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nc - cap31, Notas de estudo de Física

fisica matematica para fisicos parte 31

Tipologia: Notas de estudo

2010

Compartilhado em 20/09/2010

marilton-rafael-1
marilton-rafael-1 🇧🇷

4.5

(6)

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Baixe nc - cap31 e outras Notas de estudo em PDF para Física, somente na Docsity! Caṕıtulo 31 Introdução às Distribuições e Transformadas de Fourier Conteúdo 31.1 Funções de Schwartz e Funções de Teste . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1456 31.2 Transformadas de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1465 31.2.1 Transformadas de Fourier no Espaço de Schwartz . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1467 31.2.1.1 A Transformada de Fourier de Funções Gaussianas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1470 31.2.1.2 Invertibilidade da Transformada de Fourier no Epaço de Schwartz . . . . . . . . . . . . 1473 31.2.1.3 Transformadas de Fourier, Produtos de Convolução e Identidade de Plancherel . . . . . 1475 31.2.1.4 A Transformada de Fourier em L2(Rn, dx) e suas Propriedades Espectrais . . . . . . . 1477 31.2.2 Transformadas de Fourier. Tópicos Suplementares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1479 31.2.2.1 A Fórmula de Soma de Poisson . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1479 31.2.2.2 Transformadas de Fourier e Médias Angulares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1483 31.3 Distribuições e Distribuições Temperadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1487 31.3.1 Primeiros Exemplos de Distribuições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1489 31.3.2 Outros Exemplos de Distribuições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1494 31.3.2.1 A Distribuição Valor Principal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1494 31.3.2.2 Distribuições do Tipo Parte Finita de Hadamard . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1496 31.3.3 Algumas Relações Úteis Envolvendo Distribuições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1499 31.3.4 Derivadas de Distribuições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1501 31.3.4.1 Alguns Exemplos de Derivadas de Distribuições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1502 31.3.4.2 Cálculo da Derivada de Algumas Distribuições de Interesse . . . . . . . . . . . . . . . . 1503 31.3.5 Alguns Resultados Estruturais sobre Distribuições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1505 31.3.6 Transformadas de Fourier de Distribuições Temperadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1506 31.3.6.1 Cálculo de Transformadas de Fourier de Algumas Distribuições Temperadas . . . . . . 1507 31.3.7 Produtos de Distribuições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1509 31.3.7.1 Produto de Convolução de Distribuições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1514 31.4 Equações Diferenciais Distribucionais, Soluções Fundamentais e Funções de Green . . . 1515 31.4.1 Soluções Fundamentais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1518 31.4.1.1 Soluções Fundamentais como Funções Generalizadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1519 31.4.1.2 O Caso de Operadores Lineares a Coeficientes Constantes . . . . . . . . . . . . . . . . . 1521 31.4.1.3 Alguns Exemplos Fisicamente Relevantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1524 31.5 Exerćıcios Adicionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1527 APÊNDICES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1531 31.A Prova da Proposição 31.14 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1531 31.B Prova de (31.17) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1534 C olocada no devido contexto a noção de distribuição é tão natural que parece ter sido descoberta, não inventada.Em abstrato, uma distribuição é um funcional linear cont́ınuo em um certo espaço topológico que possua umaestrutura diferenciável, mas por trás dessa abstração encontram-se idéias muito simples, originárias do desejo(ou necessidade) de estender a noção de função, ou melhor, a noção intuitiva de densidade, de modo a incluir, por exemplo, densidades concentradas em pontos (e outros conjuntos de medida nula), permitindo ainda o emprego de pelo menos parte da estrutura do cálculo diferencial. A noção de distribuição, foi introduzida em 1935 por Sobolev1 sob o nome de “função generalizada” e foi estudada sistematicamente por Schwartz2 a partir de 1948. Essa noção desempenha um papel central em toda discussão moderna 1Sergei Lvovich Sobolev (1908–1989). 2Laurent-Möıse Schwartz (1915–2002). 1455 JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1456/1730 sobre a teoria das equações diferenciais (lineares, ao menos). As idéias f́ısicas e matemáticas subjacentes à teoria das distribuições originam-se dos trabalhos de Green3, Heaviside4, Dirac5, Weil6 e possivelmente muitos outros. Como a teoria das distribuições é intimamente ligada à teoria das transformadas de Fourier, dedicamos a Seção 31.2, página 1465, ao seu estudo. Introduziremos a noção de distribuição em Rn após alguma preparação breve. Em seguida trataremos de alguns exemplos. Após isso, discutiremos a noção de derivada de uma distribuições para então discutirmos equações diferenciais distribucionais. Isso nos remeterá ao método da função de Green. Para uma introdução pedagógica e rica em exemplos à Teoria das Distribuições, vide [24]. Para um tratamento de ńıvel intermediário, vide [152]. Uma introdução acesśıvel (direcionada a aplicações na Teoria Quântica de Campos) pode ser encontrada nos primeiros caṕıtulos de [184]. Para um texto clássico, vide [171]. Para textos mais avançados, vide [64] ou [95]. Omitiremos na presente versão o tratamento da noção de produto de distribuições, de conjuntos de frente de onda e outros itens próprios a uma discussão mais avançada. Também com o intuito de manter a discussão tão simples quanto posśıvel, omitiremos quase toda a discussão topológica sobre a natureza das distribuições no contexto da teoria dos espaços localmente convexos. Para isso remetemos o estudante interessado aos textos supracitados. 31.1 Funções de Schwartz e Funções de Teste • Funções infinitamente diferenciáveis em Rn Diz-se que uma função7 f : Rn → C, é infinitamente diferenciável em um domı́nio aberto Ω ⊂ Rn se for cont́ınua em Ω e se todas suas as suas derivadas parciais de ordem finita existirem e forem cont́ınuas em Ω, ou seja, se existirem e forem cont́ınuas para todo (x1, . . . , xn) ∈ Ω as funções ∂ |α|f ∂x α1 1 ···∂x αn n (x1, . . . , xn) para todos α1, . . . , αn ∈ N0, sendo |α| = α1 + · · · + αn. O estudante deve ser alertado a não confundir a noção de diferenciabilidade infinita com a de analiticidade. Por exemplo, a função f : R → R definida por f(x) :=    0 , se x = 0 , e− 1 x2 , se x 6= 0 , é infinitamente diferenciável, enquanto função da variável real x, mas não é anaĺıtica em x = 0. A função de uma variável complexa z = x+ iy definida por g(z) = e− 1 z2 possui uma singularidade essencial em z = 0. Para z = x ∈ R, x 6= 0, g é idêntica a f , mas para z = iy, y ∈ R, y 6= 0, tem-se g(iy) = e+ 1 y2 que diverge para y → 0. O conjunto de de todas as funções infinitamente diferenciáveis é freqüentemente denotado por C∞(Ω). É fácil constatar que C∞(Ω) é um espaço vetorial: combinações lineares finitas de funções infinitamente diferenciáveis produzem novamente funções infinitamente diferenciáveis. • O espaço de Schwartz em R O conjunto C∞(R) das funções infinitamente diferenciáveis definidas em R e assumindo valores em C possui um subconjunto que merece particular atenção. Trata-se do conjunto das funções de C∞(R) que, assim como suas derivadas, decaem a zero no infinito mais rápido do que qualquer polinômio, ou seja, é o conjunto das funções f : R → C tais que lim |x|→∞ p(x)f (q)(x) = 0 (31.1) 3George Green (1793–1841). 4Oliver Heaviside (1850–1925). 5Paul Adrien Maurice Dirac (1902–1984). 6André Weil (1906–1998). 7Em toda a presente seção trataremos, salvo menção expĺıcita, de funções que assumem valores complexos, mas o tratamento de funções que assumem valores reais é idêntico, com resultados idênticos. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1459/1730 E. 31.3 Exerćıcio. Desenhe os gráficos das funções f e g de (31.8) e (31.9), acima. Prove que as mesmas são infinitamente diferenciáveis. Sugestão: no caso da função f mostre que as derivadas de funções como exp ( − 1(x−a)2 ) são sempre da forma exp ( − 1(x−a)2 ) vezes um polinômio em 1(x−a) . Esse polinômio diverge quando x→ a mas o fator exponencial exp ( − 1(x−a)2 ) vai a zero mais rapidamente. Para g tem-se algo análogo. 6 O conjunto de de todas as funções infinitamente diferenciáveis de suporte compacto definidas em Rn é freqüentemente denotado por C∞0 (R n). É fácil constatar que o conjunto de todas funções infinitamente diferenciáveis em Rn de suporte compacto forma um espaço vetorial: combinações lineares finitas de funções infinitamente diferenciáveis de suporte compacto produzem novamente funções infinitamente diferenciáveis de suporte compacto. Esse espaço vetorial é freqüentemente denotado por C∞0 (R n) ou por D(Rn). Os elementos de D(Rn), ou seja, as infinitamente diferenciáveis em Rn de suporte compacto, são freqüentemente denominadas funções de teste9. É bastante claro pela definição que D(Rn) ⊂ S (Rn). As funções do espaço de Schwartz S (Rn) possuem uma propriedade que não é compartilhada pelas funções de D(Rn): a transformada de Fourier de uma função de S (Rn) é novamente uma função de S (Rn). Esse fato é muito importante em certos desenvolvimentos. • Convergência no espaço D(Rn) É também posśıvel introduzir uma noção de convergência em D(Rn). Dizemos que uma seqüência ϕk, k ∈ N, de funções de D(Rn) converge a uma função ϕ de D(Rn) se as seguintes condições forem satisfeitas: 1. existe um conjunto compacto K ⊂ Rn tal que para todo k ∈ N grande o suficiente o suporte da diferença ϕk − ϕ está contido dentro de K; 2. para todo multi-́ındice β a diferença Dβϕk−Dβϕ converge uniformemente à função nula em K, o que equivale a dizer que lim k→∞ sup { ∣ ∣Dβ(ϕk − ϕ)(x) ∣ ∣ , x ∈ K } = 0. Por exemplo, a seqüência de funções de D(R) dada por 1ϕk(x) =      1 k exp ( − 1 1 − x2 ) , para x ∈ (−1, 1) , 0, para x 6∈ (−1, 1) , k ∈ N, converge à função nula no sentido de convergência do espaço D(R), definido acima, mas a seqüência de funções de D(R) dada por 2ϕk(x) =     e−k 2 exp ( − 1 1 − (x/k)2 ) , para x ∈ (−k, k) , 0, para x 6∈ (−k, k) , (31.10) k ∈ N, não converge à função nula no sentido de convergência do espaço D(R), definido acima (pois a condição 1 é violada). O estudante deve observar, porém, que tanto a seqüência 1ϕk quanto a seqüência 2ϕk convergem à função nula no sentido de convergência definido no espaço de Schwartz S (R). Vide Exerćıcio E. 31.4. Esses exemplos mostram que as noções de convergência no sentido do espaço S (R) e no sentido do espaço D(R) são diferentes. E. 31.4 Exerćıcio. Usando (31.3), mostre que lim k→∞ ‖1ϕk‖m,q = 0 e lim k→∞ ‖2ϕk‖m, q = 0 para todos m, q ∈ N0. 6 9Infelizmente alguns autores também denominam funções de teste as funções de S (Rn). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1460/1730 E. 31.5 Exerćıcio. Mostre que a seqüência de funções de D(R) definidas por 3ϕk(x) =    1 k exp ( − 1 1 − (x/k)2 ) , para x ∈ (−k, k) , 0, para x 6∈ (−k, k) , k ∈ N, não converge à função nula no sentido de convergência do espaço D(R) e não converge à função nula no sentido de convergência do espaço S (R). 6 Como no caso do espaço S (Rn), comentamos que a noção de convergência nos espaços D(Rn) está associada a noções topológicas mais profundas, mas aqui iremos nos limitar a uma discussão elementar. Vide referências citadas no ińıcio da presente seção. Importante nessa discussão é a seguinte afirmação: Proposição 31.1 Se ϕk é uma seqüência de elementos de D(R n) que converge a uma função ϕ ∈ D(Rn) no sentido de convergência de D(Rn), então ϕk também converge a ϕ no sentido de convergência de S (R n). 2 O exemplo da seqüência 2ϕk de (31.10), acima, mostra que a rećıproca da afirmação dessa proposição não é verdadeira, pois 2ϕk converge à função nula segundo S (R) mas não segundo D(R) (vide Exerćıcio E. 31.4). Prova da Proposição 31.1. Considere-se uma seqüência ϕk de elementos de D(R n) que converge a uma função ϕ ∈ D(Rn) no sentido de convergência de D(Rn). Então, existe um compacto K ⊂ Rn tal que ϕk − ϕ tem suporte contido em K para todo k grande o suficiente. Para tais k’s e para valerá ‖ϕk − ϕ‖m,β := sup { (1 + ‖x‖)m ∣ ∣Dβ(ϕk − ϕ)(x) ∣ ∣ , x ∈ Rn } = sup { (1 + ‖x‖)m ∣ ∣Dβ(ϕk − ϕ)(x) ∣ ∣ , x ∈ K } = sup { (1 + ‖x‖)m, x ∈ K } sup { ∣ ∣Dβ(ϕk − ϕ)(x) ∣ ∣ , x ∈ K } , sendo m ∈ N0 e β um multi-́ındice, ambos arbitrários. O fator sup { (1 + ‖x‖)m, x ∈ K } é finito (pois K é compacto) e é independente do ı́ndice k. Já o fator sup { ∣ ∣Dβ(ϕk − ϕ)(x) ∣ ∣ , x ∈ K } converge a zero para k → ∞ pois, por hipótese, Dβϕk converge uniformemente a D βϕ. Isso provou que lim k→∞ ‖ϕk − ϕ‖m,β = 0 para todo m ∈ N0 e todo multi-́ındice β, estabelecendo que ϕk também converge a ϕ no sentido de convergência de S (R n). • Uma proposição útil A proposição a seguir será usada no que segue, por exemplo na discussão sobre a transformada de Fourier no espaço de Schwartz. Proposição 31.2 Se f ∈ S (Rn) satisfaz f(a) = 0 para algum a = (a1, . . . , an) ∈ Rn, então f pode ser escrita na forma f(x) = n∑ k=1 (xk − ak)fk(x), onde as funções fk são também elementos de S (Rn). 2 Prova. Pelo Corolário 30.2, página 1403, sabemos que podemos escrever f(x) = n∑ k=1 (xk − ak)hk(x) , JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1461/1730 onde as funções hk são infinitamente diferenciáveis. Isso não implica, todavia, que sejam funções de Schwartz. Sabemos, por outro lado, que as funções gk definidas por gk(x) := f(x) (xk − ak) ‖x− a‖2 são infinitamente diferenciáveis exceto em x = a, e decaem, assim como suas derivadas, mais rápido que qualquer polinômio em x, pois f o faz. Fora isso, vale n∑ k=1 (xk − ak)gk(x) = f(x) n∑ k=1 (xk − ak)2 ‖x− a‖2 = f(x) . Seja agora uma função infinitamente diferenciável e de suporte compacto χ escolhida de modo que χ(x) = 1 para todo x em uma vizinhança de a. Um exemplo seria a função χ(x) = g ( ‖x− a‖2 ) , onde g é a função definida em (31.9). Defina-se para cada k fk(x) := ( 1 − χ(x) ) gk(x) + χ(x)hk(x) . Como comentamos acima, gk só não é diferenciável em x = a, mas 1 − χ anula-se em uma vizinhança de a. No suporte de 1 − χ as funções gk decaem, assim como suas derivadas, mais rápido que qualquer polinômio em x. Assim, o produto (1 − χ)gk é uma função de Schwartz. Já hk é infinitamente diferenciável e o produto χ(x)hk(x) é infinitamente diferenciável e de suporte compacto sendo, portanto, uma função de Schwartz. Isso provou que as funções fk são de Schwartz. Note-se agora que n∑ k=1 (xk − ak)fk(x) = χ(x) n∑ k=1 (xk − ak)hk(x) + (1 − χ(x)) n∑ k=1 (xk − ak)gk(x) = χ(x)f(x) + (1 − χ(x))f(x) = f(x) , completando a prova. • Operadores diferenciais lineares em D(Rn) Sejam a1, . . . , aN funções infinitamente diferenciáveis em R n e sejam α1, . . . , αN multi-́ındices distintos. A expressão que a cada ϕ ∈ D(Rn) associa uma função Lϕ ∈ D(Rn) dada por ( Lϕ ) (x) = N∑ k=1 ak(x)D αkϕ(x) = N∑ k=1 ak(x) ∂|αk|ϕ ∂xα11 · · ·∂xαnn (x) , define um operador diferencial linear em D(Rn). Simbolicamente denotamos o operador diferencial linear L por L = N∑ k=1 ak(x)D αk = N∑ k=1 ak(x) ∂|αk| ∂xα11 · · · ∂xαnn . Podemos definir, o chamado operador diferencial linear dual de L, denotado por LT como sendo o operador diferencial linear que a cada ϕ ∈ D(Rn) associa uma função LTϕ ∈ D(Rn) dada por ( L Tϕ ) (x) = N∑ k=1 (−1)|αk|Dαk(akϕ)(x) = N∑ k=1 (−1)|αk| ∂ |αk|(akϕ) ∂xα11 · · · ∂xαnn (x) . (31.11) É importante notar que, com as definições de acima, vale para todas as funções ϕ, ψ ∈ D(Rn) a seguinte relação: ∫ Rn ϕ(x) ( Lψ)(x) dnx = ∫ Rn ( L Tϕ ) (x) ψ(x) dnx . (31.12) (Verifique! Sugestão: integração por partes). A validade dessa relação é a razão de ser da definição do operador dual LT . Simbolicamente denotamos o operador diferencial linear LT por L T = N∑ k=1 (−1)|αk|Dαk(ak ⋆ )(x) = N∑ k=1 (−1)|αk| ∂ |αk|(ak ⋆ ) ∂xα11 · · · ∂xαnn (x) (31.13) JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1464/1730 Notemos agora que para dois n-multi-́ındices α e β ∣ ∣xαDβ(f ∗ g)(x) ∣ ∣ ≤ 1 (2π)n/2 ∫ Rn ∣ ∣ ∣xα ( Dβxf(x− y) ) g(y) ∣ ∣ ∣ dny (31.7) ≤ ‖f‖2q, β‖g‖2q, 0 (2π)n/2 ∫ Rn |xα| (1 + ‖x− y‖)2q(1 + ‖y‖)2q d ny ≤ M‖f‖2q, β‖g‖2q, 0 (2π)n/2 |xα| (1 + ‖x‖)q , onde na última passagem usamos a desigualdade ∫ Rn 1 (1 + ‖x− y‖)2q(1 + ‖y‖)2q d ny ≤ M (1 + ‖x‖)q , (31.17) válida para todo q grande o suficiente (a saber, q > n), ondeM > 0 é uma constante. A demonstração de (31.17) encontra- se no Apêndice 31.B, página 1534. Conclúımos que, tomando q grande o suficiente (q > |α|) que sup x∈Rn ∣ ∣xαDβ(f ∗ g)(x) ∣ ∣ < ∞ para todo α e β, o que demonstra que f ∗ g ∈ S (Rn). Essas considerações provaram que S (Rn) é uma álgebra com o produto de convolução. Para provarmos que a álgebra é Abeliana, ou seja, que f ∗ g = g ∗ f para todos f, g ∈ S (Rn), notamos que (f ∗ g)(x) = 1 (2π)n/2 ∫ Rn f(x− y)g(y) dny y→x−y= 1 (2π)n/2 ∫ Rn f(y)g(x− y) dny = (g ∗ f)(x) . Para provarmos que a álgebra é associativa, ou seja, que (f ∗ g) ∗ h = f ∗ (g ∗ h) para todos f, g, h ∈ S (Rn), notamos que ( (f ∗ g) ∗ h ) (x) = 1 (2π)n/2 ∫ Rn (f ∗ g)(x− y) h(y) dny = 1 (2π)n ∫ Rn (∫ Rn f(x− y − w)g(w) dnw ) h(y) dny w→w−y = 1 (2π)n ∫ Rn (∫ Rn f(x− w)g(w − y) dnw ) h(y) dny = 1 (2π)n ∫ Rn f(x− w) (∫ Rn g(w − y)h(y) dny ) dnw = 1 (2π)n/2 ∫ Rn f(x− w)(g ∗ h)(w) dnw = ( f ∗ (g ∗ h) ) (x) . A inversão da ordem das integrações na passagem da terceira para a quarta linha, acima, é justificada pelo rápido decaimento do integrando. Vemos, então, que o espaço de Schwartz S (Rn) é uma álgebra Abeliana e associativa para o produto pontual e para o produto de convolução. Denotamos essas duas álgebras por (S (Rn), ·) e (S (Rn), ∗), respectivamente. Como veremos adiante (Proposição 31.9, página 1475), essas duas álgebras são isomorfas, o isomorfismo sendo dado pela transformada de Fourier. Os seguintes fatos serão usados no que seguirá. Proposição 31.3 Seja R : S (Rn) → S (Rn) definida por (Rf)(x) = f(−x) para toda f ∈ S (Rn). Então R2 = 1, onde 1 é o operador identidade agindo em S (Rn). Além disso, R(a ∗ b) = (Ra) ∗ (Rb) e R(a · b) = (Ra) · (Rb) para duas funções de Schwartz a e b quaisquer. 2 JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1465/1730 Prova. Exerćıcio! * O espaço das funções de Schwartz S (Rn) e o espaço das funções de teste D(Rn) são de fundamental importância para o tratamento de dois objetos de grande interesse, particularmente para o estudo de equações diferenciais: as transformadas de Fourier e as distribuições. 31.2 Transformadas de Fourier Nesta seção apresentamos as definições e os resultados básicos mais relevantes sobre as transformadas de Fourier no espaço de Schwartz. As transformadas de Fourier revelam toda a sua importância e todo seu poder quando, aliadas à Teoria das Distribuições, são inseridas no contexto da teoria das equações diferenciais. Seu estudo é relevante também na Teoria dos Espaços de Hilbert e na Teoria de Grupos, mas as mesmas têm interesse por si só. No obituário que escreveu em homenagem a G. H. Hardy10, notório por sua paixão pela matemática pura a despeito de suas aplicações, Titchmarsh11 escreve12, não sem uma ponta de ironia: “Hardy had singularly little appreciation of science for one who was sufficiently nearly a scientist to be Fellow of the Royal Society. [...] I worked on the theory of Fourier integrals under his guidance for a good many years before I discovered for myself that this theory has applications in applied mathematics, if the solution of certain differential equations can be called “applied”. I never heard him refer to these applications”13. A teoria das transformadas de Fourier é quase tão antiga quanto a teoria das séries de Fourier (das quais tratamos na Seção 30.4, página 1407) e, em verdade, derivou daquela. A relação entre ambas, porém, nem sempre é iluminante e por isso não iremos nos ater à mesma aqui. Para um excelente texto, rico em comentários históricos e aplicações, vide [112]. Para uma introdução elementar em ĺıngua portuguesa, vide o também excelente [54]. Se f é uma função integrável (real ou complexa) definida em Rn, ou seja, se satisfaz ∫ Rn |f(x)| dx < ∞, define-se a transformada de Fourier14 de f como sendo a função definida em Rn, denotada por F[f ], dada por F[f ](y) := 1 (2π)n/2 ∫ Rn f(x) e−iy·x dnx , (31.18) onde x = (x1, . . . , xn) ∈ Rn, y = (x1, . . . , xn) ∈ Rn e y · x ≡ x · y = x1y1 + · · · + xnyn = 〈y, x〉R. A transformada de Fourier conjugada de f , denotada por Fc[f ], é definida por F c[f ](y) := 1 (2π)n/2 ∫ Rn f(x) e+iy·x dnx . (31.19) Se denotarmos por R o operador que a cada função g(x) associa a função g(−x) (ou seja (Rg)(x) = g(−x) para todo x ∈ Rn) é evidente que para toda f integrável F c[f ] = R(F[f ]) . (31.20) É também evidente pelas definições que para toda f integrável (Fc[f ]) = F [ f ] . (31.21) Advertência. O estudante deve ser advertido quanto ao fato que a convenção que adotamos para a definição de transfor- mada de Fourier não é, infelizmente, universal na literatura f́ısica e matemática. Alguns autores definem a transformada de Fourier por F[f ](p) := ∫ Rn f(x) e−ip·x dnx, omitindo o fator 1 (2π)n/2 , o qual reaparece elevado ao quadrado na definição da transformada de Fourier conjugada: Fc[f ](p) := 1(2π)n ∫ Rn f(x) e+ip·x dnx Nessas convenção Fc[f ] = 1(2π)nR(F[f ]). Ou- tros autores omitem os pré-fatores 1 (2π)n/2 mas inserem um fator 2π no expoente e−ip·x do integrando, que fica e−i2πp·x. 10Godfrey Harold Hardy (1877–1947). 11Edward Charles Titchmarsh (1899–1963). 12E. C. Titchmarsh. “Godfrey Harold Hardy”. The Journal of the London Mathamatical Society, 25, 81–101 (1950). 13Op. cit., pag. 85. 14Jean Baptiste Joseph Fourier (1768–1830). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1466/1730 Em livros de F́ısica, especialmente nos de Mecânica Quântica e Teoria de Campos, é comum também introduzir-se um fator ~ no expoente, que fica e−ip·x/~. Cuidado é, portanto, necessário ao comparar-se textos diferentes15. • Transformadas de Fourier. Propriedades elementares Antes de nos aprofundarmos na teoria das transformadas de Fourier é importante listarmos algumas de suas propri- edades elementares. A transformada de Fourier e a transformada de Fourier conjugada são lineares: se f e g são duas funções integráveis quaisquer e α e β são números complexos quaisquer, valem F[αf + βg] = αF[f ] + βF[g] e Fc[αf + βg] = αFc[f ] + βFc[g] . Isso pode ser facilmente constatado pela definição e é deixado como exerćıcio. Note que αf + βg também é integrável se f e g o forem. Seja a ∈ Rn. Se g é uma função integrável definida em Rn, denotemos por ga a função ga(x) := g(x − a), x ∈ Rn, que consiste na função g transladada por a. Para a ∈ Rn defina-se também a função ea por ea(x) := e−ia·x, x ∈ Rn. É elementar constatar pelas definições que para toda g integrável valem F[ga](y) = ea(y)F[g](y) e F c[ga](y) = e−a(y)F c[g](y) , (31.22) assim como F[eag](y) = F[g](y + a) e F c[eag](y) = F c[g](y − a) . (31.23) • Cálculo de algumas transformadas de Fourier elementares Transformadas de Fourier podem ser explicitamente calculadas em diversos casos. O exerćıcio que segue ilustra as situações mais simples. E. 31.6 Exerćıcio. Reunimos aqui alguns poucos casos de funções cujas transformadas de Fourier podem ser calculadas por métodos elementares. O caso de funções Gaussianas será tratado adiante. a. Para a > 0, constante, seja χ[−a, a] a função caracteŕıstica do intervalo [−a, a]: χ[−a, a] :=    1 , se x ∈ [−a, a] , 0 , se x 6∈ [−a, a] . Mostre que χ[−a, a] é integrável em R para todo a > 0 e mostre que F [ χ[−a, a] ] (y) = √ 2 π sen (ay) y . b. Seja ha(x) = e −a|x| com a > 0, constante. Mostre que ha é integrável em R para todo a > 0 e mostre que F[ha](y) = √ 2 π a y2 + a2 . c. Seja fa(x) := 1 a2+x2 , com x ∈ R, com a > 0, constante. Mostre que fa é integrável em R para todo a > 0 e mostre que F[fa](y) = √ π 2 e−a|y| a . Sugestão. Método dos reśıduos. 15Alguns autores chegam a usar as diversas convenções acima no mesmo texto! JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1469/1730 provando que FQa = −PaF. Para provar (31.28), notemos que para toda f ∈ S (Rn) F[Rf ](y) = 1 (2π)n/2 ∫ Rn f(−x)e−iy·x dnx x→−x= 1 (2π)n/2 ∫ Rn f(x)e+iy·x dnx = Fc[f ](y) = ( RF[f ] ) (y) . A prova das relações (31.29) é elementar. Podemos agora provar a afirmação feita acima que a transformada de Fourier leva funções de Schwartz em funções de Schwartz. Proposição 31.6 A transformada de Fourier F e a transformada de Fourier conjugada Fc mapeiam S (Rn) em S (Rn). 2 Mais adiante, no Teorema 31.2, página 1474, provaremos que F e Fc mapeiam bijetivamente S (Rn) sobre si mesmo e que Fc é a inversa de Fc em S (Rn). Prova da Proposição 31.6. Como Fc = RF, é suficiente tratar de F. Seja f ∈ S (Rn). Consideremos a expressão yαDβyF[f ](y) = i |β|QαP βF[f ](y), onde α e β são n-multi-́ındices, P β := P β11 · · ·P βnn e Qα := Qα11 · · ·Qαnn . Usando (31.27), temos yαDβyF[f ](y) = F [ (−i)|β|PαQβf ] (y) . A função g = (−i)|β|PαQβf é um elemento de S (Rn) e, portanto, vale |g(x)| ≤ ‖g‖q, 0 (1 + ‖x‖)q para todo q ≥ 0. Assim, escolhendo q grande o suficiente (q > n) ∣ ∣ ∣yαDβyF[f ](y) ∣ ∣ ≤ ∣ ∣ ∣ ∣ 1 (2π)n/2 ∫ Rn g(x)e−iy·x dnx ∣ ∣ ∣ ∣ ≤ ‖g‖q, 0 (2π)n/2 ∫ Rn 1 (1 + ‖x‖)q d nx < ∞ . Isso estabeleceu que sup y∈Rn ∣ ∣ ∣yαDβyF[f ](y) ∣ ∣ ∣ <∞ para todos os n-multi-́ındices α e β, o que prova que F[f ] ∈ S (Rn). E. 31.8 Exerćıcio. Sejam f(x) := e−a(x−b) 2 e g(x) := e−c(x−d) 2 , onde a, b, c e d são constantes, sendo a > 0 e c > 0. Mostre que (f ∗ g)(x) = √ 1 2(a+ c) exp ( − ac a+ c (x− b− d)2 ) , ou seja, a convolução de duas funções Gaussianas é novamente uma função Gaussiana. 6 E. 31.9 Exerćıcio. [Relações de Weyl16] Para cada a ≡ (a1, . . . , an) ∈ Rn sejam U(a) : S (Rn) → S (Rn) e V (a) : S (Rn) → S (Rn) os operadores lineares definidos por ( U(a)f ) (x) := f(x+ a) , ( V (a)f ) (x) := ei〈a, x〉f(x) , onde 〈a, x〉 denota o produto escalar usual entre vetores a = (a1, . . . , an) e x = (x1, . . . , xn) de Rn: 〈a, x〉 := a1x1 + · · · + anxn. Mostre que valem as seguintes relações: U(a)V (b) = ei〈a, b〉V (b)U(a) , U(a)F = FV (−a) , V (a)F = FU(a) , para todos a, b ∈ R. 6 16Hermann Klaus Hugo Weyl (1885–1955). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1470/1730 31.2.1.1 A Transformada de Fourier de Funções Gaussianas As relações (31.27) são úteis também por permitirem calcular facilmente a transformada de Fourier de algumas funções, notadamente das funções Gaussianas. Exemplos relevantes são exibidos nas proposições e nos exerćıcios que seguem. Começamos exibindo o fato de que uma particular função Gaussiana tem a propriedade de ser invariante pela trans- formada de Fourier. Proposição 31.7 Seja g ∈ S (Rn) a função g(x) = exp  −1 2 n∑ j=1 x2j  . Então, Fg = g e Fcg = g. 2 Prova. Pela definição de g, é fácil constatar que para todo j = 1, . . . , n vale ∂ g∂xj (x) = −xjg(x), ou seja, (Pj − iQj)g = 0. Aplicando o operador F a essa igualdade e usando as relações (31.27), obtemos (Qj + iPj)ĝ = 0, onde ĝ ≡ Fg. Isso significa que ∂ ĝ ∂yj (y) + yj ĝ(y) = 0 para todo j = 1, . . . , n. A solução dessas equações é (justifique!) ĝ(y) = λ exp  −1 2 n∑ j=1 y2j   , onde λ é uma constante. Assim, estabelecemos que Fg = λg. Para determinar λ calculemos ambos os lados dessa igualdade em um ponto espećıfico. Como g(0) = 1, temos que λ = λg(0) = F[g](0) = 1 (2π)n/2 ∫ Rn exp  −1 2 n∑ j=1 x2j   dnx x= √ 2y = 1 πn/2 ∫ Rn exp  − n∑ j=1 y2j   dny = 1 . Isso provou que Fg = g. Como Rg = g, segue também que Fcg = RFg = Rg = g. E. 31.10 Exerćıcio. A igualdade F[g] = g para g(x) = exp  −1 2 n∑ j=1 x2j   pode também ser demonstrada usando integração no plano complexo e o Teorema de Cauchy. Faça-o! 6 Antes de estendermos os resultados da Proposição 31.7, façamos um comentário sobre a mesma. • Comentário sobre funções invariantes pela transformada de Fourier A função Gaussiana g da Proposição 31.7 não é a única função não-nula que é invariante pela transformada de Fourier e há alguns exemplos bastante simples de funções com essa propriedade. Na Seção 31.2.1.4, página 1477, mostramos que todas as funções de Hermite17 da forma h4n, n ∈ N0, são invariantes pela transformada de Fourier. No exerćıcio dirigido E. 31.38, página 1528, mostramos explicitamente que para a função de uma variável h(x) = 1 cosh (√ π 2 x ) vale F[h] = h, ou seja, essa função h também tem a si mesmo como transformada de Fourier. Como veremos adiante (Exerćıcio E. 31.15, página 1478), se f ∈ S (Rn), então h := f + F[f ] + F2[f ] + F3[f ] também satisfaz F[h] = h. Em verdade, veremos que h(x) = f(x) + f(−x) + F[f ](x) + F[f ](−x) e, portanto, se f for uma função ı́mpar, h será identicamente nula mas, se f for par, teremos h(x) = 2f(x)+2F[f ](x), que não é necessariamente a função nula. Por exemplo, para qualquer α > 0 a função fα(x) := exp ( −αx2 ) + exp ( − 14αx2 ) √ 2α 17As chamadas funções de Hermite, denotadas por hm, m ∈ N0, foram introduzidas à página 566. Vide (12.125). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1471/1730 é exatamente desse tipo (pela Proposição 31.8, página 1471) e, portanto, vale para a mesma F[fα] = fα. Outro exemplo é a função hβ(x) := 1 cosh ( β x ) + √ π 2 1 β cosh ( π 2 x β ) , β > 0, que também é a soma de uma função par com sua transformada de Fourier (vide Exerćıcio E. 31.38, página 1528) e, portanto, também satisfaz F[hβ ] = hβ . No caso de R n, n ≥ 2, pode-se provar que a função Gaussiana g da Proposição 31.7 é a única função invariante pela transformada de Fourier e pela ação do grupo de rotações SO(n). • A transformada de Fourier de funções Gaussianas O resultado contido na proposição que segue é muito importante e refere-se a transformadas de Fourier de funções Gaussianas gerais em R. Proposição 31.8 (Transformada de Fourier de Gaussianas em R) Sejam α > 0 e γ ∈ C, constantes. Então, para a função h(x) := exp ( −αx2 + γx ) , x ∈ R , tem-se F[h](y) = exp ( − 14α ( y + iγ )2 ) √ 2α . (31.30) A relação (31.30) diz-nos que a transformada de Fourier de uma função Gaussiana é novamente uma função Gaussiana. 2 Comentário. A expressão (31.30) pode ser demonstrada com uso de integração complexa (vide exerćıcio adiante), mas apresentaremos uma demonstração alternativa sem o uso dessa técnica. Em ambas as demonstrações, no entanto, faz-se uso do seguinte comentário. Para y real tem-se, por definição, F[h](y) = 1√ 2π Z ∞ −∞ e−αx 2 −i(y+iγ)x dx (31.31) e o integrando, ou seja, a função exp “ − αx2 − i(y + iγ)x ” , é uma função inteira da variável y, ou seja, é uma função de y que é anaĺıtica em todo o plano complexo. A integral do lado direito é absolutamente convergente devido ao fator e−αx 2 . Por isso, aquela integral é igualmente uma função inteira de y. ♣ Demonstração da Proposição 31.8. Seja ĥ ≡ F[h]. É fácil constatar que a função h satisfaz ( d dx + 2αx − γ ) h(x) = 0 e, portanto, satisfaz ( P − 2iαQ+ iγ ) h = 0. Usando (31.27), segue disso que ĥ satisfaz ( iP + 12α (Q+ iγ) ) ĥ = 0, ou seja, ĥ satisfaz a equação diferencial ∂∂y ĥ(y) = − 12α ( y + iγ ) ĥ(y). A solução dessa equação é ĥ(y) = Ce− 1 4α ( y+iγ )2 , onde C é uma constante de integração a ser determinada. Para isso, lembremos (31.31) e escrevamos Ce− 1 4α ( y+iγ )2 = 1√ 2π ∫ ∞ −∞ e−αx 2−i(y+iγ)x dx . Notemos que o lado esquerdo é também uma função inteira de y e, portanto, a igualdade acima vale para todo y ∈ C. Calculando ambos os lados da igualdade em y = −iγ, teremos C = 1√ 2π ∫ ∞ −∞ e−αx 2 dx = 1√ 2α , provando que ĥ(y) = e− 1 4α ( y+iγ )2 √ 2α , que é o que desejávamos estabelecer. A relação (31.30) pode também ser obtida por integração complexa. No Exerćıcio E. 31.33, página 1527, mostramos como reobter (31.30) por outros meios, a saber, usando a expansão de Taylor da função exponencial e propriadades da Função Gama de Euler. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1474/1730 Teorema 31.2 F e Fc são isomorfismos de S (Rn) em S (Rn), ou seja, são aplicações lineares bijetoras de S (Rn) em S (Rn). Mais especificamente, temos F−1 = Fc, relação essa válida em S (Rn). Valem também em S (Rn) as relações F 2 = R e F4 = 1 . Essas duas expressões implicam também que F3 = F−1. 2 Prova. Das relações (31.27) segue imediatamente que F 2Pa = −PaF2 e F2Qa = −QaF2 (31.39) Temos também que RQa = −QaR e RPa = −PaR (vide (31.29)). Logo, RF2Qa = −RQaF2 = QaRF2 e RF2Pa = −RPaF2 = PaRF2 . Isso estabeleceu que RF2 comuta com os operadores Qa e Da para todo a. Pelo Teorema 31.1, página 1473, conclúımos que RF2 é um múltiplo da identidade: RF2 = l1 para alguma constante l. Provemos agora que l = 1. Para tal basta calcular RF2 sobre uma função g ∈ S (Rn) espećıfica e ver o que disso resulta. Escolhemos para g a função g(x) = exp  −1 2 n∑ j=1 x2j  . Como vimos na Proposição 31.7, página 1470, tem-se Fg = g. Fora isso, é evidente que Rg = g. Logo, RF2g = g, provando que l = 1. Provamos, portanto, que RF2 = 1. Como R2 = 1, isso implica F2 = R e isso, por sua vez, implica que F4 = 1 e também que FRF (31.28) = F2R = 1. Mais importante, porém é o fato que RF2 = 1 diz-nos que (RF)F = F(RF) = 1. Essas relações provam que F−1 existe e vale F−1 = RF = Fc. • A transformada de Fourier e a distribuição delta de Dirac Podemos nesse ponto antecipar alguns comentários a respeito do papel das transformadas de Fourier na Teoria das Distribuições. Se escrita explicitamente, a relação F−1 [ F[f ] ] = f , válida para toda f ∈ S (Rn), induz as seguintes manipulações: f(y) = F−1 [ F[f ] ] (y) = 1 (2π)n/2 ∫ Rn F[f ](x)e+iy·x dnx = 1 (2π)n ∫ Rn (∫ Rn f(w)e−ix·w dnw ) e+iy·x dnx = 1 (2π)n ∫ Rn f(w) (∫ Rn e−i(w−y)·x dnx ) dnw , sendo que a troca de ordem de integração acima tem, em prinćıpio, significado apenas simbólico. A igualdade f(y) = ∫ Rn f(w) ( 1 (2π)n ∫ Rn e−i(w−y)·x dnx ) dnw , obtida formalmente acima, diz-nos que 1 (2π)n ∫ Rn e−i(w−y)·x dnx = δ(w − y) , (31.40) onde δ é a distribuição delta de Dirac em Rn. Como discutiremos, apesar de (31.40) ter sido obtida acima por um procedimento formal (o estudante há de observar que a integral do lado esquerdo de (31.40) não é convergente, tendo, portanto, apenas um significado simbólico), ela é correta se interpretada no sentido de distribuições. A expressão (31.40) é muito útil, sendo empregada em diversas áreas da F́ısica, como na resolução de equações diferenciais, em cálculos de seções de choque na F́ısica Quântica etc. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1475/1730 31.2.1.3 Transformadas de Fourier, Produtos de Convolução e Identidade de Plancherel • Transformadas de Fourier e produtos de convolução Vamos agora estudar a relação entre a transformada de Fourier e o produto de convolução em S (Rn). Pelas definições, vale F[f ∗ g](y) = 1 (2π)n/2 ∫ Rn (f ∗ g)(x)e−iy·x dnx = 1 (2π)n ∫ Rn (∫ Rn f(x− w)g(w) dnw ) e−iy·x dnx = 1 (2π)n ∫ Rn (∫ Rn f(x− w)e−iy·x dnx ) g(w) dnw x→x+w = 1 (2π)n/2 ∫ Rn ( 1 (2π)n/2 ∫ Rn f(x)e−iy·x dnx ) e−iy·wg(w) dnw = ( 1 (2π)n/2 ∫ Rn f(x)e−iy·x dnx )( 1 (2π)n/2 ∫ Rn e−iy·wg(w) dnw ) = F[f ](y)F[g](y) . Provamos, portanto, que F[f ∗ g] = F[f ] · F[g] Como R(a · b) = (Ra) · (Rb) para duas funções de Schwartz a e b quaisquer (Proposição 31.3, página 1464), segue disso e de F−1 = RF que F −1[f ∗ g] = F−1[f ] · F−1[g] , Como essa relação vale para todos f, g ∈ S (Rn), podemos substituir f → F[f ] e g → F[g], obtendo F−1 [ F[f ]∗F[g] ] = f ·g e disso segue que F[f · g] = F[f ] ∗ F[g] . Como R(a ∗ b) = (Ra) ∗ (Rb) para duas funções de Schwartz a e b quaisquer (Proposição 31.3, página 1464), segue disso e de F−1 = RF que F −1[f · g] = F−1[f ] ∗ F−1[g] . Para futura referência, reunimos os fatos provados acima na seguinte proposição: Proposição 31.9 Seja o produto de convolução definido em S (Rn) por (f ∗ g)(x) = 1 (2π)n/2 ∫ Rn f(x− y)g(y) dny (31.41) com f, g ∈ S (Rn) e sejam a transformada de Fourier F e sua inversa F−1 dadas por F[f ](y) = 1 (2π)n/2 ∫ Rn f(x)e−iy·x dnx e F−1[f ](y) = 1 (2π)n/2 ∫ Rn f(x)e+iy·x dnx , (31.42) para toda f ∈ S (Rn). Então, para todas f, g ∈ S (Rn) valem as relações F[f ∗ g] = F[f ] · F[g] , (31.43) F −1[f ∗ g] = F−1[f ] · F−1[g] , (31.44) F[f · g] = F[f ] ∗ F[g] , (31.45) F −1[f · g] = F−1[f ] ∗ F−1[g] . (31.46) JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1476/1730 Essas relações estabelecem que as álgebras (S (Rn), ·) e (S (Rn), ∗) (vide página 1464) são isomorfas, o isomorfismo sendo dado pela transformada de Fourier. 2 E. 31.13 Exerćıcio para o estudante que conheça a distribuição de Dirac. Obtenha formalmente a relação F[f ]∗F[g] = F[f · g] fazendo uso de (31.40). 6 • A identidade de Plancherel Em S (Rn) podemos definir um produto escalar por 〈f, g〉 C = ∫ Rn f(y) g(y) dny . É fácil constatar (faça-o!) que 〈f, g〉 C = (2π)n/2 ( (Rf) ∗ g ) (0) = (2π)n/2 ( f ∗ (Rg) ) (0) e que 〈f, g〉 C = (2π)n/2F [ f · g ] (0) . (31.47) Logo, 〈F[f ], F[g]〉 C = (2π)n/2 ( (RF[f ]) ∗ (F[g]) ) (0) = (2π)n/2 ( (F−1[f ]) ∗ (F[g]) ) (0) = (2π)n/2 ( F [ f ] ∗ F[g] ) (0) (31.45) = (2π)n/2F [ f · g ] (0) (31.47) = 〈f, g〉 C , onde na terceira igualdade usamos que (F−1[f ]) = F [ f ] , que segue de (31.21) e do fato que F−1 = Fc. A igualdade assim estabelecida 〈F[f ], F[g]〉 C = 〈f, g〉 C , válida para todos f, g ∈ S (Rn), é denominada identidade de Plancherel18 para as transformadas de Fourier. Ela afirma que F é um operador isométrico em relação ao produto escalar acima. Substituindo f → F−1[f ] e g → F−1[g] na identidade de Plancherel, obtemos 〈f, g〉 C = 〈F−1[f ], F−1[g]〉 C . Substituindo apenas f → F−1[f ] na identidade de Plancherel, obtemos que 〈f, F[g]〉 C = 〈F−1[f ], g〉 C , que afirma que F∗ = F−1 (na linguagem de operadores duais (adjuntos) em espaços de Hilbert). Substituindo apenas g → F−1[g] na identidade de Plancherel, obtemos que 〈F[f ], g〉 C = 〈f, F−1[g]〉 C . Para futura referência reunimos os resultados provados acima na seguinte proposição: Proposição 31.10 Seja o produto escalar definido em S (Rn) por 〈 f, g 〉 C = ∫ Rn f(y) g(y) dny para todas f, g ∈ S (Rn) e sejam a transformada de Fourier F e sua inversa F−1 dadas por F[f ](y) = 1 (2π)n/2 ∫ Rn f(x)e−iy·x dnx e F−1[f ](y) = 1 (2π)n/2 ∫ Rn f(x)e+iy·x dnx , para toda f ∈ S (Rn). Então, para todas f, g ∈ S (Rn) valem as relações 〈 F[f ], F[g] 〉 C = 〈 f, g 〉 C , (31.48) 〈 F −1[f ], F−1[g] 〉 C = 〈 f, g 〉 C , (31.49) 〈 f, F[g] 〉 C = 〈 F −1[f ], g 〉 C , (31.50) 〈 F[f ], g 〉 C = 〈 f, F−1[g] 〉 C . (31.51) 18Michel Plancherel (1885–1967). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1479/1730 onde usamos o fato já provado que F[h0] = h0 (Proposição 31.7, página 1470). Portanto, provamos que F[hn] = (−i)nhn , (31.55) para todo n ∈ N0 e com isso estabelecemos que cada função de Hermite hn é auto-função da transformada de Fourier com autovalor (−i)n. De acordo com (12.126), essas funções satisfazem ∫∞ −∞ hn(x)hm(x) dx = δn,m para todos n, m ∈ N0. Na Seção 30.6.2, página 1437, provamos também que essas funções formam uma base ortonormal completa no espaço de Hilbert L2(R, dx). As observações de acima permitem-nos exprimir a transformada de Fourier sobre elementos de L2(R, dx) da seguinte forma. Seja ψ = ∞∑ n=0 〈hn, ψ〉C hn a decomposição de ψ ∈ L2(R, dx) na base ortonormal completa composta pelas funções de Hermite, com 〈f, g〉 C := ∫ R f(x)g(x)dx sendo o produto escalar usual em L2(R, dx). Obtemos, então, por (31.55), Fψ = ∞∑ n=0 (−i)n〈hn, ψ〉C hn = 3∑ a=0 (−i)a ∞∑ n=0 〈h4n+a, ψ〉C h4n+a , (31.56) onde usamos o fato que as funções de Hermite h4n+k têm auto-valores (−i)k, para todo n ∈ N0 e todo k ∈ {0, 1, 2, 3}. A convergência das séries acima se dá no sentido da norma de L2(R, dx). A relação (31.56) permite exprimir a transformada de Fourier de uma função ψ arbitrária de L2(R, dx) e é válida mesmo quando a integral (31.53) não está definida. Essa abordagem da teoria das transformadas de Fourier no espaço de Hilbert L2(R, dx) fazendo uso das funções de Hermite é empregada no estudo de séries temporais e foi introduzida por Wiener19. Vemos do exposto acima que os projetores espectrais Ea, a = 0, . . . , 3, de F são dados, na notação de Dirac, por Ea = ∞∑ n=0 ∣ ∣h4n+a 〉〈 h4n+a ∣ ∣ e que podemos escrever F = 3∑ a=0 (−i)aEa = 3∑ a=0 (−i)a ∞∑ n=0 ∣ ∣h4n+a 〉〈 h4n+a ∣ ∣ . Com a posse dessas expressões, abrem-se diversas possibilidades, como por exemplo, a de se definir potências ar- bitrárias de transformadas de Fourier (também denominadas transformadas de Fourier fracionárias), dadas para γ ∈ C por F γ := 3∑ a=0 e−i πaγ 2 Ea = 3∑ a=0 e−i πaγ 2 ∞∑ n=0 ∣ ∣h4n+a 〉〈 h4n+a ∣ ∣ . * * * Nota. A equação (31.55) não deve surpreender o leitor acostumado à Mecânica Quântica pois, devido a (31.27), é fácil ver que F comuta com o “operador Hamiltoniano” do problema do oscilador harmônico: H = P 2 + Q2. Sendo as funções de Hermite hn auto-funções de H, elas devem ser também auto-funções de F. ♣ 31.2.2 Transformadas de Fourier. Tópicos Suplementares 31.2.2.1 A Fórmula de Soma de Poisson Vamos aqui apresentar uma interessante conexão entre séries e transformadas de Fourier e alguns de seus usos. Trata-se de uma relação notável e de grande utilidade denominada fórmula de soma de Poisson20. 19Norbert Wiener (1894–1964). 20Siméon Denis Poisson (1781–1840). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1480/1730 Proposição 31.11 (Fórmula de Soma de Poisson) Para cada g ∈ S (R) vale a identidade ∞∑ n=−∞ g(x+ n) = √ 2π ∞∑ m=−∞ F[g] ( 2πm ) ei2πmx (31.57) para todo x ∈ R. Em particular, vale a identidade ∞∑ n=−∞ g(n) = √ 2π ∞∑ m=−∞ F[g] ( 2πm ) . (31.58) Ambas as expressões (31.57) e (31.58) são denominadas fórmula de soma de Poisson. 2 As hipóteses sobre a função g podem ser ainda mais enfraquecidas. Vide Exerćıcio E. 31.16, logo adiante. Prova da Proposição 31.11. Em primeiro lugar, observemos que, devido ao rápido decaimento de g, a série ∑∞ n=−∞ g(x+n) converge absolutamente e uniformemente em compactos e, portanto, define uma função cont́ınua em R, que denotaremos por G: G(x) := ∞∑ n=−∞ g(x+ n) . É evidente pela definição que G é uma função periódica e de peŕıodo 1. Paralelamente, como F[g] ∈ S (R), podemos afirmar também que a série √ 2π ∑∞ m=−∞ F[g](2πm)e i2πmx converge absolutamente e uniformemente em compactos e, portanto, define uma função cont́ınua em R, que denotaremos por H : H(x) := √ 2π ∞∑ m=−∞ F[g] ( 2πm ) ei2πmx . É também evidente que H é uma função periódica e de peŕıodo 1, pois as funções ei2πmx o são. Para provarmos, como desejamos, que G = H , é suficiente, pelo Corolário 30.3, página 1415, provarmos que os coeficientes de Fourier de G coincidem com os de H , que são obviamente dados por √ 2πF[g](2πm) (vide (30.59)). De acordo com (30.59), o m-ésimo coeficiente de Fourier de G é dado por Gm = ∫ 1/2 −1/2 e−i2πmyG(y) dy = ∫ 1/2 −1/2 e−i2πmy ( ∞∑ n=−∞ g(y + n) ) dy (30.2) = ∞∑ n=−∞ ∫ 1/2 −1/2 e−i2πmy g(y + n) dy p=y+n = ∞∑ n=−∞ ∫ n+1/2 n−1/2 e−i2πm(p−n) g(p) dp ei2πmn=1 = ∞∑ n=−∞ ∫ n+1/2 n−1/2 e−i2πmp g(p) dp = ∫ ∞ −∞ e−i2πmp g(p) dp = √ 2πF[g] ( 2πm ) , completando a prova. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1481/1730 E. 31.16 Exerćıcio. Mostre que as identidades (31.57) e (31.58) valem também para funções g que sejam diferenciáveis e satisfaçam a seguinte propriedade: existe K > 0 tal que |g(x)| + |g′(x)| ≤ K1+x2 para todo x ∈ R. Sugestão: constate que todas as manipulações da prova da Proposição 31.11 são válidas sob a hipótese acima. Vide [54]. 6 • Alguns usos da fórmula de soma de Poisson E. 31.17 Exerćıcio. A chamada Função Teta de Jacobi21, denotada por θ, é definida por θ(z, t) := ∞∑ n=−∞ e2πinz−πn 2t , (31.59) com z ∈ C e t ∈ C com Re (t) > 0. a. Usando a fórmula de soma de Poisson (31.58) e também (31.30), mostre que θ satisfaz a seguinte relação: θ(z, t) = e− πz2 t √ t θ (−iz t , 1 t ) = 1√ t ∞∑ n=−∞ e− π t (z−n) 2 . (31.60) b. Observe que para z ∈ C e t ∈ C com Re (t) > 0 podemos escrever θ(z, t) = 1 + 2 ∞∑ n=1 e−πn 2t cos ( 2πnz ) . (31.61) Disso vê-se facilmente que θ(z + 1, t) = θ(z, t) e que θ(−z, t) = θ(z, t). É também evidente por (31.61) que θ(z, t) é real se z ∈ R e t > 0. Prove que para todo z ∈ C vale lim t→∞ θ(z, t) = 1 , (t ∈ R) . De (31.59) ou de (31.61) vê-se que, para cada t ∈ C com Re (t) > 0 fixo, a função θ(z, t) é uma função inteira de z, pois as séries de (31.59) ou de (31.61) são séries de funções anaĺıticas que convergem absoluta e uniformemente em compactos. c. Consideremos agora z ∈ R e t > 0. Mostre que ∫ 1/2 −1/2 θ(z, t) dz = 1 (31.62) para todo t > 0. Usando a periodicidade de θ(z, t) com relação a z e o fato que θ(z, t) = θ(−z, t), mostre que para todo δ com 0 < δ < 1/2 vale ∫ −δ −1/2 θ(z, t) dz + ∫ 1/2 δ θ(z, t) dz = ∫ 1−δ δ θ(z, t) dz , e usando (31.60), mostre que lim t→0 ∫ 1−δ δ θ(z, t) dz = 0 . (31.63) Conclua disso que para t → 0 a função θ(z, t) comporta-se como uma seqüência delta de Dirac de peŕıodo 1 centrada em z = 0. A Função Teta de Jacobi desempenha um papel em diversas áreas da Matemática (Teoria de Números, Teoria de Grupos, teoria das funções eĺıpticas etc.) e da F́ısica (teoria da difusão do calor, Mecânica Quântica, Teoria Quântica de Campos etc.). Há uma extensa literatura sobre a Função Teta de Jacobi. Mais propriedades elementares e aplicações dessa função podem ser estudadas, entre outros, em [205], [40] e [76]. No Exerćıcio E. 17.38, página 848, exibimos um problema f́ısico, o problema de difusão de calor no ćırculo, no qual a Função Teta de Jacobi surge naturalmente. 6 21Carl Gustav Jacob Jacobi (1804–1851). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1484/1730 Caso n = 3. Seja f ∈ S (R3) uma função radialmente simétrica, ou seja, tal que f(x) = f ( ‖x‖ ) . Sua transformada de Fourier F[f ] é dada por F[f ](p) = 1 (2π)3/2 ∫ R3 f ( ‖x‖ ) e−ip·x d3x . Para p 6= 0 a integral do lado direito pode ser mais facilmente calculada em coordenadas esféricas (r, θ, φ), adotando-se o eixo “z” na direção de p ∈ R3, com o que escrevemos p · x = ‖p‖‖x‖ cosθ = ‖p‖r cos θ e obtemos F[f ](p) = 1 (2π)3/2 ∫ ∞ 0 ∫ π 0 ∫ 2π 0 f(r)e−i‖p‖r cos θ r2 sen θ drdθdϕ = 1 (2π)1/2 ∫ ∞ 0 f(r) (∫ π 0 e−i‖p‖r cos θ sen θdθ ) r2dr u cos θ = 1 (2π)1/2 ∫ ∞ 0 f(r) (∫ 1 −1 e−i‖p‖ru du ) r2 dr = 2 (2π)1/2 ∫ ∞ 0 f(r) sen ( ‖p‖r ) ‖p‖r r 2 dr . Resumindo, para f ∈ S (R3) radialmente simétrica com f(x) = f ( ‖x‖ ) para todo x ∈ R3, vale F[f ](p) = ∫ ∞ 0 f(r) (√ 2 π sen ( ‖p‖r ) ‖p‖r r 2 ) dr = ∫ ∞ 0 f(r) ( J1/2 ( ‖p‖r ) √ ‖p‖r ) r2 dr , (31.72) com J1/2 sendo a função de Bessel de ordem 1/2. O estudante é estimulado a comparar (31.71) a (31.72), observando as semelhanças entre ambas. O exerćıcio que segue mostra a expressão geral da transformada de Fourier de uma função radial em n dimensões. E. 31.21 Exerćıcio-desafio. Prove que em Rn, n ≥ 1, a transformada de Fourier de uma função radial f ∈ S (Rn) é dada por F[f ](p) = 1 ‖p‖n2 −1 ∫ ∞ 0 f(r) Jn 2 −1 ( ‖p‖r ) rn/2 dr , (31.73) onde Jk é a função de Bessel de ordem k. 6 • Transformadas de Fourier e médias angulares Seja f ∈ S (Rn). Como é bem sabido, podemos expressar f na forma f(x1, . . . , xn) como função de n coordenadas Cartesianas de Rn ou na forma f(r, Ω) em função de coordenadas esféricas em Rn, onde r = √ x21 + · · · + x2n e onde Ω é um conjunto de n− 1 coordenadas angulares que coordenatizam a superf́ıcie esférica de raio 1 em Rn, que denotamos por Sn−1. No caso n = 2, por exemplo, podemos adotar Ω = ϕ, com −π < ϕ ≤ π e no caso n = 3 podemos adotar Ω = (θ, ϕ), com 0 ≤ θ ≤ π e −π < ϕ ≤ π (coordenadas esféricas). Em Sn−1 existe uma medida de integração invariante pela ação do grupo de rotações O(n), a qual denotamos por dΩ, e que é normalizada de sorte que ∫ Sn−1 dΩ = |Sn−1|, onde |Sn−1| denota a medida de área (ou volume, como queira) de Sn−1. Usando os exemplos de acima, no caso n = 2 temos dΩ = dϕ e |S1| = 2π e no caso n = 3 temos dΩ = sen θdθdϕ e |S2| = 4π. Lema 31.1 Para todo n ≥ 2 vale |Sn−1| = 2π n/2 Γ ( n 2 ) , (31.74) onde Γ é a Função Gama de Euler (vide Caṕıtulo 5, página 191). 2 JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1485/1730 Prova. A integral múltipla In := ∫ ∞ −∞ · · · ∫ ∞ −∞ e−x 2 1−···−x2n dx1 · · · dxn é igual a (∫ ∞ −∞ e−x 2 dx )n = πn/2 (integral de Laplace). Por outro lado, usando coordenadas esféricas em Rn, podemos escrever In = ∫ ∞ 0 ∫ Sn−1 e−r 2 rn−1dr dΩ = |Sn−1| ∫ ∞ 0 e−r 2 rn−1dr t=r2 = |Sn−1| 2 ∫ ∞ 0 e−tt n 2 −1dt = |Sn−1| 2 Γ (n 2 ) , onde Γ é a Função Gama de Euler, estudada no Caṕıtulo 5, página 191. Assim, |Sn−1| = 2π n/2 Γ ( n 2 ) . Com o uso da medida invariante dΩ podemos definir uma média invariante (por O(n)) de funções de S (Rn): M [f ](r) := 1 |Sn−1| ∫ Sn−1 f(r, Ω) dΩ , (31.75) f ∈ S (Rn). M [f ] é denominada média esférica de f , ou média angular de f . É bastante claro que M [f ](r) pode ser interpretada como a média de f sobre a superf́ıcie da esfera de Rn de raio r centrada em 0. Note-se queM [f ](r) = M [f ] (√ x21 + · · · + x2n ) e, portanto,M [f ] pode ser também encarada como uma função definida em Rn. É útil notar que a transformada de Fourier e sua inversa podem ser escritas em termos da média angular. De fato, se h : Rn → C é uma função integrável, temos ∫ Rn h(x1, . . . , xn) d nx = ∫ ∞ 0 ∫ Sn−1 h(r, Ω) dΩ rn−1dr = |Sn−1| ∫ ∞ 0 M [h](r) rn−1dr . Conseqüentemente, podemos escrever, para toda f ∈ S (Rn), F[f ](p) = |Sn−1| (2π)n/2 ∫ ∞ 0 M [fep](r) r n−1dr e F−1[f ](p) = |Sn−1| (2π)n/2 ∫ ∞ 0 M [fe−p](r) r n−1dr , (31.76) onde ep(x) ≡ e−ip·x. Note-se que ep(x) = ex(p). Acima, p = (p1, . . . , pn) ∈ Rn. Como veremos, é útil considerarmos a expressão M [ep] ( ‖x‖ ) e afirmamos que a mesma é uma função apenas do produto ‖p‖ ‖x‖. Esse fato é evidente se observamos que M [ep] ( ‖x‖ ) = 1 |Sn−1| ∫ Sn−1 e−ip·x dΩx = 1 |Sn−1| ∫ Sn−1 e−i‖p‖ ‖x‖ cos θ dΩx , onde escrevemos p · x = ‖p‖ ‖x‖ cosθ e com θ sendo o ângulo entre p e x. O ângulo θ pode ser expresso em termos das variáveis angulares Ωx de x e, com isso, vemos que M [ep] ( ‖x‖ ) depende apenas do produto ‖p‖ ‖x‖. Tendo isso em mente, definamos E(‖p‖ ‖x‖) por E ( ‖p‖ ‖x‖ ) := |Sn−1| (2π)n/2 M [ep] ( ‖x‖ ) . Para uma função H de duas variáveis x, y ∈ Rn podemos tomar as médias M tanto com relação à variável x quanto em relação a y. Denotaremos por Mx[H ] a média em relação à dependência em x e por My[H ] a média em relação à dependência em y. Para a função ep(x) = e ip·x temos que Mx[ep] ( ‖x‖ ) = (2π)n/2 |Sn−1| E ( ‖p‖ ‖x‖ ) = Mp[ex] ( ‖p‖ ) . (31.77) Note-se que se f é uma função radial, ou seja, f(x1, . . . , xn) = f ( ‖x‖ ) , teremos F[f ](p) = ∫ ∞ 0 f(r)E ( ‖p‖r ) rn−1dr e F−1[f ](p) = ∫ ∞ 0 f(r)E ( ‖p‖r ) rn−1dr . Como vemos em (31.71) e (31.72), temos E ( ‖p‖ ‖x‖ ) = J0 ( ‖p‖ ‖x‖ ) para n = 2 e E ( ‖p‖ ‖x‖ ) = √ 2 π sen ( ‖p‖ ‖x‖ ) ‖p‖ ‖x‖ = J1/2 ( ‖p‖ ‖x‖ ) √ ‖p‖ ‖x‖ para n = 3 JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1486/1730 e, portanto, M [ep] ( ‖x‖ ) = J0 ( ‖p‖ ‖x‖ ) para n = 2 e M [ep] ( ‖x‖ ) = sen ( ‖p‖ ‖x‖ ) ‖p‖ ‖x‖ = √ π 2 J1/2 ( ‖p‖ ‖x‖ ) √ ‖p‖ ‖x‖ para n = 3 . (31.78) E. 31.22 Exerćıcio. Mostre que para toda f ∈ S (Rn) vale M [ F[f ] ] = F [ M [f ] ] . 6 • Uma identidade importante Vamos a seguir provar uma proposição (Proposição 31.12) de importância no estudo da propagação de ondas em d = 3 dimensões espaciais e da qual faremos uso na Seção 17.4.4.1, página 793. Antes precisamos do seguinte resultado: Lema 31.2 Seja g ∈ S (Rn) e, para y ∈ Rn fixo, seja Mp[ey] ( ‖p‖ ) . Então a função de p ∈ Rn definida pelo produto G(p) := g(p)Mp[ey] ( ‖p‖ ) é também uma função de S (Rn). 2 Prova. Por (31.77) escrevemos G(p) = g(p)Mp[ey] ( ‖p‖ ) (31.77) = g(p)My[ep] ( ‖y‖ ) = g(p) ∫ Sn−1 e−ip·y dΩy . A expressão ∫ Sn−1 e−ip·y dΩy é infinitamente diferenciável em relação às variáveis p, pois envolve a integral de uma função infinitamente diferenciável em um conjunto compacto (cf. Teorema 30.5, página 1385). Além disso, tem-se (usando a notação de multi-́ındices. Vide página 598) Dβ ∫ Sn−1 e−ip·y dΩy = ∫ Sn−1 ( Dβp e −ip·y ) dΩy = (−i)|β| ∫ Sn−1 yβe−ip·y dΩy , onde D representa derivações em relação às variáveis p. Como ∣ ∣(−i)|β| ∣ ∣ = 1, |e−ip·y| = 1 e |yβ| ≤ ‖y‖|β| (pois |yk| ≤ ‖y‖ para todo k = 1, . . . , n), segue que a última expressão pode ser limitada em módulo por ‖y‖|β| |Sn−1|. É evidente, portanto, que G(p) é infinitamente diferenciável em p e, pela regra de Leibniz, tem-se (usando a notação de multi-́ındices) DαG(p) = ∑ α1, α2 α1+α2=α ( Dα1g(p) ) (−i)|α2| ∫ Sn−1 yα2e−ip·y dΩy . É elementar constatar disso e dos comentários acima que |DαG(p)| ≤ |Sn−1| ∑ α1, α2 α1+α2=α |Dα1g(p)| ‖y‖|α2| . Como g ∈ S (Rn), segue que para todo N ∈ N existe CN|β| tal que |Dα1g(p)| ≤ CN|α1| ( 1 + ‖p‖ )−N , ∀ p ∈ Rn, implicando que para todo N ∈ N |DαG(p)| ≤ |Sn−1|    ∑ α1, α2 α1+α2=α ‖y‖|α2|CN|α1|    ( 1 + ‖p‖ )−N , ∀ p ∈ Rn provando que G ∈ S (Rn). Proposição 31.12 Seja v ∈ S (Rn) e consideremos a expressão F−1 [ F[v]M [ey] ] (x) com x, y ∈ Rn. Então, para cada y ∈ Rn a função de x definida por F−1 [ F[v]M [ey] ] (x) é um elemento de S (Rn). Essa expressão depende de y apenas através de ‖y‖ e (o ponto mais importante) é igual à média da função v na superf́ıcie da esfera em Rn de raio ‖y‖ centrada em x: F −1 [ F[v]M [ey] ] (x) = 1 |Sn−1| ∫ Sn−1 v(x− y) dΩy , (31.79) JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1489/1730 É importante observar que S ′(Rn) é um espaço vetorial. Se U e V são elementos de S ′(Rn) então, para todos α, β ∈ C a aplicação de S (Rn) em C denotada por αU + βV e definida para cada ϕ ∈ S (Rn) por (αU + βV )(ϕ) := αU(ϕ) + βV (ϕ) é igualmente um elemento de S ′(Rn), ou seja, é um funcional linear cont́ınuo no sentido da convergência em S (Rn). E. 31.24 Exerćıcio. Verifique as afirmações acima. 6 No que segue usaremos tanto a notação T (ϕ) quanto a notação 〈T, ϕ〉. A expressão 〈T, ϕ〉 é por vezes dita ser o “pairing”, ou emparelhamento, da distribuição temperada T com a função ϕ. • A relação de pertinência entre S ′(Rn) e D ′(Rn) Antes de passarmos a exemplos façamos a seguinte observação. Proposição 31.13 S ′(Rn) ⊂ D ′(Rn), ou seja, toda distribuição temperada é também uma distribuição. 2 Prova. Já comentamos acima que se T é um funcional linear de S (Rn) então é também um funcional linear de D(Rn). Vamos supor que T seja um elemento de S ′(Rn) e seja ϕk uma seqüência de elementos de D(Rn) que converge a ϕ ∈ D(Rn) no sentido de convergência de D(Rn). Então, pela Proposição 31.1, ϕk também converge a ϕ no sentido de convergência de S (Rn). Como T é cont́ınua em S (Rn), isso significa que lim k→∞ T (ϕk) = T (ϕ). Mas isso está dizendo que T é cont́ınua em D(Rn), provando que T ∈ D ′(Rn). Isso estabeleceu que S ′(Rn) ⊂ D ′(Rn). Devido a essa proposição distribuições temperadas são muitas vezes denominadas simplesmente distribuições, especi- almente quando não houver necessidade de distinguir as duas noções. Tratemos agora de exemplos. 31.3.1 Primeiros Exemplos de Distribuições Vamos começar com um exemplo básico de distribuição. • Distribuições regulares Nosso primeiro exemplo trata de distribuições que não são necessariamente temperadas. Para ele precisamos de uma definição. Uma função h : Rn → C é dita ser uma função localmente integrável se para todo compacto K ⊂ Rn valer∫ K |h(x)| dnx < ∞. Naturalmente, funções cont́ınuas são localmente integráveis, mas há outros exemplos a se ter em mente, como a função ln |x| e como as funções (ln x)+ e (ln |x|)−, definidas por (lnx)+ :=    lnx , para x > 0 , 0 , para x ≤ 0 , (ln |x|)− :=    0 , para x ≥ 0 , ln |x| , para x < 0 . (31.81) Do fato que, para a > 0 tem-se ∫ a 0 lnxdx = a(ln a − 1) é elementar constatar (faça-o!) que essas três funções são localmente integráveis. Exemplo 31.1 [Distribuições regulares] Se h é uma função localmente integrável, a expressão 〈Th, ϕ〉 ≡ Th(ϕ) := ∫ Rn h(x)ϕ(x) dnx (31.82) para ϕ ∈ D(Rn) define uma distribuição. Distribuições desse tipo são denominadas distribuições regulares. Que (31.82) está bem-definida para todo ϕ ∈ D(Rn) segue do seguinte argumento. Pelo fato de o suporte de ϕ ser compacto podemos restringir a integral de (31.82) a esse suporte. Como ϕ é limitado, segue que ∫ Rn |h(x)| |ϕ(x)| dnx ≤ sup{|ϕ(x)|, x ∈ Rn} ∫ suppϕ |h(x)| dnx, que é finito por hipótese. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1490/1730 Com isso, (31.82) define um funcional linear em D(Rn). Provemos que esse funcional linear é cont́ınuo. Para tal seja ϕk ∈ D(Rn) uma seqüência de funções que converge a ϕ ∈ D(Rn) no sentido de D(Rn). Então existe um compacto K ⊂ Rn tal que supp (ϕ − ϕk) ⊂ K para todo k grande o suficiente e sup{|ϕ(x) − ϕk(x)|, x ∈ Rn} → 0 para k → ∞. Portanto, para todo k grande o suficiente, vale |Th(ϕ− ϕk)| ≤ ∫ Rn |h(x)| |ϕ(x) − ϕk(x)| dnx = ∫ K |h(x)| |ϕ(x) − ϕk(x)| dnx ≤ sup { |ϕ(x) − ϕk(x)|, x ∈ Rn }∫ K |h(x)| dnx . Como a integral do lado direito é finita, conclúımos que |Th(ϕ− ϕk)| → 0 para k → ∞ e isso estabelece que Th é cont́ınua em D(Rn) e, portanto, que é um elemento de D ′(Rn). Como mostra o exemplo de (31.80), nem toda distribuição desse tipo é temperada. ◊ O conjunto de todas as distribuições regulares em Rn será denotado por Dreg(R n): D ′ reg(R n) := { Th ∈ D ′(Rn), com h localmente integrável } . Defina-se também D ′ reg, k(R n) := { Th ∈ D ′(Rn), com h localmente integrável e k-vezes diferenciável } e D ′ reg, ∞(R n) := { Th ∈ D ′(Rn), com h localmente integrável e infinitamente diferenciável } = ∞⋂ k=1 D ′ reg, k(R n) . • Distribuições temperadas regulares Exemplo 31.2 [Distribuições temperadas regulares] Se g é uma função (mensurável) de crescimento polinomial- mente limitado, satisfazendo (31.14) para algum C > 0 e algum m ∈ N0, a expressão 〈Tg, f〉 ≡ Tg(f) := ∫ Rn g(x)f(x) dnx (31.83) para f ∈ S (Rn) define uma distribuição temperada (e, portanto, uma distribuição). Distribuições desse tipo são denominadas distribuições temperadas regulares e empregamos para as mesmas a mesma notação usada na definição das distribuições regulares em (31.82), pois em ambos os casos a distribuição é definida como uma integral de um produto de uma função de teste com uma função conveniente. Que (31.83) está bem-definida para todo f ∈ S (Rn) vê-se pelo seguinte argumento. Escrevemos ∫ Rn |g(x)| |f(x)| dnx (31.14) ≤ C ∫ Rn (1 + ‖x‖)m |f(x)| dnx (31.7) ≤ C‖f‖q, 0 ∫ Rn 1 (1 + ‖x‖)q−m d nx , (31.84) onde, na segunda desigualdade, usamos (31.7) com β = 0. Escolhendo q grande o suficiente (a saber, q ≥ n +m + 1), a integral do lado direito de (31.84) é finita, provando que o lado direito de (31.83) é uma integral absolutamente convergente para todo f ∈ S (Rn). Assim, (31.83) define um funcional linear em S (Rn). Provemos agora que é cont́ınuo em S (Rn). Para tal seja fk ∈ S (Rn) uma seqüência de funções que converge a f ∈ S (Rn) no sentido de S (Rn). Teremos |Tg(f − fk)| ≤ ∫ Rn |g(x)| |f(x) − fk(x)| dnx (31.14) ≤ C ∫ Rn (1 + ‖x‖)m |f(x) − fk(x)| dnx (31.7) ≤ C‖f − fk‖q, 0 ∫ Rn 1 (1 + ‖x‖)q−m d nx , JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1491/1730 onde na segunda desigualdade, usamos (31.7) com β = 0. Novamente escolhendo q grande o suficiente (a saber, q ≥ n +m + 1) a integral do lado direito fica finita e conclúımos que existe uma constante C0, independente de k, tal que |Tg(f − fk)| ≤ C0‖f − fk‖q, 0. Por hipótese, ‖f − fk‖q, 0 → 0 para k → ∞ e isso estabelece que Tg é cont́ınua em S (Rn). ◊ Nessa linha, outro exemplo que será importante no que segue é fornecido pelas funções gn(x) = n√ π e−n 2x2 , (31.85) com n ∈ N. Essas funções são cont́ınuas e limitadas e, portanto, são de crescimento polinomialmente limitado. Então, para cada n ∈ N, 〈Tgn , f〉 ≡ Tgn(f) = ∫ ∞ −∞ gn(x)f(x) dx (31.86) define uma distribuição em S (R). • A distribuição de Heaviside Considere-se a chamada função degrau (também denominada função de Heaviside23): H(x) :=    1, se x ≥ 0 , 0, se x < 0 . (31.87) Como H é mensurável e de crescimento polinomialmente limitada, podemos com ela definir uma distribuição temperada regular, denominada distribuição de Heaviside e denotada por TH , dada por TH(f) := ∫ ∞ −∞ H(x)f(x) dx = ∫ ∞ 0 f(x) dx . (31.88) f ∈ S (R). Teremos diversos encontros com essa distribuição no que segue, mas passemos agora a uma outra distribuição de importância central na teoria das distribuições e suas aplicações. • A distribuição delta de Dirac A distribuição delta de Dirac centrada em x0 ∈ Rn, ou simplesmente distribuição de Dirac centrada em x0 ∈ Rn, denotada por δx0 é definida como sendo a distribuição temperada que a cada f ∈ S (Rn) associa seu valor f(x0) no ponto x0, ou seja, 〈δx0 , f〉 ≡ δx0(f) = f(x0) . (31.89) É óbvio que a δx0 , assim definida, é um funcional linear em S (R n). Que é cont́ınua é facilmente visto pelo seguinte argumento. Se fk é uma seqüência de funções de S (R n) que converge a f ∈ S (Rn) no sentido de S (Rn), então, vale, em particular, que ‖f − fk‖0, 0 → 0 para k → ∞. Logo, |δx0(f − fk)| = |f(x0) − fk(x0)| (31.7) ≤ ‖f − fk‖0, 0 , mostrando que |δx0(f − fk)| → 0 para k → ∞, o que estabelece a continuidade de δx0 em S (Rn). Nota para os estudantes mais avançados. Deve-se observar que a distribuição delta de Dirac, definida acima, e a medida delta de Dirac, definida à página 1107 (vide página 1192 para a integração em relação a essa medida), são objetos matematicamente distintos, mas com efeitos semelhantes. Compare (27.35), página 1193, à definição (31.89), acima. Como veremos em breve, é posśıvel definir derivadas da distribuição delta de Dirac, mas não da medida delta de Dirac. Em compensação, a medida delta de Dirac permite integrar uma classe de funções muito maior que o espaço de Schwartz S (Rn). Vide comentário à página 1193. A restrição da integral sobre a a medida de Dirac a uma classe especial de funções infinitamente diferenciáveis (como S (Rn)) define a distribuição de Dirac. ♣ 23Oliver Heaviside (1850–1925). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1494/1730 falando, não exista para a seqüência de funções gn ele faz sentido para a seqüência de distribuições Tgn , geradas pelas funções gn. As seqüência de funções gn é um exemplo de uma classe de seqüências de funções denominadas seqüências delta de Dirac, a qual é detalhadamente estudada na Seção 30.2, página 1387, cuja leitura recomendamos ao leitor nesse momento. Vide, por exemplo, a Definição 30.1, página 1387. De fundamental importância é o Teorema 30.1, página 1389, sobre a aproximação de funções uniformemente cont́ınuas e limitadas (como as funções de Schwartz) por seqüências de funções produzidas por convolução com seqüências delta de Dirac. Um corolário imediato daquele teorema, e de interesse para a teoria das distribuições é: Corolário 31.2 Se Kn é uma seqüência delta de Dirac em R (vide Definição 30.1, página 1387) de funções polinomi- almente limitadas, TKn define uma distribuição em S (R) (pelo Exemplo 31.2) e para todo f ∈ S (R) vale lim n→∞ TKn(f) = f(0) = δ0(f) , o que permite escrever em S ′(R) δx0 = lim n→∞ TKn ◦ T−x0 = lim n→∞ T ∗ −x0TKn = limn→∞ T(Tx0Kn) , para todo x0 ∈ R. 2 Assim, a distribuição de Dirac δx0 em R pode ser entendida como o limite das distribuições T(Tx0Kn) . Uma afirmação análoga é válida em Rn. 31.3.2 Outros Exemplos de Distribuições Nesta seção apresentaremos alguns exemplos especiais de distribuições, exemplos esses distintos dos apresentados acima. Classes ainda maiores de exemplos surgirão quando tratarmos da noção de derivada de distribuições na Seção 31.3.4, página 1501. 31.3.2.1 A Distribuição Valor Principal • O valor principal de Cauchy de uma integral No espaço Rn, denotamos por B(y, r) a bola aberta de raio r > 0 centrada em y ∈ Rn: B(y, r) := { x ∈ Rn ∣ ∣ ‖x − y‖ < r } , onde ‖x − y‖ = √ (x1 − y1)2 + · · · + (xn − yn)2 é a distância Euclidiana usual em Rn. Denotamos por B(y, r)c conjunto (fechado) complementar a B(y, r), ou seja, Rn \B(y, r). Seja uma função f singular em um ponto y e integrável nos conjuntos B(y, r)c para todo r > 0. Se o limite lim r→0 ∫ B(y, r)c f(x) dnx existir seu valor é dito ser o valor principal de Cauchy da integral ∫ Rn f(x) dnx, e é denotado por VP ∫ Rn f(x) dnx. Assim VP ∫ Rn f(x) dnx := lim r→0 ∫ B(y, r)c f(x) dnx se o limite existir. Dizer que a integral de f existe no sentido de valor principal (de Cauchy) é dizer que o limite acima existe. Na discussão acima assumimos que f tenha apenas um ponto singular, mas não há qualquer dificuldade em estender essa noção para funções com um número finito de singularidades, subtraindo-se da região de integração Rn bolas de raio r centradas nesses pontos e tomando-se o limite r → 0, caso o mesmo exista. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1495/1730 Diversas integrais importantes podem ser definidas no sentido de valor principal. Na Eletrostática, por exemplo, o potencial elétrico de uma distribuição de cargas ρ (suposta cont́ınua e de suporte compacto) é dada por φ(~x) = 1 4πǫ0 ∫ Rn ρ ( ~x′ ) ‖~x− ~x′‖ d 3x′ e a integral do lado direito deve ser entendida no sentido de valor principal, devido à singularidade no integrando em ~x′ = ~x. Vide a discussão sobre a solução da equação de Poisson no Caṕıtulo 16, página 730. No nosso contexto, a noção de valor principal é importante por permitir definir uma distribuição. • A distribuição valor principal de Cauchy Em R define-se a distribuição VP ( 1 x−x0 ) por 〈 VP ( 1 x− x0 ) , ϕ 〉 := VP ∫ R 1 x− x0 ϕ(x) dx (31.99) para toda ϕ ∈ D(R), com x0 ∈ R fixo. Provemos primeiramente que o limite que define o valor principal acima existe de fato e para isso, tomaremos x0 = 0, sem perda de generalidade. Seja A > 0 grande o suficiente para que [−A, A] contenha o suporte de ϕ. Temos, para 0 < r < A, ∫ R\(−r, r) 1 x ϕ(x) dx = ∫ −r −A 1 x ϕ(x) dx+ ∫ A r 1 x ϕ(x) dx = ∫ −r −A ϕ(x) − ϕ(0) x dx+ ∫ A r ϕ(x) − ϕ(0) x dx+ ϕ(0) ( ∫ −r −A 1 x dx+ ∫ A r 1 x dx ) ︸ ︷︷ ︸ = 0 (31.100) Seja F (r) := ∫ A r ϕ(x) − ϕ(0) x dx. Temos que para r > r′ > 0 vale F (r) − F (r′) = ∫ r r′ ϕ(x) − ϕ(0) x dx. Agora, |ϕ(x) − ϕ(0)| = ∣ ∣ ∣ ∣ ∫ x 0 ϕ′(s) ds ∣ ∣ ∣ ∣ ≤ ∫ x 0 |ϕ′(s)| ds ≤ ( sup s∈[0, x] { |ϕ′(s)| } ) |x| ≤ ‖ϕ‖0, 1 |x| (31.101) e, portanto, |F (r) − F (r′)| ≤ ‖ϕn‖0, 1|r− r′| ≤ 2‖ϕn‖0, 1r. Isso mostra que r 7→ F (r) é uma rede de Cauchy e, portanto, converge quando r → 0. Para a integral ∫ −r −A ϕ(x) − ϕ(0) x dx a análise é a mesma. Isso estabelece a existência do valor principal acima. Que (31.99) define um funcional linear em D(R) é evidente. Que (31.99) é cont́ınua em D(R) é provado pelo seguinte argumento. Seja ϕn uma seqüência em D(R) que converge a 0 para n → ∞ e seja A > 0 tal que [−A, A] contém o suporte de todas as funções ϕn (tal existe pela definição de convergência em D(R)). Então, 〈 VP ( 1 x ) , ϕn 〉 = VP ∫ R 1 x ϕn(x) dx (31.100) = lim r→0 [ ∫ −r −A ϕn(x) − ϕn(0) x dx+ ∫ A r ϕn(x) − ϕn(0) x dx ] (31.102) Agora, por (31.101), ∣ ∣ ∣ ∣ ∣ ∫ A r ϕn(x) − ϕn(0) x dx ∣ ∣ ∣ ∣ ∣ ≤ ‖ϕn‖0, 1(A− r) e analogamente para a outra integral. Portanto, ∣ ∣ ∣ ∣ 〈 VP ( 1 x ) , ϕn 〉∣ ∣ ∣ ∣ < 2A‖ϕn‖0, 1 o que prova a continuidade de VP ( 1 x ) , já que ‖ϕn‖0, 1 → 0 para n→ ∞. A distribuição VP ( 1 x−x0 ) pode ser estendida sem dificuldade a S (R), sendo, portanto, uma distribuição temperada. A distribuição VP ( 1 x−x0 ) surgirá novamente adiante, por exemplo, quando calcularmos derivadas de certas distribuições. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1496/1730 • Uma relação útil para a distribuição VP ( 1 x−x0 ) Se ϕ ∈ S (R) podemos escrever, para todo r > 0 ∫ |x−x0|>r ϕ(x) x− x0 dx = ∫ x0−r −∞ ϕ(x) x− x0 dx+ ∫ ∞ x0+r ϕ(x) x− x0 dx = ∫ −r −∞ ϕ(y + x0) y dy + ∫ ∞ r ϕ(y + x0) y dy = ∫ ∞ r ϕ(x0 + y) − ϕ(x0 − y) y dy . Como ϕ é diferenciável, o limite limy→∞ ϕ(x0+y)−ϕ(x0−y) y existe e podemos escrever 〈 VP ( 1 x− x0 ) , ϕ 〉 = ∫ ∞ 0 ϕ(y + x0) − ϕ(−y + x0) y dy (31.103) para todo ϕ ∈ S (R). 31.3.2.2 Distribuições do Tipo Parte Finita de Hadamard • A noção de parte finita de integrais divergentes Seja, como acima, B(r, y) a bola aberta de raio r > 0 centrada em y ∈ Rn e seja B(r, y)c seu conjunto complementar. Suponha que f : Rn → C seja integrável em B(r, y)c para cada r > 0 e suponhamos que para todo r > 0 possamos escrever ∫ B(r, y)c f(x) dnx = D(r) + F (r) , onde lim r→0 F (r) existe e é finito, enquanto que D é divergente para r → 0. Gostaŕıamos de definir a função F , ou mais precisamente o limite lim n→∞ F (r), como a parte finita da integral ∫ Rn f(x) dnx e a função D como sua parte divergente. Uma dificuldade evidente é a de caracterizar univocamente qual a função D e qual a função F na decomposição acima. Em certos casos, se restringirmos as funções D a classes espećıficas de funções divergentes, a separação entre a parte finita e a parte divergente do limite lim r→0 ∫ B(r, y)c f(x) pode ser feita de modo único. No que segue, apresentaremos uma classe de funções com tal propriedade e em seguida mostraremos que com a correspondente definição de parte finita é posśıvel definir uma distribuição. • Uma classe de funções divergentes Para apresentarmos a noção de parte finita de uma integral divergente precisamos da proposição a seguir. Afirmação que a mesma faz pode parecer óbvia, mas a demonstração é um tanto envolvente e é apresentada em detalhe no Apêndice 31.A. Proposição 31.14 Seja R2+ := { (x, y) ∈ R2, x ≥ 0, y ≥ 0 mas (x, y) 6= (0, 0) } . Seja (ak, bk), k = 1, . . . , n, uma coleção finita de n pares distintos de números complexos com ( Re (ak), Re (bk) ) ∈ R2+ para todo k. Suponha que existam constantes c1, . . . , cn ∈ C tais que o limite lim x→0+ ( c1 (lnx)b1 xa1 + · · · + cn (lnx)bn xan ) exista e seja finito: lim x→0+ ( c1 (lnx)b1 xa1 + · · · + cn (lnx)bn xan ) = α ∈ C . (31.104) Então α = 0 e c1 = · · · = cn = 0. 2 A coleção de todas as funções definidas em (0, ∞) que sejam combinações lineares finitas de funções da forma (ln x) b xa com ( Re (a), Re (b) ) ∈ R2+ será denotado aqui por SH . É claro pela definição que SH é um espaço vetorial complexo (e mesmo uma álgebra complexa com respeito ao produto usual de funções). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1499/1730 o que prova que PF ∫ 0 −∞ ϕ(x) x dx = − ∫ 0 −∞ ln |x|ϕ′(x) dx (31.81)= − ∫ ∞ −∞ (ln |x|)− ϕ′(x) dx e, portanto, 〈 PF ( H(−x) x ) , ϕ 〉 = − 〈 (ln |x|)−, ϕ′ 〉 , (31.108) estabelecendo que PF ( H(−x) x ) é, de fato, uma distribuição. As distribuições PF ( H(x) x ) e PF ( H(−x) x ) podem ser estendidas sem dificuldade a S (R), sendo, portanto, distribuições temperadas. * ** * Mais propriedades de distribuições tipo parte finita serão estudadas adiante quanto tratarmos de derivadas de distri- buições. 31.3.3 Algumas Relações Úteis Envolvendo Distribuições No que segue, apresentaremos duas relações envolvendo distribuições as quais são úteis na F́ısica Quântica. • A fórmula de Breit-Wigner Seja, para ǫ > 0 e x0 ∈ R, a função definida por ℓx0, ǫ(x) := 1 π ǫ (x− x0)2 + ǫ2 = i 2π ( 1 (x− x0) + iǫ − 1 (x − x0) − iǫ ) , (31.109) com x ∈ R. Como ℓx0, ǫ é positiva e vale ∫∞ −∞ ℓx0, ǫ(x)dx = 1 (verifique!), a função ℓx0, ǫ define uma distribuição de probabilidades, conhecida como distribuição de Cauchy26 (ou como distribuição de Lorentz27, como distribuição de Cauchy-Lorentz ou ainda como distribuição de Breit28-Wigner29) centrada em x0. Ela é empregada, por exemplo, na teoria do espalhamento (ressonâncias) na Mecânica Quântica e na F́ısica das Part́ıculas. Como ℓx0, ǫ é cont́ınua e limitada, ela também define uma distribuição regular: Tℓx0, ǫ . Desejamos provar que em S ′(R) vale lim ǫ→0 Tℓx0, ǫ = δx0 , (31.110) ou, em termos da notação com funções generalizadas, lim ǫ→0 1 π ǫ (x− x0)2 + ǫ2 = δ(x − x0) . (31.111) A identidade (31.110), especialmente na forma (31.111), é conhecida como fórmula de Breit-Wigner. A demonstração é muito simples. Observemos que que ℓx0, ǫ(x) > 0 para todo x, que ∫∞ −∞ ℓx0, ǫ(x)dx = 1 para todo ǫ > 0 e todo x0 ∈ R e observemos que para todo δ > 0 vale ∫ ∞ x0+δ 1 π ǫ (x− x0)2 + ǫ2 dx = ∫ x0−δ −∞ 1 π ǫ (x− x0)2 + ǫ2 dx = 1 π ( arctan ( δ ǫ ) − π 2 ) , implicando que para todo δ > 0 vale lim ǫ→0 [ ∫ x0−δ −∞ ℓx0, ǫ(x) dx + ∫ ∞ x0+δ ℓx0, ǫ(x) dx ] = 0 . 26Augustin Louis Cauchy (1789–1857). 27Hendrik Antoon Lorentz (1853–1928). 28Gregory Breit (1899–1981). 29Eugene Paul Wigner (1902–1995) JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1500/1730 Pela Definição 30.1, página 1387, conclúımos que ℓx0, ǫ (para ǫ → 0) é uma seqüência delta de Dirac centrada em x0 e, pelo Teorema 30.1, página 1389, conclúımos pela validade de (31.110) e (31.111) em funções do espaço de Schwartz S (R). • A fórmula de Plemelj-Sokhotsky-Weierstrass Para ǫ ∈ R, ǫ > 0, temos 1 π 1 (x − x0) ± iǫ = 1 π (x− x0) (x − x0)2 + ǫ2 ∓ i 1 π ǫ (x − x0)2 + ǫ2 . Logo, se definirmos jx0, ǫ(x) := 1 π 1 (x−x0)±iǫ e κx0, ǫ(x) := 1 π (x−x0) (x−x0)2+ǫ2 , x ∈ R, teremos jx0, ǫ = κx0, ǫ + ℓx0, ǫ com ℓx0, ǫ definido em (31.109) e, assim, Tjx0, ǫ = Tκx0, ǫ ∓ iTℓx0, ǫ . Com a fórmula de Breit-Wigner (31.110) já sabemos que limǫ→0 Tℓx0, ǫ = δx0 . Vamos agora estudar o limite limǫ→0 Tκx0, ǫ . Para ϕ ∈ S (R) temos Tκx0, ǫ(ϕ) = 1 π ∫ ∞ −∞ κx0, ǫ(x)ϕ(x) dx = 1 π ∫ ∞ −∞ (x− x0) (x− x0)2 + ǫ2 ϕ(x) dx = 1 π ∫ ∞ −∞ y y2 + ǫ2 ϕ(y + x0) dy = 1 π ∫ ∞ 0 y2 y2 + ǫ2 ( ϕ(y + y0) − ϕ(−y + x0) y ) dy . (31.112) A função de y dada por ϕ(y+x0)−ϕ(−y+x0)y é integrável, pois ϕ ∈ S (R) e pois limy→0 ϕ(y+x0)−ϕ(−y+x0) y é finito, por ϕ ser diferenciável em x0. Além disso, vale que y2 y2+ǫ2 < 1 para todo y ∈ R. Logo, o integrando do lado direito de (31.112) é majorado pela função integrável ∣ ∣ ∣ ϕ(y+x0)−ϕ(−y+x0) y ∣ ∣ ∣. Aplica-se, portanto, o Teorema da Convergência Dominada, Teorema 27.6, página 1198, que nos permite escrever que lim ǫ→0 Tκx0, ǫ(ϕ) = limǫ→0 1 π ∫ ∞ 0 y2 y2 + ǫ2 ( ϕ(y + x0) − ϕ(−y + x0) y ) dy = 1 π ∫ ∞ 0 [ lim ǫ→0 y2 y2 + ǫ2 ]( ϕ(y + x0) − ϕ(−y + x0) y ) dy = 1 π ∫ ∞ 0 ( ϕ(y + x0) − ϕ(−y + x0) y ) dy (31.103) = 1 π 〈 VP ( 1 x− x0 ) , ϕ 〉 , ou seja, lim ǫ→0 Tκx0, ǫ = 1 π VP ( 1 x− x0 ) . Com isso, provamos que lim ǫ→0 Tjx0, ǫ = 1 π VP ( 1 x− x0 ) ∓ iδx0 . (31.113) Na notação de funções generalizadas isso fica lim ǫ→0 1 π 1 (x− x0) ± iǫ = 1 π VP ( 1 x− x0 ) ∓ iδ(x− x0) . (31.114) As relações (31.113) e (31.114) são denominadas fórmula de Plemelj30-Sokhotsky31-Weierstrass32 (ou outras com- binações de dois ou três desses nomes). 30Josip Plemelj (ou Plemelji) (1873–1967). 31Yulian-Karl Vasilievich Sokhotsky (também grafado como Sochocki ou Sokhatsk) (1842–1927). 32Karl Theodor Wilhelm Weierstrass (1815–1897). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1501/1730 As distribuições definidas pelo limite do lado esquerdo de (31.114) são freqüentemente denotadas como 1π 1 (x−x0)±i0 . Assim, 1 π 1 (x − x0) ± i0 = 1 π VP ( 1 x− x0 ) ∓ iδ(x− x0) . (31.115) A distribuição 1π 1 x±i0 pode também ser descrita de outra forma. Para ǫ > 0 podemos escrever ∫ ∞ 0 eip(±x+iǫ) dp = ± i x± iǫ . Assim, 1 π 1 x± i0 = limǫ→0 ∓i π ∫ ∞ 0 e±ip(x±iǫ) dp , onde a distribuição do lado direito é definida sobre ϕ ∈ D(R) por lim ǫ→0 ∓i π ∫ ∞ 0 (∫ R ϕ(x)e±ip(x±iǫ) dx ) dp = lim ǫ→0 ∓i √ 2 π ∫ ∞ 0 e−pǫF[ϕ](p) dp = ∓i √ 2 π ∫ ∞ 0 F[ϕ](p) dp . A fórmula de Plemelj-Sokhotsky-Weierstrass (31.115) pode ser escrita, portanto, na forma da identidade distribucional ∫ ∞ 0 eip ( ±(x−x0)+i0 ) dp = ±iVP ( 1 x− x0 ) + πδ(x − x0) . (31.116) Essa expressão será reencontrada na forma das expressões (31.129) e (31.130) quando lidarmos com transformadas de Fourier de distribuições. 31.3.4 Derivadas de Distribuições Uma das razões pelas quais definimos distribuições sobre espaços de funções infinitamente diferenciáveis é que isso torna posśıvel definir a noção de derivada de uma distribuição. Exemplos de interesse de derivadas de distribuições serão apresentados na Seção 31.3.4.1, página 1502, e na Seção 31.3.4.2, página 1503. Comecemos a discussão com o caso unidimensional. • Derivadas de distribuições em R Se g é uma função diferenciável de crescimento polinomialmente limitado, cuja derivada tem também crescimento polinomialmente limitado, então, por (31.83), Tg e Tg′ definem distribuições em S (R). Seguindo a filosofia de identificar uma distribuição com a “função generalizada” que a representa (vide discussão à página 1492), podemos interpretar Tg′ como sendo a derivada da distribuição Tg. Notemos agora que para toda f de S (R) vale Tg′(f) = ∫ ∞ −∞ g′(x)f(x) dx = − ∫ ∞ −∞ g(x)f ′(x) dx = −Tg(f ′) (31.117) (a segunda igualdade segue de integração por partes pois, pelas hipóteses, lim x→±∞ g(x)f(x) = 0). Assim, a distribuição associada à derivada g′ de g é precisamente −Tg. Esse fato é a motivação para a seguinte definição. Definição 31.1 Se T ∈ D ′(R) é uma distribuição qualquer, definimos sua derivada T ′ ∈ D ′(R) como sendo a distri- buição dada por T ′(f) := −T (f ′) (31.118) para toda f ∈ D(R). Assim, na notação de emparelhamento, 〈T ′, f〉 = −〈T, f ′〉 e na notação integral, se t(x) é a “função generalizada” que representa T , ∫ ∞ −∞ t′(x) f(x) dx = − ∫ ∞ −∞ t(x) f ′(x) dx . JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1504/1730 Considere-se a distribuição de Heaviside TH definida em (31.88). Vamos mostrar que a derivada de TH coincide com a distribuição δ0. Pela definição, (TH) ′ (f) = −TH(f ′) = − ∫ ∞ −∞ H(x)f ′(x) dx = − ∫ ∞ 0 f ′(x) dx = f(0) − f(∞) = f(0). (31.124) Portanto, para toda f ∈ S (R) tem-se (TH)′ (f) = δ0(f). Isso mostra, fazendo-se uma analogia com (31.117), que a distribuição de Dirac pode ser entendida como a derivada da distribuição associada à função degrau. Assim, apesar de H(x) não ser uma função diferenciável (sua derivada não está definida em x = 0), podemos interpretar sua derivada H ′(x) como uma “função generalizada”, a saber através da relação H ′(x) = δ(x) . Ao notar que H ′ não existe enquanto função mas existe enquanto “função generalizada” o estudante pode apreciar melhor a relevância dessa noção. E. 31.25 Exerćıcio importante. Seja h a função cont́ınua mas não diferenciável (em x = 0) definida por h(x) := |x| + x 2 =    0 , x ≤ 0 , x , x > 0 . Mostre que (Th) ′ = TH (com H definida em (31.87)) e que (Th) ′′ = δ0. Conclua, em termos de “funções generalizadas”, que valem h′(x) = H(x) e h′′(x) = δ(x) . O estudante deve atentar para o fato que a relação h′(x) = H(x) não deve ser entendida como uma igualdade entre funções, mas entre “funções generalizadas”, pois h′ não é uma função, ainda que H o seja. 6 Esse exerćıcio mostra que a distribuição de Dirac é a derivada (distribucional) segunda de uma função cont́ınua e polinomialmente limitada, a saber, da função h. Um teorema mais profundo da Teoria das Distribuições afirma que toda distribuição em S (R) é a derivada de ordem suficientemente grande de uma função cont́ınua e polinomialmente limitada. Vide Teorema 31.3, página 1505 e vide e.g. [152] e [153]. Essa afirmação não é válida para as distribuições em D(R) (ache um contra-exemplo!). • As derivadas das distribuições ln |x|, (lnx)+ e (ln |x|)− Como já observamos, ln |x| é uma função localmente integrável e, portanto, define uma distribuição com 〈 ln |x|, ϕ〉 := ∫ ∞ −∞ ln |x|ϕ(x)dx, o mesmo se dando com as funções (lnx)+ e (ln |x|)− definidas em (31.81). No que segue, vamos calcular as derivadas dessas distribuições e estabelecer que d dx ln |x| = VP ( 1 x ) , d dx (lnx)+ = PF ( H(x) x ) e d dx (ln |x|)− = PF ( H(−x) x ) . (31.125) As duas últimas relações foram estabelecidas em (31.107) e (31.108), respectivamente, de modo que falta-nos apenas demonstrar a primeira. Observemos para tal que 〈 d dx ln |x|, ϕ 〉 = −〈ln |x|, ϕ′〉 = − lim r→0+ {∫ −r −∞ ln |x|ϕ′(x)dx + ∫ ∞ r ln |x|ϕ′(x)dx } = lim r→0+ { ln(r)ϕ(r) − ln(r)ϕ(−r) + ∫ −r −∞ ϕ(x) x dx+ ∫ ∞ r ϕ(x) x dx } . Agora, ln(r)ϕ(r) = ln(r)ϕ(0) + ϕ(r)−ϕ(0)r r ln(r) e, portanto ln(r)ϕ(r) − ln(r)ϕ(−r) = ( ϕ(r) − ϕ(0) r − ϕ(−r) − ϕ(0) r ) r ln(r) . JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1505/1730 Quando r → 0, a expressão ϕ(r)−ϕ(0)r converge a ϕ′(0) e ϕ(−r)−ϕ(0) r converge a −ϕ′(0). No entanto, limr→0 r ln r = 0 e, portanto, lim r→0 ( ln(r)ϕ(r) − ln(r)ϕ(−r) ) = 0 e disso conclúımos que 〈 d dx ln |x| , ϕ 〉 = lim r→0 [∫ −r −∞ ϕ(x) x dx+ ∫ ∞ r ϕ(x) x dx ] = VP ∫ ∞ −∞ ϕ(x) x dx , demonstrando a primeira identidade em (31.125). • As derivadas das distribuições VP ( 1 x ) e PF ( 1 xm ) , m ∈ N Podemos ainda coletar alguns dos resultados anteriores e interpretá-los em termos de derivadas de distribuições. Em (31.105), por exemplo, estabelecemos que ddxPF ( 1 xm−1 ) = −(m− 1)PF ( 1 xm ) para m ∈ N, ou seja, d dx PF ( 1 xm ) = −mPF ( 1 xm+1 ) , m ∈ N . A relação (31.106) pode ser lida como d m−1 dxm−1 VP ( 1 x ) = (−1)m−1(m−1)!PF ( 1 xm ) para todo m ∈ N, ou seja, estabelecemos que dm dxm VP ( 1 x ) = (−1)mm! PF ( 1 xm+1 ) , m ∈ N0 . Junto com a primeira relação em (31.125), isso estabeleceu também que PF ( 1 xm+1 ) = (−1)m m! dm+1 dxm+1 ( ln |x| ) , m ∈ N0 . 31.3.5 Alguns Resultados Estruturais sobre Distribuições Nesta breve seção listaremos alguns resultados importantes sobre a natureza das distribuições e distribuições temperadas. Suas demonstrações serão omitidas na presente versão deste texto por requererem um estudo mais aprofundado de aspectos topológicos que sub-jazem à teoria das distribuições. • Suporte de Distribuições. Suporte singular de distribuições Recordemos que o suporte de uma função f : Rn → C, denotado por supp f ⊂ Rn, é o fecho do conjunto de todos os pontos onde a função não se anula. Para distribuições existe uma noção análoga. Dizemos uma distribuição T ∈ D ′(Rn) anula-se em um aberto Ω ⊂ Rn se T (ϕ) = 0 para toda ϕ ∈ D(Rn) com suppϕ ⊂ Ω. O suporte de uma distribuição T ∈ D ′(Rn), denotado por suppT , é o complemento da união de todos os abertos onde T se anula. É evidente por essa definição que suporte de uma distribuição é um conjunto fechado. Para distribuições temperadas a definição de suporte é idêntica. O suporte da distribuição delta de Dirac centrada em x0, δx0 , é {x0}, como facilmente se constata. O mesmo vale para suas derivadas δ (n) x0 , n ∈ N0. O suporte de uma distribuição regular Th coincide com o suporte de h. Dizemos que duas distribuições T1 e T2 são iguais em um aberto Ω ⊂ Rn se T1 − T2 anula-se em Ω. O suporte singular de uma distribuição T ∈ D ′(Rn), denotado por sing suppT , é o menor fechado de Rn em cujo complemento T é igual a uma distribuição de D ′reg, ∞(R n), ou seja, a uma distribuição regular de uma função infinitamente diferenciável. O suporte singular das distribuições δ (n) x0 coincide com o suporte dessas distribuições, ou seja, é {x0}. O suporte da distribuição VP ( 1 x−x0 ) é R, mas seu suporte singular é {x0}. • Regularidade de distribuições O resultado a seguir informa que toda distribuição temperada é uma derivada (de ordem grande o suficiente) de uma distribuição regular. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1506/1730 Teorema 31.3 Seja T ∈ S ′(Rn). Então existe uma função h definida em Rn, cont́ınua e de crescimento polinomial- mente limitado, e um n-multi-́ındice β ∈ Nn0 tais que T = DβTh, ou seja, T (f) = (−1)|β| ∫ Rn h(x) ( Dβf ) (x) dnx para toda f ∈ S (Rn). 2 Uma demonstração desse teorema pode ser encontrada, por exemplo, em [152] e [153]. Um exemplo notório é δ0, a distribuição delta de Dirac centrada em 0 em R. Vide Exerćıcio E. 31.25, página 1504. O Teorema 31.3 não é válido no caso de distribuições em D ′(Rn), como mostra o exemplo (de [152]) da distribuição T ∈ D ′(R) definida por T := ∞∑ n=−∞ Dnδn = ∞∑ n=−∞ δ(n)(x − n). Justifique! Uma forma “local” do mesmo, porém, é verdadeira: Teorema 31.4 Seja T ∈ D ′(Rn). Então, para cada compacto C ⊂ Rn existe uma função cont́ınua h definida em C e um n-multi-́ındice β ∈ Nn0 (h e β podem depender de C) tais que T (ϕ) = ( DβTh ) (ϕ), para toda função de teste ϕ ∈ D(Rn) com suporte em C, ou seja, T (ϕ) = (−1)|β| ∫ Rn h(x) ( Dβϕ ) (x) dnx (31.126) para toda ϕ ∈ D(Rn) com suppϕ ⊂ C. Um corolário evidente é que para distribuições com suporte compacto as afirmações de acima valem globalmente: se T ∈ D ′(Rn) possuir suporte compacto, então existe uma função cont́ınua h e um n-multi-́ındice β ∈ Nn0 tais que T = DβTh, ou seja vale T (ϕ) = (−1)|β| ∫ Rn h(x) ( Dβϕ ) (x) dnx para toda ϕ ∈ D(Rn). 2 Uma elegante demonstração desse teorema (fazendo uso do Teorema da Representação de Riesz, Teorema 32.9, página 1558) pode ser encontrada em [15]. Uma ilustração de como o Teorema 31.4 é usado pode ser encontrada na demonstração da Proposição 31.16, página 1512. O teorema a seguir pode ser demonstrado a partir do Teorema 31.3. Vide e.g. [15] ou [152]. Teorema 31.5 Seja T ∈ S ′(Rn) uma distribuição temperada cujo suporte é {x0}, para x0 ∈ Rn. Então T é uma combinação linear finita da distribuição δx0 e suas derivadas, ou seja, existem N ∈ N, constantes ck ∈ C, k = 1, . . . , N e inteiros não-negativos distintos nk ∈ N, k = 1, . . . , N com 0 ≤ n1 < · · · < nN , tais que T = N∑ k=1 ck δ (nk) x0 . 2 31.3.6 Transformadas de Fourier de Distribuições Temperadas Seja g ∈ S (Rn) e seja Tg a distribuição temperada definida em (31.83) por Tg(f) ≡ 〈 Tg, f 〉 = ∫ Rn g(x)f(x) dnx. De acordo com (31.52) temos que 〈 Tg, F[f ] 〉 = 〈 TF[g], f 〉 . Essa observação nos induz a definir a noção de transformada de Fourier de uma distribuição temperada seguindo o mesmo tipo de idéia que inspira a definição de derivadas de distribuições. Se T ∈ S ′(Rn) é uma distribuição em Rn, definimos sua transformada de Fourier F[T ] ∈ S ′(Rn) como sendo a distribuição que a cada f ∈ S (Rn) associa 〈 F[T ], f 〉 := 〈 T, F[f ] 〉 . Analogamente, a transformada de Fourier inversa de T ∈ S ′(Rn) é definida por 〈 F−1[T ], f 〉 := 〈 T, F−1[f ] 〉 . Com essas definições F e F−1 passam a ser consideradas como aplicações lineares de S ′(Rn) sobre si mesmo com F−1 sendo a inversa de F. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1509/1730 De (31.129)–(31.130) obtém-se também F [ VP ( 1 x )] = −i √ 2π TH−1/2 e F −1 [ VP ( 1 x )] = i √ 2π TH−1/2 , ou, na notação de funções generalizadas, F [ VP ( 1 x )] (y) = −i √ 2π ( H(y) − 1 2 ) e F−1 [ VP ( 1 x )] (y) = i √ 2π ( H(y) − 1 2 ) , (31.131) ou seja, VP ∫ ∞ −∞ e±iyx x dx = ±πi ( 2H(y) − 1 ) = ±πi sinal(y) . (31.132) Aqui, sinal(y) é o sinal de y ∈ R. Verifique! E. 31.28 Exerćıcio. Obtenha todas as relações de acima. 6 31.3.7 Produtos de Distribuições • Produtos tensoriais de distribuições Dadas duas funções ϕ, ψ ∈ D(Rn) define-se seu produto tensorial34, denotado por ϕ⊗ψ como sendo a função definida em R2n por ( ϕ⊗ ψ ) (x, y) = ϕ(x)ψ(y) . É um exerćıcio elementar (faça-o!) mostrar que ϕ⊗ ψ assim definida é um elemento de D(R2n). A coleção de todas as funções de D(R2n) que sejam combinações lineares finitas de produtos tensoriais de funções de D(Rn) é um subespaço linear de D(R2n) denotado por D(Rn) ⊗ D(Rn), o produto tensorial de D(Rn) consigo mesmo. É relativamente fácil provar usando o Teorema de Weierstrass (Teorema 30.3, página 1393) que D(Rn)⊗D(Rn) é denso em D(R2n), ou seja, toda função de D(R2n) pode ser aproximada por funções na forma de somas finitas ∑ k ϕk(x)ψk(y), com ϕk, ψk ∈ D(Rn) para todo k. Omitiremos a demonstração aqui. Se T, U ∈ D ′(Rn), define-se o produto tensorial T ⊗ U como o funcional linear definido em D(Rn) ⊗ D(Rn) por (T ⊗ U)(ϕ⊗ ψ) = T (ϕ)U(ψ) . Claramente T ⊗ U é cont́ınua em cada um dos seus argumentos separadamente. Como D(Rn) ⊗ D(Rn) é denso em D(R2n), o produto tensorial T ⊗U pode ser estendido a todo D(R2n) e, portanto, define uma distribuição nesse espaço, ou seja, T ⊗U ∈ D ′(R2n). Dessa forma, se t e u denotam as “funções generalizadas” associadas a T e U , respectivamente, é leǵıtimo escrever, na notação integral, (T ⊗ U)(ζ) = ∫ R2n t(x)u(y)ζ(x, y) dnxdny para toda ζ ∈ D(R2n). Assim, a “função generalizada” associada a T ⊗ U é t⊗ u. • Produto de funções e distribuições Ao contrário do caso de funções, o produto de duas distribuições pode ser definido sob circunstâncias bastante restritivas. Vamos discutir brevemente uma dessas circunstâncias atendendo nosso interesse próximo de discutir equações diferenciais distribucionais lineares. Sejam T ∈ D ′(Rn) uma distribuição e h ∈ C∞(Rn) uma função infinitamente diferenciável. Definimos o produto h · T como sendo a distribuição que a cada f ∈ D(Rn) associa ( h · T ) (f) := T (hf) . (31.133) Na notação de emparelhamento isso significa 〈h · T, f〉 := 〈T, hf〉 34No caso dos espaços S (Rn) as definições são análogas. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1510/1730 e na notação integral, se t é a “função generalizada” associada a T e ht é a “função generalizada” associada a h · T , ∫ Rn (ht)(x) f(x) dnx := ∫ Rn t(x) ( h(x)f(x) ) dnx . Assim, a “função generalizada” (ht)(x) é dada simbolicamente por h(x)t(x). E. 31.29 Exerćıcio. Mostre que h · T , definida em (31.133), com T ∈ D ′(Rn) e h ∈ C∞(Rn), é de fato uma distribuição. 6 Se T ∈ S ′(Rn) é uma distribuição temperada, podemos definir analogamente o produto h ·T por ( h ·T ) (f) := T (hf) (para toda f ∈ D(Rn)) desde que h seja infinitamente diferenciável e tenha crescimento polinomialmente limitado. E. 31.30 Exerćıcio. Mostre que h · T assim definida, com T ∈ S ′(Rn) e h ∈ C∞(Rn) com crescimento polinomialmente limitado, é de fato uma distribuição temperada. 6 • A regularização de uma distribuição Para ϕ ∈ D(Rn) e y ∈ Rn, seja ϕy ≡ (Ty(Rϕ)) com Ty definida em (31.94). A função ϕy é tal que ϕy(x) = ϕ(y − x) para todo x ∈ Rn. Naturalmente ϕy é, para cada y ∈ Rn, também um elemento de D(Rn). Se T ∈ D ′(Rn) a aplicação R n ∋ y 7→ T (ϕy) ∈ C define uma função em Rn, a qual é freqüentemente denotada por T ∗ ϕ. Assim, (T ∗ ϕ)(y) := T (ϕy) = T ( Ty(Rϕ) ) = ∫ Rn t(x)ϕ(y − x) dnx , sendo que na última igualdade empregamos a notação em termos de funções generalizadas, t(x) sendo a função genera- lizada associada a T . A função T ∗ ϕ é dita ser a regularização da distribuição T pela função de teste ϕ. É de se notar também que se T é uma distribuição regular, isto é, se T = Th para h localmente integrável, teremos (Th ∗ ϕ)(y) = ∫ Rn h(x)ϕ(y − x) dnx = (h ∗ ϕ)(y) . É também interessante observar que para T ∈ D ′(Rn) e ϕ ∈ D(Rn) tem-se 〈T, ϕ〉 = T (ϕ) = T (ϕ0) = ( T ∗ (Rϕ) ) (0) . (31.134) Para atender a diversos propósitos futuros, vamos estudar algumas propriedades das funções T ∗ ϕ. A primeira delas refere-se à diferenciabilidade de T ∗ ϕ. Proposição 31.15 Para T ∈ D ′(Rn) e ϕ ∈ D(Rn) e com as definições de acima a função T ∗ ϕ é infinitamente diferenciável. Tem-se também Dα(T ∗ ϕ) = ( T ∗ (Dαϕ) ) = ( (DαT ) ∗ ϕ ) (31.135) para todo n-multi-́ındice α. Por fim, vale a afirmação que se T tem suporte compacto, então T ∗ ϕ é um elemento de D(Rn). 2 Prova. Seja z ∈ Rn e considere-se a diferença ϕy+z(x) − ϕy(x) = ϕ(y + z − x) − ϕ(y − x) . JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1511/1730 Podemos escrever, usando a diferenciabilidade de ϕ e denotando ∂ϕ∂xk (x) por (Dkϕ)(x), ϕy+z(x) − ϕy(x) = ∫ 1 0 d dt ϕy+tz(x) dt = ∫ 1 0 d dt ϕ(y + tz − x) dt = n∑ k=1 ∫ 1 0 ( Dkϕ ) (y + tz − x)zk dt = n∑ k=1 ( Dkϕ ) (y − x)zk + n∑ k=1 ∫ 1 0 [( Dkϕ ) (y + tz − x) − ( Dkϕ ) (y − x) ] zk dt , sendo que na última igualdade apenas somamos e subtráımos o termo ∑n k=1 ( Dkϕ ) (y − x)zk. Observemos agora que a função x 7→∑nk=1 ( Dkϕ ) (y − x)zk assim como a função x 7−→ n∑ k=1 ∫ 1 0 [( Dkϕ ) (y + tz − x) − ( Dkϕ ) (y − x) ] zk dt (31.136) são elementos de D(Rn). Para a primeira função a afirmação é evidente; para a segunda necessitamos apenas observar 1o que o lado direito de (31.136) é infinitamente diferenciável em relação a x (pois, sob as hipóteses, podemos diferenciar sob o śımbolo de integral. Vide Proposição 30.5, página 1385) e 2o que o lado direito de (31.136) tem suporte compacto como função de x, pois as funções Dkϕ têm suporte compacto. Assim, é leǵıtimo escrevermos (T ∗ ϕ)(y + z) − (T ∗ ϕ)(y) = 〈T, ϕy+z − ϕy〉 = n∑ k=1 [〈 T, ( Dkϕ ) y 〉 + 〈 T, ∫ 1 0 [( Dkϕ ) y+tz − ( Dkϕ ) y ] dt 〉] zk . Observemos agora que a expressão ∣ ∣ ∣ 〈 T, ∫ 1 0 [( Dkϕ ) y+tz − ( Dkϕ ) y ] dt 〉∣ ∣ ∣ pode ser majorada da seguinte forma: sendo T uma distribuição, existe para cada compacto K ⊂ Rn e todo m ∈ N0 uma constante CK,m tal que ∣ ∣ ∣ ∣ 〈 T, ∫ 1 0 [( Dkϕ ) y+tz − ( Dkϕ ) y ] dt 〉∣ ∣ ∣ ∣ ≤ CK,m sup x∈K, |α|≤m ∣ ∣ ∣ ∣ Dαx ∫ 1 0 [( Dkϕ ) y+tz (x) − ( Dkϕ ) y (x) ] dt ∣ ∣ ∣ ∣ ≤ CK,m sup x∈K, |α|≤m ∫ 1 0 ∣ ∣ ∣ ( DαDkϕ ) (y − x+ tz) − ( DαDkϕ ) (y − x)dt ∣ ∣ ∣ dt . Em função da continuidade uniforme de ϕ e suas derivadas, podemos, para cada ǫ > 0, uma bola Bǫ ⊂ Rn centrada em 0 tal que para todo z ∈ Bǫ (e, conseqüentemente, tz ∈ Bǫ para todo t ∈ [0, 1]) teremos ∣ ∣ ( DαDkϕ ) (y − x + tz) − ( DαDkϕ ) (y − x) ∣ ∣ < ǫ. Com isso, obtemos que (T ∗ ϕ)(y + z) − (T ∗ ϕ)(y) = n∑ k=1 [〈 T, ( Dkϕ ) y 〉] zk + o(ǫ) . o que demonstra que T ∗ ϕ é diferenciável e vale Dk(T ∗ ϕ)(y) = 〈 T, ( Dkϕ ) y 〉 . (31.137) A argumentação de acima pode ser repetida para demonstrar que T ∗ ϕ é diferenciável um número finito arbitrário de vezes, ou seja, é infinitamente diferenciável. Para provarmos (31.135) notemos, por um lado, que 〈 T, ( Dkϕ ) y 〉 = ( T ∗ (Dkϕ) ) (y). Por outro lado, como RDk = −DkR, tem-se também 〈 T, ( Dkϕ ) y 〉 = 〈 T, TyR ( Dkϕ )〉 = − 〈 T, DkTy ( Rϕ )〉 = 〈 DkT, Ty ( Rϕ )〉 = 〈DkT, ϕy〉 = ( (DkT ) ∗ ϕ ) (y) . JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1514/1730 31.3.7.1 Produto de Convolução de Distribuições Vamos agora descrever como o produto de convolução pode ser definido para distribuições dotadas de certas propriedades. Seguindo uma estratégia já empregada antes, começamos considerando certas distribuições regulares adequadas para depois tratarmos de generalizações. • O caso de distribuições regulares Comecemos com uma definição. Dada uma função ϕ : Rn → C, denotamos por E[ϕ] a função definida em Rn ×Rn assumindo valores em C definida por E[ϕ](x, y) := ϕ(x + y). Seja C (Rn), o conjunto das funções cont́ınuas definidas em Rn, e seja C0(R n), o conjunto das funções cont́ınuas e de suporte compacto definidas em Rn. Sejam f1 ∈ C0(Rn) e f2 ∈ C (Rn) e sejam Tf1 e Tf2 as respectivas distribuições regulares. No contexto de distribuições regulares é natural definirmos o produto de convolução Tf1 ∗ Tf2 de Tf1 e Tf2 como sendo o elemento de D ′(Rn) definido por Tf1 ∗ Tf2 := Tf1∗f2 . Teremos, para cada ϕ ∈ D(Rn), 〈 Tf1∗f2 , ϕ 〉 = ∫ Rn ( f1 ∗ f2 ) (x)ϕ(x) dnx = ∫ Rn (∫ Rn f1(x − y)f2(y) dny ) ϕ(x) dnx x→x+y = ∫ Rn ∫ Rn f1(x)f2(y)ϕ(x + y) d nxdny = ∫ Rn ∫ Rn f1(x)f2(y)E[ϕ](x, y) d nxdny . Essa última expressão sugere que podeŕıamos escrever 〈 Tf1∗f2 , ϕ 〉 = 〈 Tf1 ⊗Tf2, E[ϕ] 〉 o que sugere definirmos o produto de convolução Tf1 ∗ Tf2 das distribuições Tf1 e Tf2 por 〈 Tf1 ∗ Tf2 , ϕ 〉 := 〈 Tf1 ⊗ Tf2 , E[ϕ] 〉 . Sucede, porém, que não é posśıvel dar uma interpretação distribucional à integral ∫ Rn ∫ Rn f1(x)f2(y)E[ϕ](x, y) d nxdny, pois E[ϕ], ainda que seja uma função infinitamente diferenciável, não é um elemento de D(Rn ×Rn) (ϕ(x + y) e suas derivadas não caem a zero quando x→ ∞ com x+ y constante). Esse problema pode ser remediado de um modo adequado aos nossos propósitos. O suporte da função f1(x)f2(y)ϕ(x + y) é um subconjunto compacto de Sf1, f2, ϕ := { (x, y) ∈ Rn ×Rn|x ∈ supp (f1), y ∈ supp (f2) e x+ y ∈ supp (ϕ) } . Como f1 e ϕ têm suporte compacto, não é dif́ıcil constatar que Sf1, f2, ϕ é um subconjunto compacto de R n ×Rn. Consideremos uma função auxiliar χ ∈ D(Rn ×Rn) definida de sorte que χ(x, y) = 1 para todos (x, y) contidos no compacto Sf1, f2, ϕ (uma tal função sempre existe, como já observamos anteriormente). Teremos, naturalmente, ∫ Rn ∫ Rn f1(x)f2(y)E[ϕ](x, y) d nxdny = ∫ Rn ∫ Rn f1(x)f2(y)χ(x, y)E[ϕ](x, y) d nxdny e como o produto χE[ϕ] é um elemento de D(Rn × Rn) (pois χ o é e E[ϕ] é infinitamente diferenciável), é leǵıtimo escrevermos 〈 Tf1∗f2 , ϕ 〉 = 〈 Tf1 ⊗ Tf2 , χE[ϕ] 〉 . Com isso, o produto de convolução Tf1 ∗ Tf2 das distribuições Tf1 e Tf2 é o elemento de D ′(Rn) tal que 〈 Tf1 ∗ Tf2 , ϕ 〉 := 〈 Tf1 ⊗ Tf2 , χE[ϕ] 〉 , para cada ϕ ∈ D(Rn). Utilizando essas idéias, vamos agora descrever como definir o produto de convolução de uma certa classe de distribuições. • A condição de suporte Definição. Dizemos que duas distribuições U1, U2 ∈ D ′(Rn) satisfazem a condição de suporte se para todo compacto C ⊂ Rn o conjunto S(U1, U2, C) := { (x, y) ∈ Rn ×Rn ∣ ∣ x ∈ supp (U1), y ∈ supp (U2) e x+ y ∈ C } JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1515/1730 for um subconjunto compacto de Rn ×Rn. Sejam U1, U2 ∈ D ′(Rn) duas distribuições que satisfazem a condição de suporte e seja C ⊂ Rn compacto. Denotamos por S(U1, U2, C) ⊂ D(Rn × Rn) o conjunto de todas as funções χ ∈ D(Rn × Rn) tais que χ(x, y) = 1 para todo (x, y) ∈ S(U1, U2, C). A condição de suporte compacto é importante por garantir que S(U1, U2, C) é não-vazio para todo C ⊂ Rn compacto e, em particular, por garantir que S ( U1, U2, supp (ϕ) ) é não-vazio para cada ϕ ∈ D(Rn). • Produto de convolução de distribuições satisfazendo a condição de suporte Se U1, U2 ∈ D ′(Rn) são duas distribuições que satisfazem a condição de suporte, definimos seu produto de convolução, denotado por U1 ∗ U2, como sendo o elemento de D ′(Rn) definido para cada ϕ ∈ D(Rn) por 〈 U1 ∗ U2, ϕ 〉 := 〈 U1 ⊗ U2, χE[ϕ] 〉 , (31.139) com χ ∈ S ( U1, U2, supp (ϕ) ) . É importante observar que a expressão do lado direito de (31.139) independe do particular elemento χ ∈ S ( U1, U2, supp (ϕ) ) tomado. De fato, se χ e χ′ são elementos de S ( U1, U2, supp (ϕ) ) , teremos ( χ(x, y) − χ′(x, y) ) ϕ(x+ y) = 0 se (x, y) ∈ S ( U1, U2, supp (ϕ) ) . • Algumas condições suficientes para a condição de suporte Dada a relevância da condição de suporte para a definição de produto de convolução de distribuições é importante termos uma lista de condições suficientes para que a mesma seja satisfeita. Observe-se que S(U1, U2, C) é sempre fechado para C compacto, mas não é necessariamente limitado. De fato, se f : Rn × Rn → Rn é a função cont́ınua f(x, y) := x + y, então S(U1, U2, C) = f−1(C) ∩ ( supp (U1) × supp (U2) ) , que é fechado pois f−1(C), supp (U1) e supp (U2) são fechados. Assim, para que tenhamos S(U1, U2, C) compacto é necessário e suficiente que o mesmo seja um conjunto limitado de Rn ×Rn. Se C é compacto, então é limitado e D(C) := sup{‖c‖, c ∈ C} é finito. Se (x, y) ∈ S(U1, U2, C), então (x, y) ∈ supp (U1) × supp (U2) e x+ y = c para algum c ∈ C. Logo, ‖y‖ ≤ ‖c‖ + ‖x‖ ≤ C0 + ‖x‖. Se supp (U1) também for compacto, teremos ‖x‖ ≤ D ( supp (U1) ) ≡ sup{‖x′‖, x′ ∈ supp (U1)} < ∞. Logo ‖y‖ ≤ D(C) +D ( supp (U1) ) o que prova que S(U1, U2, C) é limitado e, portanto, compacto. Conclúımos, portanto, que se supp (U1) ou supp (U2) forem compactos a condição de suporte é satisfeita. No caso de distribuições em R temos uma outra condição útil: se supp (U1) e supp (U2) forem ambos limitados inferiormente ou se forem ambos limitados superiormente, então a condição de suporte é satisfeita. Para provarmos isso, vamos supor que existam a1 e a2 ∈ R tais que supp (U1) ⊂ [a1, ∞) e supp (U2) ⊂ [a2, ∞) (o caso em que ambos são limitados superiormente é análogo). Seja C ⊂ R compacto. Então, existe k > 0 tal que C ⊂ [−k, k]. Se (x, y) ∈ S(U1, U2, C) então −k ≤ x + y ≤ k e, portanto, y ≤ k − x ≤ k − a1. Logo, temos que a2 ≤ y ≤ k − a1 e, mutatis mutantis, temos também a1 ≤ x ≤ k − a2. Isso estabelece que S(U1, U2, C) é limitado e, portanto, compacto. 31.4 Equações Diferenciais Distribucionais, Soluções Funda- mentais e Funções de Green Nesta seção desenvolveremos algumas das idéias subjacentes às noções de solução fundamantal de um operador diferencial, funções de Green etc. Trata-se provavelmente das mais importantes aplicações da noção de distribuição. Algums problemas de interesse f́ısico são também discutidos. Um tratamento mais prático e informal pode ser encontrado na Seção 17.11, página 827. • Operadores diferenciais lineares em D ′(Rn) Reunindo as definições de acima de derivada de uma distribuição e produto de uma distribuição com uma função infinitamente diferenciável, podemos introduzir a noção de operador diferencial linear agindo no espaço de distribuições D ′(Rn) (compare com a definição de operador diferencial linear agindo no espaço D(Rn) introduzida à página 1461). Sejam a1, . . . , aN funções infinitamente diferenciáveis em R n e sejam α1, . . . , αN multi-́ındices distintos. Seja o JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1516/1730 operador diferencial L = N∑ k=1 ak(x)D αk = N∑ k=1 ak(x) ∂|αk| ∂xα11 · · · ∂xαnn . Se T ∈ D ′(Rn), define-se LT ∈ D ′(Rn) como sendo a distribuição definida por ( LT ) (ϕ) := T ( L Tϕ ) , para toda ϕ ∈ D(Rn), onde LT é o operador diferencial dual de L definido em (31.11) e (31.13). É um exerćıcio simples para o leitor provar que essa definição é plenamente consistente com as definições dadas acima de derivada de uma distribuição e produto de uma distribuição com uma função infinitamente diferenciável. Na notação de emparelhamento temos, assim, 〈LT, ϕ〉 = 〈T, LTϕ〉 para toda T ∈ D ′(Rn) e toda ϕ ∈ D(Rn). • Operadores diferenciais lineares em S ′(Rn) Operadores diferenciais lineares em S ′(Rn) são definidos analogamente, com a ressalva, já mencionada quando definimos operadores diferenciais lineares em S (Rn) à página 1462, que as funções ak e suas primeiras |αk| derivadas devem ser de crescimento polinomialmente limitado. • Produtos tensoriais de operadores diferenciais lineares Se L e M são operadores diferenciais lineares agindo em D(Rn) definimos seu produto tensorial L ⊗ M em D(R2n) por ((L ⊗ M) ζ) (x, y) = LxMyζ(x, y) para ζ ∈ D(R2n). No lado direito, acima os ı́ndices x e y sob os operadores L e M, respectivamente, servem apenas para lembrar em relação a quais variáveis os operadores agem. Note-se que LxMy = MyLx. Assim, se L e M são operadores diferenciais lineares agindo em D(Rn) e T, U ∈ D ′(Rn), definimos, (L ⊗ M) (T ⊗U) como sendo a distribuição tal que ( (L ⊗ M) (T ⊗ U) ) (ζ) = (T ⊗ U) ( ( L T ⊗ MT ) ζ ) para toda ζ ∈ D(R2n). A definição de produtos tensoriais de operadores diferenciais lineares agindo em S (Rn) é análoga e não requer maiores comentários. • Equações diferenciais ordinárias distribucionais No caso de uma variável, podemos caracterizar uma equação diferencial distribucional linear de ordem N da seguinte forma. Se a0, a1, . . . , aN são funções infinitamente diferenciáveis de uma variável real e B ∈ D(R) é uma distribuição em R, a expressão aN · ( T (N) ) + aN−1 · ( T (N−1) ) + · · · + a1 · ( T (1) ) + a0 · T = B , (31.140) define uma equação diferencial distribucional para uma distribuição T . De acordo com as definições, se T satisfaz essa equação, então (−1)NT ( (aNf) (N) ) + (−1)N−1T ( (aN−1f) (N−1) ) + · · · + (−1)1T ( (a1f) (1) ) + T ( a0f ) = B(f) para toda f ∈ D(R), ou seja, T ( (−1)N (aNf)(N) + (−1)N−1 (aN−1f)(N−1) + · · · + (−1)1 (a1f)(1) + a0f ) = B(f) , (31.141) JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1519/1730 A existência de soluções fundamentais para operadores diferenciais lineares não é automaticamente garantida e para tal diversos teoremas foram demonstrados, entre os quais encontra-se o importante teorema de Malgrange35-Ehrenpreis36 (demonstrado entre 1954 e 1955), o qual estabelece que operadores diferenciais lineares a coeficientes constantes sempre possuem soluções fundamentais. Vide e.g. [207]. • A questão da unicidade de soluções fundamentais Se para um operador diferencial L, como acima, existir uma solução fundamental F , esta pode não ser única. Se g for localmente integrável e satisfizer (Lg)(x) = 0 para todo x ∈ Rn (ou seja, se g for uma solução forte da equação Lu = 0) valerá LTg = 0 pois, para todo ϕ ∈ D(Rn), (LTg)(ϕ) = Tg(L Tϕ) = ∫ Rn g(x) (LTϕ)(x) dnx (31.12) = ∫ Rn (Lg)(x) ϕ(x) dnx = 0 . Conclúımos disso que se F é uma solução fundamental de L, então qualquer distribuição de D ′(R2n) da forma F + Tg ⊗ V , com V ∈ D ′(Rn), arbitrária, será também uma solução fundamental de L. 31.4.1.1 Soluções Fundamentais como Funções Generalizadas A noção de solução fundamental do operador linear L é talvez mais facilmente explicada em termos da “função genera- lizada” F (x, y), x, y ∈ Rn, associada à distribuição F agindo em D(R2n). F é dita ser uma solução fundamental do operador linear L se LxF (x, y) = δ(x − y) , (31.147) isto é N∑ k=1 ak(x) ∂|αk| ∂xα11 · · · ∂xαnn F (x, y) = δ(x− y) . Assim, para ζ ∈ D(R2n), ∫ R2n ( LxF (x, y) ) ζ(x, y) dnxdny = ∫ Rn ζ(x, x) dnx . (31.148) Em particular, para duas funções de teste quaisquer ϕ, ψ ∈ D(Rn) tem-se ∫ Rn ∫ Rn ( LxF (x, y) ) ϕ(x)ψ(y) dnxdny = ∫ Rn ϕ(x)ψ(x) dnx , (31.149) ou seja, ∫ Rn [∫ Rn ( LxF (x, y) ) ψ(y) dny − ψ(x) ] ϕ(x) dnx = 0 . A validade dessa relação para todo ϕ ∈ D(Rn) implica a validade no sentido de distribuições da igualdade ∫ Rn ( LxF (x, y) ) ψ(y) dny = ψ(x) (31.150) para cada ψ ∈ D(Rn). Também de (31.149), obtemos ∫ Rn ∫ Rn F (x, y) ( L T xϕ(x) ) ψ(y) dnxdny = ∫ Rn ϕ(y)ψ(y) dny , ou seja, ∫ Rn [∫ Rn F (x, y) ( L T xϕ(x) ) dnx− ϕ(y) ] ψ(y) dny = 0 . 35Bernard Malgrange (1928–). 36Leon Ehrenpreis (–). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1520/1730 A validade dessa relação para todo ψ ∈ D(Rn) implica a validade no sentido de distribuições das igualdades ∫ Rn F (x, y) ( L T xϕ(x) ) dnx = ϕ(y) ou, equivalentemente, ∫ Rn ( LxF (x, y) ) ϕ(x) dnx = ϕ(y) , (31.151) para cada ϕ ∈ D(Rn). Comparar cuidadosamente com (31.150). O exemplo do operador Laplaciano em R3 apresentado à página 1522 ilustra bem as diversas relações de acima. • Soluções fracas e soluções fundamentais Se uma função F (x, y), definida para x 6= y, for solução da equação diferencial LxF (x, y) = 0 na região não-diagonal x 6= y (comparar com (31.147). Uma tal solução é denominada solução fraca da equação diferencial em questão), então a função F será uma solução fundamental de Lx se adicionalmente satisfazer a primeira relação de (31.151) para toda ϕ ∈ D(Rn). Um exemplo disso será discutido logo adiante (página 1522), quando tratarmos do operador Laplaciano em R3. • Mais comentários sobre a utilidade das soluções fundamentais. O método da função de Green Já observamos que a noção de solução fundamental de um operador diferencial linear é útil por oferecer soluções distribucionais à equação (31.143)–(31.144). É útil discutirmos isso empregando a notação de função generalizada. Se U ∈ D ′(Rn) satisfaz (31.144), tem-se para todo ϕ ∈ D(Rn) que (LU)(ϕ) = Th(ϕ). Denotando por u(x) a função generalizada associada a U , isso fica ∫ Rn ( (Lu)(x) − h(x) ) ϕ(x) dnx = 0 , e temos no sentido distribucional a igualdade (Lu)(x) = h(x) , (31.152) que corresponde a uma versão distribucional de (31.143). Como vimos em (31.146), podemos tomar U(ϕ) = F (ϕ ⊗ h), igualdade essa que na notação de funções generalizadas fica ∫ Rn u(x)ϕ(x) dnx = ∫ R2n F (x, y)ϕ(x)h(y) dnxdny , ou seja, u(x) = ∫ R2n F (x, y)h(y) dny . Com isso, (31.152) transforma-se em ∫ R2n LxF (x, y)h(y) d ny = h(x) , em concordância com (31.151) e com (31.147). Em resumo, se F (x, y) é a função generalizada associada a uma solução fundamental F do operador diferencial linear L, então a equação não-homogênea Lu = h com h ∈ D(Rn) tem uma solução distribucional dada por u(x) = ∫ R2n F (x, y)h(y) dny . (31.153) O exposto acima re-expressa as considerações que fizemos entre (31.143) e (31.146). Em muitos problemas, exige-se que a solução da equação Lxu(x) = h(x) satisfaça certas condições de contorno (de Dirichlet, de Neumann ou mistas) na fronteira de um domı́nio aberto Ω ⊂ Rn. Soluções fundamentais que conduzem a soluções que satisfaçam condições homogêneas desses tipos são denominadas funções de Green37 (para condições de contorno de Dirichlet, de Neumann ou mistas). O método de resolução de equações diferenciais parciais sob tais condições de contorno através da determinação da função de Green adequada é denominado método da função de Green. O método da função de Green é de grande relevância em F́ısica, como discutido na Seção 17.11, página 827. Também no Caṕıtulo 14, página 670, encontraremos o método da função de Green no tratamento do problema de Sturm-Liouville. Uma questão importante é a de se saber quando o lado direito de de (31.153) define uma função, ou seja, quando u é uma solução forte da equação Lu = h ou, equivalentemente, quando a distribuição U dada em (31.146) é uma distribuição regular. O lado direito de (31.153) definirá uma função se, por exemplo, F (x, y) for uma função definida quase em toda parte, tal como no exemplo do operador Laplaciano, discutido à página 1522. Isso ocorre em diversos exemplos de 37George Green (1793–1841). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1521/1730 interesse, como veremos adiante e em exemplos da Seção 17.11, especialmente quando L for um operador eĺıptico. Uma parte importante da literatura matemática da teoria das equações diferenciais parciais lineares é dedicada a essa questão. Mencionamos nesse contexto os importantes Teoremas de Weyl, de Friedrichs e de Hörmander (vide e.g. [207]). • Uma propriedade de soluções fundamentais Dada uma solução fundamental F ∈ D ′(R2n) de L, podemos obter uma distribuição F0 ∈ D ′(Rn) satisfazendo LF0 = δ0 através do seguinte procedimento. Para ψ ∈ D(Rn) fixo, defina-se Gψ ∈ D ′(Rn) por Gψ(ϕ) = F (ϕ⊗ ψ). Teremos LGψ(ϕ) = Gψ(L Tϕ) = F ( (LTϕ) ⊗ ψ ) = ( (L ⊗ 1)F )(ϕ⊗ ψ) = δ(ϕ⊗ ψ) = Tψ(ϕ) . Assim, tomando-se ψn ∈ D(Rn), n ∈ N, uma seqüência delta de Dirac centrada em 0, podemos definir F0(ϕ) := lim n→∞ Gψn(ϕ) := lim n→∞ F (ϕ⊗ ψn) , e teremos LF0(ϕ) = F0(L Tϕ) = lim n→∞ Gψn(L Tϕ) = lim n→∞ (LGψn)(ϕ) = lim n→∞ Tψn(ϕ) = δ0(ϕ) , mostrando que LF0 = δ0. Como veremos, no caso em que o operador L tem coeficientes constantes, a existência de uma distribuição F0 ∈ D ′(Rn) satisfazendo LF0 = δ0 equivale à existência de uma solução fundamental satisfazendo (31.145). 31.4.1.2 O Caso de Operadores Lineares a Coeficientes Constantes De grande importância para o estudo de muitas das equações diferenciais encontradas na F́ısica é a situação na qual o operador diferencial L considerado tem coeficientes constantes, ou seja, tem-se L = N∑ k=1 akD αk = N∑ k=1 ak ∂|αk| ∂xα11 · · ·∂xαnn e (31.154) L T = N∑ k=1 (−1)|αk| akDαk = N∑ k=1 (−1)|αk| ak ∂|αk| ∂xα11 · · · ∂xαnn ; , (31.155) com ak, k = 1, . . . , N , sendo constantes. Nesse caso vê-se claramente que L = L T se e somente se |αk| for par para todo k = 1, . . . , N . Seja F0 ∈ D ′(Rn) uma distribuição tal que LF0 = δ0 . (31.156) Se uma tal F0 existir podemos definir uma solução fundamental F de L por F (ϕ⊗ ψ) := (2π)n/2F0 ( ϕ ∗ (Rψ) ) . (31.157) para ϕ, ψ ∈ D(Rn), onde (Rφ)(x) := φ(−x), φ ∈ D(Rn). De fato, teremos ( (L ⊗ 1)F )(ϕ⊗ ψ) = F ((LTϕ) ⊗ ψ) = (2π)n/2F0((LTϕ) ∗ (Rψ)) = (2π)n/2F0(LT (ϕ ∗ (Rψ))) = (2π)n/2(LF0) ( ϕ ∗ (Rψ) ) = (2π)n/2δ0 ( ϕ ∗ (Rψ) ) = ∫ Rn ϕ(−y)ψ(−y) dny = ∫ Rn ϕ(y)ψ(y) dny = δ(ϕ ⊗ ψ) , JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1524/1730 E. 31.31 Exerćıcio. Mostre que com (31.162) a função generalizada F0(x) associada à solução fundamental F0 é formal- mente dada por F0(x) = F [ 1 PL ] (x) . (31.163) Com isso, a solução da equação não-homogênea Lu = h fornecida em (31.160) é também dada formalmente por u(x) = ∫ Rn F [ 1 PL ] (x− y)h(y) dny . (31.164) Para certos operadores L é possivel dar sentido matemático a (31.163) e (31.164), como veremos nos exemplos tratados na Seção 31.4.1.3 e, informalmente, na Seção 17.11, página 827. 6 31.4.1.3 Alguns Exemplos Fisicamente Relevantes Vamos agora ilustrar as idéias de acima com alguns exemplos de interesse em F́ısica. Um tratamento mais informal é oferecido na Seção 17.11, página 827. • O exemplo do Laplaciano em R3. A equação de Poisson revisitada Consideremos a equação de Poisson ∆u = h em R3 com h ∈ S (R3). Nesse caso consideramos o operador L = ∆ para o qual temos LT = ∆ = L e cujo polinômio caracteŕıstico associado é P∆(p) = −‖p‖2, com p = (p1, p2, p3) ∈ R3 e com ‖p‖2 = p21 + p22 + p23. Uma solução fundamental F0 para ∆ em R 3 será tal que para toda ϕ ∈ S (R3) teremos ( ∆F0 ) (ϕ) = δ0(ϕ). Assim, como ∆T = ∆, vale F0(∆ϕ) = δ0(ϕ). Tomemos ϕ da forma ϕ = F −1 [ 1 P∆ F[φ] ] , com φ ∈ S (R3). Como ∆F−1 = F−1P∆, segue que δ0(ϕ) = ( ∆F0 ) (ϕ) = F0(∆ϕ) = F0 ( ∆F−1 [ 1 P∆ F[φ] ]) = F0 ( F −1[ F[φ] ]) = F0(φ) . Assim, estabelecemos que uma solução fundamental de ∆ é a distribuição F0 dada por F0(φ) = δ0 ( F −1 [ 1 P∆ F[φ] ]) , φ ∈ S (R3) . (31.165) O lado direito da igualdade em (31.165) é dado por δ0 ( F −1 [ 1 P∆ F[φ] ]) = − 1 (2π)3 ∫ R3 (∫ R3 e−ix·pφ(x) d3x ) 1 ‖p‖2d 3p = − lim R→∞ 1 (2π)3 ∫ ‖p‖<R (∫ R3 e−ix·pφ(x) d3x ) 1 ‖p‖2d 3p = − lim R→∞ 1 (2π)3 ∫ R3 ( ∫ ‖p‖<R e−ix·p ‖p‖2 d 3p ) φ(x) d3x . A inversão da ordem das integrais é novamente permitida pelo Teorema de Fubini (dáı ser necessário limitar a integral em p para a região ‖p‖ < R). Para cada x 6= 0 calculamos a integral em p adotando um sistema de coordenadas esféricas com eixo “z” na direção de x, escrevendo ∫ ‖p‖<R e−ix·p ‖p‖2 d 3p = ∫ π −π ∫ π 0 ∫ R 0 e−ir‖x| cos θdr sen θdθdϕ = 2π ∫ π 0 ∫ R 0 e−ir‖x| cos θdr sen θdθ , sendo r ≡ ‖p‖, ϕ ∈ (−π, π] o ângulo azimutal e θ ∈ [0, π] o ângulo zenital. Agora, ∫ π 0 e−ir‖x| cos θ sen θdθ = 2 sen ( r‖x‖ ) r‖x‖ e ficamos com 4π ∫ R 0 sen ( r‖x‖ ) r‖x‖ dr = 4π ‖x‖ ∫ R 0 sen s s ds. Logo, F0(φ) = − 4π (2π)3 ( lim R→∞ ∫ R 0 sen s s ds ) ∫ R3 φ(x) 1 ‖x‖d 3x . JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1525/1730 Como, sabidamente, lim R→∞ ∫ R 0 sen s s ds = π 2 (isso se prova facilmente pelo método dos reśıduos), conclúımos que uma solução fundamental de ∆ em R3 é a distribuição F0 dada por F0(φ) = − 1 4π ∫ R3 φ(x) 1 ‖x‖d 3x , φ ∈ S (R3) . Na notação de funções generalizadas, a solução fundamental de ∆ em R3 obtida acima é dada por F0(x) := − 1 4π 1 ‖x‖ , x ∈ R 3 . Conforme já comentamos, uma solução fundamental mais geral é obtida adicionando-se a esta uma solução u da equação de Laplace ∆u = 0. Do Teorema 16.1, página 733, aprendemos, porém, que se exigirmos que u e seu gradiente decaiam rapidamente a zero no infinito, então u deverá ser identicamente nula. Com isso, a solução (31.158) de ∆U = Th com h ∈ S (R3) será U(ϕ) = ∫ R3 ( − 1 4π ∫ R3 h(x′) ‖x− x′‖ d 3x′ ) ϕ(x) d3x , ϕ ∈ S (R3), como facilmente se constata, e conclúımos que uma solução da equação de Poisson ∆u = h com h ∈ S (R3) é dada por u(x) = − 1 4π ∫ R3 h(x′) ‖x− x′‖ d 3x′ . Essa solução da equação de Poisson é também obtida com mais generalidade (ou seja, com menos restrições à função h) no Teorema 16.2, página 734. • O exemplo da equação de difusão não-homogênea Consideremos a equação de difusão não-homogênea ( ∂ ∂t −D∆ ) u = h em Rn+1 com h ∈ S (Rn+1). Nesse caso consideramos o operador L = ∂∂t −D∆ para o qual temos LT = − ∂∂t −D∆ e cujo polinômio caracteŕıstico associado é P(p0, p) = −ip0 +D‖p‖2, com p0 ∈ R, p = (p1, . . . , pn) ∈ Rn e com ‖p‖2 = p21 + · · · + p2n. Uma solução fundamental F0 para L será dada por F0(φ) = δ0 ( F−1 [ 1 P F[φ] ]) , φ ∈ S (Rn+1). Assim, tomando y0 ∈ R e y = (y1, . . . , yn) ∈ Rn, teremos F0(φ) = δ0 ( F −1 [ 1 P F[φ] ]) = 1 (2π)n+1 ∫ Rn+1 (∫ Rn+1 e−i(y0p0+y·p)φ(y) dn+1y ) 1 P(p) dn+1p = − 1 (2π)n+1 ∫ Rn+1 (∫ Rn+1 e−i(y0p0+y·p)φ(y) dn+1y ) 1 ip0 −D‖p‖2 dn+1p = − lim R1→∞ lim R2→∞ 1 (2π)n+1 ∫ ‖p‖<R2 ∫ R1 −R1 (∫ Rn+1 e−i(y0p0+y·p)φ(y) dn+1y ) 1 ip0 −D‖p‖2 dp0d np = − lim R1→∞ lim R2→∞ 1 (2π)n+1 ∫ ‖p‖<R2 ∫ Rn+1 ( ∫ R1 −R1 e−iy0p0 ip0 −D‖p‖2 dp0 ) e−iy·pφ(y) dn+1ydnp . Agora, o limite lim R1→∞ ∫ R1 −R1 e−iy0p0 ip0 −D‖p‖2 dp0 pode ser calculado pelo método dos reśıduos, fornecendo lim R1→∞ ∫ R1 −R1 e−iy0p0 ip0 −D‖p‖2 dp0 = 2πH(y0)e −Dy0‖p‖2 , JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1526/1730 com H sendo a função de Heaviside (31.87). Verifique! Assim, F0(φ) = lim R2→∞ 1 (2π)n ∫ ‖p‖<R2 ∫ Rn+1 H(y0)e −Dy0‖p‖2e−iy·pφ(y) dn+1ydnp = 1 (2π)n/2 ∫ Rn+1 ( 1 (2π)n/2 ∫ Rn e−Dy0‖p‖ 2 e−iy·p dnp ) H(y0)φ(y) d n+1y (31.30) = 1 (2π)n/2 ∫ Rn+1  H(y0) e− ‖y‖2 4Dy0 ( 2Dy0 )n/2  φ(y) dn+1y . Assim, na notação de funções generalizadas, a solução fundamental do operador ∂∂t −D∆ é F0(y0, y) = H(y0) e − ‖y‖ 2 4Dy0 √ ( 4πDy0 )n , y0 ∈ R, y ∈ Rn . Por (31.160), uma solução da equação de difusão não-homogênea ( ∂ ∂t −D∆ ) u = h em Rn+1 com h ∈ S (Rn+1) é, portanto, dada por u(t, x) = ∫ Rn+1 F0(t− y0, x− y)h(y0, y) dy0dny = ∫ t −∞ ∫ Rn e − ‖x−y‖ 2 4D(t−y0) √ ( 4πD(t− y0) )n h(y0, y) d nydy0 ; t ∈ R, x ∈ Rn . (31.166) E. 31.32 Exerćıcio. Verifique explicitamente que ( ∂ ∂t −D∆x )  H(t− y0) e − ‖x−y‖ 2 4D(t−y0) √ ( 4πD(t− y0) )n   = δ(t− y0)δ(x − y) . 6 JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1529/1730 ou seja, essa função h tem a si mesma como transformada de Fourier! Sugestões. Observe que h(x) = 2 e βx 1+e2βx . Logo, F[h](y) = 2√ 2π ∫ ∞ −∞ eβx 1 + e2βx e−ixy dx = 1 β √ 2π ∫ ∞ −∞ e( 1 2−i y 2β )s 1 + es ds = 1 β √ 2π ( lim a→∞ Ia ) , onde, para a > 0, Ia := ∫ a −a e( 1 2−i y 2β )s 1 + es ds. Como descreveremos abaixo, o limite lim a→∞ Ia pode ser obtido considerando-se a integral complexa ∮ Ca F (z) dz, onde F (z) := e( 1 2−i y 2β )z 1 + ez e onde Ca é o caminho de integração retangular fechado e orientado no sentido anti-horário indicado na Figura 31.1, página 1529. C 2 π π i i −a a a Figura 31.1: O caminho de integração retangular fechado orientado no sentido anti-horário Ca no plano complexo. Aqui, a > 0 é arbitrário. Constate que a integral no segmento horizontal inferior de Ca é precisamente Ia. Mostre que a integral no segmento horizontal superior de Ca é e πy/βIa. Mostre que as integrais nos segmentos verticais de Ca convergem a zero no limite a→ ∞. Conclua disso que ∫ ∞ −∞ e( 1 2−i y 2β )s 1 + es ds = 1 1 + eπy/β [ lim a→∞ ∮ Ca F (z) dz ] . Agora, a integral ∮ Ca F (z) dz pode ser calculada pelo método dos reśıduos. Observemos para tal que F (z) é da forma F (z) = p(z) q(z) , com p(z) = e( 1 2−i y 2β )z e q(z) = 1 + ez . As funções p e q são funções inteiras (anaĺıticas em toda parte) e q tem zeros somente nos pontos zn = (2n+ 1)πi, n ∈ Z, todos zeros simples (justifique essas afirmações!). Há um único desses zeros no interior do retângulo delimitado pela curva Ca, a saber, o ponto z0 = πi. Sob essas circunstâncias o Teorema dos Reśıduos informa-nos que ∮ Ca F (z) dz independe de a e que vale ∮ Ca F (z) dz = 2πiResF (z0), onde ResF (z0) é o reśıduo de F em z0. Como q tem um zero de ordem um em z0 vale, por uma fórmula bem-conhecida, ResF (z0) = p(z0) q′(z0) (prove-a ou procure-a e.g. em [33]). Calculando o lado direito e reunindo os resultados, obtenha (31.170). 6 JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1530/1730 E. 31.39 Exerćıcio dirigido. Este exerćıcio estende o método empregado no Exerćıcio E. 31.38, página 1528. Para β > 0, constante, seja a função h(x) = 1 ( cosh ( β x ))2 , x ∈ R. Sabemos do Exerćıcio E. 31.1, página 1457, que h ∈ S (R). Mostre que F[h](y) = √ π 2 y β2 senh ( π 2 y β ) . (31.172) Sugestões. Observe que h(x) = 4 e 2βx ( 1+e2βx )2 . Logo, F[h](y) = 4√ 2π ∫ ∞ −∞ e2βx ( 1 + e2βx )2 e −ixy dx = 1 β √ 2 π ∫ ∞ −∞ e(1−i y 2β )s ( 1 + es )2 ds = 1 β √ 2 π ( lim a→∞ Ia ) , onde, para a > 0, Ia := ∫ a −a e(1−i y 2β )s ( 1 + es )2 ds. Como descreveremos abaixo, o limite lima→∞ Ia pode ser obtido considerando-se a integral complexa ∮ Ca F (z) dz, onde F (z) := e(1−i y 2β )z ( 1 + ez )2 e onde Ca é o caminho de integração retangular fechado e orientado no sentido anti-horário indicado na Figura 31.1, página 1529. Constate que a integral no segmento horizontal inferior de Ca é precisamente Ia. Mostre que a integral no segmento horizontal superior de Ca é −eπy/βIa. Mostre que as integrais nos segmentos verticais de Ca convergem a zero no limite a→ ∞. Conclua disso que ∫ ∞ −∞ e(1−i y 2β )s ( 1 + es )2 ds = 1 1 − eπy/β [ lim a→∞ ∮ Ca F (z) dz ] . Agora, a integral ∮ Ca F (z) dz pode ser calculada pelo método dos reśıduos. Observemos para tal que F (z) é da forma F (z) = p(z) q(z) , com p(z) = e(1−i y 2β )z e q(z) = ( 1 + ez )2 . As funções p e q são funções inteiras (anaĺıticas em toda parte) e q tem zeros somente nos pontos zn = (2n+ 1)πi, n ∈ Z, todos zeros duplos (justifique essas afirmações!). Há um único desses zeros no interior do retângulo delimitado pela curva Ca, a saber, o ponto z0 = πi. Sob essas circunstâncias o Teorema dos Reśıduos informa-nos que ∮ Ca F (z) dz independe de a e que vale ∮ Ca F (z) dz = 2πiResF (z0), onde ResF (z0) é o reśıduo de F em z0. Como q tem um zero de ordem dois em z0 vale, por uma fórmula bem-conhecida, ResF (z0) = 2 p′(z0) q′′(z0) − 2 3 p(z0)q ′′′(z0) ( q′′(z0) )2 (prove-a ou procure-a e.g. em [33]). Calculando o lado direito e reunindo os resultados, obtenha (31.172). 6 JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1531/1730 Apêndices 31.A Prova da Proposição 31.14 Esta seção é dedicada à prova da Proposição 31.14, página 1496. Essa demonstração requer alguns lemas preparatórios, com os quais iniciaremos a discussão. Algumas das afirmações que seguem podem ser um tanto óbvias para alguns, mas isso é um tanto ilusório. Por essa razão apresentamos demonstrações detalhadas. O leitor perceberá que algumas das demonstrações adiante seguem passos familiares à teoria das funções “almost”-periódicas (vide, e.g., [105]). • Alguns fatos preparatórios Lema 31.3 Sejam a, b ∈ R. Então vale lim T→∞ 1 T ∫ 2T T ei ( at+b ln t ) dt =    1 , se a = b = 0 , 0 , se a 6= 0 . (31.A.1) Para a = 0 vale 1 T ∫ 2T T eib ln t dt = ( 2eib ln 2 − 1 1 + ib ) eib lnT , (31.A.2) e o limite T → ∞ só existe para b = 0 (e vale 1). Para todo b ∈ R vale, porém, lim sup T→∞ ∣ ∣ ∣ ∣ ∣ 1 T ∫ 2T T eib ln t dt ∣ ∣ ∣ ∣ ∣ > 0. 2 Prova. A afirmativa é evidente para o caso a = b = 0. Seja, agora a 6= 0. Definamos F (T ) := 1 T ∫ 2T T ei ( at+b ln t ) dt. Para t > 0 defina-se a função f(t) := at+ b ln t. Como f ′(t) = a+ bt , f é inverśıvel para todo t grande o suficiente. Adotemos então T grande o suficiente para garantir que f−1(t) exista para todo t ≥ T . Fazendo a mudança de variável s = f(t) podemos escrever F (T ) = 1 T ∫ f(2T ) f(T ) eis 1 f ′(f−1(s)) ds = 1 T ∫ f(2T ) f(T ) eis 1 a+ bf−1(s) ds = 1 aT ∫ f(2T ) f(T ) eis ds− b aT ∫ f(2T ) f(T ) eis 1 af−1(s) + b ds . Assim, ∣ ∣ ∣ ∣ ∣ F (T ) − 1 aT ∫ f(2T ) f(T ) eis ds ∣ ∣ ∣ ∣ ∣ ≤ |b||a|T ∫ f(2T ) f(T ) ∣ ∣ ∣ ∣ 1 af−1(s) + b ∣ ∣ ∣ ∣ ds ≤ |b||a| ( sup s∈[T, ∞) ∣ ∣ ∣ ∣ 1 af−1(s) + b ∣ ∣ ∣ ∣ ) |f(2T ) − f(T )| T ≤ |b||a| ( sup s∈[T, ∞) ∣ ∣ ∣ ∣ 1 af−1(s) + b ∣ ∣ ∣ ∣ ) |a|T + |b| ln 2 T . Como lim t→∞ |f(t)| = ∞ tem-se também lim s→∞ |f−1(s)| = ∞. Assim, lim T→∞ ( sup s∈[T, ∞) ∣ ∣ ∣ ∣ 1 af−1(s) + b ∣ ∣ ∣ ∣ ) = 0. Provou-se assim que lim T→∞ F (T ) = lim T→∞ 1 aT ∫ f(2T ) f(T ) eis ds = lim T→∞ eif(2T ) − eif(T ) iaT = 0 . JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1534/1730 onde c′k ≡ ckeiπbk , ou seja, lim y→∞ n∑ k=1 c′ke i ( Im (ak)y+Im (bk) ln y ) eRe (ak)y+Re (bk) ln y = α . (31.A.4) Seja a relação de ordem em R2+ (vide enunciado da Proposição 31.14) definida da seguinte forma: dizemos que (a, b) ≻ (a′, b′) se a > a′ ou se a = a′ mas b > b′. Isso faz de R2+ um conjunto totalmente ordenado. Vamos supor que( Re (ak0 ), Re (bk0) ) seja o máximo (não necessariamente único) do conjunto {( Re (a1), Re (b1) ) , . . . , ( Re (an), Re (bn) )} ⊂ R2+ segundo a relação de ordem acima. Fatorando eRe (ak0 )y+Re (bk0 ) ln y de (31.A.4) e notando que lim y→∞ eRe (al)y+Re (bl) ln ye−Re (ak0 )y−Re (bk0 ) ln y = 0 caso ( Re (al), Re (bl) ) ≺ ( Re (ak0), Re (bk0) ) obtemos de (31.A.4) que lim y→∞ eRe (ak0 )y+Re (bk0 ) ln y ∑ m∈M c′me i ( Im (am)y+Im (bm) ln y ) = α , (31.A.5) onde M ⊂ {1, . . . , n} é conjunto de todos os ı́ndices m tais que ( Re (am), Re (bm) ) = ( Re (ak0 ), Re (bk0) ) (como k0 ∈M , M é não-vazio). Agora, dos fatos que 1. lim y→∞ eRe (ak0 )y+Re (bk0 ) ln y = ∞, 2. A função ∑ m∈M c′me i ( Im (am)y+Im (bm) ln y ) é limitada no conjunto y > 0, pois ∣ ∣ei(Im (am)y+Im (bm) ln y ∣ ∣ = 1 para todo y > 0. segue pelo Lema 31.7 que ∑ m∈M c′me i ( Im (am)y+Im (bm) ln y ) = 0 para todo y > 0 e que α = 0. Pela definição de M tem-se ( Re (am), Re (bm) ) = ( Re (am′), Re (bm′) ) se m, m′ ∈ M . Assim, como por hipótese, os pares (ak, bk) são todos distintos, segue que ( Im (am), Im (bm) ) 6= ( Im (am′), Im (bm′) ) se m 6= m′, ambos em M . Portanto, pelo Lema 31.6, as funções ei ( Im (am)y+Im (bm) ln y ) , m ∈ M , são linearmente independentes e conclúımos que c′m = 0 para todo m ∈M , o que evidentemente implica cm = 0 para todo m ∈M . A soma em (31.A.4) pode assim ser reduzida ao conjunto complementar de M (que denotamos por M c) e que é um subconjunto próprio de {1, . . . , n}. Logo, obtemos, agora com α = 0, lim y→∞ ∑ k∈Mc c′ke i(Im (ak)y+Im(bk) ln y) eRe (ak)y+Re (bk) ln y = 0 . Repetindo a argumentação de acima um número finito de vezes, conclúımos que os coeficientes ck são nulos para todo k = 1, . . . , n, como queŕıamos provar. 31.B Prova de (31.17) Nesta seção demonstramos a desigualdade (31.17), página 1464, enunciada na proposição que segue. Proposição 31.17 Para todo q grande o suficiente, a saber q > n, vale para todo x ∈ Rn ∫ Rn 1 (1 + ‖x− y‖)2q(1 + ‖y‖)2q d ny ≤ M (1 + ‖x‖)q , onde M > 0 é uma constante que depende de q e de n. Uma posśıvel escolha é M = 2q ∫ Rn ( 1 + ‖y‖ )−q dny. 2. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 31 1535/1730 Prova. Observemos em primeiro lugar que adotando u = x2 e v = x 2 na identidade do paralelogramo, equação (3.29), página 163, obtemos ‖x− y‖2 + ‖y‖2 = 1 2 ‖x‖2 + 2 ∥ ∥ ∥ x 2 − y ∥ ∥ ∥ 2 . (31.B.6) Observemos em segundo lugar que para todo a ≥ 0 vale (1+a)2 = 1+2a+a2 ≥ 1+a2. Assim, (1+‖x−y‖)2(1+‖y‖)2 ≥ (1 + ‖x− y‖2)(1 + ‖y‖2). Portanto, (1 + ‖x− y‖)2(1 + ‖y‖)2 ≥ ( 1 + ‖x− y‖2 )( 1 + ‖y‖2 ) = 1 + ‖x− y‖2 + ‖y‖2 + ‖x− y‖2 ‖y‖2 ≥ 1 + ‖x− y‖2 + ‖y‖2 (31.B.6) = 1 + 1 2 ‖x‖2 + 2 ∥ ∥ ∥ x 2 − y ∥ ∥ ∥ 2 (31.B.7) Logo, ∫ Rn 1 (1 + ‖x− y‖)2q(1 + ‖y‖)2q d ny = ∫ Rn ( 1 (1 + ‖x− y‖)2(1 + ‖y‖)2 )q dny (31.B.7) ≤ ∫ Rn ( 1 1 + 12‖x‖2 + 2 ∥ ∥x 2 − y ∥ ∥ 2 )q dny = ∫ Rn ( 1 1 + 12‖x‖2 + 2 ‖y‖ 2 )q dny , onde na última passagem fizemos a mudança de variáveis y → y + x2 . Agora, 1 + 1 2 ‖x‖2 + 2 ‖y‖2 ≥ 1 + 1 2 ‖x‖2 + 1 2 ‖y‖2 = 1 2 [ ( 1 + ‖x‖2 ) + ( 1 + ‖y‖2 ) ] ≥ 1 4 [ (1 + ‖x‖)2 + (1 + ‖y‖)2 ] ≥ 1 2 (1 + ‖x‖) (1 + ‖y‖) , Acima, na passagem da segunda para a terceira linha usamos o fato que (1+c2) ≥ 12 (1+c)2 para todo c ∈ R, conseqüência de 2(1+ c2)− (1+ c)2 = (c−1)2 ≥ 0. Na passagem da terceira para a quarta linha usamos o fato que para todos a, b ∈ R vale a2 + b2 ≥ 2ab, conseqüência elementar da desigualdade (a− b)2 ≥ 0. Retornando finalmente a (31.B.7), temos ∫ Rn 1 (1 + ‖x− y‖)2q(1 + ‖y‖)2q d ny ≤ ∫ Rn ( 2 ( 1 + ‖x‖ )( 1 + ‖y‖ ) )q dny = 2q ( 1 + ‖x‖ )q ∫ Rn 1 ( 1 + ‖y‖ )q d ny . Para q grande o suficiente (q > n) a integral é finita, provando o que desejávamos. Parte IX Análise Funcional 1536
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