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Historia dos Complexos, Notas de estudo de Matemática

Este é um trabalho elaborado para o curso História da Matemática, estudando, strictu-sensu, a história dos números complexos, desde Hierão de Alexandria até os tempos modernos, passando por Cradano e a solução da cúbica e os mais ilustres matemáticos italianos renascentistas.

Tipologia: Notas de estudo

2010

Compartilhado em 30/11/2010

Saloete
Saloete 🇧🇷

4.6

(116)

357 documentos

Pré-visualização parcial do texto

Baixe Historia dos Complexos e outras Notas de estudo em PDF para Matemática, somente na Docsity! Uma Breve História de i Amanda Cristina Estevam Daiane Alice Henrique Jean Cerqueira Berni 25 de setembro de 2010 Sumário 1 Tópicos da História dos Números Complexos 2 1.1 Esbarrões nos Números Complexos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2 1.2 A Cúbica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 1.3 Como números complexos podem representar soluções reais . . . . . . . . . . . . . 11 1.4 Gauß e o Teorema Fundamental da Álgebra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 1.5 Importância do Teorema Fundamental da Álgebra para os Números Complexos . . 16 1.6 Conclusões . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 1 tomar a raiz quadrada de 81− 144 requerida pela fórmula, ele toma a raiz quadrada de 144− 81, i.e., ele substitui √ −1 por 1, e falha em observar que o problema enunciado é imposśıvel. Se este engano é devido a Hierão ou à ignorância de algum copista, isto não pode ser determinado.( cf.[1])” Isto é, usando a = 28, b = 4 e c, a inclinação, c = 15, em sua fórmula para h, Hierão escreveu: h = √ (15)2 − 2 ( 28 − 4 2 )2 = √ 225 − 2(12)2 = √ 225 − 144 − 144 = √ 81 − 144 O próximo e brilhante passo seguinte teria sido, é claro, escrever: h = √ −63 mas Stereometria escreve isto como h = √ 63, e assim Hierão perdeu o privilégio de ser o primeiro estudiodo a ter derivado a raiz quadrada de um número negativo na análise matemática de um problema f́ısico. Se Hierão realmente encobriu sua aritmética, então ele pagou profundamente por isso com sua fama. Isto seria mil anos antes de um matemático sequer se importar com tal coisa - e então, simplesmente descartar a raiz quadrada de um número negativo como sendo desprovida de sentido - e ainda quinhentos anos mais cedo de a raiz quadrada de um número negativo ser levada a sério (mas ainda considerada um mistério). Enquanto Hierão quase certamente estava ciente do aparecimento da raiz quadrada de um número negativo no problema do frustum, seu colega alexandrino de quatro séculos depois, Di- ofanto, parece ter perdido completamente um evento similar quando teve a chance. Diofanto é hoje famoso por ter interpretado o mesmo papel para a álgebra que Euclides interpretou para a geometria. Em seu livro VI, por exemplo, podemos encontrar o problema 22: “Dado um triângulo retângulo de área 7 e peŕımetro 12, encontre seus lados.” Eis como Diofanto derivou a equação quadrática 172x = 336x2 + 24 do enunciado do problema. Com os lados do triângulo retângulo denotados por P1 e P2, o problema apresentado por Diofanto é equivalente a resolver o sistema de equações: { P1P2 = 14 P1 + P2 + √ P 21 + P 2 2 = 12 Estas equações podem ser resolvidas rotineiramente por meio de manipulação algébrica, mas a ideia inteligente de Diofanto foi imediatamente reduzir o número de variáveis de duas para uma escrevendo: P1 = 1 x e P2 = 14x Então a primeira equação produz a identidade 14 = 14, e a segunda: 1 x + 14x + √ 1 x2 + 196x2 = 12 4 que pode ser facilmente colocada na forma: 172x = 336x2 + 24 (1.1) Mas por que Diofanto não escreveu logo: 336x2 − 172x + 24 = 0? Diofanto escreveu a equação na forma (1.1) porque nela aparecem todos os coeficientes como números positivos, i.e., os antigos rejeitavam os números negativos como sendo sem significado porque eles não poderiam de modo algum interpretar o papel de uma grandeza f́ısica (nenhum número pode ser menor que o nada). De fato, em todo o livro Arithmetica (problema 2 do livro V) ele escreveu, da equação 4x + 20 = 4 que esta era absurda, porque levava à solução imposśıvel x = −4. De acordo com esta posição, Diofanto usava apenas a raiz quadrada positiva quando resolvia uma equação quadrática. No final do século XVI encontramos matemáticos se referindo a raizes quadradas de números negativos como sendo fict́ıcias, absurdas ou falsas. E assim, é claro, a raiz quadrada de um número negativo estaria simplesmente além dos limites. É ao matemático francês René Descartes, escrevendo catorze séculos depois em seu La Geometrie de 1637, que devemos o termo imaginário para tais números. Antes de Descartes ter introduzido este termo, as raizes quadradas de números negativos eram chamadas de “sofistas”ou “sutis”.É em tal coisa que de fato a equação quadrática de Diofanto resulta para o triângulo do problema: x = 43 ± √ −167 168 Mas não foi isso que Diofanto escreveu. O que ele escreveu foi simplesmente que a equação quadrática era imposśıvel. Mas ele disse isso porque a equação não admitia solução racional porque “meio coeficiente de x multiplicado por si mesmo, menos o produto do coeficiente de x2 e as unidades”deve constituir um quadrado para uma solução racional existir, enquanto ( 172 2 )2 − (336)(24) = −668 certamente não é quadrado de nenhum número. Quanto à raiz quadrada deste número negativo, Diofanto não tinha nada a dizer. Seiscentos anos depois (c. 850 E.C.), o matemático hindu (indiano) Mahaviracarya escreveu sobre este assunto, mas apenas para declarar o que Hierão e Diofanto fizeram anos antes: “O quadrado de um número positivo bem como de um número negativo é positivo; e a raiz quadrada de quantidades que são quadrados são positivas ou negativas, respectivamente. Como na natureza das coisas uma quantidade negativa não é um quadrado, ela não pode admitir raiz quadrada.” Neste trabalho pretendemos discorrer um pouco sobre o surgimento e o desenvolvimento dos números complexos, como veremos nas próximas seções. 1.2 A Cúbica No final de 1494, o livro Summa de Arithmetica, Geometria, Proportioni et Proportionalita, re- sumindo todo o conhecimento da época em aritmética e álgebra (incluindo equações quadráticas), 5 e trigonometria, o frei franciscano Luca Pacioli (c. 1445 - 1514) fez uma asserção ousada. Ele declarou que a solução da cúbica era “tão imposśıvel no presente estado da ciência quanto a quadratura do ćırculo”. O problema posterior esteve entre os matemáticos desde os tempos do matemático grego Hippocrates (c. 440 A.E.C.). A quadratura do ćırculo se provava ser dif́ıcil , e quando Pacioli escreveu isso este problema ainda estava em aberto. Ele claramente estava apenas querendo dizer isso para dar uma noção da dificuldade da resolução da cúbica, já que em 1882 provou-se a quadratura do ćırculo ser imposśıvel. Pacioli estava errado na sua afirmação já que, dez anos depois, na Universidade de Bolonha, o matemático Scipione del ferro (1465-1526) conseguiu, de fato, descobrir como resolver a tão- chamada cúbica reduzida, um caso especial da cúbica geral, na qual o termo de segundo grau não aparece. devido ao papel central desempenhado pela resolução da cúbica reduzida nos primeiros progressos na direção da compreensão da raiz quadrada de menos um, vale a pena expender algum esforço para compreender o que Del Ferro fez. A cúbica geral contém todas as potências da indeterminada, i.e., x3 + a2x 2 + a1x + a0 = 0 onde podemos tomar o coeficiente ĺıder igual a 1 desde que estamos trabalhando sobre um corpo (a saber, R), onde o coeficiente de x3, a3 é inverśıvel (caso contrário, a equação não seria de fato uma cúbica, e sim uma equação quadrática). A cúbica resolvida por del Ferro, por outro lado, tem a forma geral: x3 + px = q onde p e q são números não-negativos. Assim como Diofanto, os matemáticos do século XVI, inclusive Del Ferro, evitavam o aparecimento de coeficientes negativos em suas equações (cf. [4]). Resolver esta equação pode parecer recair num caso muito especial de cúbica, mas com a desoberta de um último truque engenhoso, a solução de del Ferro é geral. No que del Ferro de algum modo “tropeçou”é que as soluções da cúbica reduzida podem ser expressas como uma soma de dois termos, i.e., podemos exprimir a variável x como x = u+ v. Substituindo isto na cúbica reduzida, expandindo e reagrupando os termos, resultamos em: u3 + v3 + (3uv + p)(u + v) = q Esta única equação, embora pareça um tanto complicada, pode ser escrita como duas equações individualmente menos complicadas: 3uv + p = 0 que então diz: u3 + v3 = q resolvendo a primeira equação para v em termos de p e de u, e substituindo na segunda equação, obtemos: u6 − qu3 − p 3 27 = 0 6 - 1577). Fontana atraiu a atenção de Fior porque recentemente anunciara que podia resolver cúbicas da forma geral: x3 + px2 = q Fior pensou que Fontana estivesse blefando, então viu em Fontana a sua v́ıtima perfeita para o concurso público. Tartaglia Fontana, que é mais conhecido hoje simplesmente como “Tartaglia”. Tartaglia nasceu muito pobre. Tinha sete anos quando uma tropa francesa, ao saquear Brescia, irrompeu em um templo, onde grande parte da população se refugiara. Um soldado deu-lhe um golpe com um sabre no meio do rosto. Depois disso, o menino gaguejou anos a fio. Por isso os amigos o apelidaram de “Tartaglia”(tartamudo ou gago). Fontana suspeitou que Fior tivesse recebido o segredo da cúbica reduzida de del Ferro. Temendo que fosse desafiado a resolver tais cúbicas, e não sabendo como resolvê-las, Tartaglia se engajou num esforço imenso em tentar resolvê-la; bem antes do dia do concurso ele foi bem sucedido em redescobrir a fórmula de del Ferro para a solução de x3 + px = q por si só. Este é um exemplo interessante de como, uma vez sabendo-se que o problema tem solução, outros rapidamente a encontram. Enfim, a descoberta de Tartaglia combinada com sua habilidade de realmente saber resolver x3 + px2 = q (que ele não estava blefando), concedeu-lhe a vitória sobre Fior. Ocorreu assim: cada um propôs trinta problemas para o outro, e enquanto Fior não conseguiu resolver nenhum de Tartaglia, Tartaglia resolveu todos os de Fior. Tudo isto é bizarro, mas a história só melhora. Como del Ferro, Tartaglia manteve seu recém adquirido conhecimento para si, por razões já mencionadas e por que Tartaglia planejava publicar as soluções dos dois tipos de cúbicas num livro que ele pensou que um dia ia escrever. Quando a not́ıcia de sua vitória sobre Fior se espalhou, no entanto, ela rapidamente chegou aos ouvidos de Girolamo Cardano (1501-1576), outrora conhecido somente como Cardano. Diferente de Fior, Cardano era um intelecto de destaque que, entre seus muitos atributos, ocupava o de ser um exce- lente matemático. A curiosidade intelectual de Cardano por conhecer o segredo de Tartaglia o fez 9 implorar a ele que contasse como resolvia a cúbica.. Depois de recusar-se inicialmente, Tartaglia se rendeu e contou a regra a Cardano, mas não a sua dedução, e mesmo assim extraindo dele um voto de segredo. De acordo com Tartaglia, Cardano jurou: “Eu juro a você, pelos Santos Evangelhos de Deus, e como homem leal e honrado, não apenas nunca publicar as suas descobertas se você mas ensinar, mas também lhe prometo, e empenho mi- nha fé como verdadeiro cristão, escrevê-las em código, de modo que após a minha morte ninguém será capaz de entendê-las”[5] Cardano não foi um santo mas com certeza também não foi um patife. Ele quase certamente tinha a intenção de manter o seu voto de silêncio, mas quando começou a ouvir que Tartaglia e del Ferro não foram os primeiros a resolver a cúbica reduzida, a situação mudou. Uma vez que ele tinha realmente visto os papeis de del Ferro, Cardano não se sentiu mais preso ao voto que fizera. Ele publicou a solução que redescobriu sozinho no seu livro Ars Magna. Cardano não foi um ladrão intelectual, e de fato mostrou como estender a solução da cúbica reduzida a todas as cúbicas. A ideia era a seguinte: Cardano começou com a fóma geral da cúbica: x3 + a2x 2 + a1x + a0 = 0 e mudou a variável x = y − 1 3 a2 Substituindo isto na cúbica geral, expandindo e reagrupando termos, ele obteve: y3 + ( a1 − 1 3 a22 ) y = − 2 27 a32 + 1 3 a1a2 − a0 isto é, ele obteve a cúbica reduzida y3 + py = q com: p = a1 − 1 3 a22 q = − 2 27 a32 + 1 3 a1a2 − a0 A cúbica reduzida agora poderia ser resolvida com a fórmula de Cardano. Por exemplo, se começarmos com: x3 − 15x2 + 81x − 175 = 0 fazendo a mudança de variável x = y + 5, obtemos: p = 81 − 1 3 (15)2 = 6 q = − 2 27 (−15)3 + 1 3 (81)(−15) − (−175) = 20 e então y3 + 6y = 20. 10 Então parece que o problema da cúbica finalmente poderia descansar, e tudo estava bem...lembremo- nos da solução de x3 = px + q x = 3 √ q 2 + √ q2 4 − p 3 27 − 3 √ −q 2 − √ q2 4 − p 3 27 Existe um dragão escondido nesta versão da fórmula de Cardano!! Se q2 4 − p 3 27 < 0 então a fórmula envolve a raiz quadrada de um número negativo, e o grande enigma não era o número imaginário per se, mas algo completamente diferente. O fato de Cardano não ter medo de números imaginários é muito evidente em seu famoso problema no Ars Magna, o de dividir 10 em duas partes cujo produto fosse 40. Ele chama este problem de “manifestamente imposśıvel”porque leva à equação quadrática x2 − 10x + 40 = 0 onde x e 10− x são as duas partes, uma equação com raizes complexas - que Cardano chamou de sof́ısticas porque não poderiam ter significado f́ısico - 5 + √ −15 e 5− √ −15. A soma destes dois números obviamente cancela as partes imaginárias, mas e quanto ao produto? Cardano, de modo ousado escreveu: “no entanto, vamos operar”e formalmente calculou: (5 + √ −15)(5 − √ −15) = 5.5 − 5 √ −15 + 5 √ −15 − √ −15 √ −15 = 25 + 15 = 40 Como Cardano escreveu sobre seu cálculo, “colocando de lado as torturas mentais envolvidas”ao fazer isto, i.e., manipulando √ −15 como um número qualquer, tudo funciona. Como vários de seus “quase”contemporâneos notaram, Cardano tinha levantado um bom ar- gumento: raizes quadradas de números negaivos aparecem quando o problema não tem solução. Por exemplo, no começo do século XVII, René Descartes disse que quando se tentava encontrar a intersecção de uma reta com uma circunferêmcia, se chegava a uma equação quadrática, e que a fórmula de sua resolução levava a raizes quadradas de números negativos quando a reta, de fato, não intersectava a circunferência. Então, para a maioria das pessoas o sentimento era que o aparecimento de soluções “imposśıveis”ou “imaginárias”era simplesmente sinal de que o problema em pauta não admitia solução. Mas o que realmente deixou Cardano perplexo foi o caso em que tais raizes quadradas de números negativos ocorriam em sua fórmula para equações cúbicas que tinham somente ráızes reais. 1.3 Como números complexos podem representar soluções reais Considere o problema relatado pelo disćıpulo de Cardano, o engenheiro-arquiteto Rafael Bom- belli (1526-1572). A fama de Bombelli entre seus contemporâneos era a de um homem prático 11 os números são ficções úteis. Jean-Robert Argand No século XIX as coisas começaram a ser postas em ordem. Jean Robert Argand, um vendedor de livros de Paris foi o primeiro a sugerir, num livreto publicado em 1806 que podeŕıamos dispensar alguns mistérios de tais números “fict́ıcios”, “montruosos”e “imaginários”por representá-los geo- metricamente em um plano: o ponto com coordenadas (a, b) corresponderia ao número complexo a + ib, como na figura a seguir: A proposta de Argand foi em geral ignorada até que Gauß propôs a mesma ideia em 1831 e mostrou que poderia ser algo matematicamente útil. Também foi Gauß que propôs o termo “números complexos”. Dois anos depois, William Rowan Hamilton mostrou que se poderia começar com um plano, definir uma soma e um produto de pares ordenados de um modo conve- niente e terminar com algo idêntico aos números complexos. A abordagem de hamilton evitava completamente o misterioso i: ele era apenas o ponto (0, 1). Mas por que os matemáticos se importaram em procurar um alicerce firme para os números complexos? Porque eles eram tão úteis que mal se podia evitar lidar com eles.Euler e Gauß mos- traram que se pode usá-los para resolver problemas em álgebra e em teoria dos números. Hamilton construiupartes significantes da f́ısica usando números complexos. Este “cálculo complexo”se tor- nou extremamente poderoso, em parte porque se provou ser mais fácil que o cálculo real. nas mãos de Riemann, Weierstraß e de outros, se tornou uma ferramenta matemática poderosa que servia tanto à matemática pura quanto à aplicada. 1.4 Gauß e o Teorema Fundamental da Álgebra Pedro Rothe (Petrus Roth), em seu livro Arithmetica Philosophica, (publicado em 1608), es- creveu que uma equação polinomial de grau n, n ∈ Z+ (com coeficientes reais) pode ter n soluções. 14 Albert Girard, em seu livro “L’invention nouvelle em l’Algebre” (publicado em 1629), afirmou que uma equação de grau n tem n soluções, mas não menciona que estas soluções devam ser números reais. Mais ainda, ele agrega que sua asserção é válida “salvo que a equação seja incompleta”, com o que quer dizer que nenhum dos coeficientes do polinômio pode ser igual a zero. No entanto, quando explica em detalhe ao que se refere, se faz evidente que ele pensa que a asserção sempre é verdadeira; em particular, mostra que a equação: x4 = 4x − 3 apesar de ser incompleta, tem as seguintes quatro soluções (a raiz 1 tem multiplicidade 2) 1, 1, −1 + i √ 2 e − 1 − i √ 2 Gottfried Wihelm Leibniz, em 1702, e mais tarde Nikolaus Bernoulli, conjecturaram o contrário. Como mencionar-se-á de novo mais adiante, se segue do teorema fundamental do álgebra que todo polinômio com coeficientes reais e de grau maior que zero pode ser escrito como um produto de polinômios com coeficientes reais com graus 1 ou 2. De qualquer modo, em 1702 Leibniz disse que nenhum polinômio de tipo x4 + a4 (com a ∈ R∗) se pode escrever de tal modo. Depois, Nikolaus Bernoulli fez a mesma afirmação concernente ao polinômio x4 − 4x3 + 2x2 + 4x + 4, mas ele recebeu uma carta de Euler em 1742, no que lhe dizia que seu polinomio passava a ser igual a: (x2 − (2 + α)x + 1 + √ 7 + α)(x2 − (2 − α)x + 1 + √ 7 − α), onde α é a raiz quadrada de 4 + 2 √ 7 enquanto: x4 + a4 = (x2 + a √ 2x + a2)(x2 − a √ 2x + a2) O Teorema Fundamental da Álgebra é conhecido como a proposição de que todo o po- linômio em C[X]∗ possui no mı́nimo um zero complexo. Tal resultado foi demonstrado (embora ainda com algumas falhas, pelos modernos padrões de rigor, somente corrigidas na totalidade por A. Ostrowski em 1920) por Karl Friedrich Gauß em 1799, num trabalho que constitui a sua tese de doutoramento, com o t́ıtulo bem descritivo (tradução livre) “Nova demonstração do teorema de que toda a função racional inteira de uma variável pode ser decomposta em factores reais do primeiro ou segundo graus”. Gauß voltou posteriormente a fazer mais três demonstrações deste teorema, a última delas em 1849. O t́ıtulo do trabalho sugere, por um lado, que existiriam ten- tativas de demonstração anteriores e, por outro, que a questão essencial era a da decomposição em fatores reais (isto é, com coeficientes reais) lineares ou quadráticos (quer dizer, de uma das formas ax + b ou ax2 + bx + c ), questão que é, aliás, equivalente à da existência de ráızes em C. Naquela época, a Álgebra ainda era entendida como essencialmente a teoria dos polinômios com coeficientes reais ou complexos ou, se quisermos, como a teoria das equações algébricas, sendo o teorema fundamental da álgebra considerado como o teorema fundamental desta teoria. Mas, ao contrário da ênfase que tinha sido posta no passado, não era tanto a obtenção de soluções de equações da forma P (x) = 0 como a questão da existência de soluções (em C ) que ocupava o centro de gravitação do interesse de Gauß pois, mesmo para binômios da forma xn − a , com n ≥ 5, a existência de zeros era considerada uma questão longe de trivial. 15 1.5 Importância do Teorema Fundamental da Álgebra para os Números Complexos A maior importância do teorema fundamental da álgebra para a história dos números com- plexos (tanto como para a das equações algébricas) é simplesmente o fato de ter sido posśıvel demonstrá-lo, o que abriu o caminho para o reconhecimento e desenvolvimento dos números com- plexos e da Análise Complexa em toda a sua plenitude. Mencionemos alguns antecedentes históricos do teorema, começando pelos êxitos dos algebris- tas italianos do século XVII na resolução das equações quadráticas, cúbicas e quárticas gerais, conseguindo exprimir sempre as respectivas ráızes por meio de radicais, em função dos coeficien- tes. Em algumas dessas resoluções (por exemplo, no caso da cúbica, como explicamos na seção 1.2), os números “imaginários”fizeram uma fugaz e incontornável aparição 4,como que anunciando para a posteridade que não podiam deixar de ser considerados em certas situações. A qúıntica geral resistiu a todas as tentativas de resolução por meio de radicais, mas por boa razão, pois tais expressões para as ráızes são, em geral, imposśıveis de obter, como veio a demonstrar Nield Henrik Abel em 1826 (elaborando sobre os extensos trabalhos de Lagrange). Todavia, até à altura em que Gauß se debruçou sobre o assunto, quase todos os matemáticos acreditavam na existência de ráızes em alguma “terra de ninguém”(alguma extensão do corpo C dos números complexos, como diŕıamos hoje), e desenvolviam métodos imaginativos para mostrar que tais soluções eram, na realidade, números complexos, mas não existia uma prova geral de que fosse sempre assim. Peter Roth já afirmara, em 1608, que as equações de n−ésimo grau têm, quando muito, n ráızes. Albert Girard, na sua “L’invention en algèbre, em 1629, foi o primeiro a afirmar que há sempre n soluções (possivelmente repetidas), mas não o demonstrou. Descartes, na 3a parte de La Géométrie, em 1637, descreve tudo o que se conhecia na época sobre equações, observa que um polinômio que se anula em α é diviśıvel por x− α, e descreve a famosa“regra dos sinais”para calcular o número máximo de ráızes reais positivas e negativas. Leibniz, na Acta Eruditorum, de 1702, considera a questão de saber se é sempre posśıvel fatorizar um polinômio em fatores reais lineares ou quadráticos, mas cede pela negativa, face ao “contra-exemplo”: x4 + a4 = (x2 − a2i)(x2 + a2i) = (x + a √ i)(x − a √ i)(x + a √ −i)(x − a √ −i) O produto de quaisquer dois fatores lineares no membro à direita nunca é um polinômio quadrático real, mas não ocorreu a Leibniz que √ i e √ −ipudessem ser da forma a + bi ; de fato,√ i = √ 2 2 (1 + i) e √ −i = √ 2 2 (1− i) , donde resulta que o produto do 1o e 3o factores, bem como o produto do 2o e do 4o, são quadráticos reais, obtendo-se a fatorização: x4 + a4 = (x2 + a √ 2x + a2)(x2 − a √ 2x + a2) Também lhe escapou que isto resultaria muito facilmente da identidade x4 + a4 = (x2 + a2)2 − 2a2x2 4É claro que a equação quadrática ax2 + bx + c = 0 também tem soluções complexas (quando o descriminante é negativo), mas os matemáticos podiam dizer (e diziam!) que nesse caso não havia soluções. Até a época de Descartes, pelo menos, também diziam que as soluções negativas não eram soluções “reais”! 16
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