependência. O planejamento urbano ruim, o transporte público inadequado, a informação de difícil acesso, as barreiras arquitetônicas, a falta de apoio social e as barreiras econô- micas são questões que contribuem para a elevação desse limiar. Baixar o limiar redu- zindo barreiras (por exemplo, pela melhora da iluminação e da sinalização, pelo estímulo à inclusão social e pela garantia da seguran- ça econômica) permite que as pessoas com limitações mantenham sua funcionalidade. Intervenções que auxiliem as pessoas a man- ter suas funções, prevenir e controlar doenças e reverter ou retardar o declínio, bem como implementar planejamento e design amigo do idoso, são importantes para reduzir o limiar de dependência. Essa é a razão pela qual, no gráfico de capacidade funcional, o limiar não é representado por uma linha mas sim uma barra, o que significa que pode variar dentro de um intervalo; em outras palavras, duas pessoas diferentes com a mesma condição física podem levar vidas bem distintas: a pri- meira, uma vida independente (por estar em um ambiente favorável), a outra, tornando- -se incapacitada por estar inserida em um ambiente adverso. Pilar 2. Aprendizagem ao Longo da Vida A globalização e as rápidas mudanças na ex- pansão da economia de conhecimento fazem com que a informação seja, hoje, o commodi- ty mais valioso. (141). O acesso à informação é, portanto, chave para o Envelhecimento 48 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade Ativo. A aprendizagem ao longo da vida é im- portante não somente para a empregabilidade, mas também para favorecer o bem-estar. É um pilar que sustenta todos os outros pilares do Envelhecimento Ativo. Nos instrumenta- liza para permanecer saudáveis, relevantes e engajados na sociedade. Confere, portanto, poder de decisão e maior certeza de segu- rança pessoal. No nível social, pessoas bem informadas e capacitadas de qualquer camada social e de todas as idades contribuem para a competitividade econômica, o emprego, a proteção social sustentável e a participação dos cidadãos. A aprendizagem ao longo da vida, ao facilitar a prosperidade em geral, contribui significativamente para a solida- riedade entre gerações. A OCDE considera a aprendizagem contínua um dos componentes mais importantes do capital humano em um mundo que está envelhecendo (142). A aprendizagem sob o ponto de vista for- mal - isto é, a aquisição de conhecimento de forma estruturada com o objetivo de obter certificado ou diploma -, se concentra, tradi- cionalmente, nas primeiras décadas de vida. Contudo, a aprendizagem está sendo cada vez mais necessária durante a vida adulta, devido à especialização profissional, a mudanças de carreira ou simplesmente crescimento pes- soal. Grande parte do desenvolvimento de habilidades adicionais acontece em situações informais, por meio de atividades planejadas como oficinas, cursos de curta duração e se- minários. Por fim, a aprendizagem informal ou experiencial ocorre em todas as idades no cotidiano - em casa, no trabalho e nas ativi- dades de lazer. A necessidade de aprendizado é variada e constante ao longo do curso de vida. Paralelo à educação formal e às habilidades de leitura e escrita, a educação para a saúde é necessária para o auto-cuidado, a educação financeira é necessária para gerenciar renda e despesas e a educação tecnológica é necessária para estar plenamente conectado. Ficar desa-tualizado sobre os avanços tecnológicos pode fazer com que a pessoa não possa mais exercer a profissão que aprendeu (por exemplo, um engenheiro do setor automotivo hoje precisa saber mais sobre eletrônica do que mecânica; há vinte anos, só precisava saber mecânica). A vulnerabilidade, em todos os aspectos, aumenta nas pessoas com baixo nível de esco- laridade - um grupo em que, com frequência, preponderam minorias raciais e culturais, imigrantes, deficientes e idosos e, em muitos países, mulheres também. A educação organizada de adultos após o fim da escolarização tende a se focar na aquisição de habilidades e conhecimentos relacionados ao trabalho e a se direcionar a pessoas em ati- vidade na força de trabalho. A necessidade de uma abordagem mais inclusiva e estratégica feita especialmente para determinados grupos alvo no intuito de promover o Envelhecimen- to Ativo foi reconhecida pela Comissão Eu- ropeia (143), incluindo pessoas que deixaram a escola precocemente e imigrantes. Um mo- delo de curso de vida ainda mais abrangente para a aprendizagem de adultos pressupõe uma variedade de programas que atendam às necessidades de lidar com situações, de contribuir e de cultivar relacionamentos (ou seja, aperfeiçoamento pessoal) (144). Pilar 3. Participação Participação é muito mais do que simples- mente ter um trabalho remunerado. Significa engajamento em qualquer causa social, cívica, recreativa, cultural, intelectual ou espiritual que dê significado à vida e promova um sentimento de realização e de pertencimen- to. “Participar” sustenta a saúde positiva, por favorecer o engajamento e a fluência de experiências que podem ser intrinsecamente satisfatórias, conferindo um sentimento de ter propósito na vida e constituindo oportunida- des para relações sociais positivas (134). Ter propósito na vida contribui para diminuir o risco de morte em pessoas de todas as idades (145). O engajamento social e intelectual está ligado à boa saúde - subjetiva (relatada pelos sujeitos) e objetivamente - desde a juventude até a velhice (146) e ao bom funcionamento Seção III: Envelhecimento Ativo - Promovendo a Resiliência ao Longo do Curso de Vida • 49 SEÇÃO IV: DETERMINANTES DO ENVELHECIMENTO ATIVO - CAMINHOS PARA A RESILIÊNCIA Em 2002, no intuito de esclarecer os fatores múltiplos e interativos que determinam se a pessoa envelhece ativamente ao longo da vida ou não, a OMS promulgou um conjunto inter-relacionado de Fatores Determinantes do Envelhecimento Ativo (Fig. 9). A cultura e o gênero foram considerados como fatores determinantes abrangentes e transversais que SEÇÃO IV: DETERMINANTES DO ENVELHECIMENTO ATIVO - CAMINHOS PARA A RESILIÊNCIA moldam as pessoas e o meio em que estão inseridas ao longo da vida. Os fatores deter- minantes e os comportamentos pessoais são específicos de cada pessoa. O ambiente físico - os fatores determinantes sociais, econômi- cos, de saúde e de serviço social - constituem os fatores contextuais. Figura 9. Determinantes do Envelhecimento Ativo (Fonte: OMS 2002 (1)) Todos os fatores determinantes interagem e formam uma rede dinâmica de condições de proteção que podem tanto favorecer o desenvolvimento de reservas para respostas resilientes, quanto criar riscos que impeçam o desenvolvimento dessas reservas ou as destruam completamente. Resumidamente, o Envelhecimento Ativo é a interação dinâmica, que ocorre durante toda a vida, entre risco e proteção na pessoa e no ambiente. Ao mes- mo tempo, cada fator determinante também influencia individualmente o Envelhecimento Ativo. Embora haja uma quantidade cada vez maior de pesquisas baseadas em dados de estudos longitudinais sobre muitos dos fatores deter- minantes, ainda há uma compreensão limitada de como eles interagem ao longo da vida. Embora mais evidências estejam surgindo nos países de média renda, especificamente 54 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade plásticas e outras fórmulas mágicas. As taxas de cirurgia plástica aumentaram em paralelo ao envelhecimento populacional (187) e os Estados Unidos e o Brasil foram os líderes mundiais em número de cirurgias estéticas em 2013 (188). A discriminação por causa da idade e de outras características sociais é cada vez mais reconhecida como um fator de risco para a saúde (189), pois limita o acesso a outros fato- res determinantes, como recursos econômicos e serviços. As ações discriminatórias variam desde a exclusão até a recusa de serviços, a negligência e a violência. Como outros preconceitos, como o racismo e o sexismo, o edaísmo ignora tanto as diferenças quanto as semelhanças entre os grupos - nesse caso, entre os idosos e os jovens (190). O design é um desses exemplos. Desconsiderar uma perspectiva significativa para pessoas idosas no processo de planejamento urbano leva à exclusão. Os idosos consultados sobre o pla- nejamento urbano em 33 cidades do mundo para o Guia Cidade Amiga do Idoso da OMS (2007) relataram consistentemente que os sinais de trânsito para pedestres eram breves demais e que havia um número insuficiente de bancos para que os pedestres pudessem descansar (14). Outro exemplo é a dificuldade em lidar adequadamente com as diferenças de idade na área das políticas. O relatório da OMS Idosos em Situações de Emergência: Uma Perspectiva do Envelhecimento Ativo (2008) (191) identificou emergências naturais e relacionadas a conflitos nas quais as respos- tas políticas não levaram em consideração vulnerabilidades específicas mais comuns em idosos, como as limitações de mobilidade e a maior suscetibilidade às variações de tem- peratura. A discriminação por causa da idade pode ser encontrada em todo tipo de situação. Manifesta-se no local de trabalho na relutân- cia de contratar e treinar trabalhadores idosos e nas políticas de aposentadoria compulsória com base na idade. No cuidado à saúde, se evidencia na falsa crença de que as doenças são menos tratáveis na velhice, resultando na limitação do acesso a serviços diagnósticos e a intervenções (79). Gênero. As expectativas sobre homens e mulheres desde o nascimento determinam as oportunidades e os riscos para o Envelheci- mento Ativo em todas as áreas da vida. Apesar dos avanços importantes em vários países nas últimas décadas, ainda há disparidades significativas entre homens e mulheres. O acúmulo dessas discrepâncias tem forte im- pacto sobre a saúde e o bem-estar dos idosos de várias maneiras e consequências enormes para a sociedade em geral. As mulheres e o envelhecimento. O discurso dominante em quase todas as culturas é o de superioridade masculina. Tem inevitavelmen- te um efeito importante sobre as mulheres, agravado ainda por outras condições como a pobreza, a invalidez e o próprio processo de envelhecimento. Conforme documentado pelo Fórum Econômico Mundial (192), as mulheres estão em variados graus de des- vantagem em todos os países e em todas as áreas da vida - participação econômica e oportunidades, grau de escolaridade, saúde e sobrevivência e poder de decisão política. Especialmente em regiões mais desenvol- vidas, houve progresso substancial, mas as desigualdades de gênero persistem em todo o mundo (193). Mesmo em alguns países de alta renda há situações recentemente relatadas de aumento de desigualdade: na Austrália, por exemplo, as mulheres estão ganhando 81,8 centavos para cada dólar que os homens ganham, nos mesmos postos e ocupações, abaixo dos 85,1 centavos que ganhavam há dez anos (194). O relatório da OMS sobre Mulheres, Enve- lhecimento e Saúde (2006) apresenta várias desigualdades específicas de gênero (195). • Meninas e mulheres podem ter menos acesso a alimentos nutritivos, a atividades físicas que promovam a saúde e a sono adequado. • Meninas e mulheres têm menos acesso à educação e a oportunidades de participação e desenvolvimento pessoal fora de casa. Seção IV: Determinantes do Envelhecimento Ativo - caminhos para a Resiliência • 57 • Na educação formal e no mercado de tra- balho, os estereótipos de gênero restringem as escolhas de carreira da mulher, o nível de aspiração, o salário e a renda após a aposentadoria. • As mulheres podem não ter direito de her- dar os bens da família nem de conseguir um acordo justo por ocasião do divórcio. • As expectativas com relação ao tradicional papel de cuidadora da mulher na família muitas vezes limita as possibilidades de desenvolvimento pessoal e profissional fora de casa, assim como a segurança financeira atual e futura. O cuidado, especialmente o cuidado de longo prazo de pessoas com incapacidade, é, em sua maioria, realizado por mulheres e tem con- sequências importantes para a saúde (196). Meninas e mulheres têm maior probabilidade de sofrer violência doméstica e abuso sexual do que meninos e homens (197). As mulhe- res sofrem discriminação no acesso à saúde; por exemplo, as mulheres não têm o mesmo acesso do que os homens a muitos serviços e intervenções especializados (195,198). Diferenças biológicas relacionadas ao enve- lhecimento e ao sexo, agravadas pelo impacto cumulativo das desigualdades sociais ao lon- go da vida, levam a maiores taxas de morbida- de e incapacidade. Por exemplo, uma análise transversal recente de dados internacionais concluiu que a baixa idade materna quando do nascimento do primeiro filho está ligada a uma maior prevalência de doença crônica e ao pior desempenho físico na velhice (199). No âmbito mundial, embora 40% de todos os homens e mulheres acima dos 60 anos vivam com alguma deficiência (200), mais mulhe- res apresentam problemas de mobilidade, incontinência, lesões relacionadas a quedas, demência e depressão (195). As mulheres, com maridos mais velhos de cuja renda dependem, têm muito mais pro- babilidade de ficar sozinhas e pobres na ve- lhice. É comum que mulheres idosas vivam sozinhas, com uma baixa renda, muitas vezes com doenças crônicas e deficiências e, portan- to, sejam socialmente isoladas e vulneráveis. Mulheres de idade avançada são o grupo populacional que demanda mais cuidados da comunidade (201). Um fator de proteção contra o isolamento das mulheres, entretanto, é o vínculo mais estreito com familiares e, em geral, uma rede maior de amigos em compa- ração com os homens (202). Os homens e o envelhecimento. Embora desfrutem mais das vantagens sociais e eco- nômicas que favorecem o Envelhecimento Ativo do que as mulheres, a socialização dos homens que estimula, na maioria das culturas, ser “masculino” (ou seja, forte e auto-sufi- ciente) traz vários riscos ao bem-estar físico, social e mental (203). O fato de os homens se exporem a risco mais frequentemente ao longo da vida é uma das explicações para sua expectativa de vida mais baixa em compara- ção a das mulheres, apesar de suas melhores condições sócio-econômicas (203). De acordo com a ONU, as mulheres vivem 4,5 anos mais do que os homens em todo o mundo (204). Os homens têm maior probabilidade de con- sumir álcool em excesso (205), fumar (206), utilizar drogas ilícitas (207) e se envolver em acidentes de trânsito (208). Os homens são as vítimas mais frequentes de violência fora de casa. No Brasil em 2013, 22 em cada 1000 ho- mens jovens entre 15–24 anos morriam antes de completar 25 anos, comparado com 12 em cada 1000 mulheres jovens na mesma faixa etária (209). Em praticamente todas as regiões do mundo, os homens acima dos 60 anos apre- sentam a maior incidência de suicídio com taxas aumentando progressivamente a cada década (210). Alguns estudos mostram que os homens relutam mais a buscar ajuda para lidar com problemas de saúde (203). Em um levan- tamento randomizado de adultos australianos, os homens tinham consideravelmente menos probabilidade do que as mulheres de buscar informações de saúde e de se responsabiliza- rem pela própria saúde (211). Esforços para 58 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade direcionar informações e serviços de saúde para os homens estão aumentando nos países mais desenvolvidos (212). De acordo com a avaliação dos mesmos, os que se provarem mais eficazes, poderão ser mais amplamente implementados. A transição para a aposentadoria pode ser mais difícil para os homens, uma vez que a identidade do homem pode depender mais da sua ocupação e os relacionamentos fora da família podem ser principalmente relaciona- dos ao trabalho (213). Os homens em geral mostram mais resistência em participar de organizações e atividades voltadas para os idosos, mas a probabilidade de que participem aumenta quando a oferta se adequa aos inte- resses específicos e à experiência profissional (214). Os homens costumam cultivar menos as relações sociais com familiares e amigos, tendendo a delegar ao cônjuge esse papel (215). Viúvos idosos têm maior chance do que as viúvas de se casar novamente, possivel- mente porque tenham menos companheirismo com iguais do que as viúvas e também porque tenham mais recursos financeiros (202). O isolamento social dos homens idosos reflete uma relutância em se envolver com os outros, e os riscos de isolamento são mais altos para os homens divorciados e para os que nunca se casaram (214). “A natureza transformadora do envelhecimento populacional global exige que todas as sociedades criem novos arcabouços conceituais. Faz-se necessária uma total reavaliação sobre quem somos, como nos relacionamos com nossa vida prolongada, uns com os outros como homens e mulheres - como seres humanos. Precisamos continuar a aprofundar e expandir nossa compreensão sobre gênero por meio da colaboração interdisciplinar e intersetorial. Nossa sagacidade para inovação dentro da diversidade cultural que se apresenta permite atualizar essa visão de diferentes maneiras. Quando a igualdade de gêneros é realmente aceita, as aptidões, experiências e recursos de mulheres e homens de todas as idades serão reconhecidos como um patrimônio intrínseco de uma sociedade plenamente coesa, enriquecedora, produtiva e sustentável.” (216) Determinantes Comportamentais O comportamento individual tem papel direto e significativo no Envelhecimento Ativo. O comportamento saudável promove uma vida mais longa, uma capacidade funcional ótima e bem-estar, enquanto que o comportamento não saudável aumenta o risco de mortalidade, doença e incapacidade. As principais doenças crônicas no mundo - doença cardiovascular, hipertensão arterial, câncer e diabetes tipo II - têm relação causal com quatro fatores de risco ligados a estilos de vida: tabagismo, sedentarismo, maus hábitos alimentares e consumo de álcool (217). Os comportamentos relacionados à saúde são fundamentais para o desenvolvimento da resiliência uma vez que contribuem com a energia, a força, a resistên- cia a doenças e lesões e com uma disposição mais positiva. Contudo, a vigilância dos com- portamentos relacionados à saúde na velhice é deficitária (218), apesar do fato de que as intervenções de promoção de saúde também possam ser benéficas e ter boa relação custo- -benefício na velhice (140,219). Embora esses comportamentos sejam indivi- dualistas e dependam de decisões pessoais, Seção IV: Determinantes do Envelhecimento Ativo - caminhos para a Resiliência • 59 contribui para a fragilidade, as quedas, o enfraquecimento do sistema imunológico, a cicatrização ruim e a depressão (236). Cerca de 23% da população mundial é muçulmana (237), religião de acordo com a qual todos os fiéis, com algumas exceções, devem je- juar durante o dia no mês do Ramadã. Jejuar pode ser prejudicial à saúde dos muçulmanos idosos com problemas significativos de saúde (em especial aqueles com diabetes ou que são frágeis) na ausência de orientações adequadas de segurança por parte dos serviços de saúde (238). Atividade física. Os benefícios abrangentes, e de impacto ao longo de toda a vida, da ativi- dade física regular em todas as idades para a saúde física, cognitiva e mental estão bem es- tabelecidos. O exercício é uma das ações mais importantes para promover o Envelhecimento Ativo. Nunca é tarde demais para colher os benefícios da atividade física. Ela reduz os riscos de doença cardíaca e acidentes vascu- lares, diabetes, câncer, depressão, quedas e declínio cognitivo; preserva a mobilidade, a força muscular, a resistência, a força óssea, o equilíbrio e a coordenação (239). Um grande estudo longitudinal com homens noruegueses concluiu que 30 minutos de qualquer ativida- de física seis dias por semana estão associados a uma redução de 40% da mortalidade acima dos 70 anos. Mostrou também que aumentar a atividade física é tão benéfico quanto parar de fumar para reduzir o risco de mortalidade (240). O nível de atividade física está, contudo, caindo em todas as idades e no mundo in- teiro como resultado do estilo de vida cada vez mais sedentário (231). Os níveis de ati- vidade física são mais baixos nas mulheres do que nos homens (195) e são mais baixos na velhice em ambos os sexos (241). De acordo com o Guia Cidade Amiga do Idoso da OMS, algumas características do meio urbano desencorajam a caminhada ao ar livre (14), como o tráfico intenso, a má qualidade do ar, a violência e a ausência de calçadas, parques ou estruturas recreativas. Políticas que encorajam o uso do carro particular em lugar do transporte ativo também prejudicam a atividade física saudável. Sono. O sono adequado é uma contribuição ao Envelhecimento Ativo pouco valorizada. Dormir regularmente duas horas a menos do que as oito horas recomendadas aumenta o risco de obesidade, diabetes e doença car- diovascular e reduz a resistência a infecções, além de prejudicar a aprendizagem, a memó- ria e a resolução de problemas. Dormir cinco horas ou menos por noite pode aumentar o risco de mortalidade em até 15% (242). Pesquisas em países mais desenvolvidos mostram que a duração média do sono nos adultos diminuiu de oito para sete horas e que as queixas de dificuldade para dormir aumentaram. Desempregados e pessoas com condição sócio-econômica mais baixa rela- tam mais problemas de sono do que outros grupos (243). Pessoas que trabalham de noite ou em sistema de plantão têm mais risco de desenvolver problemas de saúde a longo pra- zo, inclusive doença cardiovascular (244). É comum que os idosos tenham dificuldade de dormir adequadamente devido às mudanças normais relacionadas ao envelhecimento e também a patologias que causam distúrbios secundários do sono, como a osteoartrite e a próstata aumentada. Um estudo recente com pessoas acima dos 50 anos em seis países mostrou uma associação positiva entre o desempenho cognitivo, a duração do sono de seis a nove horas e a boa qualidade de sono relatada pelo sujeito (245). Os adultos que já sofrem privação crônica de sono podem ter menor resiliência e maior suscetibilidade a doenças à medida que envelhecem. Sexo seguro. É provável que os baby boo- mers, gerontolescentes de agora, sejam mais ativos sexualmente do que seus pais. Têm uma melhor condição de saúde, são mais frequentemente solteiros ou divorciados, se- xualmente mais liberais do que as gerações anteriores e têm acesso a medicamentos que melhoram a experiência sexual, como o citrato de sildenafila. De acordo como um le- 62 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade vantamento da AARP (Associação Americana de Pessoas Aposentadas) (246), a maioria dos participantes americanos de meia idade ou mais velhos diz que o sexo é importante para a qualidade de vida e cerca de um terço relata fazer sexo ao menos uma vez por semana. O mesmo levantamento também revelou que so- mente uma minoria dos solteiros sexualmente ativos usa preservativo. A atividade sexual sem proteção e a sobrevida mais longa das pessoas infectadas pelo HIV estão fazendo com que aumente a incidência de doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) nos ido- sos. Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos relatam que incidência de clamídia na faixa etária acima dos 55 anos subiu 41% de 2005 a 2009 (247) e que a de sífilis subiu 67% (248) (embora os idosos ainda tenham menos essas doenças do que os mais jovens). Mais pessoas acima dos 50 anos estão vivendo com AIDS. Um estudo sobre AIDS nos Es- tados Unidos mostrou que 29% de todas as pessoas com AIDS em 2011 estavam acima dos 50 anos, comparado com 17% em 2001. Além disso, 50% dos idosos com AIDS está infectado há um ano ou menos (249). Na África Subsaariana, a introdução dos medi- camentos anti-retrovirais melhorou a expec- tativa de vida de muitas pessoas infectadas pelo HIV. Estima-se que três milhões, ou seja, 14%, da população soropositiva de 15 anos e mais, têm acima de 50 anos de idade (250). Apesar disso, os idosos são amplamente ne- gligenciados na resposta à AIDS. Há pouca campanha de prevenção de AIDS direcionada aos idosos e os médicos podem confundir a infecção por HIV com problemas associados ao envelhecimento (249,251). Mulheres idosas têm maior risco de contrair DSTs. As paredes vaginais mais delgadas são vulneráveis a laceração e, portanto, mais suscetíveis à infecção. Além disso, depois da menopausa, tendem a deixar de consultar o ginecologista para fazer o rastreamento para câncer de colo do útero. Um grande impe- dimento para o rastreamento e tratamento abrangente das DSTs tanto nos homens quanto nas mulheres é a pressuposição edaísta de que pessoas idosas não são sexualmente ativas (252). Álcool. O consumo de álcool está crescendo em paralelo ao desenvolvimento econômico e tem efeitos negativos sobre a saúde em todas as idades. Beber está associado a mais de 200 problemas de saúde, de acordo com a OMS (253), embora a doença cardiovascular e o diabetes sejam as causas mais frequentes de morte relacionada ao álcool. Os maiores consumidores de álcool estão nas Américas e na Europa, especialmente na Rússia e no Leste Europeu, mas a mudança de estilo de vida nas economias emergentes, como China e Índia, estão fazendo aumentar o consumo de álcool (253). Muito mais homens bebem em excesso do que mulheres em qualquer idade. Crianças, adolescentes e idosos são mais vulneráveis aos efeitos do álcool e quanto mais cedo se começa a beber, maior a chance de criar dependência mais tarde. O número de pessoas que bebe álcool e a quantidade consumida diminui com a idade, à medida que as pessoas se tornam mais sensíveis aos efeitos da bebida ou tomam medicamentos que contraindicam seu consu- mo. Idosos com problemas de dependência do álcool podem ter longo histórico de adição ou ter adquirido a dependência mais tarde para lidar com o estresse da vida (254). Além da relação com as doenças crônicas, o álcool está implicado em quedas, acidentes de trânsito e violência, inclusive a doméstica (255). O abu- so do álcool e suas consequências impedem a melhora da expectativa de vida nos países do leste europeu desde 1980. O aumento da incidência nos países emergentes que estão envelhecendo rapidamente é também motivo de preocupação (81). Auto-cuidado e educação para a saúde. Os comportamentos da vida cotidiana para manter a saúde e prevenir as doenças são denominados auto-cuidado. Além dos com- portamentos já descritos, eles incluem higiene oral e pessoal, consultas com profissionais de Seção IV: Determinantes do Envelhecimento Ativo - caminhos para a Resiliência • 63 saúde, vacinação, rastreamento preventivo, adesão ao tratamento medicamentoso pres- crito e outras ações voluntárias para gerenciar doenças crônicas. O auto-cuidado está forte- mente associado com a educação para a saúde, definida como a habilidade de obter, processar e compreender informações e serviços bási- cos de saúde para tomar decisões adequadas com relação à saúde (256). A Internet é cada vez mais utilizada como estratégia para obter informações de saúde (257). O baixo nível de educação para a saúde, entretanto, é bastante frequente em todas as regiões do mundo, especialmente nas pessoas idosas, com ní- veis de renda e escolaridade mais baixos e habilidade linguística ruim. Mesmo em países mais desenvolvidos, como Canadá, Estados Unidos, Austrália e Nova Zelândia, menos de 50% dos adultos têm educação adequada para a saúde (258). Portanto, esses achados sugerem que a saúde da maioria das pessoas está comprometida devido ao nível inadequa- do de conhecimento sobre como cuidar de si mesmo. Outros fatores que contribuem para o auto-cuidado incluem a autoeficácia (259) (crença na própria capacidade de conseguir realizar uma tarefa específica) e a presença de apoio social (260). Determinantes Pessoais Biologia e genética. Há um número signi- ficativo de pesquisas que mostram que os fatores genéticos respondem por até 25% da diferença na idade em que as pessoas morrem e que parte da resistência ou suscetibilidade a muitas doenças também é hereditária (261). Diferenças de inteligência são parcialmente hereditárias (262), assim como a doença de Alzheimer familiar, embora somente menos de 1% de todos os casos da doença sejam desse tipo (263). Determinadas disposições associadas com o bem-estar psicológico são evidentes desde a mais tenra infância, como a sociabilidade, o otimismo e o calor humano (264) e estudos recentes indicam que haja uma base genética para a felicidade (265). Fatores ambientais e sociais, contudo, influenciam muito se ocorre e como ocorre a maior parte das predisposições genéticas, reveladas ou não durante o desenvolvimento e o envelhecimento. Capacidade cognitiva. Há consenso sobre os padrões de mudança cognitiva ao longo do curso de vida (266). Algumas habilidades cognitivas têm seu auge na juventude e decli- nam com o passar dos anos, como a velocida- de mental, a solução de novos problemas, o raciocínio espacial e a capacidade de realizar muitas tarefas ao mesmo tempo. No entanto, habilidades que dependem do acúmulo de conhecimento e expertise aumentam com a idade, como vocabulário, conhecimentos gerais, e conhecimentos específicos e habi- lidades adquiridas através de vários papeis, ocupações e interesses ao longo dos anos. A habilidade intelectual é muito variada em todas as idades e alguns idosos têm aptidões melhores ou iguais às de pessoas mais jovens. Até uma idade bastante avançada, os idosos têm desempenho tão bom quanto o dos mais jovens em tarefas que requeiram sabedoria - ou seja, “discernimento em questões de vida importantes mas incertas” (267) - e podem ter desempenho superior ao dos mais jovens em áreas em que ambos tenham expertise (268). Embora o declínio do funcionamento cogniti- vo e o desenvolvimento da demência estejam associados ao envelhecimento, surgem a par- tir de fatores sociais, ambientais e individuais que são modificáveis. Pesquisas indicam que os idosos com maior grau de escolaridade, participação social, atividades estimulantes, estilo de vida saudável e saúde mental positi- va têm mais “reservas cognitivas”, apesar da presença de doença neurológica (269). Fatores psicológicos. A revisão de um gran- de número de pesquisas sobre o bem-estar psicológico mostra que várias disposições emocionais e características psicológicas estão associadas com a resiliência ao longo da vida adulta, que se manifesta por meio da saúde contínua, da boa recuperação após doenças e do bem-estar mental (264). En- tre essas importantes características estão 64 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade (285). É muito mais provável que uma pessoa com renda baixa vá morar em um local onde esteja exposta a riscos à saúde, como áreas de risco (encostas e margens), poluição (tráfego, indústrias), intempéries, materiais tóxicos e pouco acesso a serviços (37). O acesso a água potável e o saneamento são uma preocupação em todo o mundo. A poluição interna também é uma questão. Normalmente advém do uso, pelas mulheres de países de baixa renda, de combustíveis sólidos (lenha, carvão e estru- me) para cozinhar (286). Esse tipo específico de poluição é tido como um importante fator de risco evitável para doenças respiratórias (287). A maioria das pessoas prefere “envelhecer na própria casa” (288,289); ou seja, na casa e na comunidade onde habitualmente vivem. Barreiras arquitetônicas em casa são uma causa importante de diminuição da capaci- dade funcional, inclusive do funcionamento cognitivo (290) e do risco de quedas. Modifi- cações em casa podem ter impacto positivo e melhorar o uso da moradia (291,292), aumen- tar a independência nas atividades de rotina (291,293,294) e reduzir, consideravelmente, o número de quedas (293,295). No entanto, as adaptações da casa ou a transferência para residências alternativas podem desencadear um sentimento de perda de controle por parte dos idosos, se não forem aceitas (296). Um exemplo é o asilo ou lar para idosos que, apesar de oferecer muito conforto, pode deixar as pessoas afastadas demais do lar, da comunidade e das oportunidades de interagir facilmente com outras gerações. Meio ambiente. As mudanças ambientais e climáticas apresentam desafios imediatos e de longo prazo para a resiliência dos indiví- duos e para a capacidade das comunidades de manejar bem eventos extremos. A longo prazo, a poluição atmosférica cria ou exacer- ba problemas respiratórios e câncer. A OMS estima que sete milhões de mortes prematuras são resultado da poluição atmosférica a cada ano (297). O aumento da exposição aos raios ultravioleta faz aumentar o risco de desenvol- ver catarata e câncer de pele. O surgimento e a disseminação de bactérias desconhecidas, vírus e insetos apresentam novos perigos à saúde. Os grupos populacionais mais vulne- ráveis a esses efeitos a longo prazo das mu- danças climáticas são as crianças, os idosos, as pessoas como saúde debilitada ou com deficiências e as com baixa renda (298). A poluição atmosférica na China, por exemplo, mostrou ter consequências desastrosas para a expectativa de vida saudável e a longevidade dos idosos (299). Embora eventos ambientais graves (secas, en- chentes, ondas de calor e de frio, tempestades fortes) e desastres naturais sem relação com o clima (terremotos, tsunamis) afetem o bem- -estar de comunidades inteiras, têm um im- pacto ainda maior nos “grupos vulneráveis”: crianças, idosos e pessoas com deficiências (300). Durante o tsunami de 2011 no Japão, 31% da população afetada estava acima dos 60 anos, mas 64% dos que morreram eram idosos (18). Da mesma forma, 70% das mor- tes em decorrência do furacão Katrina, em Nova Orleans em 2005, foi de idosos, embora representassem somente 15% da população local (301). Calor extremo fora do comum por dez dias durante o verão Europeu de 2003 resultou em quase 35.000 mortes além do es- perado para o período, predominantemente de pessoas acima dos 70 anos. O maior número de mortes - quase 15.000 - ocorreu na França (191). Essas ocorrências se tornarão mais frequentes e irão afetar um número maior de idosos. Devido à redução da capacidade funcional, uma maior incidência de doença e uma rede de apoio social frequentemente menor, os idosos são mais vulneráveis ao evento em si e sofrem mais as consequências dele, como acesso limitado a medicamentos e alimentos (302). Em épocas de escassez de recursos e serviços, os idosos podem ser esquecidos na resposta à situação de emergência. No entanto, os idosos são um grupo muito variado e muitos podem contribuir, e o fazem, empregando habilidades e experiência para esforços de Seção IV: Determinantes do Envelhecimento Ativo - caminhos para a Resiliência • 67 alívio e de reconstrução. Conforme registrado em estudos de caso de vários países coletados pela OMS (302), os idosos sustentam a famí- lia, usam sua posição de respeito para manter a comunidade intacta e oferecem assistência material e prática. Muitas vezes mais vulne- ráveis em situações de emergência, também têm muitas, e às vezes únicas, contribuições a dar para a recuperação e a reconstrução das comunidades. Determinantes Sociais O ambiente social e as redes pessoais de fa- mília, amigos, colegas e conhecidos influen- ciam muito, seja favorecendo ou minando a resiliência ao longo da vida. Educação. As pessoas com maior grau de escolaridade vivem por mais tempo e com mais saúde do que as com menor grau de escolaridade (303). A educação de nível superior leva a maior renda, mais segurança de renda e melhores condições de trabalho e de moradia o que, por sua vez, resulta em saúde melhor. A educação de nível superior influencia a educação para saúde, que resulta em estilo de vida mais saudável. A educação também fortalece a resiliência cognitiva: na velhice, pessoas com maior grau de escola- ridade têm risco mais baixo de desenvolver demência do que as que têm menor grau de escolaridade (304). Enfatizando ainda mais a importância da aprendizagem ao longo da vida, os benefícios não parecem ser limitados à educação formal das primeiras décadas de vida. Aprender du- rante a vida adulta tem impacto positivo sobre a auto-estima e a auto-confiança (305), a par- ticipação social, os níveis de atividade física e de tabagismo e as habilidades e chances de arranjar emprego e conseguir uma promoção (306). Um estudo sueco mostra que, espe- cialmente para pessoas com menor grau de escolaridade e para as mulheres, conseguir um diploma quando adulto aumenta signi- ficativamente a participação no mercado de trabalho e o salário (307). A aprendizagem na velhice também contribui para o bem-estar. Por exemplo, participar de atividades artísticas ou musicais mostrou melhorar o bem-estar das pessoas acima dos 50 anos (308). Outros estudos revelaram melhor desempenho cognitivo, saúde, níveis de atividade e disposição, conforme relatado pelos sujeitos (309), além de melhor desem- penho cognitivo mensurável dos idosos ins- critos em cursos quando comparado aos não inscritos (309,310). Apesar do grande valor da aprendizagem na velhice para o bem-estar, a participação diminui com a idade (311) e aqueles que mais se beneficiariam são os que menos participam (306). Apoio social. Há forte evidência mostrando a associação entre apoio social e a saúde física e mental (312,313). As redes sociais podem fornecer apoio emocional, reforçar com- portamentos saudáveis, melhorar o acesso a serviços, emprego, informação e recursos materiais (como creche, transporte, alimen- tação e moradia) e ajudar os imigrantes a se integrar na sociedade (312–314). A associação se mantém na velhice. Aqueles com redes sociais fortes têm menos fatores de risco à saúde, menor incidência de doença cardíaca, menor taxa de mortalidade (315) e melhor saúde mental. Na velhice, as redes sociais de apoio podem se tornar menores e se focar mais na família devido a mudanças tais como perda do cônjuge, alterações de saúde ou responsabilidade de cuidar da família (316). Exclusão social. A exclusão social foi defi- nida em linhas gerais como: um processo de não reconhecimento e privação de direitos e recursos de certos segmentos da população ... levando ao isolamento social em sete dimensões: ex- clusão simbólica (imagens negativas ou invisibilidade); exclusão de identidade (a identidade da pessoa é reduzida ao fato de pertencer a um grupo); exclusão sócio- -política (entraves à participação cívica/ política); exclusão institucional (redução 68 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade do acesso a serviços); exclusão econômica (falta de recursos financeiros); exclusão de laços sociais significativos (ausência/per- da da rede social); e exclusão territorial (redução da área geográfica de moradia, vizinhança insegura). (317) Grupos minoritários e desprivilegiados em qualquer sociedade estão diante do risco da exclusão social (318). Na ausência de re- cursos, informação e apoio para facilitar a participação na sociedade e, às vezes, enfren- tando completa rejeição, esses indivíduos têm maior probabilidade de apresentar uma gama de problemas de saúde, adições, fim de rela- cionamentos e isolamento social (313). Uma pesquisa sobre idosos de minorias étnicas que moravam em bairros desprivilegiados mos- trou que muitos estão sujeitos a diversos tipos de exclusão e sofrem com a solidão e a baixa qualidade de vida (319). A exclusão social de idosos pode ser o resultado de mudanças demográficas e sócio-econômicas nos bairros em que moram. Sentir-se como estrangeiros na própria cidade foi a experiência relatada por idosos em Tóquio e Londres consultados para o Guia Cidade Amiga do Idoso da OMS (14). A gentrificação de bairros de renda mais baixa em Montreal resultou em um sentimen- to de exclusão por parte dos residentes mais velhos com relação à identidade, às redes sociais e à influência política sobre o plane- jamento local, embora a construção de um novo centro comunitário em um dos bairros tenha aumentado a inclusão social desses sujeitos (320). Isolamento social e solidão. Isolamento social é a falta objetiva de contato social; solidão é a avaliação individual subjetiva da adequação da rede social de cada um (321). Tanto o isolamento social quanto a solidão são comumente associados a maiores riscos de morbidade e mortalidade e a comportamentos não saudáveis (321). A experiência de isola- mento social e solidão para os idosos está li- gada à diminuição da função cognitiva (321). Os idosos com redes sociais enfraquecidas ou mobilidade restrita, pessoas com doença mental e refugiados apresentam risco especí- fico de isolamento social e solidão (322). As mulheres apresentam risco mais alto do que os homens (323). Um estudo transnacional em 25 países europeus mostrou que a prevalência da solidão aumenta com a idade, mas também que morar em determinados desses países representa risco ainda maior para solidão do que ser idoso (322). Violência e abuso. A violência e o abuso sofridos no começo da vida continuam a influenciar a saúde e o bem-estar ao longo da vida. Uma revisão sistemática revelou uma relação causal entre o abuso não sexual (abuso emocional ou físico, negligência) em crianças e problemas de saúde mental mais adiante e também com comportamentos que representam risco para a saúde como o abuso de drogas e o comportamento sexual perigoso (324). O impacto do abuso sobre o bem-estar na vida adulta depende de muitos fatores, como a gravidade do abuso, a idade em que aconteceu o ato abusivo, a relação que se tinha com o perpetuador, o número de perpetuadores, frequência e duração (325). A prática disseminada de contenção física, muitas vezes aplicada em idosos com de- mência em instituições de cuidado a longo prazo e instituições geriátricas (368), pode facilmente se caracterizar como uma forma de abuso ao idoso. Na Declaração de Toronto sobre a Prevenção Global do Abuso ao Idoso, desenvolvida pela OMS em parceria com a Rede Internacional para a Prevenção do Abuso ao Idoso (INPEA), há uma definição abrangente de abuso ao ido- so para orientar a prevenção, a identificação e a intervenção: O abuso ao idoso é uma ação isolada ou repetida, ou a inação quando a ação é necessária, que ocorre em qualquer rela- ção em que haja expectativa de confian- ça, causando prejuízo ou sofrimento ao idoso. Há várias formas de abuso: físico, psicológico, emocional, sexual, financeiro ou, simplesmente, a negligência, seja ela Seção IV: Determinantes do Envelhecimento Ativo - caminhos para a Resiliência • 69 nômica desde a crise de 2008 deve ter reper- cussões a longo prazo para a atual geração de adultos jovens que ainda não conseguiram se estabelecer profissional nem financeiramente (151,340). Como será a experiência de enve- lhecer para aqueles que já chegaram aos 30 anos sem um histórico de emprego e que ainda dependem dos pais e dos avós? Os desempregados têm pior qualidade de sono, mais problemas de saúde física e mental e taxa mais alta de mortalidade. Trabalhadores idosos desempregados têm maior dificuldade de se reintegrar à força de trabalho (341) num momento da vida em que garantir a segurança financeira para a aposentadoria e para os cui- dados necessários na velhice é fundamental. Por outro lado, as pessoas que continuam a trabalhar após a idade de aposentadoria man- têm melhor funcionamento físico, mental e cognitivo do que os aposentados de mesma idade (342). As condições de trabalho contribuem para o bem-estar tanto quanto a renda gerada pelo trabalho. Uma revisão sistemática revelou que a flexibilidade no trabalho tem impacto positivo sobre a saúde nas situações em que os trabalhadores exercem seu poder de escolha e controle, como no planejamento pessoal de turnos de trabalho e na escolha da aposentado- ria parcial ou gradual. Quando “flexibilidade” significa que o empregador decide quando e por quanto tempo a pessoa irá trabalhar, en- tretanto, podem haver efeitos negativos sobre o bem-estar e a saúde do trabalhador (339). Um estudo longitudinal na Alemanha iden- tificou uma correlação entre a insegurança no emprego e a baixa satisfação com a saúde (343). Outro estudo alemão determinou que o estresse psicossocial relacionado ao trabalho está ligado à pior saúde subjetiva e a sinto- mas de depressão (344). Constatou-se que o estresse psicossocial do trabalho ocorre tanto nos trabalhadores idosos quanto nos jovens, mas os níveis desse estresse são mais altos nos empregados com menor grau de escolaridade e renda mais baixa (344). O emprego é uma questão central que precisa ser abordada para que as crescentes desi- gualdades possam ser reduzidas. O trabalho precisa ser decente para que desempenhe seu papel no Envelhecimento Ativo. A definição da Organização Internacional do Trabalho (OIT) é que o emprego deve propiciar renda justa, segurança no local de trabalho; prote- ção social para as famílias; oportunidades para melhor desenvolvimento pessoal e integração social; tratamento igualitário de homens e mulheres, trabalhadores idosos e pessoas com deficiência; e liberdade para que os trabalhadores expressem seus pontos de vista, se organizem e participem de decisões pertinentes ao trabalho que os afetem (345). Prevê-se que a participação dos trabalhadores idosos na força de trabalho aumente. Há uma crescente conscientização de que a continui- dade da vida profissional dos trabalhadores idosos é essencial para a produtividade geral e para a sustentabilidade dos programas sociais. As políticas em alguns países estão indo na direção do aumento da idade de aposentado- ria, de opções mais flexíveis de aposentadoria parcial e de formas criativas de promover a aprendizagem ao longo da vida e práticas de emprego amigas do idoso. O potencial de ganho é enorme. Um estudo da Deloitte na Austrália revelou que uma participação adicional de 5% por parte dos trabalhadores idosos acrescentaria mais 48 bilhões de dó- lares australianos ao produto interno bruto (ou 2,4% da renda nacional) - equivalente às maiores reformas macroeconômicas da Austrália (346). Ainda há, entretanto, entraves significativos no local de trabalho que advêm de mitos edaístas sobre a capacidade produtiva dos trabalhadores idosos, sua motivação e capaci- dade de aprender. Ao mesmo tempo, algumas pessoas idosas - inclusive muitas mulheres - são obrigadas a continuar a trabalhar em em- pregos de baixa qualidade porque têm renda insuficiente após a aposentadoria. As razões incluem a participação fragmentada na força de trabalho, a expansão dos planos de pensão 72 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade de contribuição definida (que não garantem a renda após a aposentadoria) e a diminuição do valor dos investimentos de aposentadoria devido a crises econômicas ou emergências familiares. Em muitos países de baixa renda, continuar a trabalhar é uma necessidade dian- te da falta de seguridade social. Em 2010, a participação de pessoas acima dos 65 anos na força de trabalho formal era de cerca de 31% nas regiões de baixa e média renda comparado com somente 8% nos países de alta renda (25). O direito de parar de trabalhar e se aposentar com o apoio de uma renda de aposentadoria decente é tão importante para preservar a identidade pessoal quanto o direito de continuar a ter uma vida profissional signi- ficativa. A hipótese de que o desenvolvimento econômico nos países de renda mais baixa irá liberar recursos públicos para sustentar uma aposentadoria digna e necessária para os idosos pode explicar a diminuição prevista da participação das pessoas acima dos 65 anos na força de trabalho nesses países. Pensões e transferência de renda. Pensões podem ser transferências de renda privadas ou públicas e podem prever ou não contri- buição. De acordo com a OIT, pouco menos da metade (48%) das pessoas no mundo em idade de aposentadoria compulsória recebe pensão (281). Nos países em desenvolvimen- to, cerca de 80% dos idosos não possui renda regular (374). O valor monetário de uma pensão é um fator determinante importante do bem-estar na velhice. Dados de 13 países da OCDE mostram que a saúde é, em geral, melhor nos países com benefícios previden- ciários mais generosos e que essa associação é mais forte para as mulheres (348). A OIT, entretanto, relata que os países de alta renda mudaram políticas para reduzir a cobertura e os benefícios dos planos com contribuição, reduzindo, assim, sua capacidade de proteger futuros pensionistas contra a pobreza (281). Em muitos países de baixa e média renda, expandiram-se as pensões contributivas ou não contributivas (281), embora as pensões contributivas possam estar restritas à peque- na proporção de servidores públicos. Um estudo sobre o impacto das pensões sociais não contributivas no Brasil e na África do Sul mostrou que as mesmas tiveram impacto significativo sobre o bem-estar das famílias (349). Paralelo ao impacto direto sobre o bem-estar, poder de decisão e nutrição dos beneficiados, constatou-se que essas pensões afetam positivamente a economia local (18). Há também evidências de que as pensões sociais levem a melhora na nutrição e na escolaridade dos membros jovens da família (350) e contribuam para reduzir a participação das crianças na força de trabalho (351). Da mesma forma que as pensões, o seguro desemprego tem impacto positivo sobre o bem-estar. Revelou-se em 34 países da OCDE uma correlação positiva entre o valor do segu- ro desemprego e a satisfação na vida (352). O seguro desemprego também está ligado a uma menor incidência de suicídio nos homens, conforme mostra a análise de dados de 25 pa- íses da OCDE (353). Além das transferências de renda, as transferências em espécie (como energia, alimento e subsídios de moradia) e os serviços de cuidado na residência contribuem para a resiliência do indivíduo e da família. Por exemplo, considera-se que os subsídios alimentares para os pobres em Moçambique, cujos principais beneficiados são os idosos, também melhoram a nutrição das crianças da família (354). Serviços Sociais e de Saúde Serviços sociais e de saúde acessíveis, igua- litários e bem coordenados são fundamentais para promover a saúde, prevenir, tratar e manejar problemas de saúde à medida que ocorrem, ao longo da vida, e para preservar a qualidade de vida até a morte. Somente são realizáveis e sustentáveis quando a mesma prioridade é dada ao apoio a todos os outros fatores determinantes do Envelhe- cimento Ativo. O modelo do curso de vida do Envelhecimento Ativo explicita a visão de que os pacotes de serviços fornecidos nas sociedades em processo de envelhecimento Seção IV: Determinantes do Envelhecimento Ativo - caminhos para a Resiliência • 73 precisam abordar múltiplas metas com rela- ção à capacidade funcional ao longo da vida da pessoa e a uma gama de doenças e níveis de incapacidade. Suprindo as Necessidades de Saúde de uma População cada Vez mais Velha Há forte evidência de que a presença de doen- ças crônicas leva ao uso dos serviços de saúde e não a idade em si (355). Doenças e defi- ciências crônicas, contudo, se tornam mais frequentes com o avançar da idade e o uso do cuidado à saúde e os gastos de fato aumentam com ela (356). Em alguns países, incluindo o Canadá (357) e os Estados Unidos (356), o custo per capita do cuidado à saúde para os idosos aumentou ao longo dos anos, à medida que mais intervenções e novas tecnologias se tornaram disponíveis para problemas co- muns na velhice (por ex., cirurgia de catarata, substituição de articulação, ponte de safena). Os sistemas de suporte e cuidado à saúde estão diante de dois desafios significativos no contexto da Revolução da Longevidade: primeiro, prevenir doenças e deficiências crônicas; e segundo, oferecer cuidado de alta qualidade e de boa relação custo-benefício que seja adequado aos indivíduos. De acordo com as estimativas da Carga Mun- dial de Morbidade da OMS para 2010 (79), 23,1% da carga total de morbidade pode ser atribuída a problemas enfrentados por pessoas acima dos 60 anos (que constituíam 11,7% da população mundial em 2013 (19)). Nas regi- ões menos desenvolvidas, a carga de morbi- dade por pessoa entre os idosos é mais alta do que nas regiões mais desenvolvidas. De modo geral, as principais doenças que contribuem para a invalidez são a doença cardiovascu- lar, o câncer e a doença respiratória crônica, patologias musculoesqueléticas e doenças mentais e neurológicas (79). Algumas pato- logias comuns na velhice são especialmente incapacitantes e requerem detecção precoce e manejo adequado. As doenças crônicas que são comuns nos idosos podem ser classificadas em dois gru- pos. O primeiro inclui doenças que aparecem em torno da sexta década de vida e são, em geral, evitáveis por meio de comportamentos saudáveis e/ou intervenções de estilo de vida e serviços de saúde preventiva eficazes. Aí estão normalmente incluídas a doença car- diovascular, o diabetes, a doença pulmonar obstrutiva crônica e muitos tipos de câncer. A segunda categoria de doenças está mais relacionada aos processos de envelhecimen- to e ainda não se sabe o suficiente sobre sua prevenção. Aí incluem-se a demência, a de- pressão e as patologias musculoesqueléticas. Embora a pesquisa possivelmente acabe por chegar a prevenção e tratamentos eficazes, o manejo precoce é, atualmente, a chave para controlar a incapacitação e/ou manter a qua- lidade de vida. Demência. Em todas as regiões, o número de pessoas com demência continuará a aumentar rapidamente, a não ser que haja progresso significativo das medidas de prevenção. A demência já se tornou uma das dez princi- pais causas de mortalidade em todo o mundo (358). Em 2013, 44,4 milhões de pessoas tinham demência e esse número deve dobrar nos próximos 20 anos, para 75,6 milhões, e dobrar de novo, para 135,5 milhões em 2050 (359). De todas as pessoas com demência, 58% vivem em países menos desenvolvidos e espera-se que essa proporção aumente para 71% até 2050, à medida que as pessoas pas- sem a viver mais tempo. A maioria das pesso- as com demência no mundo continua a viver na comunidade, se tornando gradualmente incapacitada até a morte. Os transtornos psi- cológicos e comportamentais associados com essa doença progressiva são particularmente desgastantes para os cuidadores familiares que, por sua vez, passam a ter maior risco de apresentar declínio da própria saúde física e emocional. Comunidades amigas do idoso que também são amigáveis à demência estão ganhando experiência no apoio a pessoas com demência e a seus cuidadores, contribuindo, portanto, para a manutenção da qualidade de vida de ambos. Nas comunidades amigas da 74 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade plexos onde a melhora física não é possível, o cuidado deve se focar em uma melhor qua- lidade de vida para o paciente (371). Um continuum de serviços de saúde. Um continuum abrangente de serviços inclui a promoção da saúde, a prevenção de doenças, a cura, a recuperação, o manejo, a prevenção do declínio e o cuidado paliativo. Esses serviços são prestados por vários agentes envolvidos no fornecimento do cuidado: o próprio indiví- duo e a família; cuidadores da comunidade e instituições (Fig. 10). A maioria dos sistemas formais de saúde foi desenvolvida com ênfase nos serviços médicos e institucionais preven- tivos e curativos para suprir os requisitos de “cuidado catastrófico” ocasional de uma po- pulação muito mais jovem (ou seja, doenças transmissíveis e lesões). À medida que as necessidades de saúde da população mudam no contexto da Revolução da Longevidade, a sustentabilidade e a eficácia dos serviços social e de saúde demandam uma mudança radical para alcançar um melhor equilíbrio entre “cuidado” e “cura”, entre “paliativo” e “preventivo”. A mudança necessária de paradigma depende de dois componentes fundamentais: (a) um sistema focado no cui- dado primário baseado na comunidade para fornecer cuidado e garantir a coordenação ao longo do tempo e entre serviços; e (b) um corpo de profissionais de saúde de todas as áreas que seja amplamente treinado para com- preender os aspectos da saúde relacionados ao envelhecimento e para reagir à mudança das necessidades de saúde ao longo de todo o curso de vida. Promoção da saúde. A Carta de Ottawa sobre a Promoção da Saúde define a promoção da saúde como “o processo de possibilitar que as pessoas tomem para si o controle sobre a própria saúde e a melhorem” (16). Apesar de a promoção da saúde dar poder de decisão aos indivíduos, também atribui uma respon- sabilidade vital ao setor público de criar as condições e os serviços necessários à saúde. A promoção da saúde é uma atribuição parti- lhada que envolve a família, a escola, o local de trabalho, a comunidade e os serviços de saúde, com o apoio das políticas governa- mentais em todos os níveis. A integração de uma perspectiva de saúde em todas as áreas políticas - desde a agricultura até o urbanismo - faz parte da promoção da saúde. No nível individual, desenvolver a educação para a saúde é a chave para que se tenha o poder de decisão sobre a própria saúde em todas as idades. A prevenção de doenças e lesões inclui, de forma geral, três ações preventivas: “primária” (vacinação contra a gripe, remoção dos perigos de queda em casa), “secundária” (triagem para detecção de diabetes ou câncer) e “terciária” (por exemplo, práticas de estilo de vida e medicamentos para controle do diabetes uma vez diagnosticado). Cuidado primário. Conforme mencionado anteriormente, a espinha dorsal de todos os serviços de saúde é o cuidado primário com base na comunidade. Os clínicos gerais e outros profissionais de saúde integrados fornecem a primeira linha de serviços para prevenir doenças e fazer a detecção precoce no intuito de controlar as doenças crônicas e de manejar as limitações. O cuidado primário é normalmente a porta de entrada para outros Figura 10. Dimensões do cuidado (Fonte: Kalache 2013 (21)) Nota: O tamanho das caixas representa o volume de cui- dado fornecido na maioria das sociedades e é o inverso de onde a maior parte do apoio financeiro é dada na maioria das sociedades. Seção IV: Determinantes do Envelhecimento Ativo - caminhos para a Resiliência • 77 serviços necessários - o centro de planeja- mento e coordenação do cuidado que leva em consideração as necessidades da pessoa como um todo e respeita suas metas e valores. Os entraves ao cuidado primário, contudo, são frequentes. Consultas que são breves demais, com profissionais que não têm treinamento adequado sobre as necessidades de saúde relacionadas ao envelhecimento, não raro resultam em diagnóstico errado e tratamento inadequado. A longa distância para chegar aos serviços, custo alto e o tempo prolongado de espera em locais desconfortáveis são outros problemas frequentes nas regiões de baixa e média renda. Um levantamento com idosos em 11 países de alta renda conduzido pelo Fundo do Commonwealth também encontrou lacunas e obstáculos financeiros no acesso e no cuidado (386). No intuito de fortalecer o cuidado primário para promover o Envelheci- mento Ativo, a OMS promove princípios ba- seados em evidências para o cuidado primário amigo do idoso em três áreas: (1) informação, educação, comunicação e treinamento; (2) sistemas de gestão de cuidado à saúde; e (3) o ambiente físico (387). Cuidado intensivo. Os serviços de cuidado intensivo são intervenções episódicas com o objetivo de curar uma doença, tratar uma lesão ou outras patologias que ameacem a vida ou que possam causar deficiência. O cuidado primário com base na comunidade, com-plementado pelo cuidado medicamen- toso, pelos serviços especializados e pelos hospitais de cuidado intensivo são os com- ponentes centrais. Apesar de serem essenciais para as pessoas de todas as idades, os serviços de cuidado intensivo não são suficientes para manter a saúde das pessoas nem para fornecer o suporte necessário para manejar doenças crônicas. Os sistemas de saúde foram pro- jetados para suprir as demandas de saúde da população antes das transições demográficas e epidemiológicas e, portanto, tendem a tra- tar a doença crônica da mesma forma que as patologias agudas - ou seja, como episódios únicos e não recorrentes e que não se relacio- nam com outras necessidades de saúde (388). “Sem mudanças, os sistemas de saúde continuarão a ficar cada vez mais ineficientes e ineficazes à medida que a prevalência de doenças crônicas aumenta... as despesas de saúde continuarão a aumentar, mas a condição de saúde da população não melhorará. Enquanto o modelo de cuidado intensivo dominar os sistemas de saúde, irá minar por completo os resultados de saúde que poderiam ser alcançados.” (388) Nos países mais desenvolvidos, os idosos respondem por internações em maior número e mais longas do que outras faixas etárias. O ambiente hospitalar não é muito adequado aos idosos com questões de saúde complexas. O resultado, não raro, é uma gama de problemas induzidos pela hospitalização, como infecções, quedas, confusão, ansiedade, delírio e declínio funcional. Da mesma forma que as perspecti- vas “amigas do idoso” estão remodelando o cuidado primário e os ambientes urbanos, um novo modelo amigo do idoso para o cuidado hospitalar também está se desenvolvendo. É um modelo que leva em consideração a pers- pectiva do idoso com relação ao ambiente físi- co, às atitudes e comportamentos da equipe, às políticas administrativas e aos procedimentos e protocolos de cuidado (389). Cuidado a longo prazo. O cuidado a longo prazo descreve um conjunto de serviços sociais e de saúde que tem como objetivo controlar doenças crônicas, prevenir as defi- ciências e preservar a qualidade de vida. São ações de cuidado a longo prazo: a monitora- 78 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade ção de sintomas, o manejo da medicação, a fisioterapia, a terapia ocupacional, o controle da dor, o apoio para auto-manejo da doença, a enfermagem, o cuidado pessoal (banhar, vestir, alimentar) e o suporte em casa (limpeza da casa e preparo de refeições). O ideal é que esses serviços apoiem o envelhecer em casa e incluam os seguintes elementos: comunica- ção, continuidade, coordenação, abrangência e elo com a comunidade (390). As instituições de cuidado a longo prazo podem se fazer ne- cessárias, contudo, quando o idoso é altamen- te dependente e não tem suporte adequado em casa. O cuidado institucional e na comunidade pago pelo governo está disponível nos países mais desenvolvidos, mas ainda ausente nas regiões menos desenvolvidas. Apoio a Cuidadores não Remunerados. Os cuidadores não remunerados precisam ser reconhecidos como a pedra fundamental do cuidado a longo prazo. Os Centros de Con- trole e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC) citaram evidências do Instituto de Medicina de que os cuidadores não remu- nerados fornecem cerca de 90% do suporte e cuidado recebido pelos idosos (391). A maioria dos cuidadores não remunerados são cônjuges, que são idosos também, e filhas e noras. Embora cuidar seja intrinsecamente compensador, é também difícil, exaustivo e demanda tempo. As consequências do cui- dado não remunerado a longo prazo para a saúde física, a saúde mental, as redes sociais, o emprego e a segurança financeira são bem documentadas (392,393). Por exemplo, cui- dadores negligenciam o cuidado de si mesmo (394). Os cuidadores de pessoas com demên- cia têm saúde pior do que os cuidadores de pessoas sem essa doença (395). A extensão de serviços confiáveis e suficientes, tanto informais quanto formais, para quem recebe cuidado assim como alternativas de acolhi- mento temporário, preserva enormemente o bem-estar do cuidador principal e melhora sua capacidade de cuidar por mais tempo (396). Também são úteis os serviços de apoio direto aos cuidadores, como treinamento, grupos de apoio e remuneração financeira justa. A responsabilidade por fornecer cuidado a longo prazo não pode ser exclusivamente nem da família nem do governo. Redes familiares menores, mais complexas e geograficamente mais dispersas são cada vez menos capazes de fornecer cuidado sem reforço adicional. Há uma crescente crise global do que se deno- mina “insuficiência familiar” na Declaração do Rio - Além da Prevenção e Tratamento: Desenvolvendo uma Cultura do Cuidado em resposta à Revolução da Longevidade (180). A resposta a essa insuficiência familiar deve ser a criação de uma “cultura de cuidado” que inclua a família e o cuidado público, mas que também corrija significativamente a desi- gualdade de gênero no cuidado. Uma cultura de cuidado precisa engajar empregadores, negócios, estruturas e serviços públicos da comunidade (moradia, transporte), grupos de voluntários e familiares em uma iniciativa ampla, intergeracional, com a meta comum de solidariedade tanto para com as pessoas que precisam de cuidado como também para com os indivíduos envolvidos com o fornecimento desse cuidado. Conforme enfatiza a Carta sobre Gênero e Envelhecimento (216), criar oportunidades e remover obstáculos que per- petuam a desigualdade de gênero no cuidado paliativo é uma abordagem que melhora a qualidade de vida dos pacientes e das famílias diante de problemas associados à doença com risco de vida. Se dá através da prevenção e do alívio do sofrimento por meio da identificação precoce e avaliação e tratamento impecáveis da dor e de outros problemas físicos, psicos- sociais e espirituais. Cuidado paliativo. A maior parte do uso de serviços de saúde durante a vida ocorre nos últimos seis meses ou um ano de vida (356). Um estudo com beneficiários do Medicare nos Estados Unidos revela que, embora mais pessoas estejam morrendo em casa ou em asilos do que no passado, os meses que antecedem a morte se caracterizam por mais transições de e para o hospital e por um aumento no uso das unidades de cuida- do intensivo no mês que precede a morte. Seção IV: Determinantes do Envelhecimento Ativo - caminhos para a Resiliência • 79 SEÇÃO V: RESPOSTA DAS POLÍTICAS 84 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade A Revolução da Longevidade: Uma Perspectiva Macroeconômica A Revolução da Longevidade gerou previ- sões de consequências econômicas e sociais avassaladoras partindo da premissa de que os idosos constituem uma carga cada vez maior para o resto da sociedade. Análises recentes (402) mostraram, contudo, que a Revolu- ção da Longevidade não é uma catástrofe macroeconômica, mas que é necessário que se tomem medidas urgentes para descartar ideias ultrapassadas sobre o curso de vida e para mudar políticas no intuito de lidar com essa nova realidade. Alguns direcionamentos amplos são propostos neste documento. A diminuição esperada do número de pessoas na força de trabalho remunerada (15-64 anos de idade) pode ser compensada pela maior participação de mulheres e de pessoas acima dos 65 anos na força de trabalho. “Políticas amigas da família” - permitindo que ambos os pais possam equilibrar as responsabilidades de trabalho e família - podem encorajar os casais a ter filhos enquanto mantêm a produ- tividade na força de trabalho e a segurança econômica na velhice. A preocupação de que trabalhadores idosos sejam menos produtivos pode ser contornada com maior ênfase no treinamento contínuo e na atualização de habilidades. A sustentabilidade a longo pra- zo dos fundos de pensão pode ser garantida melhorando as perspectivas de emprego de adultos desempregados ou subempregados de todas as idades, e não cortando benefícios dos aposentados nem dos que se aproximam da aposentadoria. Oferecendo a todos os tra- balhadores a opção irrestrita de buscar uma ocupação significativa com oportunidades de desenvolver novas habilidades e de ter condi- ções de trabalho compatíveis com diferentes capacidades funcionais, trabalhar por mais tempo pode ser uma perspectiva positiva. Ao mesmo tempo, a opção de uma saída digna e economicamente segura da força de trabalho quando as escolhas e capacidades mudarem deve ser uma decisão mútua, que beneficie tanto os trabalhadores quanto a sociedade. O aumento previsto na demanda por cuidado e suporte de saúde é administrável por meio de um amplo espectro de abordagens que são baseadas em evidências. Resolver as desigual- dades dos fatores determinantes sociais e eco- nômicos do Envelhecimento Ativo e adaptar o ambiente para que se torne mais amigo do idoso e propício à saúde reduzirá os riscos de doenças crônicas e de problemas psicossociais. A promoção da saúde direcionada e contínua, que inclua a educação para a saúde, é neces- sária para melhorar os conhecimentos sobre a saúde em todas as idades, para que as pessoas possam cuidar melhor da própria saúde e da saúde da família. O cuidado sustentável e de alta qualidade para todos é possível com um sistema de saúde que seja ancorado na Atenção Primária Amigo do Idoso; que forneça um espectro abrangente e coordenado de serviços contínuos e centrados no indivíduo, para pro- moção, prevenção, tratamento, reabilitação e cuidado; e que seja oferecido por profissionais com treinamento em todos os aspectos da saú- de relacionados com a idade. Oferecer sistemas de cuidado a longo prazo que não dependam exclusivamente da família nem utilizem os recursos públicos de maneira desproporcio- nal, é possível se cultivarmos uma cultura de cuidado que envolva governos, famílias, comunidades, empregadores, o setor volun- tário e os negócios. Incapacidades que levam à dependência se tornaram uma preocupação universal. Conforme esclarecido na Declaração “Além da Prevenção e Tratamento: Desenvol- vendo uma Cultura do Cuidado em Resposta à Revolução da Longevidade” (175), cuidado e suporte precisam ser reconhecidos como responsabilidades coletivas. Países em todas as regiões do mundo precisam SEÇÃO V: RESPOSTA DAS POLÍTICAS cultura, justiça e desenvolvimento rural e urbano. Conscientização e conhecimento para se mobilizar de forma eficaz. É crucial para aumentar a consciência sobre as implicações imediatas e a longo prazo da Revolução da Longevidade para informar e mobilizar ações. A coleta de dados e as pesquisas so- bre a idade e o envelhecimento melhoraram consideravelmente na última década, mas ainda se fazem necessárias a desagregação de dados e a disseminação muito mais ampla do conhecimento baseado em evidências em todas as regiões, especialmente nos países de média e baixa renda. Recomendações de Políticas Chave A política do Envelhecimento Ativo requer ações abrangentes e intersetoriais sobre os quatro pilares (Fig. 12) e todos os fatores determinantes. As recomendações de polí- ticas a seguir foram projetadas para serem relevantes para tomadores de decisão em todos os níveis, em todos os setores e em todos os países. A maior parte se direciona ao governo, mas muitas são relevantes também para outros atores - a saber, as organizações intergovernamentais como as Nações Unidas, a sociedade civil, o setor privado, a mídia e os próprios idosos (ver Fig. 13 e tabelas a seguir). Embora o Envelhecimento Ativo se aplique a pessoas em todos os pontos do curso de vida, algumas recomendações se re- lacionam especificamente aos idosos. Outras são recomendações de integração da idade; ou seja, onde o envelhecimento precisa se integrar a outras áreas políticas, dado que o envelhecimento deve ser abordado de acordo com a perspectiva do curso de vida. Enquanto fatores determinantes transversais, o gênero e a cultura precisam ser levados em conside- ração em todas as áreas políticas quando se for desenvolver ações específicas. Tabela 6. Recomendações para a Saúde Figura 12. Os Pilares do Envelhecimento Ativo (Fonte: Adaptação de OMS 2002 (1)) Seção V: Resposta das Políticas • 87 Figura 13. Ação intersetorial Para tirar máximo proveito da Revolução da Longevidade, é essencial não só aumentar o número de anos de vida, mas também os anos em boa saúde. Os fatores de risco, tanto ambientais como comportamen- tais, precisam ser reduzidos. Simultaneamente, os fatores de proteção precisam aumentar para garantir que as doenças crônicas e o declínio funcional possam ser prevenidos ou adiados (ou seja, minimizados ao máximo). A promoção da saúde, a prevenção, a detecção e o tratamento das doenças precisam estar vigorosamente garantidos para apoiar o Envelhecimento Ativo e para maximizar os dividendos da maior longevidade. Quando, e se, as pessoas vierem a precisar de cuidado, ele deve ser integrado e personali- zado com ênfase geral sobre a manutenção da maior capacidade funcional e qualidade de vida possível. Recomendações para a Saúde 1. Reduzir fatores de risco associados às principais doenças e aumentar os fatores de proteção ao longo do curso de vida. 88 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade G ov er no s A ca de m ia / So ci ed ad e C iv il O rg an iz aç õe s In te rg ov er na m en ta is Se to r Pr iv ad o M íd ia 1.1 Influências econômicas sobre a saúde. Reduzir as desigualdades sócio-econômicas que contribuem para o surgimento da doença e da deficiência ao longo da vida: pobreza absoluta, desigualdade de renda, baixo grau de educação e de conhecimentos, exclusão social. Priorizar a melhora da condição de saúde dos grupos socialmente excluídos. 1.2 Ambientes amigos do idoso, limpos e saudáveis. Facilitar o acesso universal a ar e água não poluídos; reduzir a poluição e minimizar a exposição a poluentes, em especial nos grupos vulneráveis; construir ambientes sem barreiras para facilitar a mobilidade ativa, o acesso a áreas verdes saudáveis e à alimentação saudável. 1.3 Hábitos saudáveis e auto-cuidado em todas as idades. Promover hábitos saudáveis e auto-cuidado desde a mais tenra idade e ao longo da vida, cultivando a educação para a saúde nos currículos educacionais e favorecendo o acesso amplo e contínuo a informações de saúde confiáveis. 1.4 Controle do tabaco. Desencorajar veementemente as pessoas a começarem a fumar, controlar o uso do tabaco para evitar fumar passivamente e apoiar as pessoas que queiram parar de fumar. 1.5 Controle do álcool. Fornecer informações sobre o consumo seguro e implementar medidas criativas para reduzir o consumo excessivo. 1.6 Atividade física. Fornecer oportunidades baratas, acessíveis e prazerosas de atividade física ao longo de todas as etapas do curso de vida, inclusive para os que têm limitação funcional. 1.7 Escolhas alimentares saudáveis. Garantir acesso a alimentos baratos e nutritivos e a informações imparciais sobre nutrição equilibrada ao longo do curso de vida. 1.8 Aconselhamento sobre práticas e intervenções preventivas eficazes. Desenvolver e disseminar recomendações direcionadas de acordo com a idade e a condição funcional sobre a eficácia de medidas específicas de prevenção de doença/promoção de saúde e intervenções de saúde para melhorar a saúde e a expectativa de vida. 1.9 Resiliência psicológica. Estimular a resiliência psicológica desde a primeira infância e ao longo da vida através do currículo Recomendações para a Saúde Seção V: Resposta das Políticas • 89 G ov er no s A ca de m ia / So ci ed ad e C iv il O rg an iz aç õe s In te rg ov er na m en ta is Se to r Pr iv ad o M íd ia 4. Desenvolver uma cultura de cuidado. 4.1 Auto-cuidado. Promover o auto-cuidado e dar apoio para que os idosos possam manejar eles mesmos suas doenças. 4.2 Envelhecer em casa. Oferecer um espectro amplo, flexível e de preço razoável de opções de moradia e serviços na comunidade para ajudar idosos e pessoas com deficiência a permanecer em casa, como adaptações da casa, opções de moradia alternativa, serviços de transporte, manutenção da casa, serviços de refeição e cuidado pessoal. 4.3 Organização e prestação de cuidado. Estabelecer sistemas de apoio e cuidado com os seguintes atributos de melhores práticas: abrangência dos serviços; comunicação com quem recebe o cuidado e com a família; cuidadores não remunerados e entre os fornecedores; coordenação de todos os serviços centrados em quem recebe o cuidado; continuidade em todas as situações e ao longo do tempo; ligação com a comunidade, incluindo as comunidades etno-culturais. 4.4 Dar suporte aos cuidadores. Dar aos cuidadores não remunerados suporte adequado e flexível para que possam cuidar do próprio bem-estar físico, profissional, financeiro e psicossocial enquanto cuidam do idoso. Promover a posição de que o cuidado não remunerado é uma escolha e não uma obrigação imposta por papeis sociais determinados pelo gênero, nem pela falta de alternativa de cuidado na comunidade. Promover formas de “compartilhar o cuidado” entre gerações da família e com as redes de amigos e da comunidade. 4.5 Instrução e treinamento para o cuidado. Dar suporte para que os provedores de serviço e a sociedade civil ofereçam educação prática, flexível e continuada e informação para auxiliar os cuidadores não remunerados e fornecer treinamento certificado de alto nível para cuidadores remunerados. 4.6 Condições de trabalho dos cuidadores. Propiciar aos cuidadores condições de trabalho e remuneração adequadas, que levem em consideração o valor e a complexidade de seu trabalho e reforcem a dedicação à profissão de cuidador. 4.7 Multi-morbidade e fragilidade. Garantir acesso a avaliação geriátrica abrangente e a uma abordagem de cuidado construída Recomendações para a Saúde 92 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade G ov er no s A ca de m ia / So ci ed ad e C iv il O rg an iz aç õe s In te rg ov er na m en ta is Se to r Pr iv ad o M íd ia em parceria com o idoso para prevenir ou reverter a fragilidade, preservar a qualidade de vida e minimizar riscos desnecessários. 4.8 Cuidado paliativo. Garantir cuidado paliativo que seja centrado na pessoa, com mais “toque” e menos tecnologia (high touch and low tech), desde o início de doenças que limitem a vida e altamente focado no conforto e no cuidado. Preparar e auxiliar as pessoas próximas a quem está morrendo para que possam acompanhá-la durante essa jornada final e seguir adiante. 4.9 Planejamento para a dependência e o cuidado. Conscientizar sobre a importância de prever o declínio funcional e a possível dependência na velhice, incluindo o planejamento de arranjos de moradia, cuidado de longo prazo e instruções de cuidado avançado. 1. Promover oportunidades inovadoras para a aprendizagem ao longo da vida. 1.1 Cultura de aprendizagem ao longo da vida. Propiciar oportunidades flexíveis e acessíveis de ampliação de conhecimentos, educação, treinamento e re-treinamento ao longo do curso de vida; e adaptar os arranjos de trabalho para facilitar e estimular a aprendizagem para suprir uma gama de necessidades pessoais e profissionais. Dar suporte para que a sociedade civil ofereça acesso e encoraje a aprendizagem em situações e modalidades não tradicionais para alcançar pessoas excluídas ou socialmente isoladas. 1.2 Melhores Práticas. Apoiar a identificação e disseminação de Tabela 7. Recomendações para a Aprendizagem ao Longo da Vida A aprendizagem ao longo da vida suporta todos os outros pilares do Envelhecimento Ativo. O conhecimento contribui para a saúde, garante maior participação em todas as esferas da sociedade e aumenta a segurança. Numa sociedade na qual o conhecimento se torna mais acessível, embora mediado por uma tecnologia da comunicação em constante desenvolvimento, o acúmulo de conhecimento ao longo da vida é fundamental. Recomendações para a Aprendizagem ao Logo da Vida G ov er no s A ca de m ia / So ci ed ad e C iv il O rg an iz aç õe s In te rg ov er na m en ta is Se to r Pr iv ad o M íd ia Recomendações para a Saúde G ov er no s A ca de m ia / So ci ed ad e C iv il O rg an iz aç õe s In te rg ov er na m en ta is Se to r Pr iv ad o M íd ia Seção V: Resposta das Políticas • 93 melhores práticas para maximizar o engajamento e a obtenção dos maiores benefícios possíveis da aprendizagem ao longo da vida. 2. Melhorar o acesso à informação. 2.1 Acessibilidade. Garantir que a informação seja fornecida de forma acessível para que as pessoas com capacidade funcional reduzida ou com baixo grau de escolaridade não sejam excluídas. 2.2 Inclusão tecnológica. Reduzir a exclusão digital garantindo acesso e treinamento adaptado às necessidades específicas das pessoas de todas as idades que estejam sujeitas ao risco de exclusão. 2.3 Informação sobre direitos. Garantir que as pessoas tenham total acesso a informações abrangentes e confiáveis sobre seus direitos e às formas de fazer valer esses direitos, especialmente para os mais vulneráveis. 3. Reconhecer o papel crucial do voluntariado na promoção da aprendizagem ao longo da vida. 3.1 Treinamento e orientação para voluntários. Dar apoio a organizações da sociedade civil para que ofereçam treinamento e orientação para voluntários e membros, no intuito de aprimorar habilidades e ampliar conhecimentos. 4. Promover a educação para a saúde como prioridade e preparar as pessoas para o cuidado. 4.1 Educação para a saúde. Propiciar oportunidades direcionadas e gerais para melhorar a educação para a saúde em todas as situações e com pessoas de todas as idades. Estabelecer ferramentas de treinamento e diretrizes para a prática no intuito de garantir que os profissionais de saúde tenham o melhor conjunto de habilidades possível para discernir as necessidades específicas dos pacientes e agir de forma a supri-las. 4.2 Cuidado. Fornecer instrução e modelos de auto-cuidado e de cuidado dos outros, contestando, especificamente, estereótipos ultrapassados de determinação de papeis de acordo com o gênero. 5. Proporcionar educação e treinamento sobre o envelhecimento. Recomendações para a Aprendizagem ao Logo da Vida 94 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade G ov er no s A ca de m ia / So ci ed ad e C iv il O rg an iz aç õe s In te rg ov er na m en ta is Se to r Pr iv ad o M íd ia 4.3 Organizações de idosos. Investir em grupos organizados por homens e mulheres idosos na comunidade, como associações de idosos e grupos de auto-ajuda. 4.4 Inclusão social. Dar suporte à sociedade civil para que estabeleça programas voluntários com o objetivo específico de fortalecer a conexão das pessoas de diferentes gerações, gêneros e culturas e que envolvam a inclusão digital. 5. Re-projetar o trabalho e o ambiente de trabalho para a participação mais estável e por mais tempo na força de trabalho. 5.1 Trabalhadores idosos. Encorajar os idosos que queiram trabalhar a fazê-lo implementando estratégias para reter trabalhadores idosos e para facilitar a transição trabalho- aposentadoria quando não for mais possível ou desejável trabalhar. 5.2 Acabar com a discriminação. Adotar e implementar políticas não discriminatórias para o recrutamento, a seleção, o treinamento e a promoção. Proibir o uso da idade de aposentadoria compulsória como meio coercivo de expulsão do emprego e implementar uma idade mínima de aposentadoria. 5.3 Oportunidade de emprego em todas as idades. Estimular a criação de oportunidades de emprego para adultos de todas as idades, especialmente aqueles que estão sujeitos a alta taxa de desemprego e subemprego. 5.4 Flexibilidade no trabalho. Permitir a implementação de práticas flexíveis de trabalho ao longo da vida, tanto para mulheres quanto para homens, considerando que facilitar os períodos de aprendizagem ao longo da vida, cuidado e buscas pessoais é investir em capital humano. 5.5 Local de trabalho saudável. Promover hábitos saudáveis no local de trabalho e dar oportunidades para que se melhore a saúde pessoal. Introduzir e melhorar ambientes de trabalho seguros e ergonômicos. 6. Cultivar a solidariedade intergeracional. 6.1 Solidariedade intergeracional. Estimular o contato e o diálogo entre gerações; proporcionar educação, o quanto antes, sobre os Recomendações para a Participação Seção V: Resposta das Políticas • 97 G ov er no s A ca de m ia / So ci ed ad e C iv il O rg an iz aç õe s In te rg ov er na m en ta is Se to r Pr iv ad o M íd ia valores de apoio mútuo e cuidado na família e entre gerações; reduzir o potencial de conflito entre as gerações produzido por desinformação e estereótipos de idade; identificar os desafios enfrentados pelas famílias (e, especialmente, os adultos jovens) e promover soluções que aumentem as oportunidades de participação e o bem-estar. 6.2 Decisões inclusivas. Garantir o diálogo entre gerações, dando voz aos jovens e aos idosos quando se tomarem decisões sobre questões de interesse público relacionadas ao envelhecimento. 7. Criar ambientes amigos do idoso para encorajar a participação. 7.1 Design amigo do idoso para todas as idades. Construir ambientes amigos do idoso que promovam a independência e a segurança e reduzam as barreiras para as pessoas de todas as idades, especialmente para aquelas que tenham limitações funcionais. 7.2 Transporte e mobilidade. Melhorar o transporte público e a mobilidade para que pessoas de todas as idades, inclusive aquelas com capacidade funcional reduzida, possam se movimentar, tanto para o lazer quanto para suprir suas necessidades essenciais. 7.3 Serviços e programas na comunidade local. Criar e apoiar serviços amigos do idoso e inclusivos na comunidade local para aumentar a participação, inclusive a participação daqueles que se Tabela 9. Recomendações para a Segurança / Proteção A segurança é um direito humano básico que nos permite viver livres de insegurança física, social e financeira. Quando as pessoas não mais conseguem sustentar e proteger a si mesmas, o que muitas vezes acontece na velhice, políticas que tratam de necessidades e direitos se tornam particularmente importantes. Recomendações para a Participação Recomendações para a Segurança / Proteção sintam excluídos devido à migração. 98 • Envelhecimento Ativo: Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade G ov er no s A ca de m ia / So ci ed ad e C iv il O rg an iz aç õe s In te rg ov er na m en ta is Se to r Pr iv ad o M íd ia G ov er no s A ca de m ia / So ci ed ad e C iv il O rg an iz aç õe s In te rg ov er na m en ta is Se to r Pr iv ad o M íd ia 1.1 Direito à segurança física, abrigo, saneamento, água e alimentos seguros para o consumo. Garantir proteção, segurança e dignidade para todos, inclusive para as pessoas em fim de vida, promovendo as necessidades e os direitos básicos de segurança física ao longo da vida, tanto para homens quanto para mulheres; e criar e implementar protocolos que abordem as vulnerabilidades específicas relacionadas à idade, ao gênero e às limitações funcionais em situações de emergência e conflito. 1.2 Acesso universal à seguridade social básica. Garantir que todos tenham acesso à seguridade social básica ao longo da vida, como o direito a educação, moradia, medicamentos e serviço de saúde acessíveis. 2. Construir ambientes físicos amigos do idoso como princípio fundamental da segurança. 2.1 Ambientes de proteção. Construir comunidades e ambientes amigos do idoso que contribuam para a segurança dos residentes, em especial daqueles que tenham incapacidades ou morem sozinhos. 2.2 Moradia. Fornecer uma gama de opções acessíveis de moradia que facilite o envelhecimento em casa e informação abrangente para orientar as pessoas sobre as vantagens de opções, como modificações na casa, moradias alternativas e/ou diferentes arranjos de moradia. 3. Erradicar a pobreza e garantir uma renda básica ao longo do curso de vida. 3.1 Proteção social. Fornecer e/ou aumentar a cobertura dos benefícios mínimos de proteção social para evitar períodos de empobrecimento ao longo da vida, que ameaçam o bem-estar mais tarde, e também prevenir o empobrecimento na velhice. 3.2 Inovações de geração de renda para eliminar a pobreza. Implementar mecanismos eficazes para erradicar a pobreza e a privação material dos idosos, em especial das mulheres idosas (por exemplo, esquemas de microcrédito e cooperativas). 3.3 Desigualdades. Desenvolver e/ou manter políticas que reduzam as desigualdades econômicas entre homens e mulheres e nos Recomendações para a Segurança / Proteção G ov er no s A ca de m ia / So ci ed ad e C iv il O rg an iz aç õe s In te rg ov er na m en ta is Se to r Pr iv ad o M íd ia Seção V: Resposta das Políticas • 99
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