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Guias e Dicas
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Aprendizagem Infantil- uma abordagem da - Aloisio Araujo, Notas de estudo de Pedagogia

Aprendizagem Infantil

Tipologia: Notas de estudo

2014

Compartilhado em 02/03/2014

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gabriela-de-amorim-10 🇧🇷

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Baixe Aprendizagem Infantil- uma abordagem da - Aloisio Araujo e outras Notas de estudo em PDF para Pedagogia, somente na Docsity! APRENDIZAGEM INFANTIL Uma abordagem da neurociência, economia e psicologia cognitiva Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento Nacional Estudos Estratégicos APRENDIZAGEM INFANTIL © Direitos autorais, 2010, de organização, da Academia Brasileira de Ciências Rua Anfilófio de Carvalho, 29 - 3o Andar 20030-060 - Rio de Janeiro, RJ - Brasil Tel: (55 21) 3907-8100 Fax: (55 21) 3907-8101 © Direitos de publicação reservados por Academia Brasileira de Ciências e Fundação Conrado Wessel Rua Pará, 50 - 15º andar 01243-020 - São Paulo, SP - Brasil. Tel/Fax: (55 11) 3237-2590 Coordenação e Edição: Fernanda Wolter Marcia de Castro Faria Graça Melo José Moscogliatto Caricatti Revisora : Mirian Cavalcanti Aprendizagem infantil : uma abordagem da neurociência, economia e psicologia A654 cognitiva / Aloísio Pessoa de Araújo, coordenador. – Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Ciências, 2011. 264 p. - (Ciência e tecnologia para o desenvolvimento nacional. Estudos estratégicos) Inclui bibliografia. ISBN: 878-85-85761-33-2 1. Aprendizagem. 2. Educação de crianças. 3. Desenvolvimento cognitivo. 4. Capital humano. 5. Rendimento escolar. I. Araújo, Aloísio Pessoa de, 1946-.II. Academia Brasileira de Ciências CDU: 370.1523 CDD: 37.015.3 Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil v G R U P O D E E S T U D O Aloisio Araujo (Coordenador - FGV/IMPA/ABC) Edson Amaro (USP) Erasmo Barbante Casella (USP) Flávio Cunha (University of Pennsylvania) Jaderson Costa da Costa (PUC/RS) João Batista Araujo e Oliveira (Inst. Alfa e Beto e JM Associados) Luiz Carlos Faria da Silva (Universidade Estadual de Maringá) Luiz Davidovich (Responsável pela Diretoria da ABC) Simon Schwartzman (IETS/ABC) Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil ix Devido ao descaso com a educação, agravado pelo seu passado escravocrata, o Brasil historicamente possui altos níveis de desigualdade de renda, o que inclusive prejudica seu desenvolvimento econômico. Embora a desigualdade de renda tenha caído um pouco nos últimos anos, e tenha havido para algumas faixas etárias a universalização do ensino, como por exemplo, na faixa dos sete aos 14 anos, fortes problemas persistem. O desempenho medíocre em avaliações nacionais e internacionais pode comprovar esta afirmação. Avanços da neurociência permitem concluir que grande parte do desenvolvimento cerebral, bem como a capacidade posterior de aprendizado dá-se no pré-natal aos primeiros anos de vida. Corroborando este entendimento, estudos feitos por economistas, notadamente, os do professor James Heckman, prêmio Nobel de Economia, e da Universidade de Chicago, comprovam que intervenções educacionais feitas durante a primeira infância com crianças de baixa renda possuem taxa de retorno muito superiores a investimentos feitos em idades posteriores. Destaque-se também os estudos de James Heckman e Flávio Cunha, que constatam que desigualdades de rendimento escolar no desenvolvimento cognitivo, observado aos quatro anos como função de diferenças educacionais da mãe, persistem, na média, ao longo da trajetória educacional da criança. Conclui-se então que, para corrigir as desigualdades educacionais e permitir um maior desenvolvimento econômico através da incorporação de um número maior de adolescentes em faixas mais elevadas de educação, é preciso fazer intervenções na fase mais precoce da criança. Isto porque boa parte da formação de capital humano dá-se no seio intrafamiliar, nos primeiros anos de vida, onde os pais mais educados, através de leituras e estímulo, conseguem preparar melhor a criança para quando ela ingressar na escola. Mais ainda, Heckman e Cunha observam que a educação adquirida numa certa etapa da vida facilita o aprendizado nas seguintes. Estas ideias, tanto da neurociência quanto da educação e da economia, se complementam, daí a decisão por uma abordagem multidisciplinar do aprendizado infantil. A ideia deste livro ocorreu-nos devido à combinação do interesse científico do tema e de sua alta relevância para o país. Isto porque no Brasil , além de possuirmos baixas taxas de escolarização e desempenho medíocre nas avaliações, a fecundidade e’ maior justamente entre as mulheres de menor índice de instrução. Outro fator importante em nossa decisão é que outras academias de ciências, como a americana, realizaram estudos semelhantes, com alto impacto nas políticas educacionais destes países. A proposta deste estudo foi aceita pela Academia Brasileira de Ciências, que já tinha interesses semelhantes ao nosso. Assim, gostaria de agradecer o apoio recebido, durante os últimos três anos, ao grupo constituído oficialmente pela Academia, que várias vezes se reuniu para debater APRESENTAÇÃO DO COORDENADOR Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil x e propor ideias, resultando em um trabalho apresentado para críticas e sugestões, via internet, em encontro dos membros da Academia em 6 de maio de 2009. Organizamos também, um encontro científico, nos dias 16, 17 e 18 de dezembro de 2009, com alguns dos maiores especialistas internacionais, onde nossos trabalhos foram igualmente apresentados para a comunidade internacional. Este encontro contou com a participação de eminentes cientistas nacionais e internacionais das áreas de neurobiologia, economia, psiquiatria infantil, educação, medicina, entre outros. Também participou o ministro da Educação, Fernando Haddad, o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, o secretário de Fazenda do estado do Rio de Janeiro, Joaquim Lévy, e o ex-presidente da Academia Brasileira de Ciências, Maurício Marques Peixoto. O encontro teve ampla repercussão na mídia, com extensos espaços nos jornais. Os trabalhos do grupo durante este encontro, que resultou no presente livro, foram compostos de textos com recomendações de políticas públicas de responsabilidade de todos nós , além de três artigos de participantes específicos, e de alguns palestrantes não pertencentes ao grupo da Academia. O primeiro artigo, de autoria dos professores James Heckman ( Universidade de Chicago) e Flávio Cunha (Universidade da Pensilvânia), desenvolve e estima econometricamente um modelo de formação de capital humano e chega à interessante conclusão de que existe uma grande interação entre o capital humano adquirido em diversas fases da vida. Os autores também concluem que é difícil a aquisição de habilidades cognitivas em fases posteriores da criança, embora habilidades não cognitivas, como disciplina, interação social, obediência à hierarquia ainda possam ser adquiridas em fases posteriores do processo educacional. O subgrupo de neurociência, de autoria do professor Jaderson Costa da Costa (PUC/RS) e dos professores Erasmo Barbante e Edson Amaro (Universidade de São Paulo - USP) produziu um artigo no qual se descrevem as diversas formas de medição da atividade cerebral, e sua importância para o aprendizado. O terceiro artigo é de autoria dos especialistas em educação, João Batista Araujo e Oliveira e Luiz Carlos Faria da Silva. Neste artigo os autores, baseados em experiências de trabalhos científicos internacionais, arguem que é importante que se introduzam práticas do método fônico nos processos de alfabetização das crianças brasileiras. A ausência de tal prática tem provocado vários prejuízos para o processo de alfabetização no Brasil, o que em grande parte já foi corrigido em vários outros países, conforme descrito pelos autores. Temos também três artigos de palestrantes não pertencentes ao grupo da ABC, transcritos de nosso seminário internacional. O primeiro, do professor Ricardo Paes e Barros, do IPEA, que conclui, através de estudos econométricos, que creches de baixa qualidade não conseguem ter efeitos significativos no desempenho educacional posterior. O segundo, do professor Fernando Capovilla da USP, que estuda e sugere métodos educacionais apropriados para crianças com necessidades especiais. O terceiro, do professor Andre Portela da EESP-FGV, dá evidências de que a pré-escola (ensino de quatro e cinco anos) tem forte impacto positivo no aprendizado. O livro conta também com o resumo feito pelos professores Jaderson Costa da Costa (PUC/RS), Erasmo Barbante e Edson Amaro (Universidade de São Paulo) das palestras dos convidados internacionais . Como se sabe, situação da educação infantil no Brasil ainda está muito longe de Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil xi uma situação satisfatória. Um grande avanço foi obtido com o projeto de emenda constitucional aprovado pelo Congresso Nacional em 2009, que torna mandatória a matrícula para crianças de quatro a cinco anos e prevê a universalização em 2016. Também, o plano nacional de educação a ser implementado em breve prevê a matrícula para 50% das crianças de zero a três anos em 2022, a partir da cobertura atual de pouco mais de 20%. No entanto, isto é muito pouco para um país como o Brasil, onde a maioria das crianças vem de família de baixa renda per capita, e baixa educação dos pais, e que, portanto, devido a sua baixa vocalização política se encontra ainda menos representados nas creches. Esta situação tende a perpetuar boa parte da alta desigualdade de renda em nosso país. Isto agravado por serem as creches, em sua maioria, de qualidade duvidosa. É bem verdade que existem iniciativas importantes de governos federal, estaduais e municipais (estes responsáveis pela educação infantil) de se abrirem mais vagas. Concentrar recursos nas crianças de baixa renda, construindo-se creches de alta qualidade nas regiões de baixo desempenho escolar parece ser uma política adequada. Outro caminho é concentrar recursos já no pré-natal, aliando políticas de saúde e educação, inclusive com a instrução dos pais para o problema. Como enfatizou o professor Mustard em nosso seminário internacional, um dos pioneiros em educação infantil, foi esta a base de sucesso de Cuba no campo da saúde e da educação da sua população. Iniciativas semelhantes foram feitas no Chile e mesmo em nosso país, embora de forma incipiente. Pois, como é sabido, os cuidados com a saúde e nutrição durante o pré-natal e nos primeiros anos de vida são determinantes na plasticidade cerebral e consequentemente no desenvolvimento educacional, além da saúde do indivíduo ao longo de sua vida. É igualmente importante que se criem centros de pesquisa em educação infantil em nossas universidades, sejam públicas ou privadas. Estes centros poderiam ser financiados tanto pela iniciativa privada quanto por órgãos públicos como o MEC. Estes centros deveriam ser conduzidos tanto por educadores como por neurocentistas e pediatras. Também poderiam ser dirigidos por economistas que poderiam fazer estudos quantitativos sobre os custos e benefícios dos diversos métodos utilizados. Por fim, gostaria de agradecer à Academia Brasileira de Ciências, ao seu presidente, Jacob Palis Jr., às funcionárias Márcia Graça Melo, Fernanda Wolter, e Sandra Frias, designer gráfica, que nos prestaram inestimável apoio durante o processo de realização deste trabalho. Agradeço, também, ao professor James Heckman pelo apoio dado para trazermos ao Brasil cientistas internacionais notáveis, especialistas na área de educação infantil. Meus agradecimentos especiais ao Itaú Social, ao Dr. Pedro Henrique Mariani e à Fundação Getulio Vargas pelo auxílio dado, e em especial à Fundação Conrado Wessel. Aloísio Pessoa de Araújo Coordenador Membro da ABC Fundação Getúlio Vargas Instituto de Matemãtica Pura e Aplicada íNDICE INTRODUCAO - Conclusões e Recomendações 1 SUMáRIO DAS CONCLUSõES E RECOMENDAçõES DO GRUPO DE TRABALHO SOBRE EDUCAçãO INFANTIL 3 PARTE I - Capital Humano 9 1. INTRODUçãO 11 2. A PRODUçãO DE CAPITAL HUMANO 14 3. OS PROGRAMAS DE FORMAçãO DE CAPITAL HUMANO NA PRIMEIRA INFâNCIA 16 4. AS INTERVENçõES NA ADOLESCêNCIA 28 5. CONCLUSãO 31 REFERêNCIAS 32 PARTE II - Neurobiologia 35 AS BASES NEUROBIOLóGICAS DA APRENDIzAGEM DA LEITURA 37 I. INTRODUçãO 39 II. OBJETIVOS 42 III. MÉTODOS DE ESTUDO 43 IV. NEUROPLASTICIDADE E APRENDIzAGEM 48 V. DESENVOLVIMENTO DAS ESTRUTURAS ENCEFáLICAS ENVOLVIDAS COM A APRENDIzAGEM, LEITURA E LINGUAGEM 50 V.A. Desenvolvimento de estruturas regionais 50 V.B. Desenvolvimento do comportamento e aprendizagem 50 VI. A CAPACIDADE DA LEITURA ESTá RELACIONADA A REGIõES ESPECíFICAS DO CÉREBRO 54 VI.A. Circuito Temporoparietal 55 VI.B. Circuito Temporo-occipital ou via direta 58 VII. LEITURA E MOMENTO DE ATIVAçãO DAS DIFERENTES REGIõES CEREBRAIS DURANTE A LEITURA 59 VIII - ESTáGIOS INICIAIS DO APRENDIzADO DA LEITURA 61 VIII.A. Processamento fonológico 63 VIII.B. Processamento ortográfico 64 VIII.C. Processamento semântico 64 IX- NEUROBIOLOGIA E MÉTODOS DE ENSINO DA LEITURA 66 X. REFERêNCIAS 70 PARTE III - Métodos de Alfabetização 79 MÉTODOS DE ALFABETIzAçãO: O ESTADO DA ARTE 81 INTRODUçãO 81 A EVIDêNCIA SOBRE EFICáCIA DOS MÉTODOS DE ALFABETIzAçãO 86 ESTUDOS SOBRE CUSTO DE OPORTUNIDADE DO USO DO TEMPO NAS CLASSES DE ALFABETIzAçãO 95 VALIDADE DOS ESTUDOS SOBRE ALFABETIzAçãO EM PAíSES CUJAS LíNGUAS POSSUEM ESCRITAS ALFABÉTICAS 113 MUDANçAS E TENDêNCIAS NAS POLíTICAS DE ALFABETIzAçãO 117 MUDANçAS E TENDêNCIAS DAS POLíTICAS DE ALFABETIzAçãO NO MUNDO 120 REFERêNCIAS BIBLIOGRáFICAS 124 ANEXOS - Meeting on early childhood education 135 AGENDA 137 RESUMO DAS APRESENTAçõES COMPILADAS PELOS PROFESSORES EDSON AMARO, ERASMO BARBANTE E JADERSON COSTA 139 MINICURRíCULOS 186 POLíTICAS DE EDUCAçãO REGULAR E ESPECIAL NO BRASIL: SOBRE OS PERIGOS DE TRATAR AS CRIANçAS OUVINTES COMO SE FOSSEM SURDAS, E AS SURDAS, COMO SE FOSSEM OUVINTES 190 A IMPORTâNCIA DA qUALIDADE DA CRECHE PARA A EFICáCIA NA PROMOçãO DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL 212 IMPACTOS DA PRÉ-ESCOLA NO BRASIL 231 3Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil SUMáRIO DAS CONCLUSõES E RECOMENDAÇõES DO GRUPO DE TRAbALHO SObRE EDUCAÇÃO INFANTIL O Problema • O desempenho educacional das crianças brasileiras é muito inadequado. Resultados da Avaliação Brasileira do Final do Ciclo de Alfabetização, a Prova ABC, avaliação do movimento Todos pela Educação divulgada em agosto de 2011, mostram que 57,2% dos estudantes do terceiro ano do ensino fundamental, o que corresponde à antiga segunda série, não conseguem resolver problemas básicos de matemática, como soma ou subtração. Resultados semelhantes são encontrados na avaliação dos estudantes brasileiros no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes da OECD, PISA. • Dificuldades de linguagem são associadas às de processamento matemático e de lógica. Falhas na alfabetização dificultam a incorporação de conhecimentos importantes para o desenvolvimento profissional. • Embora o número de alunos no ensino médio venha aumentando de forma significativa nos últimos vinte anos, menos de 60% dos jovens de uma coorte conseguem concluí-lo; esse número, porém, tem se estabilizado. Uma fração ainda menor ingressa no ensino superior. Causas • Parte do problema deve-se tanto à falta de recursos e má utilização destes, quanto à ausência de uma política nacional eficaz de atração, seleção e retenção de melhores professores. Outra parte ao descompasso entre as políticas específicas de atenção às crianças (antes da escola e na alfabetização) e as recomendações que decorrem de evidência científica internacional. • De acordo com a neurobiologia, sabe-se que o desenvolvimento mais acentuado da estrutura cerebral (volume e maturação cerebral e, notadamente, sinaptogenese) ocorre nos primeiros anos de vida. Consequentemente, este é um período sensível para o desenvolvimento das habilidades envolvidas no Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 4 processo de aprendizagem da linguagem. Eventual atraso na estimulação dessa habilidade poderia implicar perda do melhor momento para o desenvolvimento do reconhecimento da relação grafema-fonema, tão importante para a leitura, no futuro, de palavras desconhecidas. Este fato tem sido ignorado na formulação de políticas públicas de educação. • Essa evidência se complementa pelos estudos em economia que mostram a grande rentabilidade de investimentos que ocorrem na mais tenra idade e produzem habilidades que são utilizadas para acumulação de outras habilidades (“habilidade produz habilidade”). Por exemplo, é muito difícil formar um engenheiro que não tenha desenvolvido habilidades básicas de álgebra. Estudos recentes mostram que investimentos que ocorrem entre os três e quatro anos de idade têm uma taxa de retorno de 17% ao ano, enquanto alguns programas de recuperação tardia apresentam retornos que são nulos e muitas vezes negativos (custo maior do que o benefício). Recomendações Atenção à infância: é importante investir na educação durante os primeiros anos • Estabelecer políticas integradas e flexíveis de atendimento às famílias com crianças pequenas, conforme suas diferentes circunstâncias e necessidades, visando assegurar o direito a condições básicas de se desenvolver. Estas políticas devem minimizar o efeito dos fatores de risco, entre os quais a condição social e econômica de seus pais. Famílias em condições críticas, especialmente em relação à violência, pobreza extrema, ambientes tóxicos, e monoparentais, requerem atendimento diferenciado. • Desenvolver políticas públicas que apoiem as mães na educação e no desenvolvimento dos seus filhos. • Incorporar no atendimento pré e pós-natal dos serviços de saúde pública e da assistência familiar já existentes as dimensões de desenvolvimento cognitivo e linguístico das crianças. Inovações tecnológicas no tratamento de epidemias e a acentuada queda da taxa de fecundidade abrem espaço para que a estrutura física e os recursos humanos da área de saúde sejam mobilizados para Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 5 estimular o desenvolvimento cognitivo, que é precário em boa parte das famílias brasileiras, principalmente aquelas provenientes de famílias de baixa condição socioeconômica. Tanto a evidência da neurobiologia quanto a da economia apontam altos retornos para essa realocação de recursos na fase inicial da vida. Para tanto, será importante incentivar e capacitar os profissionais da área, especialmente os profissionais da saúde. • Dar prioridade para o diagnóstico precoce de condições que afetam o desenvolvimento posterior da criança, tanto na linguagem quanto na sociabilidade. Propiciar tratamentos adequados para as crianças com necessidades especiais, tais como deficits auditivos, visuais, e crianças que possam ser incluídas no espectro autista. • Estabelecer, para as creches e pré-escolas, mecanismos de regulação que assegurem a qualidade dos atendentes, proporção adequada entre adultos e crianças, equipamentos, livros e infraestrutura, de modo a promover o desenvolvimento integral da criança, incluindo o seu desenvolvimento linguístico e lógico-matemático, e atitudes que favoreçam uma posterior escolarização bem-sucedida. • Desenvolver programas de capacitação e certificação de educadores da primeira infância de nível médio e superior que levem em conta os conhecimentos científicos sobre os fatores que promovem o desenvolvimento infantil. • Estimular programas para promover o hábito da leitura em casa. Alfabetização: devem ser utilizados métodos baseados em evidência científica • Levar em consideração a evidência científica e as orientações oficiais dos países mais avançados com relação à importância de adoção de políticas, materiais e métodos adequados de alfabetização. Ainda não há estudo nacional semelhante. • Tomar como referência os estudos sobre a neurobiologia da aprendizagem para se repensar a prática educacional. O melhor conhecimento dos circuitos neurais para a expressão e entendimento verbal, aquisição da habilidade da leitura e manutenção dos mecanismos atencionais e estratégia de aprendizagem são importantes para estabelecer processos mais eficientes de alfabetização. Capital Humano Lq0 a a Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 13 As competências adquiridas em uma etapa do ciclo de vida afetam a aprendizagem na próxima fase da vida. Como ressaltado nos recentes estudos sobre o desenvolvimento infantil (Shonkoff e Phillips, 2000), diferentes habilidades são formadas e moldadas em diferentes fases do ciclo da vida. A evidência empírica nos ensina que quando as oportunidades de formação dessas habilidades são perdidas, a reabilitação pode ser onerosa e a plena reabilitação proibitivamente custosa (Cameron, 2004; Knudsen et al., 2006; Knudsen, 2004). Estes resultados salientam a necessidade de que os cientistas sociais e os formuladores de políticas públicas tenham uma visão abrangente da formação de habilidades ao longo da vida. A seguir, apresentamos uma discussão sobre a teoria do investimento em capital humano ao longo da infância e da adolescência. Na terceira seção, temos um resumo da literatura sobre o impacto dos investimentos na infância na produção de capital humano. Na Seção 4, a evidência sobre o impacto dos investimentos durante a adolescência, e, finalmente, as considerações finais. Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 14 Apresentamos, em uma forma resumida, a teoria introduzida por Cunha e Heckman (2007) sobre a produção de capital humano em diferentes estágios da infância. Para simplificar, a nossa análise parte de um modelo com dois períodos de infância, que são denotados pelo index t , t = {1,2} . O capital humano desta pessoa quando adulta h é produzido durante a infância através de investimentos It feitos pela família em cada período t . A função de produção que liga investimentos It à habilidade h é: h = [γ(I1) ϕ + (1- γ) (I2) ϕ] O parâmetro γ, γ ∈[0,1], é chamado de multiplicador. Ele nos informa a importância relativa do investimento que ocorre na fase mais tenra da infância para a produção de capital humano. Por exemplo, se γ = 1 , então todo o capital humano é produto do investimento durante o primeiro período da infância. quando γ = 0, nada que se produz de capital humano decorre de investimentos na primeira infância. O parâmetro ϕ, ϕ ∈(-∞,1] nos informa a proporção necessária de investimentos no primeiro e segundo períodos da infância para produzir capital humano. Em outras palavras, ϕ determina a elasticidade de substituição entre I1 e I2. Por exemplo, quando ϕ → -∞, então para produzir uma unidade de capital humano h é necessário uma unidade de investimento I1 e uma unidade de investimento I2 . Ou seja, ambos devem ocorrer na mesma proporção. Neste caso, diríamos que a elasticidade de substituição entre I1 e I2 é zero pois não é possível substituir um pelo outro. Por outro lado, quando ϕ = 1, pode-se usar apenas I1 , ou apenas I2, ou até mesmo uma combinação de I1 e I2 para se produzir h. Neste caso, dizemos que a elasticidade de substituição é infinita. Admita que a família tenha uma quantidade de recursos R para investir na criança. A questão é: Como repartir esses recursos entre I1 e I2? Para responder, admita-se que ambos os investimentos são compostos pelos mesmos tipos de produtos, digamos livros. Suponha que o preço dos livros seja p. A família pode comprar livros agora e pagar p por cada livro, ou pode depositar p em uma poupança e resgatar (1+r)p no futuro quando for comprar livros para o investimento I2. Isto quer dizer 2. A PRODUÇÃO DE CAPITAL HUMANO ϕ 1 (1) Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 15 que o valor presente do livro no período t = 2 é . Dessa maneira, a restrição orçamentária é dada pela equação: Como discutido em Cunha e Heckman (2007), quando ϕ ∈(-∞,1) a proporção ótima entre investimentos I1 e I2 é dada pela fórmula: (2) A equação (2) nos informa que a proporção deve ser maior quanto mais importante for o investimento na determinção do capital humano, que é capturado pelo parâmetro γ. Ela também nos diz que quanto mais barato o investimento for em relação ao investimento (i.e., quanto mais alta for a taxa de juros r ), então menor deve ser a proporção . Finalmente, esta proporção deve ser mais próxima de um quanto menor for o parâmetro da elasticidade de substituição entre os investimentos. I1 1 + r p 1 + r pp I1 + I2 = R I2 I1 = (1 - γ) (1 + r) γ 1-ϕ 1 I2 I1 I2 I1 I2 I1 Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 18 Durante o período do experimento, cada classe de pré-escola tinha entre 20 e 25 alunos com três ou quatro anos de idade. A primeira coorte foi admitida com crianças de quatro anos de idade e que receberam apenas um ano de tratamento. A última coorte recebeu o tratamento junto com um grupo de crianças de três anos de idade que não faz parte do estudo. As aulas ocorriam todos os dias da semana por 2,5 horas por dia durante o ano escolar. Dez professoras ocuparam as quatro vagas de ensino necessárias, ao longo do estudo, resultando em uma média criança-professor na razão de 5,7 para o período de duração do programa. Todas já tinham sido professoras em escolas públicas. Durante o programa, as professoras visitavam a casa das crianças uma vez por semana por 1 hora e meia. O propósito da visita era para envolver as mães no processo educacional de seus filhos e para que estas também implementassem o currículo em casa.7 Para incentivar a participação das mães, as professoras também ajudavam com quaisquer outros problemas familiares. Por exemplo, muitos professores ensinavam os pais a obter ajuda governamental caso a criança ou alguma outra pessoa na família precisasse de algum tratamento médico. Ocasionalmente, essas visitas eram substituídas por passeios instrutivos, como uma ida ao zoológico. O programa desenvolveu um currículo piagetiano de aprendizado ativo, que é centrado em jogos e brincadeiras baseados em soluções de problemas e guiados por perguntas indiretas.8 As crianças são incentivadas a planejar, executar e refletir sobre as suas próprias atividades. Os tópicos no currículo eram baseados em fatores-chave de desenvolvimento cognitivo relacionados ao planejamento, expressão e compreensão. Esses fatores foram organizados em dez categorias tais como “representação criativa”, “classificação” (reconhecimento de similaridades e diferenças), “números” e “tempo”. Esses princípios educacionais foram baseados nos tipos de perguntas indiretas feitas pelas professoras. Por 7 Schweinhart et al. (1993). 8 Um exemplo de pergunta direta é “Você tem um bom relacionamento com o seu pai?”. A mesma pergunta pode ser feita indiretamente da seguinte forma: “Por favor, diga-me como é o seu relacionamento com o seu pai”. As perguntas diretas incentivam uma resposta curta e simples. As perguntas indiretas incentivam uma resposta mais elaborada, utilizando todo o conhecimento da pessoa que está respondendo. Além disso, as perguntas indiretas tendem a ser menos sugestivas do que as perguntas diretas. Schweinhart et al. (1993). Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 19 exemplo, “Me conte o que você fez. Descreva-me como você fez isto”.9 O currículo foi aperfeiçoado ao longo do programa e culminou com a aplicação sistemática de princípios de instrução que eram essencialmente fundamentados na teoria de Piaget. Isto fez com que todas as atividades acontecessem dentro de uma rotina diária estruturada para ajudar as crianças a desenvolverem um senso de responsabilidade e a desfrutar oportunidades para independência. ii) O Programa Abecedarian O projeto Abecedarian recrutou 111 crianças nascidas entre 1972 e 1977, vindas de 109 famílias que tiveram uma elevada nota no índice de alto risco.10 As famílias foram matriculadas e a intervenção começou poucos meses após o nascimento. A seleção dos participantes teve como base mais as características das famílias do que as das crianças, como no programa Perry. Praticamente todas as crianças eram negras, seus pais tinham baixos níveis de escolaridade, renda, capacidade cognitiva e níveis elevados de comportamento patológico. As crianças foram testadas para detectar se havia retardamento mental. Setenta e seis por cento das crianças viviam com somente um dos pais ou eram criadas pelos avós. A idade das mães neste grupo era em média inferior a vinte anos, com dez anos de escolaridade e qI de 85, ou seja, um desvio-padrão abaixo da média de desenvolvimento cognitivo normal para a idade da mãe. Foram formados quatro grupos de cerca de 28 crianças cada. quando os bebês completaram seis semanas de idade, eles foram distribuídos aleatoriamente entre o grupo de intervenção pré-escolar e o grupo de controle. A idade média de entrada foi de 4,4 meses. Aos cinco anos de idade, exatamente quando estavam prestes a entrar no jardim de infância, todas as crianças foram novamente distribuídas entre os grupos de tratamento e o de controle. Esta fase durou até as crianças completarem oito anos de idade. Ao final havia quatro diferentes grupos: crianças que não sofreram nenhuma intervenção, crianças que sofreram 9 Schweinhart et al. (1993). 10 Para construir o índice de alto risco foram ponderadas a escolaridade do pai e da mãe, a renda da família, a ausência paterna, a existência ou não de um apoio familiar para a mãe, indicação de problemas acadêmicos sofridos pelos irmãos da criança, o uso de benefícios da seguridade social e o baixo nível de QI dos pais. Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 20 uma intervenção quando elas eram muito jovens, crianças que sofreram intervenção a partir dos cinco anos de idade e aquelas que receberam o tratamento durante toda a sua infância. As crianças foram acompanhadas até os 21 anos de idade.11 O Programa Abecedarian usou o mesmo currículo do Programa Perry e por essa razão não iremos repetir os seus detalhes. No entanto, o Abecedarian foi um programa mais intenso do que o Perry: ele foi conduzido em tempo integral, durante os 12 meses do ano. Na fase inicial existia um professor para cada três crianças, mas este número cresceu para uma razão de 6:1 com a continuação do programa. Por funcionar em tempo integral durante todo o ano, o custo per capita do Abecedarian foi de US$ 15.125 em dólares de 2006. Durante os três primeiros anos do ensino primário, um professor fazia visitas regulares às casas das crianças envolvidas para reunir-se com os pais e ajudá-los na prestação suplementar de atividades educativas em casa. Ele fornecia um currículo de atividades individualmente planejado e adaptado para cada criança e também servia como ligação entre os professores regulares e a família, interagindo com estes a cada duas semanas. Ele também ajudava a lidar com outras questões que poderiam melhorar a capacidade da família de cuidar da criança, tais como encontrar emprego, navegar pela burocracia das agências de serviços sociais e transportar as crianças para consultas e compromissos. Grande parte das crianças do grupo de controle foi matriculada em creches e pré-escolas que existiam na comunidade. Dessa maneira, podem-se interpretar os impactos do Programa Abecedarian em relação à opção existente na época, que era a matrícula em creches. Como veremos adiante, as crianças nas creches não se desenvolveram tanto quanto aquelas que foram parte do programa de primeira infância. As diferenças nos resultados são muito grandes e podem ser explicadas por quatro razões que não são mutuamente exclusivas: (1) os professores nos programas de primeira infância recebiam treinamento intenso; (2) a razão criança-professor era baixa; (3) a estrutura curricular deu uma rotina de ensino estruturada que permitiu às crianças desenvolverem-se plenamente; (4) 11 Os bebês no grupo de controle receberam uma fórmula de leite em pó fortificada com ferro e tantas fraldas quanto necessárias, como incentivo para garantir sua participação. Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 23 O programa também oferecia exames feitos por médicos que visitavam as escolas de primeira infância uma vez a cada dois meses e, caso necessário, enviavam as crianças para tratamento em hospitais ou clínicas especializadas. Além disso, aulas de educação física foram dadas durante as sessões na parte da tarde. Caso uma criança exibisse um mau comportamento, a brincadeira ou atividade era interrompida para que ela recebesse uma explicação sobre a razão pela qual aquele comportamento não era socialmente aceitável. Houve um esforço para que as crianças não fossem socialmente isoladas ou deixadas de lado. Certamente, não houve punição física. As sessões de conversação foram usadas para trabalhar os conceitos de sentimento como amor e tristeza. Pequenas peças de teatro foram montadas para estimular o desenvolvimento emocional das crianças. As sessões de jogos promoviam o entendimento da importância de se seguir as regras. As crianças tinham um uniforme para tentar inibir a formação de grupos sociais entre as crianças. Além das aulas normais, houve ainda um programa de reforço onde as crianças com dificuldade de aprendizado recebiam atenção única. Além disso, os professores visitavam os lares das crianças para que eles pudessem estabelecer uma relação próxima com os pais, aprender mais sobre o ambiente familiar e discutir quaisquer necessidades especiais ou problemas comportamentais dos alunos. Os pais eram convidados para uma reunião mensal com os professores na escola. iv) Os Centros de Pais e Filhos de Chicago Os Centros de Pais e Filhos de Chicago (CPC) foram abertos em 1967 para servir crianças em 25 áreas de extrema pobreza na cidade de Chicago. Embora antigo, não houve coleta de dados desde o começo do programa. A coleta de dados começou com a geração das crianças nascidas em 1980. A participação no programa foi voluntária e 989 crianças nascidas em 1980 foram matriculadas aos três anos de idade. Foram identificadas 550 crianças que poderiam ser matriculadas no projeto, mas que não foram. Ao contrário dos demais programas, a avaliação do CPC não foi experimental, e sim quase experimental. O programa CPC tem uma estrutura similar ao do programa Pré-Escola Perry e, por essa razão, descrevemos apenas as Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 24 poucas diferenças entre eles. O CPC funciona três horas por dia durante o ano acadêmico e também por seis semanas durante o verão. As atividades são estruturadas e enfatizam a aprendizagem de linguagem e matemática. Ao contrário do Programa Perry, que usa o modelo de Piaget, o programa CPC usa o método fônico para ensinar linguagem. No entanto, o CPC tem menos professores por aluno do que o Perry: enquanto este tem em média 5,7 crianças por professora, aquele tem 8,5 crianças por professora. Esse fato faz com que o custo per capita do CPC seja de aproximadamente oito mil dólares em dólares de 2006, sendo assim 15% mais barato do que o Perry. A evidência gerada pelos projetos Perry, Abecedarian, Saúde Infantil das Ilhas Maurício e CPC comprova, entre outras coisas, que os participantes foram mais propensos a concluir o ensino médio e tornaram-se menos propensos a participar em atividades relacionadas ao crime e delinquência. No Projeto Perry as crianças que participaram do programa foram acompanhadas até os 40 anos de idade, enquanto no Abecedarian e CPC elas foram acompanhadas até os 21.13 Os três programas tiveram efeitos significativos na dimensão educacional.14 Como mostra a Figura 3, enquanto 45% dos participantes no grupo de controle concluíram o ensino médio, o mesmo percentual para o grupo de tratamento no Programa Perry foi de 66%. Essa diferença é estatística e economicamente significativa. Os números para o Projeto Abecedarian são similares: enquanto 51% do grupo de controle chegaram ao fim do ensino médio, o mesmo percentual para o grupo de tratamento foi de 67%. Os três programas reduziram a necessidade de educação especial e contribuíram em muito para a redução do problema de repetição escolar. Uma informação interessante que não mostramos na Figura 3: na avaliação do Projeto Abecedarian, percebeu-se que enquanto apenas 13% das crianças no grupo de controle concluíram o ensino superior, um percentual quase três vezes maior no grupo de tratamento conseguiu o diploma universitário. 13 A evidência descrita aqui foi primeiramente apresentada por Barnett (2004). 14 Pelo que sabemos, não houve mensuração sobre impactos educacionais no projeto de saúde das Crianças nas Ilhas Maurício. Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 25 O Projeto Perry, o CPC e o Projeto nas Ilhas Maurício tiveram impactos fortes na redução da participação em crimes relacionados, entre outros, ao comércio de drogas ilegais, roubo, homicídio e estupro para os meninos.15 Enquanto 44% dos meninos no grupo de controle foram condenados e presos por este tipo de crime, o mesmo número para os meninos no grupo de tratamento foi de 28%. O Projeto nas Ilhas Maurício encontrou efeitos similares: no grupo de controle, 36% dos participantes foram condenados por algum tipo de crime enquanto que, no grupo de tratamento, esse número foi de aproximadamente 23.6%.16 No CPC, 25% dos jovens que não participaram do programa já tinham sido presos pelo menos uma vez até os 21 anos de idade. O mesmo percentual para o grupo que recebeu o tratamento foi 30% menor. Os programas de primeira infância previnem que crianças se tornem pessoas violentas. Hoje sabemos que o comportamento antissocial pode ser classificado de acordo com a fase da vida onde ele surge: antes da puberdade (durante a infância) e após a puberdade (durante a adolescência).17 O comportamento violento que surge na infância ocorre com baixa frequência na população, mas se trata de um problema sério: tais crianças exibem um comportamento violento com as demais crianças e uma crueldade extrema com os animais. O comportamento antissocial que surge na adolescência tende a ser mais comum, mas também menos extremo. A maior parte desses adolescentes tende a cometer pequenos roubos e furtos e a mentir para os pais e professores. O comportamento antissocial que surge durante a infância está intimamente associado com déficits neuropsicológicos (capacidade intelectual subdesenvolvida) e pouco envolvimento dos pais com os filhos durante os primeiros anos de vida.18 Dessa maneira, os programas de primeira infância reduzem a criminalidade, pois eles elevam o desenvolvimento intelectual das crianças, prevenindo, assim, o aparecimento de comportamento antissocial na infância. 15 Esse tipo de crime não é praticado pelas meninas no grupo de controle ou no grupo de tratamento. Entretanto, para as meninas, o Programa Perry reduziu em quase 50% o número de condenações por crimes associados ao vandalismo, à prostituição e a outros tipos de crimes menores. 16 Veja evidência em Raine et al. (2003). 17 Veja Patterson et al. (1989) e Moffitt (1993). 18 Veja Moffitt (1993) e Raine et al. (1994). Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 28 quão eficazes são as intervenções feitas na adolescência? É possível remediar as consequências de negligência e abandono nos primeiros anos? Estas questões são pertinentes, pois é possível que várias crianças não estejam recebendo os investimentos ótimos durante a infância. A evidência mostra que intervenções feitas durante a adolescência produzem benefícios que são mais reduzidos do que aqueles obtidos com as intervenções que ocorrem durante a infância. Iremos discutir brevemente o que é conhecido sobre intervenções desenvolvidas nas escolas. Alguns estudos recentes sobre “Big Brothers/Big Sisters” (BB/BS) e “Patrocine um Estudante” têm demonstrado que estes programas têm amplo impacto social e acadêmico sobre as crianças e os adolescentes participantes. No programa BB/BS, adultos voluntários são emparelhados aleatoriamente com filhos de mães solteiras com a finalidade de fornecer uma amizade adulta e responsável ao menor. O objetivo desta amizade é promover o desenvolvimento do jovem. Não foi feita nenhuma tentativa específica de melhorar deficiências específicas ou alcançar metas educacionais. Tierney et al. (1995) mostrou que 18 meses após a introdução da figura do um mentor, os participantes, que tinham idades de dez a 16 anos na época, tornaram-se menos propensos a iniciar uso de drogas ou álcool, agredir alguém, faltar aula ou mentir para a mãe. As suas notas melhoraram e eles passaram a se sentir mais competentes em seu trabalho escolar. A principal meta do programa “Patrocine um Estudante” foi ajudar os estudantes de escolas públicas secundárias da cidade de Filadélfia a chegar à universidade. O programa previa reforço escolar através de um tutor por vários anos (durante o ensino médio e um ano após a graduação), ajuda para as despesas com os preparativos para a universidade. Mentores individuais incentivaram, apoiaram e acompanharam o progresso do estudante. O programa previa ainda uma ajuda financeira de US$ 6 mil durante o período em que estivessem matriculados em cursos credenciados em uma universidade. Usando uma amostra similar de jovens que não participaram do programa, Johnson (1996) encontrou um impacto nas notas do segundo e terceiro anos do segundo grau e aumento de 22% no ingresso à universidade um ano após a graduação da escola secundária. 4. AS INTERvENÇõES NA ADOLESCêNCIA Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 29 O “quantum Opportunity Program” (qOP) ofereceu à minoria desfavorecida assessoramento e incentivos financeiros (US$1 para despesas imediatas e US$1 depositado em uma poupança para a universidade), para cada hora gasta pelos estudantes em atividades relacionadas a investimentos em capital humano. Os alunos, que foram sorteados aleatoriamente para participar do programa, foram designados a um mentor no início da primeira série do segundo grau. Todos os participantes foram mantidos no programa por quatro anos, independentemente de sua permanência na escola. Durante este período, os participantes tiveram em média 1.286 horas de atividades educativas. O programa aumentou em 33% a graduação no ensino médio. A taxa de detenção para os participantes do programa foi metade daquela dos não participantes. Esses benefícios não vieram sem que se gastasse bastante dinheiro: a média por estudante nos quatro anos foi de dez mil e quinhentos dólares por participante. Ainda assim, uma análise custo-benefício estima um ganho social líquido positivo com o programa qOP (Taggart, 1995). Novamente, a evidência mostra que o qOP e programas como ele podem melhorar drasticamente as competências sociais e a adaptação dos adolescentes à sociedade. Mas esses programas não produzem milagres. Numa avaliação recente do qOP por Maxfiel e Schirm (2003) encontrou- se que os efeitos do programa sobre comportamentos de risco foram ambíguos. Também foi mais eficaz para os adolescentes das séries intermediárias do que para aqueles das primeiras ou últimas séries elegíveis para a intervenção. Houve grande variabilidade nos efeitos estimados do programa por localidade. Dois outros estudos fornecem provas adicionais de que programas criativos, projetados para manter adolescentes na escola, podem ser eficazes. O programa “Ohio’s Learning, Earning, and Parenting” (LEAP) e o programa “Teenage Parent Demonstration” (TPD) proporcionaram incentivos financeiros para os pais de adolescentes para que estes ficassem ou voltassem para a escola. O programa LEAP apresentou aumento nas taxas de graduação do ensino médio dos adolescentes que ainda estavam matriculados na escola quando eles entraram no programa. No programa TPD os resultados não foram muito claros, houve divergências de acordo com a localização. Tanto o LEAP quanto o TPD apresentaram efeitos positivos sobre os rendimentos e empregabilidade dos participantes que ainda estavam Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 30 na escola quando os programas começaram. Os efeitos estimados eram muitas vezes negativos, mas para os participantes que já tinham saído da escola antes do início dos programas. A literatura disponível sobre escolaridade demonstra que oferecer a estudantes desfavorecidos incentivos financeiros para permanecer na escola e participar nas atividades de aprendizagem escolar pode aumentar seu tempo na escola e melhorar sua empregabilidade no futuro. Deve-se notar que, embora tais programas têm comprovado sua influência positiva sobre emprego e salários (e, no caso do qOP, reduzir a criminalidade), eles não produzem milagres. Embora positivos, os impactos são modestos e os custos são altos. Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 33 MOFFITT, Terry. The neuropsychology of conduct disorder. Development Psychopathology, v. 5, p. 135-151, 1993. PATTERSON, Gerald; DeBARYSCHE, Barbara; RAMSEY, Elizabeth. A developmental perspective on antisocial behavior. American Psychologist, v. 44, p. 329-334,1989. RAINE, Adrian; BRENNAN, Peter; MEDNICK, Sarnoff. Birth complications combined with maternal rejection at age 1 year predispose to violent crime at age 18 years. Archives of General Psychiatry, v. 51, p. 984-988, 1994. _______; VENABLES, Peter; DALAIS, Cyril; MELLIGEN, Kjetil; REYNOLDS, Chandra; MEDNICK, Sarnoff. Early educational and health enrichment at age 3-5 years is associated with increased autonomic and central nervous system arousal and orienting at age 11 years: evidence from the Mauritius Child Health Project. Psychophysiology, v. 38, p. 234-247, 2001. _______; MELLINGEN, Kjetil; LIU, Jianghong; VENABLES, Peter; MEDNICK, Sarnoff. Effects of environmental enrichment at ages 3–5 years on schizotypal personality and antisocial behavior at ages 17 and 23 years. American Journal of Psychiatry, v. 160, p. 183-198, 2003. REYNOLDS, Arthur; TEMPLE, Judy; ROBERTSON, Dylan; MANN, Emily. Age 21 cost-benefit analysis of the title I Chicago Child- Parent Centers. Educational Evaluation and Policy Analysis, v. 24, p. 267-303, 2002. SCHWEINHART, Lawrence; BARNES, Helen; WEIKART, David. Significant benefits: the High-Scope Perry Preschool Study through age 27. Ypsilanti, MI: High/Scope Press, 1993. Neurobiologia X Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 39 A aquisição da capacidade de efetuar uma leitura eficiente é fundamental para o progresso de uma cultura. Um dos maiores problemas do Brasil e provavelmente o mais grave é o péssimo status educacional da população, e isto tem sido demonstrado repetidamente por meio das avaliações do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB), divulgadas pelo Ministério da Educação. Não muito diferente dos anos anteriores, os resultados do SAEB para o ano de 2005 apontam que 59% das crianças finalizaram o quarto ano do ensino fundamental sem ter adquirido um grau de alfabetização razoavelmente adequado. Esses dados podem ter alguma relação com problemas sociais do país, todavia são maiores que aqueles observados em países de nível socioeconômico semelhante, e com certeza também têm relação com a quantidade e tipo de instrução oferecida, de acordo com as avaliações efetuadas pelo Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA do inglês Programme for International Student Assessment; http://www.oecd.org/dataoecd/30/17/39703267.pdf), que avalia estudantes de 15 anos de idade, comparando os resultados em testes de matemática, leitura e ciências. Estas avaliações ocorrem a cada três anos, e, nos exames de 2009, os alunos brasileiros obtiveram médias que os colocam na 53ª posição, entre 65 países [1]. Atuações que possam ajudar a minimizar este tipo de problema, obviamente, são de caráter multidisciplinar e implicam atuação dos mais diversos segmentos da sociedade. Diferentemente da fala ou da marcha, a aquisição da capacidade de leitura corresponde a um processo de complexas adaptações do sistema nervoso, que necessitam de estimulação e orientação externa, ocorrendo de modo mais lento que outros padrões citados, os quais se desenvolvem de modo muito menos dependentes do ambiente externo [2]. Na realidade, a aprendizagem da leitura é baseada no reconhecimento que símbolos representam unidades que quando agrupadas formam palavras, e a aquisição deste conhecimento torna-se mais fácil, quando estas palavras já são de conhecimento prévio do aprendiz. A unidade da escrita conhecida como grafema é o correspondente da unidade sonora, denominada fonema, e esta consciência é fundamental na aquisição da leitura [3]. Esta capacidade é I. INTRODUÇÃO Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 40 denominada consciência fonológica e está presente de forma estável em crianças a partir dos cinco anos de idade [2, 4]. Este tipo de percepção representa um passo inicial para o desenvolvimento da capacidade da leitura e está associado à ativação e desenvolvimento de circuitos neurais em regiões específicas do cérebro, que desde a idade pré-escolar já se mostram presentes, localizando-se principalmente em áreas do hemisfério cerebral esquerdo [5-8]. Salientamos que a aquisição da leitura está também relacionada logicamente a outras capacidades como a atenção e memória, que não serão abordadas de modo destacado neste documento. Todo o processo de aquisição de qualquer informação pelo cérebro passa pelos caminhos sensoriais que permitem “captar” as qualidades do mundo externo e transmiti-las ao sistema nervoso central. O processamento central ocorre em vários níveis de integração, mas, certamente a integração sensório-motora cortical é fundamental para os mecanismos perceptuais. A extensa área cortical humana responsável pela associação de informações sensitivo-sensoriais permite dar sentido às informações que recebemos do ambiente ou que geramos internamente. É o “cérebro” podendo pensar, conhecer, comunicar e decidir [9, 10]. O cérebro humano é estruturado por sistemas complexos bem organizados. No cognitivismo computacional, o cérebro é metaforicamente entendido como um dispositivo que funciona à semelhança de um computador que processa a informação de entrada (input) e emite respostas adequadas (output). Entretanto, esta concepção simplificada não considera as complexas conexões córtico-corticais e córtico- subcorticais, bem como as vias de associação inter-hemisféricas e o processamento paralelo multi e intersegmentar. O córtex cerebral e o tálamo estão interconectados por uma extensa via de projeções excitatórias (conexões córtico-subcorticais) que mantém a reverberação autossustentada associada aos processos sensoriais, cognitivos, emocionais e motores [10]. Entende-se por reverberação a automanutenção de uma atividade num circuito neuronal após um estimulo transitório [11], e que é fundamental para a geração e persistência do processo cognitivo. Os processos neurobiológicos que participam do processo de aprendizagem foram estudados em animais de experimentação, destacando-se os processos de aquisição e armazenamento da memória, desempenho em determinadas tarefas e aprendizado espacial. Nas últimas décadas o desenvolvimento tecnológico disponibilizou Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 43 a. Observações da patologia humana e experimentação em animais. A observação de pacientes com lesões focais cerebrais foi durante muito tempo a única janela para o conhecimento do cérebro e constitui o método neuropatológico ou anátomo- clínico baseado na constatação de que as lesões cerebrais podem determinar deficits funcionais perceptuais, motores, ou cognitivos. Por outro lado, estudos experimentais de ablação ou estimulação cortical em animais permitiram a correlação anátomo-funcional [10]. Embora o cérebro humano seja uma estrutura complexa composta por áreas com funções bem determinadas, lembramos que geralmente existem muitas interconexões entre diferentes áreas cerebrais, que dificultam as interpretações de experimentos, os quais, muitas vezes não são fidedignamente representativos das situações reais [12- 15]. Devemos ter em mente que os experimentos de ablação ou as lesões cerebrais representam em verdade a perda de uma área funcional do cérebro, que também interrompe a conexão com outras áreas do sistema nervoso central, promovendo, portanto, não só a perda da função relacionada à região lesada, mas também à desconexão do circuito envolvido naquela função. Assim, as lesões podem confirmar a “necessidade”, mas não a “suficiência” de uma determinada região cerebral. Além disso, estes “mapas” que dispõem as funções cerebrais relacionadas a regiões específicas do cérebro como se este fosse um mosaico de funções expõem limites precisos entre estas áreas funcionais, o que nem sempre corresponde à realidade [10, 16]. As áreas cerebrais já mapeadas nem sempre correspondem a representações funcionais uniformes ou precisamente delimitadas, podendo haver superposições funcionais [12, 16]. Algumas funções não ficam limitadas a fronteiras rígidas, como é o caso das funções cognitivas que dependem de amplas áreas do cérebro e de conexões e associações entre elas. O processo de informação central também envolve os mecanismos atencionais, de memorização e afetivos relacionados à motivação. III. MéTODOS DE ESTUDO Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 44 b. Estudos Funcionais: Ressonância Magnética Funcional, Tomografia por Emissão de Pósitrons e Magnetoencefalografia. Para estudos diretamente relacionados à investigação das funções cerebrais, a ressonância magnética funcional (RMf) tem sido a técnica de escolha. A RMf se sustenta nos mesmos princípios físicos da ressonância magnética (RM), que permitem a construção de imagens tomográficas detalhadas do cérebro. A molécula de hemoglobina completamente desoxigenada possui uma susceptibilidade magnética aproximadamente 20% maior do que a hemoglobina completamente oxigenada [17]. O contraste entre as imagens com sangue oxigenado e com sangue venoso foi posteriormente denominado “contraste BOLD” (do inglês, Blood-Oxygenation-Level Dependent) e é utilizado em exames de rotina de RMf. O aumento da atividade neuronal decorrente de determinada tarefa ou ação realizada pelo sujeito causa um discreto aumento da extração de oxigênio pelos tecidos e um grande aumento da perfusão cerebral regional. Por consequência, ocorre um aumento da concentração de oxihemoglobina em relação à desoxihemoglobina, o que finalmente determina aumento do sinal T2*. O desafio tem sido superar as suas limitações técnicas: a) O sinal BOLD é fraco. A variação de sinal na prática em tarefas motoras (que tipicamente produzem os sinais mais intensos) é da ordem de 0,5-3% na maior parte dos equipamentos atualmente instalados; b) É uma medida indireta de atividade neuronal, e o mecanismo que correlaciona às variáveis de atividade neuronal e de intensidade de sinal BOLD ainda não é completamente entendido; c) Tanto o movimento de cabeça como o ruído dentro do aparelho de RM comumente causam artefatos; d) Ainda existe grande variabilidade inter- e intrassujeitos [18, 19] maior que entre os equipamentos de RM [20]. Para superar todas essas dificuldades, pesquisadores passaram a aplicar métodos estatísticos à RMf, de forma semelhante à já realizada em estudos de PET. A forma de lidar com as incertezas listadas acima passou a ser a obtenção de muitas imagens do cérebro em diferentes “estados” ou “condições”, organizados em “paradigmas”, para que a diferença entre elas pudesse ser estatisticamente determinada [21]. O mais simples desses paradigmas é o “paradigma em bloco”. No paradigma em bloco, duas ou mais condições são comparadas em uma mesma sequência através de dois ou mais blocos. Sujeitos podem alternar blocos de tarefa propriamente dita (como mexer a mão, por exemplo), Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 45 com blocos de controle. As imagens obtidas durante cada um dos tipos de blocos podem então ser comparadas estatisticamente [17]. Os estudos com RMf detectam áreas de ativação como parte de uma complexa rede neural: não devemos incorrer nos mesmos erros anteriores e construir uma “nova frenologia” baseada num “mosaico” funcional sem interpretarmos a participação das conexões amplas entre as áreas corticais e subcorticais [10]. Os exames com capacidade de avaliação de alterações hemodinâmicas e metabólicas como a RMf e o PET permitiram uma localização muito precisa destas regiões cerebrais envolvidas no ato da leitura. Por outro lado, técnicas de medicina nuclear com o uso de PET ou SPECT (do inglês, Single Photon Emission Computed Tomography) foram inicialmente utilizadas, e hoje ainda o são, mas apenas em algumas aplicações específicas, para avaliar alterações metabólicas (ex. PET) ou de fluxo sanguíneo (ex. SPECT), associado ao aumento de atividade neural [22]. Atualmente essas técnicas são mais utilizadas em estudos de neuroimagem molecular, que mostram o estado e disponibilidade de receptores ou transmissores neurais. Dessa maneira, temos a possibilidade de investigar os componentes químicos e ultraestruturais do cérebro de maneira específica. O PET permite obter imagens tridimensionais de processos funcionais no ser vivo. Certas substâncias são emissoras de pósitrons, e, por sua vez, quando um desses é emitido imerso na matéria, ele viaja uma pequena distância e então interage com um elétron do meio. A interação de matéria com antimatéria resulta na completa aniquilação de ambas as partículas. Devido à conservação de energia e momento, suas massas são convertidas em um par de fótons que viajam em direções opostas. A detecção simultânea desses fótons emitidos indiretamente pelo radioisótopo (radiotraçador) emissor de pósitrons torna possível a produção de imagens tomográficas. Assim, quando introduzimos no corpo uma molécula emissora de pósitrons e biologicamente ativa, o sistema detecta esse par de fótons e as imagens da concentração do radiotraçador que é introduzido no corpo são reconstruídas por análise computadorizada. Se a molécula biologicamente ativa escolhida para o PET for a 18F-flúor-deoxi-2-glicose (18FDG), um análogo da glicose, as concentrações do radiotraçador expressam a atividade do tecido em termos de captação regional da glicose. quando se quer, por exemplo, estudar a função de determinados Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 48 A Neuroplasticidade é a adaptação funcional/estrutural que minimiza ou reverte os efeitos das alterações estruturais (lesionais) ou funcionais do sistema nervoso e que também permite a aquisição do conhecimento. Este processo envolve a (1) reparação [30-34], a (2) reorganização ou rearranjo estrutural [30, 33, 34], a (3) sinaptogênese reativa como o denominado “brotamento” dos terminais axônicos [9, 35] e (4) a neurogênese [32, 36-40]. Paralelamente a este processo de reorganização morfofuncional, ocorrem modificações nas sinapses químicas, por períodos curtos ou longos (plasticidade sináptica) para o qual concorrem modificações moleculares intraneuronais e processos extrínsecos (ambientais) que também podem modificar a funcionalidade neuronal [41- 43]. O potencial de ação no terminal pré-sináptico promove a liberação do neurotransmissor na fenda sináptica que se irá acoplar aos receptores da membrana pós-sináptica; da interação do neurotransmissor com o receptor da membrana pós-sináptica resultarão as trocas iônicas e a conversão do fenômeno químico em elétrico, com o aparecimento dos potenciais pós-sinápticos. As modificações na eficiência da transmissão sináptica, principalmente a potencialização de longa duração (LTP do inglês, Long-term potentiation), acompanham os processos de aprendizado e de memória [10, 42]. A plasticidade cerebral durante o processo de aquisição da leitura provavelmente induz outras modificações no circuito neural envolvido com o aprendizado. Assim, as funções de memória são armazenadas no hipocampo por semanas ou meses e através do processo de consolidação são transferidas e armazenadas no neocórtex temporal. Durante este processo, as modificações nas conexões neurais permitem que se aprenda a solucionar novos problemas. Isto é de extrema importância para a memória, aprendizagem e outras funções simbólicas do cérebro demonstrando a contínua plasticidade de alguns circuitos neurais com o aprendizado. Este processo é fortemente dependente de fatores neurobiológicos, genéticos e ambientais/familiares [44]. Deve-se enfatizar que mesmo na idade adulta há redistribuição das funções sensório-motoras dependentes Iv. NEUROPLASTICIDADE E APRENDIZAGEM Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 49 de treino. Assim, pacientes leitores com Braille, apresentam maior representação sensorial e motora para a área do dedo indicador (dedo utilizado na leitura) quando avaliados por estimulação magnética transcraniana (TMS do inglês transcranial magnetic stimulation) e Potenciais evocados somatosensoriais [45]. Em músicos de instrumentos de corda ou teclado foi evidenciado aumento do sulco do giro pré-central como um correlato da expansão da área motora nestes indivíduos e inversamente relacionado à idade do início deste treinamento musical [46]. Embora a macroestrutura do encéfalo seja relativamente constante, a complexa microestrutura pode ser significativamente modelada pelo ambiente antes do nascimento, durante o desenvolvimento do indivíduo e mesmo durante toda a sua vida. A maioria dos estudos foram realizados com animais de experimentação, principalmente com roedores, onde o ambiente era enriquecido com objetos, estímulo à atividade física etc., evidenciando um melhor desempenho em atividades de aprendizagem e no desenvolvimento cortical; o mesmo é evidenciado quando se comparam animais com adequada disponibilidade de alimentos com aqueles em que foi induzida alguma deficiência [47]. Jacobs e colaboradores (1993), estudando a área de Wernicke obtidas de cérebro de indivíduos que tiveram maior educação formal, comparado com aqueles com menor nível educacional, demonstraram maior densidade de dendritos nos primeiros [48]. Nos organismos multicelulares, o genoma celular é homogêneo, mas pode sofrer modificações com o desenvolvimento. Estas modificações podem ocorrer devido à expressão de determinados genes, que será transmitida pela mitose. As modificações estáveis são denominadas de “epigenéticas” por poderem ser herdadas e não são decorrentes de mutação do DNA. Nos últimos anos, dois mecanismos moleculares relacionados com o processo epigenético foram muito estudados: a metilação do DNA e as modificações das histonas. Portanto, o processo epigenético permite ao organismo responder a modificações do ambiente pela expressão de determinados genes [49]. Estas pesquisas reforçam a importância do ambiente e principalmente do estímulo ambiental no desenvolvimento do cérebro e consequentemente da aquisição do conhecimento, desenvolvimento de habilidades e do comportamento. Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 50 V.A- Desenvolvimento de estruturas regionais Nos dois primeiros anos de vida ocorre o desenvolvimento mais acentuado do cérebro: o seu peso duplica, há aumento importante do volume da substância branca e do grau de mielinização e um aumento menor do volume da substância cinzenta [50, 51]. Além disso, há aumento importante do volume hipocampal [51, 52]. Até os oito anos de vida ocorre um aumento lento do volume da substância cinzenta pré-frontal que depois se acelera entre oito e 14 anos [53]. A rápida formação de sinapses inicia-se nos primeiros meses de vida pós-natal e atinge o máximo de densidade aproximadamente aos três meses no córtex sensorial, e entre dois e 3,5 anos no córtex frontal [54, 55]. É importante salientar que os cuidados dos pais, o ambiente, as interações sociais e afetivas etc. podem influenciar este desenvolvimento. Dados experimentais demonstram a influência ambiental na formação sináptica e organização cortical: animais que se desenvolvem em meio enriquecido apresentam maior densidade sináptica em determinadas áreas do cérebro quando comparados com os animais que se desenvolveram em meios não enriquecidos [56]. V.B- Desenvolvimento do comportamento e aprendizagem As bases neurobiológicas para o desenvolvimento comportamental e aprendizagem envolvem múltiplas plataformas de investigação. A convergência dos dados de diversos grupos de pesquisa mostra um cenário de constantes mudanças, e que atualmente está alicerçado em alguns achados com maior grau de reprodução entre os pesquisadores. O sistema de linguagem é composto por vários subsistemas, mas abordaremos aqui aqueles mecanismos concernes à leitura principalmente. Por outro lado, o sistema de aprendizagem é talvez ainda mais complexo, mas há indícios que sugerem forte interação com linguagem, e principalmente quando analisamos os v. DESENvOLvIMENTO DAS ESTRUTURAS ENCEFáLICAS ENvOLvIDAS COM A APRENDIZAGEM, LEITURA E LINGUAGEM Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 53 processos de linguagem. Esta abordagem é contextualizada tendo em vista os distúrbios de aprendizagem. quando avaliamos os distúrbios que podem determinar dificuldades com o processo de leitura, identificamos duas classes (1) sensório-motor, i.e aqueles relacionados a deficits auditivos, visuais e/ou motores, e o (2) fonológico. De modo simplificado, todo o processo de aprendizagem envolve a atenção, a percepção, as funções simbólicas como a linguagem e praxias, os processos de raciocínio, memorização e as funções executivas. As funções simbólicas e as executivas dependem do córtex associativo, e seu processamento é cortical, com fortes interações subcorticais. A linguagem é o sistema de simbolização prototípico. O estudo da aquisição da linguagem é um excelente paradigma para a compreensão do desenvolvimento da cognição em seres humanos [65]. A função da linguagem tem a maior parte dos substratos neurais localizados no hemisfério cerebral dominante. Na imensa maioria dos indivíduos (mais de 90%), este é o hemisfério cerebral esquerdo. A expressão verbal depende da área de Broca localizada no giro frontal inferior; no córtex das bordas posteriores do sulco temporal superior encontra- se a área de Wernicke, classicamente responsável pela compreensão e interpretação simbólica da linguagem. Os estudos de neuroimagem para entender as bases biológicas da leitura nos permitem conhecer os mecanismos cognitivos do aprendizado em geral. O processo de leitura depende da decodificação das palavras, fluência e compreensão da escrita. Neste processo, ocorre inicialmente a análise visual, dependente, portanto, deste sistema sensorial e da atenção seguida do processamento linguístico da leitura, para a associação grafema-fonema (correspondência grafofonêmica) e leitura global da palavra. Participam a região occipital onde se localiza o córtex visual primário, associada ao processamento dos símbolos gráficos e áreas do lobo parietal, associadas à função viso-espacial diretamente relacionadas ao processo gráfico. Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 54 A importância do hemisfério esquerdo na atividade da leitura em adultos já é conhecida desde o final do século XIX, quando Déjerine relacionou lesões dos giros angular, supramarginal e temporal superior esquerdo com quadros de perda da capacidade da leitura [66]. Nos últimos anos vários estudos têm mostrado resultados na mesma direção, de um grande número de inferências previamente realizadas por Déjerine sobre os aspectos neurobiológicos da leitura; outros pesquisadores interpretando os distúrbios adquiridos da leitura, decorrentes de lesões cerebrais, apresentam resultados que se alinham com esse conceito [67-71]. As estruturas neurais relacionadas à leitura estão distribuídas principalmente no hemisfério cerebral esquerdo, incluindo a região occipital, temporal posterior, giros angular e supramarginal do lobo parietal e o giro frontal inferior e estas áreas são ativadas em diferentes tipos de situações que ocorrem durante a leitura. A Figura 2 demonstra de modo esquemático as principais regiões cerebrais envolvidas no processamento da leitura. vI. A CAPACIDADE DA LEITURA ESTá RELACIONADA A REGIõES ESPECíFICAS DO CéREbRO Figura 2. Representação didática das áreas cerebrais associadas à leitura: a) Área visual primária, situada nos lobos occipitais de ambos os hemisférios, que está associada à percepção visual da palavra a ser lida; b) Porção posterior do giro temporal superior, giros angular e supramarginal, que estão associadas ao processo de análise fonológica de uma palavra, ou seja, na segmentação das unidades que a compõe; c) Junção dos lobos temporal (mais inferiormente) e occipital, que são consideradas áreas secundárias da visão, destacando-se mais especificamente os giros lingual e fusiforme, além de partes do temporal médio, que estão associadas ao ato da análise visual da palavra. Especula- se que faça parte de processos de interpretação direta da palavra, ou seja, da transferência da análise ortográfica para o significado; e d) Giro frontal inferior esquerdo (“área de Broca”), que participa no processo de decodificação fonológica. De modo didático, podemos citar a presença de dois circuitos principais no cérebro (Figura 3), que são ativados quando uma palavra escrita é visualizada pelo córtex responsável pela visão: o circuito temporoparietal e o circuito temporo- occipital; e ainda devemos salientar o importante papel do giro frontal inferior (área de Broca), que atua em determinadas situações, associadamente ao circuito temporoparietal. Figura 2 Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 55 VI.A. Circuito Temporoparietal A informação da palavra previamente processada pelo córtex da visão é “transmitida” por este circuito para áreas do parênquima encefálico na região correspondente à junção dos lobos temporal e parietal esquerdo, mais precisamente para porções mais posteriores dos giros temporal superior, angular e supramarginal, (Figura 2 – b); inclui também áreas do giro frontal inferior (Figura 2 – d), que são ativadas principalmente durante o processo de análise fonológica de uma palavra, ou seja, na segmentação das unidades que a compõe, que implica a transformação do grafema para o fonema [72]. Estas áreas estão associadas ao processo de decodificação da palavra durante a leitura em seus menores segmentos, que são as letras, as quais são correlacionadas com os seus respectivos sons. Assim, após a visualização da palavra “BOLA” (pelas regiões occipitais), os quatro símbolos alfabéticos são “analisados” na região temporoparietal, a qual efetua a correlação dos sons “be + o + ele + a”, com as suas letras correspondentes. A área de Broca (no giro frontal inferior, correspondente às áreas de Brodmann 44- pars opercularis e 45 - pars triangularis) também tem participação no ato da leitura, quer seja silenciosa ou em voz alta, quando estão ocorrendo os processos de decodificação e recodificação fonológica e provavelmente está associada à formação da estrutura sonora, através da movimentação dos lábios, língua e aparelho vocal [62, 63, 73]. Alguns autores, avaliando crianças de sete a 17 anos de idade, sem qualquer problema de aprendizado, observaram que durante testes de leitura, nas fases mais iniciais do aprendizado da leitura, ocorria maior participação das áreas do circuito parieto-temporal e também do giro frontal inferior, e em contrapartida, observaram menor participação das áreas do circuito temporo-occipital. Por outro lado, estes autores também registraram maior participação das áreas temporo-occipitais nas crianças de maior idade. Estas regiões cerebrais envolvidas principalmente durante as fases iniciais do aprendizado da leitura são as áreas estimuladas, independentemente da idade e da capacidade do leitor, diante de testes com pseudopalavras (Figura 3). Pseudopalavras correspondem às junções de letras que apesar de inexistentes na ortografia da língua do indivíduo avaliado e não terem qualquer significado, obedecem às regras gerais de ortografia e pronúncia desta língua [61, 74]). Exemplos de pseudopalavras na língua portuguesa Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 58 VI. B. Circuito Temporo-occipital ou via direta Uma segunda região com papel importante na atividade da leitura está localizada nas junções dos lobos temporal e occipital esquerdo, que são consideradas áreas secundárias da visão, destacando-se mais especificamente os giros lingual e fusiforme e partes do giro temporal médio, que são ativados principalmente durante a análise visual da palavra, permitindo uma interpretação mais imediata direta da palavra, ou seja, é efetuada uma transferência direta e praticamente simultânea da análise ortográfica para o significado (Figura 2c) [80]. Esta via, conhecida como direta ou léxica, é ativada durante a leitura de palavras regulares (que apresenta correspondência entre letra e som) e mais frequentemente utilizadas, ou seja, em um momento de maior experiência do leitor-aprendiz, que já teve contacto com elas por inúmeras vezes, como “GATO, BOLA, PATO, MACACO”, estas palavras passam a ser analisadas de modo mais automático [75, 81]. Nesta região estariam armazenadas todas as informações importantes sobre estas palavras, necessárias para soletrá- las, pronunciá-las ou compreendê-las de modo simultâneo. Assim a identificação das palavras vai ocorrer em um tempo significativamente inferior ao que ocorre durante a leitura de uma palavra desconhecida, que é realizada através da via indireta. quanto mais palavras são armazenadas nesta região, pela prática repetitiva, mais fluente será a leitura. Está região cerebral participa também na análise de palavras irregulares, as quais não representam estrutura sonora da língua, necessitando ser conhecidas através de processos de memorização, como “EXCEçãO, EXEMPLO, HOJE, AMANHã, BOXE OU VEXAME” [82]. Está região estaria representando um sistema de identificação da palavra baseado na memória da forma da mesma. Assim, crianças pré-escolares expostas à palavra coca-cola, como representada simbolicamente pelo fabricante, a reconhecem rapidamente, o que não ocorre quando estas mesmas letras estão escritas em letra bastão, por exemplo. Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 59 Os estudos de Papanicolaou e colaboradores [29, 83, 84] utilizando mapas por magnetoencefalografia demonstraram que a lateralidade da linguagem na verdade não era tão marcada como se imaginava, e que também se observa a ativação do hemisfério não dominante, porém, em menor intensidade. A MEG permitiu obtermos dados em tempo real do que ocorre durante o ato da leitura. Nos primeiros 150ms após a visualização de uma palavra, há um componente inicial que representa a ativação do córtex sensorial primário da visão. No intervalo entre 100 e 150ms, observa- se ativação bilateral dos giros temporal superior, que inclui o giro de Heschl. No intervalo entre 150-300ms ocorre a ativação de regiões corticais occipito-temporal e temporal basal bilateralmente, todavia predominando à esquerda, principalmente no giro temporal médio. Logo em seguida ocorria a ativação das regiões cerebrais temporal superior, parietal inferior e frontal inferior, também predominando à esquerda (Figura 5). vII. LEITURA E MOMENTO DE ATIvAÇÃO DAS DIFERENTES REGIõES CEREbRAIS DURANTE A LEITURA Figura 5: Padrão de ativação cerebral durante os estágios iniciais da aquisição da leitura. A) Durantes provas de decodificação neurológica em crianças com e sem risco para distúrbio da leitura; B) Padrão de ativação cerebral em adultos, sem distúrbio de leitura, durante provas de decodificação neurológica. GTS: Giro temporal posterior (adaptado com autorização de Simos et al, 2002). Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 60 Salientamos que os estudos com MEG não evidenciam a participação das áreas frontais, que só foram identificadas através dos estudos de RMf. Dificuldades de aprendizagem referem-se a alterações no processo de desenvolvimento do aprendizado da leitura, escrita e raciocínio lógico-matemático, podendo estar associadas a comprometimento da linguagem oral. A dificuldade específica na realização da leitura e da escrita decorrente da dificuldade em decodificar palavras isoladas e não resultantes de um distúrbio global do desenvolvimento ou alterações sensoriais é denominada de dislexia. Os estudos realizados com RMf mostram que o córtex temporo- parietal esquerdo está envolvido no processo de aquisição fonológica tanto em crianças quanto em adultos e pode estar interrompido durante o processamento fonológico em pacientes disléxicos adultos e crianças [88, 89]. Em pacientes disléxicos observa-se redução de atividade no giro temporal superior esquerdo durante o processo de leitura e de processamento fonológico [88, 89]. Estes achados estão de acordo com as primeiras observações de Galaburda quanto à ocorrência de heterotopias neuronais em pacientes disléxicos, sugerindo interrupção ou deformação da rede neuronal envolvida no processamento da leitura [69, 71, 90-93]. Outras áreas, tais como o giro frontal inferior esquerdo, também estão envolvidas com o processo de leitura e discute-se uma possível divisão funcional conforme o envolvimento com os processos semânticos e os fonológicos [62]. Estes sistemas de processamento não são específicos, eles também estão envolvidos em diferentes tarefas; isto supre um mecanismo pelo qual o aprendizado da leitura afeta o desempenho de tarefas de não leitura tais como a repetição de pseudopalavras. O giro fusiforme direito envolvido no reconhecimento de faces e constituindo o que denominamos de córtex visual extraestriado abriga os processos relacionados à aptidão para o aprendizado da leitura [74]. Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 63 no processamento semântico, e das áreas mais posteriores no processamento fonológico e gramatical [99, 100]. A seguir, apresentamos as modificações anatômicas e funcionais, associadas à especialização e integração das principais áreas cerebrais relacionadas à aprendizagem da leitura, desde a infância até a adolescência. VIII.A. Processamento fonológico Já no primeiro ano de vida, no início do desenvolvimento do processamento fonológico, tem sido observada a ativação de regiões cerebrais occipitais e temporais dos hemisférios direito e esquerdo [101]. Nos anos seguintes observa-se a consolidação da ativação principalmente do giro temporal esquerdo, porém dos nove aos 11 anos de idade ainda ocorre uma ativação desta região durante o processamento visual e auditivo da palavra [102], diferentemente dos adultos, onde apenas o estímulo pela via auditiva vai determinar a ativação desta região. Vários estudos demonstram que o córtex temporal superior esquerdo desenvolve-se antes que outras áreas relacionadas à linguagem e acredita-se que, com o desenvolvimento do corpo caloso, ocorreria um efeito inibitório das regiões temporoparietais do hemisfério esquerdo sobre áreas homólogas do direito [103]. Além disso, a importância dessa região no desenvolvimento da leitura pode ser confirmada através da análise de pacientes com dislexia do desenvolvimento submetidos a estudos anatomopatológicos, onde pode ser observada a presença de distúrbios da migração neuronal no córtex temporal superior esquerdo [69, 71]. Há também uma menor ativação desta região em testes de decodificação fonológica durante a realização de exames de neuroimagem, comprovando o papel do giro temporal superior na interpretação e correlação dos sons com os grafemas [104, 105]. A ativação das áreas do giro frontal inferior durante a decodificação fonológica aumenta com o desenvolvimento da criança e da melhora da capacidade da leitura [106]. Conforme já citado anteriormente, vários estudos têm demonstrado que na verdade existe uma segmentação funcional em relação à leitura no giro frontal inferior que apresenta, em sua porção mais dorsal, uma maior especialização para auxiliar a decodificação fonológica (associadamente a regiões temporo-parietais), e uma área mais anterior, que participa da interpretação do significado da palavra [99, 100]. Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 64 VIII. B. Processamento ortográfico VIII. C. Processamento semântico O giro fusiforme esquerdo, que corresponde a “área visual da palavra” é mais ativado à medida que ocorre o desenvolvimento da leitura na criança, ocorrendo predominantemente quando diante da visualização de palavras de uso rotineiro [107]. As crianças na fase pré-alfabética costumam apresentar ativação do giro fusiforme bilateralmente durante o reconhecimento de uma palavra, quer apresentada por estímulos visuais ou auditivos [102]. À medida que vão atingindo a fase alfabética, eles passam a recrutar cada vez menos os neurônios do giro fusiforme direito e intensificam a ativação do lado contralateral. No adulto, além de ocorrer a ativação apenas do giro frontal esquerdo durante a apresentação de estímulos visuais, não se observam alterações funcionais por estímulos auditivos [102]. Esta lateralização e participação mais imediata do giro fusiforme esquerdo, observada durante o desenvolvimento literário da criança, está diretamente relacionada a uma maior capacidade de leitura que ocorre com o passar dos anos. A capacidade de processamento semântico durante a leitura também se aperfeiçoa durante o desenvolvimento, sendo observado de modo gradativo uma maior ativação das regiões posteriores do giro temporal médio [108, 109]. Com o passar dos primeiros anos de treinamento da leitura, observa-se também durante testes de interpretação semântica uma gradativa ativação das áreas do giro frontal inferior. Conforme já comentamos anteriormente, durante a interpretação do significado da leitura, observa-se no adolescente e no adulto uma maior ativação de áreas mais anteriores do giro frontal, lembrando que as porções mais posteriores apresentam maior especialização para auxiliar a decodificação fonológica. Esta menor ativação das áreas mais anteriores em crianças, provavelmente, está relacionada a uma imaturidade do giro frontal inferior das crianças [110, 111] ou a uma maior influência do processamento semântico na rapidez da decodificação Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 65 fonológica e reconhecimento ortográfico da palavra [108], que não é tão necessária no leitor mais experiente. O fato de o giro frontal inferior ser ativado apenas posteriormente durante o desenvolvimento evidencia o seu papel na melhor capacidade de leitura. Salientamos ainda o fato de que a menor modulação do córtex pré-frontal em crianças determina um insuficiente controle cognitivo e maior susceptibilidade à interferência de estímulos irrelevantes, prejudicando muito a compreensão do texto [111]. Com base no estudo de Suzuki e colaboradores, que avalia a presença de um quadro de hiperlexia adquirida em adulto com lesão de áreas frontais do hemisfério esquerdo, e nos estudos acima citados [99, 100, 112], podemos inferir que os pacientes com quadro de hiperlexia, que apresentam capacidade de ler, porém sem uma compreensão adequada, apresentam uma ativação das porções mais posteriores de áreas do córtex pré-frontal esquerdo e não das áreas mais anteriores, que teriam o papel da interpretação semântica. Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 68 Sabemos que obviamente não existe um único programa de ensino que possa ser considerado como o melhor para todas as crianças. O avanço das pesquisas neurocientíficas sobre os circuitos envolvidos na aprendizagem e os mecanismos de aquisição do conhecimento podem ser relevantes para a educação. Assim, deveriam ser tomados como referência os estudos sobre a neurobiologia da aprendizagem, para se repensar a prática educacional. Por exemplo, o melhor conhecimento dos circuitos neurais para a expressão e entendimento verbal, aquisição da habilidade da leitura e manutenção dos mecanismos atencionais e estratégia de aprendizagem são importantes para estabelecer processos mais eficientes de alfabetização. Várias iniciativas governamentais demonstram essa preocupação com as questões de aprendizagem, suas dificuldades e prevenções. Como exemplo, o Congresso norte-americano solicitou que o National Institute of Child Health and Human Development (NICHD) com o Ministério da Educação convocasse um painel Nacional para estabelecer o estado-da-arte do conhecimento científico sobre o processo de aprendizagem da leitura [115] http://www.nichd.nih.gov/publications/nrp/smallbook.htm); foram avaliados centenas de estudos científicos e a conclusão foi que “as evidências científicas indicavam que os programas de leitura que se baseavam de modo mais intenso no ensino da consciência fonológica resultavam em maior grau de sucesso para o aprendizado inicial da leitura” [115]. Na Europa, os Estados da Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento, OECD (Organization for Economic Cooperation and Development) desenvolveu um Projeto de investigação - PISA [116]. O ponto difícil do teste era a medida das competências de leitura, para os quais foram utilizados testes que medem os diferentes “graus de competência”, que vão desde a simples compreensão (grau de competência I) até a interpretação e formulação de problemas (grau de competência V). Os resultados do Estudo PISA foram apresentados pela OECD [117], onde os estudantes da Finlândia obtiveram os melhores escores [116]. Em decorrência de resultados discrepantes entre os vários países e os baixos escores obtidos por parcela significativa dos estudantes, o Centro para a Investigação da Educação e Inovação da OECD (Centre for Educational Research and Innovation - CERI) pôs em curso, em 23 de novembro de 1999, o projeto Ciências da aprendizagem e investigação do cérebro: implicações potenciais para as políticas e práticas da educação [118-120]. O objetivo deste projeto é o de Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 69 fundamentar e definir os requisitos para uma colaboração entre a ciência da educação e a investigação do cérebro [116]. Iniciativa semelhante teve a nossa Câmara dos Deputados encomendando um relatório ao painel internacional de especialistas em alfabetização infantil [121]. A utilização dos avanços da neurociência para políticas educacionais constitui um excelente exemplo da ciência translacional sendo utilizada para o benefício público [121, 122]. Nas palavras de Manfred Spitzer [116], referindo-se ao objetivo da OECD “em fundamentar e definir os requisitos para uma colaboração entre a ciência da educação e a investigação do cérebro” e “em promover a aproximação entre os políticos de educação e os investigadores do cérebro, bem como apresentar fatos de investigação, que possamos (e que devíamos e devemos) transpor para as práticas, se quisermos tornar o sistema educativo mais eficiente”. Os estudos de desenvolvimento cerebral e do funcionamento cerebral de acordo com os diferentes testes de leitura e de outros estudos referentes à plasticidade cerebral reforçam a importância da estimulação da capacidade de decodificação fonológica, no início da alfabetização, independente do método escolhido para o ensino da leitura. Eventual atraso na estimulação desta habilidade poderia implicar a perda do melhor momento para o desenvolvimento do reconhecimento da relação grafema- fonema, tão importante para a leitura no futuro de palavras desconhecidas. A perda do momento inicial mais propício para o desenvolvimento da capacidade de leitura e escrita determina que se procure, após esta faixa etária, resgatar este aprendizado com o desenvolvimento de certas habilidades dentro de um processo de aprendizado e reabilitação. Isto determina outro planejamento da estratégia de ensino estimulando a capacidade associativa e as habilidades de percepção e execução. De qualquer forma, deve-se estimular o aprendizado fônico, visto que as pesquisas quantitativas evidenciam que é benéfico e que há correspondência com o processo neurobiológico. Não podemos deixar de salientar a extrema importância das fases iniciais do desenvolvimento, desde o período gestacional, e de que o ensinamento da leitura só ocorrerá de modo totalmente satisfatório, também independentemente do método de ensino, quando for baseado em uma intensa motivação do aprendiz, não só no ambiente escolar, mas também no domiciliar. Agradecimentos pela leitura e sugestões: Ana Maria Alvarez, Victor Haase e Mirna Wetters Portuguez. Academia Brasileira de Ciências – Aprendizagem Infantil 70 PISA, Assessing Scientific, Reading and Mathematical Literacy. 2009. Foorman, B.R., et al., The Role of Instruction in Learning to Read: Preventing Reading Failure in At-risk Children. Journal of Educational Psychology, 1998. 90. Byrne, B. and R. 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