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nc - cap30, Notas de estudo de Física

fisica matematica para fisicos parte 30

Tipologia: Notas de estudo

2010

Compartilhado em 20/09/2010

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Baixe nc - cap30 e outras Notas de estudo em PDF para Física, somente na Docsity! Caṕıtulo 30 Aproximação de Funções. Aproximações Polinomiais e Séries de Fourier Conteúdo 30.1 Noções de Convergência para Seqüências de Funções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1381 30.1.1 Importância da Convergência Uniforme . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1382 30.1.1.1 Troca de Ordem entre Limites e Integrais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1383 30.1.1.2 Troca de Ordem entre Limites e Derivadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1384 30.1.1.3 Troca de Ordem entre Derivadas e Integrais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1385 30.2 Seqüências Delta de Dirac . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1387 30.3 Aproximação de Funções por Polinômios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1393 30.3.1 O Teorema de Weierstrass . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1393 30.3.2 O Teorema de Taylor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1400 30.4 Aproximação de Funções por Polinômios Trigonométricos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1407 30.4.1 Preliminares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1407 30.4.2 A Série de Fourier de Funções Periódicas de Peŕıodo T . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1410 30.4.3 Polinômios Trigonométricos e Funções Cont́ınuas e Periódicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1411 30.4.4 Convergência de Séries de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1416 30.4.4.1 Séries de Fourier em Senos ou Co-Senos para Funções Definidas em Intervalos Compactos1422 30.4.5 Revisitando a Aproximação Uniforme de Funções Cont́ınuas e Periódicas por Polinômios Tri- gonométricos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1426 30.4.6 Séries de Fourier e o Espaço de Hilbert L2([−π, π], dx) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1429 30.5 O Teorema de Stone-Weierstrass . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1431 30.6 Completeza de Algumas Famı́lias de Funções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1435 30.6.1 Completeza de Polinômios Ortogonais em Intervalos Compactos . . . . . . . . . . . . . . . . . 1435 30.6.2 Completeza de Polinômios de Hermite . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1437 30.6.3 Completeza dos Polinômios Trigonométricos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1438 30.7 Exerćıcios Adicionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1442 APÊNDICES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1449 30.A Prova do Teorema de Weierstrass Usando Polinômios de Bernstein . . . . . . . . . . . . 1449 30.B A Demonstração de Weierstrass do Teorema de Weierstrass . . . . . . . . . . . . . . . . . 1453 N a F́ısica e também em diversas áreas da Matemática Aplicada, estamos muitas vezes interessados em resolverproblemas cuja solução não pode ser obtida exatamente. No caso de equações diferenciais, por exemplo, sãomuito raras as situações nas quais uma solução pode ser expressa em termos de funções “elementares”, tais comopolinômios, exponenciais, logaritmos, senos, co-senos ou combinações finitas das mesmas. Na grande maioria dos casos apresentam-se métodos de solução em termos de aproximações que, sob hipóteses adequadas, podem estar tão próximas quanto se queira da solução correta. É, portanto, uma questão importante desenvolver métodos de aproximar funções com certas propriedades e é disso, basicamente, que trataremos neste caṕıtulo. Não pretendemos aqui esgotar o assunto, o que ademais seria imposśıvel, dada a sua extensão, mas tratar de dois tipos fundamentais de aproximações de funções: as aproximações por polinômios e as aproximações por polinômios trigonométricos. Este último tópico é o domı́nio das chamadas séries de Fourier e suporemos que o leitor já possua alguma familiaridade com seus aspectos mais elementares e suas aplicações. Como veremos, aproximações por polinômios e por polinômios trigonométricos são dois assuntos relacionados. Ambos os métodos de aproximação estão também na raiz de muitos outros desenvolvimentos, como na teoria dos espaços de Hilbert, e mesmo em temas mais abstratos, como na Álgebra de Operadores. Sua utilização prática é enorme e ambos os assuntos têm dominado boa parte das aplicações da Matemática a problemas de F́ısica e de Engenharia desde o século XVIII. 1380 JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1381/1730 30.1 Noções de Convergência para Seqüências de Funções Em benef́ıcio do estudante, vamos recordar brevemente na corrente seção algumas das noções e resultados básicos sobre convergência de seqüências de funções definidas em R (ou em sub-conjuntos de R), noções e resultados esses que utilizaremos no que segue. Presumimos que o estudante já tenha sido exposto a esses temas e um tratamento mais detalhado que o nosso pode ser encontrado em quaisquer bons livros de Cálculo ou Análise real. Algumas das noções aqui tratadas são também desenvolvidas com muito mais detalhe no Caṕıtulo 21, página 1003, mas a leitura prévia desse caṕıtulo, ainda que útil, é dispensável para o que segue. Seja D um subconjunto de R. As seguintes noções de convergência são de fundamental importância: a. Convergência pontual. Diz-se que uma seqüência de funções fn : D → C, definidas em D, converge pontualmente a uma função f : D → C se para cada x ∈ D valer lim n→∞ fn(x) = f(x). b. Convergência uniforme. Diz-se que uma seqüência de funções fn : D → C converge uniformemente a uma função f : D → C se lim n→∞ ( sup x∈D |fn(x) − f(x)| ) = 0. Se uma seqüência fn converge pontualmente a uma função f , então f é dita ser o limite pontual da seqüência fn. Se uma seqüência fn converge uniformemente a uma função f , então f é dita ser o limite uniforme da seqüência fn. Além da convergência uniforme e pontual, há diversas outras noções de convergência para seqüências de funções, das quais destacamos as duas seguintes. Sejam a e b ∈ R com −∞ < a < b < ∞. c. Convergência no sentido de L1 ( [a, b], dx ) . Seja fn : [a, b] → C uma seqüência de funções tais que ∫ b a |fn(x)|dx < ∞ para todo n ∈ N. Seja também f : [a, b] → C com ∫ b a |f(x)|dx < ∞. Dizemos que a seqüência fn converge a f no sentido de L1 ( [a, b], dx ) se lim n→∞ ∫ b a |fn(x) − f(x)|dx = 0. d. Convergência no sentido de L2 ( [a, b], dx ) . Seja fn : [a, b] → C uma seqüência de funções tais que ∫ b a |fn(x)|2dx < ∞ para todo n ∈ N. Seja também f : [a, b] → C com ∫ b a |f(x)|2dx < ∞. Dizemos que a seqüência fn converge a f no sentido de L2 ( [a, b], dx ) se lim n→∞ √∫ b a |fn(x) − f(x)|2dx = 0. Definições análogas existem para o caso de seqüências definidas, não em um intervalo finito [a, b], mas em intervalos não-finitos, como a reta real R ou a semi-reta R+. Antes de falarmos sobre a importância da convergência uniforme, apresentemos um critério importante para que se tenha convergência uniforme de séries de funções. • O teste M de Weierstrass Em muitas situações lidamos com séries de funções, ou seja, com seqüências da forma sn(x) = n∑ k=0 fk(x), n ∈ N, onde fk são funções reais definidas em um certo domı́nio comum D ⊂ R. É muito importante nesses casos ter em mãos critérios que permitam saber se a seqüência sn converge uniformemente em D a alguma função. De particular utilidade nesse contexto é um pequeno resultado devido a Weierstrass1, conhecido como teste M de Weierstrass, o qual fornece condições suficientes para a convergência uniforme de uma série: Proposição 30.1 (Teste M de Weierstrass) Seja D ⊂ R, D não-vazio, e seja fn : D → C uma seqüência de funções definidas em D e tais que para cada k exista uma constante Mk ≥ 0 tal que |fk(x)| ≤ Mk para todo x ∈ D. Então, se a 1Karl Theodor Wilhelm Weierstrass (1815–1897). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1384/1730 conhecido é o da seqüência de funções cont́ınuas fn(x) :=    n2x , 0 ≤ x ≤ 1n , −n2x + 2n , 1n ≤ x ≤ 2n , 0 , 2n ≤ x ≤ 1 , (30.3) com n ≥ 2, funções essas definidas no intervalo [0, 1]. Vide Figura 30.1, página 1384. É fácil constatar que para cada x ∈ [0, 1] vale lim n→∞ fn(x) = 0, sendo que esse limite não é uniforme, já que fn(1/n) = n para cada n. Ocorre, porém, que ∫ 1 0 fn(x) dx = 1 para todo n. Logo, lim n→∞ ∫ a b fn(x) dx 6= ∫ a b ( lim n→∞ fn(x) ) dx, pois o lado esquerdo vale 1 e o lado direito vale 0. 0 11/n 2/n n Figura 30.1: Gráfico de uma função fn definida em (30.3). Observe que a área do triângulo vale 1 para todo n. A hipótese feita na Proposição 30.3 de a seqüência fn converge uniformemente em um intervalo compacto também não é gratuita, como mostra o seguinte (contra-)exemplo: Seja fn : R → R a seqüência de funções definidas por fn(x) :=    1 2n , −n ≤ x ≤ n , 0 , de outra forma , (30.4) com n ≥ 1. Então, fn converge uniformemente em toda R à função identicamente nula (justifique!), mas ∫ ∞ −∞ fn(x) dx = 1 para todo n, mostrando que 1 = lim n→∞ (∫ ∞ −∞ fn(x) dx ) 6= ∫ ∞ −∞ ( lim n→∞ fn(x) ) dx = 0. 30.1.1.2 Troca de Ordem entre Limites e Derivadas A Proposição 30.3 tem uma outra conseqüência útil referente à possibilidade de inversão de limites por derivadas. Proposição 30.4 Seja fn : R → C, n ∈ N, uma seqüência de funções cont́ınuas e diferenciáveis com derivadas f ′n também cont́ınuas. Suponhamos que a seqüência fn convirja pontualmente a uma função f : R → C e que a seqüência JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1385/1730 de derivadas f ′n convirja uniformemente em cada intervalo compacto [a, b] ⊂ R a uma função g : R → C. Então, g é cont́ınua e f é diferenciável, com f ′ = g. Assim, em outras palavras, vale, sob as hipóteses de acima, lim n→∞ ( dfn dx (x) ) = d dx ( lim n→∞ fn(x) ) . 2 Prova. A seqüência de funções cont́ınuas f ′n converge uniformemente a g em cada intervalo compacto [a, b] ⊂ R e, assim, pela Proposição 30.2, g é cont́ınua em todos esses intervalos e, portanto, é cont́ınua em todo R. Tomemos um intervalo compacto [a, x] ⊂ R. Como a seqüência de funções cont́ınuas f ′n converge uniformemente nesse intervalo à função g, vale pela Proposição 30.3 que limn→∞ ∫ x a f ′ n(y)dy = ∫ x a g(y)dy. A integral do lado esquerdo é fn(x)−fn(0). Como a seqüência fn converge pontualmente à função f , teremos que limn→∞ ( fn(x)−fn(0) ) = f(x)−f(0). Assim, estabelecemos que ∫ x a g(y)dy = f(x) − f(0). O lado esquerdo é diferenciável em x, a derivada sendo a função cont́ınua g(x) (pelo Teorema Fundamental do Cálculo). Logo, o lado direito é também diferenciável em x e sua derivada é f ′(x). Como isso vale para cada x ∈ R, estabelecemos que f ′ = g. 30.1.1.3 Troca de Ordem entre Derivadas e Integrais Tanto na F́ısica quanto na Matemática em geral, é muito comum encontrarmos situações nas quais temos uma função φ(x, t) sendo integrada na variável x em um certo domı́nio, digamos de −∞ e +∞, resultando em uma função apenas da variável t, e desejarmos calcular a derivada dessa função resultante da integral em relação à variável t, usando para tal a expressão d dt ∫ ∞ −∞ φ(x, t)dx = ∫ ∞ −∞ ∂φ ∂t (x, t)dx, na qual, em um sentido formal, a derivação na variável t é trocada de ordem com a integração em x. Tal troca de ordem é por vezes de grande utilidade em manipulações, por exemplo, na teoria das equações diferenciais ordinárias e parciais. Na proposição que segue apresentaremos condições suficientes para garantir que tal troca seja válida. Proposição 30.5 Seja φ : R × R → C cont́ınua e suponhamos que a derivada parcial ∂φ∂t (x, t) exista para todos (x, t) ∈ R×R e seja igualmente continua. Parte I. Para todo intervalo compacto [a, b] ⊂ R a função de t definida por ∫ b a φ(x, t)dx é diferenciável e vale d dt ∫ b a φ(x, t) dx = ∫ b a ∂φ ∂t (x, t) dx . (30.5) Parte II. Vamos adicionalmente supor que valham as seguintes hipóteses: a. ∫ ∞ −∞ |φ(x, t)|dx existe para todo t ∈ R; b. ∫ ∞ −∞ ∣∣∣∣ ∂φ ∂t (x, t) ∣∣∣∣ dx existe para todo t ∈ R; c. a seqüência de funções Fn(t) := ∫ |x|>n ∣∣∣∣ ∂φ ∂t (x, t) ∣∣∣∣ dx converge quando n → ∞ à função identicamente nula, uni- formemente para t em qualquer intervalo compacto [a, b] ⊂ R. Então, a função de t definida por ∫∞ −∞ φ(x, t)dx é diferenciável e vale d dt ∫ ∞ −∞ φ(x, t) dx = ∫ ∞ −∞ ∂φ ∂t (x, t) dx . (30.6) 2 JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1386/1730 Prova da Parte I. Para evitar confusões na notação, vamos no que segue denotar a derivada parcial ∂φ∂x por φ1 e a derivada parcial ∂φ∂t por φ2. Como φ2(x, t) é cont́ınua, podemos escrever ∫ t 0 (∫ b a φ2(x, τ) dx ) dτ = ∫ b a (∫ t 0 φ2(x, τ) dτ ) dx , trocando a ordem das integrais. Agora, ∫ t 0 φ2(x, τ) dτ = ∫ t 0 ∂φ ∂t (x, τ) dτ = φ(x, t) − φ(x, 0) e o lado direito claramente vale ∫ b a φ(x, t)dx − ∫ b a φ(x, 0)dx. Com isso, estabelecemos que ∫ b a φ(x, t) dx = ∫ t 0 Φ(τ) dτ + C , (30.7) onde Φ(τ) := ∫ b a φ2(x, τ) dx e C := ∫ b a φ(x, 0) dx . Note-se que C é constante, ou seja, independente de t. É importante agora provarmos que Φ : R → C é cont́ınua. Vamos provisoriamente restringir τ ao intervalo compacto [−T, T ] para algum T > 0. Por hipótese, a função φ2(x, τ) é cont́ınua e, portanto, uniformemente cont́ınua no domı́nio compacto [a, b] × [−T, T ] ⊂ R2. Logo, para todo ǫ > 0 existe δ(x) tal que |φ2(x, τ) − φ2(x′, τ ′)| < ǫ sempre que |x − x′| < δ(ǫ) e |τ − τ ′| < δ(ǫ). Em particular, vale que |φ2(x, τ) − φ2(x, τ ′)| < ǫ sempre que |τ − τ ′| < δ(ǫ). Logo, se |τ − τ ′| < δ(ǫ), valerá ∣∣∣Φ(τ) − Φ(τ ′) ∣∣∣ ≤ ∣∣∣∣∣ ∫ b a φ2(x, τ) dx − ∫ b a φ2(x, τ ′) dx ∣∣∣∣∣ ≤ ∫ b a |φ2(x, τ) dx − φ2(x, τ ′)| dx < (b − a)ǫ , o que prova que Φ : [−T, T ] → C é cont́ınua. Como T > 0 é arbitrário, conclúımos que Φ : R → C é cont́ınua, como desejávamos. A continuidade de Φ permite afirmar que ∫ t 0 Φ(τ) dτ é diferenciável como função de t e de (30.7) conclúımos que ∫ b a φ(x, t) dx é também diferenciável como função de t e vale d dt ∫ b a φ(x, t) dx = Φ(t) = ∫ b a ∂φ ∂t (x, t) dx , como queŕıamos estabelecer. Isso termina a prova da Parte I. Prova da Parte II. A hipótese a garante a existência da função f : R → C definida por f(t) := ∫ ∞ −∞ φ(x, t) dx. Para n ∈ N, defina-se também a seqüência de funções fn(t) := ∫ n −n φ(x, t) dx. Se provarmos que fn converge pontualmente a f e que fn é diferenciável e a seqüência de derivadas f ′ n converge uniformemente a ∫ ∞ −∞ ∂φ ∂t (x, t) dx para t em compactos [a, b] (sendo que essa integral existe pela hipótese hipótese b), então poderemos evocar a Proposição 30.4, página 1384 e obter que lim n→∞ ∫ n −n φ(x, t) dx é diferenciável como função de t e que vale d dt ( lim n→∞ ∫ n −n φ(x, t) dx ) = ∫ ∞ −∞ ∂φ ∂t (x, t) dx , ou seja, d dt ∫ ∞ −∞ φ(x, t) dx = ∫ ∞ −∞ ∂φ ∂t (x, t) dx , como desejamos. Provemos então que fn converge pontualmente a f . Tem-se |fn(t) − f(t)| = ∣∣∣ ∫ |x|>n φ(x, t)dx ∣∣∣ ≤ ∫ |x|>n |φ(x, t)| dx. Pela hipótese a, tem-se para cada t que limn→∞ ∫ |x|>n |φ(x, t)| dx = 0 (doutra forma ∫∞ −∞ |φ(x, t)| dx não existiria), provando que para cada t vale limn→∞ |fn(t) − f(t)|, o que diz que fn converge a f pontualmente. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1389/1730 3. Outra seqüência tipo degrau. Esse exemplo difere ligeiramente do anterior. Seja a seqüência 2Kn(x) =    n , se x ∈ ( 0, 1n ) , 0 , de outra forma, com n ∈ N. Todas as propriedades da definição 30.1 são evidentes nesse caso. É interessante notar que, em contraste com os exemplos anteriores, vale para todo x ∈ R que lim n→∞ 2 Kn(x) = 0. 4. Mais uma outra seqüência tipo degrau. Esse exemplo difere ligeiramente do anterior. Seja a seqüência 3Kn(x) =    n , se x ∈ ( 1 n2 , 1 n + 1 n2 ) , 0 , de outra forma, com n ∈ N. Todas as propriedades da definição 30.1 são evidentes nesse caso. É interessante notar que, em contraste com os exemplos anteriores, o ponto x = 0 não faz parte do suporte de 3Kn. Também vale aqui que lim n→∞ 3 Kn(x) = 0 para todo x ∈ R. 5. Seqüências obtidas por re-escalonamento de funções de suporte compacto. Seja ϕ : R → R uma função integrável, cujo suporte seja compacto e tal que ∫∞ −∞ ϕ(s)ds 6= 0. Seja, para cada n ∈ N, 4Kn(x) := n ϕ(nx)∫ ∞ −∞ ϕ(s)ds . É fácil provar que 4Kn satisfaz as propriedades da definição 30.1 (faça!). A propriedade (30.8), por exemplo, é satisfeita com K = (∫∞ −∞ |ϕ(s)|ds )/(∣∣∣ ∫∞ −∞ ϕ(s)ds ∣∣∣ ) , a propriedade (30.9) é evidente pela definição e a propriedade (30.10) segue do fato de o suporte de 4Kn ser compacto, sendo igual ao suporte de ϕ re-escalonado por um fator 1/n (por exemplo, se supp ϕ = [a, b] então supp 4Kn = [a/n, b/n]). Note que 4Kn(0) = nϕ(0) /∫∞ −∞ ϕ(s)ds . Portanto, 4Kn(0) pode ser positivo e ou negativo (ou até mesmo nulo!). Note que o suporte de ϕ não precisa necessariamente conter o ponto x = 0!. Esse exemplo generaliza o das seqüências 1Kn e 2Kn, acima. 6. Seqüências obtidas por re-escalonamento de funções de Schwartz. Seja f : R → R com f ∈ S (R) (para a definição das funções de Schwartz, vide Seção 31.1, página 1456) e tal que ∫∞ −∞ f(s)ds 6= 0. Seja, para cada n ∈ N, 5Kn(x) := n f(nx)∫ ∞ −∞ f(s)ds . É fácil provar que 5Kn satisfaz as propriedades da definição 30.1 (Exerćıcio!). Note que 5Kn(0) = nf(0) /∫∞ −∞ f(s)ds . Portanto, como no caso da seqüência 4Kn, o valor de 5Kn(0) pode ser positivo e ou negativo ou até mesmo nulo. O caso da seqüência Gaussiana gn, acima, é o caso particular onde f(x) = e −x2 ∈ S (R). • Aproximando funções através de seqüências delta de Dirac O fato importante sobre as seqüências delta de Dirac é o seguinte teorema: Teorema 30.1 Seja f : R → C uma função satisfazendo as seguintes condições: 1. f é uniformemente cont́ınua5 em todo R, ou seja, para cada ǫ > 0 existe δ(ǫ) > 0 tal que |f(z)− f(z′)| ≤ ǫ sempre que |z − z′| ≤ δ(ǫ). 5A noção de continuidade uniforme de funções em espaços métricos é tratada com mais detalhe na página 1260 e seguintes. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1390/1730 2. f é limitada em todo R, ou seja, sup{|f(x)|, x ∈ R} < ∞. Seja Kn uma seqüência delta de Dirac centrada em 0 em R. Defina-se, para cada n ∈ N, Fn(x) := ∫ ∞ −∞ Kn(y)f(x − y) dy = ∫ ∞ −∞ Kn(x − y)f(y) dy . Então, a seqüência Fn é uma seqüência de funções uniformemente cont́ınuas e converge uniformemente a f em R: lim n→∞ ‖f − Fn‖∞ = lim n→∞ ( sup x∈R |f(x) − Fn(x)| ) = 0 . 2 Antes de provarmos o teorema, façamos alguns comentários. A condição de continuidade uniforme implica, evidente- mente, a continuidade da função f . Uma condição suficiente para que f seja uniformemente cont́ınua é que f satisfaça a condição de Hölder6: existem constantes C1 > 0 e γ > 0 tais que para todos x e y ∈ R vale |f(x) − f(y)| ≤ C1 |x − y|γ . (30.16) Dela estabelece-se facilmente a continuidade uniforme tomando δ(ǫ) = (C1) −1ǫ 1 γ . É útil mencionar que se f for dife- renciável em todo R e f ′ for limitada, ou seja, sup{|f ′(x)|, x ∈ R} < ∞, então f satisfaz a condição de Hölder (30.16) com γ = 1 (nesse caso, f é dita ser Lipschitz7-cont́ınua). De fato, nesse caso, para x ≥ y, arbitrários, vale |f(x) − f(y)| ≤ ∣∣∣∣ ∫ x y f ′(s) ds ∣∣∣∣ ≤ ∫ x y |f ′(s)| ds ≤ sup { |f ′(s)|, s ∈ R } |x − x′| , desigualdade essa também válida se x ≤ y. Portanto, vale a condição de Hölder (30.16) com γ = 1 e C1 = sup{|f ′(s)|, s ∈ R}. Com isso vemos que as funções do espaço de Schwartz S (R) (vide Seção 31.1, página 1456) satisfazem as hipóteses do Teorema 30.1. Para certas seqüências delta de Dirac espećıficas é posśıvel enfraquecer algumas restrições sobre as funções f menci- onadas no Teorema 30.1, eventualmente com perda da uniformidade da convergência da seqüência Fn à função f . Por exemplo, para a seqüência de funções Gaussianas de (31.85) (que formam uma seqüências delta de Dirac, como veremos mais adiante) a restrição que f seja limitada pode ser substitúıda pela restrição de que f não cresça mais rápido no infinito do que algum polinômio. Nesse caso Fn ainda convergirá (eventualmente de forma não-uniforme) à f . Deixamos a prova dessa afirmação como exerćıcio ao leitor. Prova do Teorema 30.1. Observemos primeiramente que, como f é limitada, definindo C0 := sup{|f(x)|, x ∈ R}, teremos ∣∣∣∣ ∫ ∞ −∞ Kn(y)f(x − y) dy ∣∣∣∣ ≤ ∫ ∞ −∞ |Kn(y)| |f(x − y)| dy ≤ C0 ∫ ∞ −∞ |Kn(y)| dy (30.8) ≤ C0K . Isso mostra que as integrais que definem as funções Fn estão bem definidas. Que cada Fn é uniformemente cont́ınua prova-se da seguinte forma. Usando a continuidade uniforme de f , sabemos que para cada ǫ > 0 existe δ(ǫ) tal que |f(z) − f(z′)| < ǫ sempre que |z − z′| < δ(ǫ). Seja, então ǫ > 0 e x, x′ ∈ R quaisquer tais que |x − x′| < δ(ǫ). Teremos, |Fn(x) − Fn(x′)| = ∣∣∣∣ ∫ ∞ −∞ Kn(y) ( f(x − y) − f(x′ − y) ) dy ∣∣∣∣ ≤ ∫ ∞ −∞ |Kn(y)| ∣∣∣f(x − y) − f(x′ − y) ∣∣∣ dy ≤ ǫ ∫ ∞ −∞ |Kn(y)| dy (30.8) ≤ ǫK , 6Otto Ludwig Hölder (1859–1937). 7Rudolf Otto Sigismund Lipschitz (1832–1903). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1391/1730 pois |(x − y) − (x′ − y)| = |x − x′| < δ(ǫ). Como isso vale para todo ǫ > 0 e δ(ǫ) independe de x, estabeleceu-se a continuidade uniforme de Fn. Vamos agora escrever, usando (30.9), f(x) − Fn(x) = ∫ ∞ −∞ ( f(x) − f(x − y) ) Kn(y) dy . Para cada δ > 0 podemos quebrar a última integral em três intervalos: ∫ −δ −∞ ( f(x) − f(x − y) ) Kn(y) dy + ∫ δ −δ ( f(x) − f(x − y) ) Kn(y) dy + ∫ ∞ δ ( f(x) − f(x − y) ) Kn(y) dy (30.17) e denominaremos essas integrais I, II e III, respectivamente. Comecemos estudando a integral II. Para cada ǫ > 0 teremos pela continuidade uniforme |f(x) − f(x − y)| ≤ ǫ sempre que |y| ≤ δ(ǫ) e, portanto, escolhendo δ = δ(ǫ) ∣∣∣∣∣ ∫ δ −δ ( f(x) − f(x − y) ) Kn(y) dy ∣∣∣∣∣ ≤ ∫ δ −δ ∣∣f(x) − f(x − y) ∣∣ |Kn(y)| dy ≤ ǫ ∫ δ −δ |Kn(y)| dy ≤ ǫ ∫ ∞ −∞ |Kn(y)| dy (30.8) ≤ Kǫ . Passemos agora às integrais I e III. Como f é limitada, vale para a integral I, ∣∣∣∣∣ ∫ −δ −∞ ( f(x) − f(x − y) ) Kn(y) dy ∣∣∣∣∣ ≤ ∫ −δ −∞ ∣∣f(x) − f(x − y) ∣∣ |Kn(y)| dy ≤ 2C0 ∫ −δ −∞ |Kn(y)| dy e, analogamente, para a integral III, ∣∣∣∣ ∫ ∞ δ ( f(x) − f(x − y) ) Kn(y) dy ∣∣∣∣ ≤ 2C0 ∫ ∞ δ |Kn(y)| dy , Logo, por (30.10), podemos obter ∣∣∣∣∣ ∫ −δ −∞ ( f(x) − f(x − y) ) Kn(y) dy + ∫ ∞ δ ( f(x) − f(x − y) ) Kn(y) dy ∣∣∣∣∣ ≤ ǫ escolhendo n grande o suficiente, digamos n > N(ǫ), independente de x. Dessa forma, juntando as estimativas para as integrais I, II e III conclúımos que |f(x) − Fn(x)| ≤ (2 + K)ǫ para n > N(ǫ), independente de x. Logo, ‖f − Fn‖∞ = sup{‖f(x) − Fn(x)‖, x ∈ R} ≤ (2 + K)ǫ para n > N(ǫ). Como isso vale para ǫ > 0 arbitrário a demonstração está completa. E. 30.1 Exerćıcio (fácil). Seja 1Kn a seqüência delta de Dirac definida em (30.15) e seja f(x) = sen (x). Mostre que Fn(x) := ∫ ∞ −∞ 1Kn(x − y) sen (y) dy = n [ cos ( x − 1 2n ) − cos ( x + 1 2n )] (30.69) = sen (x) sen ( 1 2n ) 1 2n . Usando o fato bem-conhecido que limǫ→0 sen ǫ ǫ = 1, mostre explicitamente que essa seqüência de funções Fn converge uniformemente em R à função seno quando n → ∞. 6 • Generalização para mais dimensões As idéias de acima podem ser facilmente estendidas para mais dimensões. Definição 30.2 (Seqüências delta de Dirac em Rm) Uma seqüência de funções Kn : R m → R, n ∈ N, é dita ser uma seqüência delta de Dirac em Rm centrada em 0 ∈ Rm se satisfizer JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1394/1730 O estudante pode interessar-se em saber que os aproximantes de Bernstein para funções cont́ınuas e os polinômios de Bernstein (que definiremos no Apêndice 30.A, página 1449) estão intimamente ligados às curvas de Bézier9 e às splines de Bézier, de ampla aplicação atual em Computação Gráfica (as fontes que produziram as letras que o caro leitor lê neste mesmo momento foram geradas com tais curvas). No Apêndice 30.B, página 1453, apresentamos outra demonstração instrutiva do Teorema 30.3 e que segue as idéias originais de Weierstrass. Também muito interessante é a demonstração encontrada em [61], talvez a mais elementar, e que aparentemente é devida a Lebesgue10. Vide também [207]. Na referência [112] diversas demonstrações do Teorema 30.3 podem ser encontradas. Como discutiremos na Proposição 30.8, página 1416, o Teorema de Weierstrass é equivalente a um outro Teorema importante, o Teorema de Fejér (Teorema 30.9, página 1414), o qual é fundamental para a Teoria das Séries de Fourier e afirma que funções cont́ınuas e periódicas podem ser aproximadas uniformemente por polinômios trigonométricos. Muito importante também é o fato de o Teorema 30.3 poder ser generalizado ainda mais, a saber, de intervalos compactos da reta como [a, b] ⊂ R para subconjuntos compactos da reta (como os conjuntos de Cantor, discutidos na Seção 25.3, página 1133). Esse é o conteúdo do Teorema 30.18, página 1434 o qual é conseqüência do importante Teorema de Stone-Weierstrass, Teorema 30.16, página 1431, que também generaliza fortemente o Teorema 30.3. A Seção 30.5, página 1431, é dedicada ao Teorema de Stone-Weierstrass e suas algumas de suas conseqüências. O Teorema 30.3 também é válido para funções cont́ınuas de várias variáveis. Vide Teorema 30.5, página 1398. No que segue, iremos provar uma forma mais forte do Teorema 30.3, a saber: Teorema 30.4 (Teorema de Weierstrass) Seja f uma função real ou complexa, cont́ınua em um intervalo fechado [a, b] ⊂ R e tal que suas k primeiras derivadas existam e sejam cont́ınuas nesse intervalo. Então, f pode ser aproximada uniformemente por polinômios nesse intervalo e suas k primeiras derivadas podem ser aproximadas uniformemente pelas derivadas desses polinômios, ou seja, para todo ǫ > 0 existe um polinômio pǫ tal que ∥∥∥p(l)ǫ − f (l) ∥∥∥ ∞ = sup x∈[a, b] |p(l)ǫ (x) − f (l)(x)| ≤ ǫ para todo 0 ≤ l ≤ k. 2 Como o leitor pode perceber essa generalização do Teorema 30.3 afirma que não apenas é posśıvel aproximar unifor- memente funções cont́ınuas em intervalos compactos por polinômios mas, no caso de a função ser k vezes diferenciável, é posśıvel encontrar aproximantes polinomiais cujas k primeiras derivadas também aproximam uniformemente as respec- tivas derivadas da função a ser aproximada. Adiante, apresentaremos uma prova do teorema mais geral, Teorema 30.4. Seguiremos muito proximamente a demons- tração apresentada em [40], demonstração essa aparentemente devida a Landau11 mas, para a facilidade do estudante, acrescentaremos alguns detalhes12. Antes de iniciarmos a prova do Teorema 30.4 precisamos fazer um comentário sobre um fato que usaremos a respeito de extensões cont́ınuas de funções. • Certas extensões cont́ınuas de funções Seja f uma função cont́ınua definida em um intervalo fechado limitado [a, b] assumindo valores reais ou complexos e que tenha suas k primeiras derivadas igualmente cont́ınuas nesse intervalo. Seja um intervalo fechado limitado [α, β] que contém [a, b] no seu interior, ou seja, com −∞ < α < a < b < β < ∞. Então, existe pelo menos uma função f̃ definida em [α, β] com as seguintes propriedades: 1. f̃ coincide com f no intervalo [a, b]. 2. f̃ e suas k primeiras derivadas são cont́ınuas em [α, β]. 9Pierre Étienne Bézier (1910–1999). 10Henri Léon Lebesgue (1875–1941). 11Edmund Georg Hermann Landau (1877–1938). 12Nossa prova é também ligeiramente mais precisa que a de [40], pois lá o parâmetro δ (vide abaixo) é tomado na forma 0 < δ < 1 mas, para evitar problemas em certos limites de integração, o correto é tomá-lo como faremos adiante. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1395/1730 3. f̃ e suas k primeiras derivadas anulam-se nos extremos α e β do intervalo [α, β]. A função f̃ é, assim, uma extensão de cont́ınua de f ao intervalo [α, β] cujas k primeiras derivadas são extensões cont́ınuas das respectivas k primeiras derivadas de f ao intervalo [α, β]. Além disso, f̃ e suas k primeiras derivadas anulam-se nos extremos do intervalo [α, β] em que estão definidas. Há infinitas funções f̃ com tais propriedades. Uma maneira de construir uma tal função é escolhê-la de modo que seja idêntica a f no intervalo [a, b], seja infinitamente diferenciável nos intervalos [α, a) e (b, β] mas de modo que limx→a f̃ (l)(x) = f (l)(a) no intervalo [α, a) e limx→b f̃ (l)(x) = f (l)(b) no intervalo (b, β], para todo 0 ≤ l ≤ k. Exemplo 30.1 Uma posśıvel escolha de uma função f̃ com as propriedades acima é a seguinte: f̃(x) =    f(x) , a ≤ x ≤ b ( k∑ l=0 f (k)(a) l! (x − a)l ) Fα, a(x) , α ≤ x < a ( k∑ l=0 f (k)(b) l! (x − b)l ) (1 − Fb, β(x)) , b < x ≤ β , onde, para u < v, a função Fu, v : [u, v] → [0, 1] é definida por Fu, v(x) := 1 Nu, v ∫ x u exp ( − 1 (y − u)2 − 1 (y − v)2 ) dy , u ≤ x ≤ v , Nu, v sendo a constante de normalização Nu, v := ∫ v u exp ( − 1 (y − u)2 − 1 (y − v)2 ) dy . Essa função Fu, v é cont́ınua, estritamente crescente, infinitamente diferenciável no intervalo u < x < v e satisfaz lim x→u Fu, v(x) = 0, lim x→v Fu, v(x) = 1, e lim x→u F (l)u, v(x) = limx→v F (l)u, v(x) = 0, ∀ l ≥ 1 . Com isso, é fácil ver que f̃ satisfaz as propriedades requeridas: é cont́ınua e k-vezes diferenciável em [α, β] e satisfaz f̃(α) = 0 = f̃(β) , f̃ (l)(α) = 0 = f̃ (l)(β) , ∀ l ≥ 1 , f̃ (l)(a) = f (l)(a) e f̃ (l)(b) = f (l)(b) , ∀ 0 ≤ l ≤ k , (30.23) além de, obviamente, ser uma extensão de f . ◊ E. 30.2 Exerćıcio. Verifique as afirmações feitas acima. 6 Para o que segue, a forma espećıfica de f̃ , como aquela do exemplo acima, não será relevante, apenas suas propriedades. • Prova do Teorema de Weierstrass, Teorema 30.4 Daqui por diante, consideraremos sem perda de generalidade que [a, b] ⊂ (0, 1), ou seja, tomamos 0 < a ≤ b < 1, e consideraremos f̃ uma extensão de f a todo o intervalo [0, 1] com as propriedades acima (adotando α = 0 e β = 1). Com uma tal função podemos definir os polinômios pn(x) := 1 2Dn(0) ∫ 1 0 f̃(u) [ 1 − (u − x)2 ]n du (30.24) JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1396/1730 com x ∈ [a, b], onde, para γ ∈ [0, 1], definimos Dn(γ) := ∫ 1 γ [ 1 − v2 ]n dv . A expressão Dn(0) pode ser calculada explicitamente repetindo-se o procedimento de integração por partes (vide (12.87), página 556) e tem-se Dn(0) = (2n)!! (2n + 1)!! , (30.25) mas não faremos uso dessa expressão aqui. Uma outra prova de (30.25), por uma mudança de variáveis e com uso do binômio de Newton, pode ser encontrada em (30.75), página 1414. A seqüência de funções Kn(x) = [ 1 − x2 ]n 2Dn(0) , definidas no intervalo [−1, 1], não forma exatamente uma seqüência delta de Dirac como na Definição 30.1, página 1387, mas a demonstração que segue é muito próxima à do Teorema 30.1, página 1389. Os pn são claramente polinômios de grau menor ou igual a 2n. Como veremos, esses polinômios aproximam f com as propriedades requeridas. Para mostrar isso, fixemos x ∈ [a, b] e comecemos observando que pn(x) = 1 2Dn(0) ∫ 1 0 f̃(u) [ 1 − (u − x)2 ]n du v=u−x = 1 2Dn(0) ∫ 1−x −x f̃(v + x) [ 1 − v2 ]n dv = A1 + A2 + A3 , com A1 := 1 2Dn(0) ∫ −δ −x f̃(v + x) [ 1 − v2 ]n dv, A2 := 1 2Dn(0) ∫ δ −δ f̃(v + x) [ 1 − v2 ]n dv , A3 := 1 2Dn(0) ∫ 1−x δ f̃(v + x) [ 1 − v2 ]n dv , (30.26) onde δ satisfaz 0 < δ < min{a, 1 − b} e será convenientemente fixado mais adiante13. Vamos tratar de estimar cada uma das três expressões Aj acima. Como f̃ é cont́ınua no intervalo [0, 1], seu módulo assume um valor máximo, que denotaremos por F , ou seja, em śımbolos, F := sup x∈[0, 1] ∣∣∣f̃(x) ∣∣∣. Com isso podemos escrever que |A3| ≤ 1 2Dn(0) ∫ 1−x δ |f̃(v + x)| [ 1 − v2 ]n dv ≤ F 2Dn(0) ∫ 1−x δ [ 1 − v2 ]n dv ≤ F 2Dn(0) ∫ 1 δ [ 1 − v2 ]n dv = F Dn(δ) 2Dn(0) , (30.27) onde, na última desigualdade, usamos que 1 − x ≤ 1. De forma totalmente análoga, prova-se que vale também |A1| ≤ F Dn(δ) 2Dn(0) . (30.28) O termo A2 pode ser manipulado da seguinte forma. Usando a identidade 1 = Dn(0) Dn(0) = ∫ δ 0 [ 1 − v2 ]n dv + Dn(δ) Dn(0) = ∫ δ −δ [ 1 − v2 ]n dv + 2Dn(δ) 2Dn(0) , escrevemos A2 := f̃(x) − f̃(x) × 1 + 1 2Dn(0) ∫ δ −δ f̃(v + x) [ 1 − v2 ]n dv = f̃(x) − f̃(x)Dn(δ) Dn(0) + 1 2Dn(0) ∫ δ −δ ( f̃(v + x) − f̃(x) ) [ 1 − v2 ]n dv . 13Como 0 < δ < min{a, 1− b} e x ∈ [a, b], segue que −δ > −x e δ < 1−x. Assim, os três intervalos de integração em (30.26) são crescentes. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1399/1730 e A2 é a mesma integral, mas no conjunto complementar R = ( [−x1, 1 − x1] × [−xm, 1 − xm] ) \ [−δ, δ]m. A integral A1 pode ser majorada por A1 ≤ F ∫ R [ 1 − v21 ]n · · · [ 1 − v2m ]n dv1 · · · dvm 2mDn(0)m , onde F := sup x∈[0, 1]m |f̃(x)|. A integral em R pode ser quebrada como soma de produtos de integrais unidimensionais, algumas da forma ∫ 1−xk −xk [ 1 − v2k ]n dvk 2Dn(0) = ∫ xk 0 [ 1 − v2k ]n dvk + ∫ 1−xk 0 [ 1 − v2k ]n dvk 2Dn(0) ≤ 2 ∫ 1 0 [ 1 − v2k ]n dvk 2Dn(0) = 1 e sempre ocorrerá ao um fator da forma R 1−xk δ [1−v 2 k] n dvk 2Dn(0) ou R −xk −δ [1−v 2 k] n dvk 2Dn(0) as quais podem ser estimadas por Dn(δ)2Dn(0) , como provamos na demonstração do Teorema 30.4, acima (vide (30.27)). Assim, A1 ≤ KF Dn(δ) 2Dn(0) (30.29) ≤ KF (n + 1) ( 1 − δ2 )n sendo K uma constante dependente apenas da dimensão m. O termo A2 pode ser manipulado analogamente à demonstração do Teorema 30.4. A2 = ∫ δ −δ · · · ∫ δ −δ f̃ ( v1 + x1, . . . , vm + xm ) m∏ k=1 [ 1 − v2k ]n dv1 · · ·dvm 2mDn(0)m = f̃ ( x1, . . . , xm )( 1 − Dn(δ) Dn(0) )m + ∫ δ −δ · · · ∫ δ −δ ( f̃ ( v1 + x1, . . . , vm + xm ) − f̃ ( x1, . . . , xm )) m∏ k=1 [ 1 − v2k ]n dv1 · · ·dvm 2mDn(0)m . (30.31) Por (30.29), sabemos que Dn(δ)Dn(0) → 0 para n → ∞ e, portanto, para qualquer ǫ > 0 podemos achar n grande o suficiente para que tenhamos ∣∣∣∣f̃ ( x1, . . . , xm ) − f̃ ( x1, . . . , xm )( 1 − Dn(δ) Dn(0) )m∣∣∣∣ ≤ ǫ . Uma função que seja cont́ınua em um conjunto compacto, como f̃ , é uniformemente cont́ınua nesse intervalo (Teorema 28.12, página 1261). Assim, para cada ǫ > 0 dado podemos encontrar um δ > 0, pequeno o suficiente e independente de x de forma que ∣∣f̃ ( v1 +x1, . . . , vm + xm ) − f̃ ( x1, . . . , xm )∣∣ < ǫ desde que |vk| < δ para todo k. Assim, a integral do lado direito de (30.31) pode ser majorada por ǫ ( 1 − Dn(δ)Dn(0) )m ≤ ǫ. Conclúımos disso que ∣∣∣pn(x1, . . . , xm) − f̃ ( x1, . . . , xm )∣∣∣ ≤ KF (n + 1) ( 1 − δ2 )n + 2ǫ . Como |1 − δ| < 1, isso completa a demonstração de que f é uniformemente aproximável por polinômios. Vamos provar agora que para cada n-multi-́ındice α, com 1 ≤ |α| ≤ K, as derivadas Dαpn também convergem uniformemente às derivadas Dαf quando n → ∞. Notemos que, pela definição de pn, Dαpn(x1, . . . , xm) = ∫ 1 0 · · · ∫ 1 0 f̃(u1, . . . , um)D α x ( n∏ k=1 [ 1 − (uk − xk)2 ]n ) du1 · · · dum 2mDn(0)m JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1400/1730 Agora, devido ao fato de a função [ 1 − (u − x)2 ]n ser simétrica pela troca u ↔ x, vale Dαx n∏ k=1 [ 1 − (uk − xk)2 ]n = (−1)|α|Dαu n∏ k=1 [ 1 − (uk − xk)2 ]n . Assim, Dαpn(x1, . . . , xm) = (−1)|α| 2mDn(0)m ∫ 1 0 · · · ∫ 1 0 f̃(u1, . . . , um)D α u n∏ k=1 [ 1 − (uk − xk)2 ]n du1 · · ·dum . Repetindo-se |α| vezes o processo de integração por partes e usando o fato que f̃ e suas derivadas anulam-se nas fronteiras da integral múltipla acima, obtemos, Dαpn(x1, . . . , xm) = 1 2mDn(0)m ∫ 1 0 · · · ∫ 1 0 ( Dαu f̃ ) (u1, . . . , um) n∏ k=1 [ 1 − (uk − xk)2 ]n du1 · · · dum . Já vimos, porém, que essa igualdade implica que Dαpn converge uniformemente a D αpnf̃ no intervalo [a, b] para n → ∞. Isso completa a prova do Teorema de Weierstrass, Teorema 30.5. 30.3.2 O Teorema de Taylor Nesta seção apresentaremos o Teorema de Taylor, um dos teoremas básicos do Cálculo Diferencial, o qual enuncia condições que permitem aproximar certas funções infinitamente diferenciáveis por séries de potência absoluta e unifor- memente convergentes em intervalos limitados da reta real. Se a função que estamos interessados em aproximar não for infinitamente diferenciável ou não satisfizer as condições enunciadas abaixo, tem-se como alternativa o Teorema de Wei- erstrass, que garante a possibilidade de se obter uma aproximação uniforme por polinômios. O Teorema de Weierstrass é estudado na Seção 30.3.1, página 1393. A demonstração do Teorema de Taylor segue de um simples racioćınio iterativo que ora iniciamos. Seja f : R → C uma função K-vezes diferenciável, com K > 0. Pelo Teorema Fundamental do Cálculo podemos escrever f(x) = f(x0) + ∫ x x0 f ′(s1) ds1 , (30.32) para todos x e x0 ∈ R. Para K > 1 vale também para f ′(s1) a mesma relação f ′(s1) = f ′(x0) + ∫ s1 x0 f ′′(s2) ds2. Dáı, temos f(x) = f(x0) + (x − x0)f ′(x0) + ∫ x x0 (∫ s1 x0 f ′′(s2) ds2 ) ds1 = f(x0) + (x − x0)f ′(x0) + ∫ x x0 (x − t)f ′′(t) dt , (30.33) pois, invertendo a ordem das integrais, ∫ x x0 (∫ s1 x0 f ′′(s2) ds2 ) ds1 = ∫ x x0 f ′′(s2) (∫ x s2 ds1 ) ds2 = ∫ x x0 (x − s2)f ′′(s2) ds2 . Usando indução, esse resultado pode ser generalizado, conduzindo ao seguinte teorema: Teorema 30.6 (Teorema de Taylor) Se f : R → C é uma função K vezes diferenciável (K ≥ 1) em um domı́nio conexo Ω ⊂ R, então para todo N < K vale f(x) = N∑ a=0 (x − x0)a a! f (a)(x0) + ∫ x x0 (x − t)N N ! f (N+1)(t) dt , (30.34) JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1401/1730 para todos x e x0 ∈ Ω. Essa expressão pode ser reescrita na forma f(x) = N∑ a=0 (x − x0)a a! f (a)(x0) + (x − x0)N+1 N ! ∫ 1 0 (1 − s)Nf (N+1) ( x0 + s(x − x0) ) ds . (30.35) As relações (30.34) e (30.35) são denominadas identidades de Taylor. Os polinômios TN [f ](x, x0) = N∑ a=0 (x − x0)a a! f (a)(x0) são denominados polinômios de Taylor de ordem N centrados em x0 da função f e a expressão RN [f ](x, x0) = ∫ x x0 (x − t)N N ! f (N+1)(t) dt = (x − x0)N+1 N ! ∫ 1 0 (1 − s)Nf (N+1) ( x0 + s(x − x0) ) ds é denominada resto da expansão de Taylor de f , ou fórmula do resto da expansão de Taylor de f . Suponhamos agora que f seja infinitamente diferenciável e que exista um intervalo compacto I(x0, β) = [x0 − β , x0 + β], β ≥ 0, tal que existem constantes M ≥ 0, C > 0 e γ com 0 ≤ γ < 1, tais que para todo y ∈ I(x0, β) e todo k ≥ 0 valha ∣∣∣f (k)(y) ∣∣∣ ≤ M Ck ( k! )γ . (30.36) Então, para todo x ∈ I(x0, β) tem-se f(x) = ∞∑ a=0 (x − x0)a a! f (a)(x0) , (30.37) sendo que a série do lado direito converge absoluta e uniformemente em I(x0, β). A série (30.37) é denominada série de Taylor real de f centrada em x0. 2 As origens do Teorema 30.6 remontam aos trabalhos de Taylor14 nos primórdios do Cálculo Diferencial e Integral. Taylor descobriu a série que leva seu nome entre 1712 e 1715, mas a importância desse resultado só foi reconhecida por Lagrange15 em 1772. A expressão “série de Taylor” para designar a expansão (30.37) data de 1786, tendo sido cunhada por Lhuilier16. Séries de Taylor para funções espećıficas (como a função arco-tangente) eram conhecidas antes de Taylor. Sua contribuição foi a de ter encontrado uma expansão válida para uma grande classe de funções. Taylor, um disćıpulo de Newton17, inventou também o método de integração por partes, entre outras contribuições seminais. Prova do Teorema 30.6. Já provamos essa afirmação para K = 1 (relação (30.32)) e para o caso K > 1 já tratamos o caso N = 0 e N = 1 (relações (30.33) e (30.32)). Para efetuarmos a prova por indução, suponhamos que a relação f(x) = M∑ a=0 (x − x0)a a! f (a)(x0) + ∫ x x0 (x − s1)M M ! f (M+1)(s1) ds1 14Brook Taylor (1685–1731). 15Joseph-Louis Lagrange (1736–1813). 16Simon Antoine Jean Lhuilier (1750–1840). 17Isaac Newton (1643–1727). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1404/1730 onde as funções Fk são infinitamente diferenciáveis. 2 Prova. Como f(y1, . . . , yn) = 0, vale f(x1, . . . , xn) = [ f(x1, . . . , xn) − f(y1, x2, . . . , xn) ] + [ f(y1, x2, . . . , xn) − f(y1, y2, x3, . . . , xn) ] + · · · + [ f(y1, . . . , yn−1, xn) − f(y1, . . . , yn) ] , (30.39) ou seja, f(x1, . . . , xn) = n∑ k=1 [ f(y1, . . . , yk−1, xk, . . . xn) − f(y1, . . . , yk, xk+1, . . . xn) ] . (30.40) Para cada k = 1, . . . , n a função f(y1, . . . , yk−1, xk, . . . xn)−f(y1, . . . , yk, xk+1, . . . xn) é infinitamente diferenciável como função de xk e anula-se em xk = yk. Portanto, pelo Corolário 30.1, podemos escrevê-la na forma f(y1, . . . , yk−1, xk, . . . xn) − f(y1, . . . , yk, xk+1, . . . xn) = (xk − yk)Fk(xk, . . . , xn) , (30.41) onde Fk é uma função infinitamente diferenciável de xk. Como o lado esquerdo é uma função infinitamente diferenciável das demais variáveis, Fk também o será. Logo, (30.38) segue de (30.40) e de (30.41). • O Teorema de Taylor e o de Weierstrass Os seguintes comentários sobre a relação entre as afirmativas do Teorema de Weierstrass e do Teorema de Taylor são de interesse para o estudante. Ambos os teoremas estabelecem condições para que uma função possa ser uniformemente aproximada por polinômios em intervalos compactos. As hipótese do Teorema de Weierstrass são, porém, mais fracas, pois nele requer-se apenas que a função a ser aproximada seja cont́ınua, enquanto que no Teorema de Taylor requer-se que a função seja cont́ınua e infinitamente diferenciável. Assim, o Teorema de Weierstrass garante, por exemplo, a possibilidade de se aproximar a função f(x) = ∣∣x − 12 ∣∣ por polinômios uniformemente no intervalo [0, 1], por exemplo, pelos polinômios de Bernstein (vide (30.22)) n∑ p=0 ∣∣∣∣ p n − 1 2 ∣∣∣∣ ( n p ) xp(1 − x)n−p . (30.42) Essa função f , contudo, não possui uma expansão de Taylor centrada em x0 = 1/2 (pois não é diferenciável nesse ponto) nem outra expansão de Taylor centrada em outro ponto do mesmo intervalo [0, 1] convergirá à função em todo intervalo (a expansão de Taylor de |x−1/2| centrada em, digamos, x0 = 3/4 é 1/4+(x−3/4) = x−1/2, que só é igual a |x−1/2| para x ≥ 1/2). Uma diferença notável entre os polinômios de Taylor e os polinômios aproximantes cuja existência o Teorema de Weierstrass garante, é que os coeficientes dos primeiros são fixos, não dependendo do grau do polinômio aproximante. O k-ésimo coeficiente do polinômio de Taylor de grau N centrado em x0 = 0 de uma função f é f (k)(0) k! , que não depende do grau N do polinômio. Já os coeficientes dos polinômios aproximantes de Bernstein (30.22) ou dos polinômios aproximantes de Landau (30.24) dependem em geral de k e de N . O k-ésimo coeficiente do polinômio (30.22), por exemplo, que aproxima uma função f no intervalo [0, 1], é dado por ∑k p=0(−1)k−pf ( p N ) ( N p )( N−p N−k ) e depende de k e de N . Dessa forma, quando desejamos melhorar a aproximação de uma função através de seu polinômio de Taylor só precisamos acrescentar mais termos ao mesmo, aumentando seu grau mas sem alterar os coeficientes já utilizados. Em contraste, se quisermos melhorar a aproximação de uma função usando os polinômios aproximantes cuja existência é garantida pelo Teorema de Weierstrass devemos aumentar o grau do polinômio e eventualmente modificar todos os coeficientes do mesmo. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1405/1730 Comentamos, por fim, que o polinômio de Taylor, ou mesmo os polinômios de Bernstein ou de Landau, nem sempre produzem o melhor aproximante polinomial uniforme de uma função f (cont́ınua e infinitamente diferenciável) em um intervalo compacto. A existência de um melhor aproximante uniforme polinomial único em um intervalo compacto de uma função cont́ınua f é um teorema devido a Haar18 (vide [44], [192], [169] ou [134]) mas, infelizmente, não há uma fórmula fechada conhecida que o determine. • O Teorema de Taylor em várias variáveis Se g : Rn → C é uma função de n variáveis reais, K-vezes diferenciável em um certo domı́nio Ω ⊂ Rn, podemos obter o análogo do Teorema de Taylor através do seguinte procedimento. Seja f : R → C definida por f(t) := g(y + th), com y, h ∈ Rn de modo que y e x ≡ y + h pertencem a algum aberto convexo Ω0 ⊂ Ω (a convexidade é necessária para que se possa garantir que y + th pertença a Ω0 para todo t ∈ [0, 1]). Para a a-ésima (a ≤ K) derivada f (a)(t), vale f (a)(t) a! = a∑ α1, ..., αn=0 α1+···+αn=a hα11 · · ·hαnn α1! · · ·αn! ∂ag ∂yα11 · · · ∂yαnn ( y + th ) = ∑ α∈Nna hα α! ( Dαy g ) ( y + th ) , (30.43) sendo que, acima, usamos a notação de multi-́ındices introduzida à página 598. Essa expressão segue facilmente, pela regra da cadeia, de d dt = n∑ k=1 hk ∂ ∂yk , igualdade válida quando aplicada a f(t) = g(y + th). Disso temos da dta f(t) = ( n∑ k=1 hk ∂ ∂yk )a g(y + th) = a∑ α1, ..., αn=0 α1+···+αn=a a! α1! · · ·αn! hα11 · · ·hαnn ∂a ∂yα11 · · · ∂yαnn g ( y + th ) . O Teorema de Taylor, Teorema 30.6, página 1400, vale para a função f na variável t e se considerarmos o caso em que t = 1 e t0 = 0 obteremos o seguinte: Teorema 30.7 (Teorema de Taylor em n variáveis) Se g : R → C é uma função K vezes diferenciável (K ≥ 1) em um domı́nio conexo Ω0 ⊂ Rn, então para todo N < K vale para y, x ∈ Ω0, com x = y + h, g(x) = g(y + h) = N∑ a=0 ∑ α∈Nna hα α! (Dαg) (y) + ∑ α∈NnN+1 hα α! (N + 1) ∫ 1 0 (1 − s)N ( Dαy g ) ( y + sh ) ds , (30.44) ou seja, g(x) = g(y + h) = N∑ a=0 a∑ α1, ..., αn=0 α1+···+αn=a hα11 · · ·hαnn α1! · · ·αn! ∂ag ∂yα11 · · ·∂yαnn (y) + N+1∑ α1, ..., αn=0 α1+···+αn=N+1 hα1 · · ·hαn α1! · · ·αn! (N + 1) ∫ 1 0 (1 − s)N ∂ N+1g ∂yα11 · · · ∂yαnn ( y + sh ) ds , (30.45) com h ≡ x − y. A relação (30.45) é denominada identidade de Taylor. Os polinômios TN [g](x, y) = N∑ a=0 ∑ α∈Nna (x − y)α α! (Dαg) (y) = N∑ a=0 a∑ α1, ..., αn=0 α1+···+αn=a ( x1 − y1 )α1 · · · ( xn − yn )αn α1! · · ·αn! ∂ag ∂yα11 · · ·∂yαnn (y) 18Alfréd Haar (1885–1933). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1406/1730 são denominados polinômios de Taylor de ordem N centrados em y da função g e a expressão RN [g](x, y) = ∑ α∈NnN+1 (x − y)α α! (N + 1) ∫ 1 0 (1 − s)N (Dαg) ( y + sh ) ds = N+1∑ α1, ..., αn=0 α1+···+αn=N+1 ( x1 − y1 )α1 · · · ( xn − yn )αn α1! · · ·αn! (N + 1) ∫ 1 0 (1 − s)N ∂ N+1g ∂yα11 · · · ∂yαnn ( y + sh ) ds , (30.46) com h ≡ x−y é denominada resto da expansão de Taylor de g, ou fórmula do resto da expansão de Taylor de g. Podemos, portanto, reescrever (30.45) e (30.44) na forma g(x) = TN [g](x, y) + RN [g](x, y) . (30.47) Suponhamos agora que g seja infinitamente diferenciável e que exista uma bola compacta centrada em y e de raio β ≥ 0 B(y, β) = { x ∈ Rn ∣∣∣ ‖x − y‖ ≤ β } tal que existem constantes M ≥ 0, C > 0 e γ com 0 ≤ γ < 1, tais que para todo w ∈ B(y, β) e todo n-multi-́ındice α = (α1, . . . , αn) valha ∣∣∣∣ ∂|α|g ∂wα11 · · · ∂wαnn (w) ∣∣∣∣ ≤ M C |α| α1! · · ·αn!∣∣∣Nn|α| ∣∣∣ |α|1−γ (13.3) = M C|α| α1! · · ·αn!(n − 1)! (n + |α| − 1)! |α| γ , (30.48) com |α| = α1 + · · · + αn. Então, para todo x ∈ B(y, β) tem-se g(x) = ∞∑ a=0 ∑ α∈Nna ( x − y )α α! (Dαg) (y) = ∞∑ a=0 a∑ α1, ..., αn=0 α1+···+αn=a ( x1 − y1 )α1 · · · ( xn − yn )αn α1! · · ·αn! ∂ag ∂yα11 · · · ∂yαnn (y) , (30.49) sendo que a série do lado direito converge absoluta e uniformemente em B(y, β). A série (30.49) é denominada série de Taylor real de g centrada em y. 2 Prova. As primeiras afirmações seguem de (30.43) e do Teorema de Taylor para uma variável, Teorema 30.6, página 1400. É fácil verificar que, sob (30.48), o termo de resto (30.46) converge a zero para N → ∞ e a série (30.49) converge absolutamente. Como ilustração, os primeiros termos da série de Taylor centrada em y de uma função infinitamente diferenciável g de duas variáveis são g(x) = g(y) + ( x1 − y1 ) ∂g ∂y1 (y) + ( x2 − y2 ) ∂g ∂y2 (y) + ( x1 − y1 )2 2! ∂2g ∂y21 (y) + ( x2 − y2 )2 2! ∂2g ∂y22 (y) + ( x1 − y1 )( x2 − y2 ) ∂2g ∂y1∂y2 (y) + ( x1 − y1 )3 3! ∂3g ∂y31 (y) + ( x2 − y2 )3 3! ∂3g ∂y32 (y) + ( x1 − y1 )2( x2 − y2 ) 2! 1! ∂3g ∂y21∂y2 (y) + ( x1 − y1 )( x2 − y2 )2 1! 2! ∂3g ∂y1∂y22 (y) + · · · . JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1409/1730 é fácil constatar, usando as relações de ortogonalidade ∫ π −π ei(n−m)xdx = 2πδm,n , m, n ∈ Z , (30.53) que os coeficientes pk podem ser expressos em termos de p por pk = ∫ π −π e−ikx√ 2π p(x) dx =: 〈ek, p〉 , (30.54) com ek(x) := eikx√ 2π . Uma questão natural é saber sob quais circunstâncias uma função 2π-periódica f pode ser expressa como limite (em um sentido a ser precisado) de uma seqüência de polinômios trigonométricos: f(x) = lim n→∞ n∑ k=−n fk eikx√ 2π =: ∞∑ k=−∞ fk eikx√ 2π , (30.55) com os coeficientes fk independentes de n e dados por fk = ∫ π −π e−ikx√ 2π f(x) dx =: 〈ek, f〉 . (30.56) Uma série como (30.55)–(30.56), caso o limite exista, é denominada série de Fourier. Os coeficientes fk são denominados coeficientes de Fourier da função f . De (30.56) vê-se que para que todos os coeficientes de Fourier fk de uma função f existam basta que f seja integrável em [−π, π]. Para f integrável e n ∈ N0 as somas parciais Sn(f, x) := n∑ k=−n fk eikx√ 2π = n∑ k=−n (∫ π −π e−iky√ 2π f(y) dy ) eikx√ 2π (30.57) são denominadas somas parciais de Fourier da função f . A série de Fourier da função f se escreve então como o limite lim n→∞ Sn(f, x) := lim n→∞ n∑ k=−n fk eikx√ 2π =: ∞∑ k=−∞ fk eikx√ 2π caso esse limite exista em algum sentido a ser precisado. Observemos que alguns autores preferem escrever Sn(f, x) na forma Sn(f, x) := n∑ k=−n Fke ikx , com Fk := 1 2π ∫ π −π e−iky f(y) dy , k ∈ Z . Como já mencionamos, foi Fourier o primeiro a propor expressões como (30.55)–(30.56). Coube a seus sucessores estudar sobre quais hipóteses e em que sentido (30.55)–(30.56) são válidas. Uma questão que então se coloca é identificar condições sobre f sob as quais a seqüência de polinômios trigonométricos Sn(f, x) convirja pontualmente à função f , ou seja, para que o limite limn→∞ Sn(f, x) de (30.55) exista e seja igual a f para todo x ∈ [−π, π] ou quase em toda parte. Devido ao largo emprego de séries de Fourier na resolução de equações diferenciais, essa não é apenas uma questão acadêmica. No que seguirá, empenharemo-nos em apresentar respostas, ainda que parciais, a essa questão e a outras congêneres. • Um outro encontro com as séries de Fourier: a expansão de Laurent Antes de prosseguirmos observemos que séries de Fourier convergentes ocorrem naturalmente no contexto da teoria das funções anaĺıticas de uma variável complexa. Se g(z) é uma função anaĺıtica no interior de um anel Aab = {z ∈ C, a < |z| < b} ⊂ C, com 0 ≤ a < b, é bem sabido da teoria das funções de variável complexa que g pode ser representada em Aab por uma série de Laurent 26 centrada em z0 = 0: g(z) = ∞∑ n=−∞ gnz n , 26Pierre Alphonse Laurent (1813–1854). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1410/1730 a qual é absolutamente convergente para z ∈ Aab, sendo os coeficientes gn dados por gn = 1 2πi ∮ C g(w) wn+1 dw para todo n ∈ Z, com C sendo uma curva suave e fechada em Aab que dá uma volta em torno de z0 = 0 no sentido anti-horário. Se tivermos a < 1 < b, o ćırculo unitário S1 = {z ∈ C, |z| = 1} estará inteiramente contido em Aab. Nesse caso, se escolhermos z no ćırculo unitário |z| = 1, podemos escrever z = eiθ com −π < θ ≤ π. Definindo f(θ) := g(eiθ), a expansão de Laurent fica f(θ) = ∞∑ n=−∞ gne inθ , que é uma expansão de f em termos de uma série trigonométrica. Tomando a curva C como sendo também o ćırculo unitário (ou seja, tomando w = eiϕ com −π < ϕ ≤ π), a expressão para os coeficientes gn fica gn = 1 2π ∫ π −π f(ϕ)e−inϕ dϕ . Assim, obtemos para f a representação f(θ) = ∞∑ n=−∞ (∫ π −π e−inϕ√ 2π f(ϕ) dϕ ) einθ√ 2π . (30.58) Conclúımos assim que se f(θ) é a restrição ao ćırculo unitário de uma função anaĺıtica em Aab com 0 ≤ a < 1 < b (no caso, da função g), então f possui a representação em série de Fourier (30.58), a qual, sob as hipóteses, converge absoluta e uniformemente para todo −π < θ ≤ π. Note que, sob essas hipóteses, f é não apenas cont́ınua, mas infinitamente diferenciável em relação a θ. No que seguirá, veremos que condições mais fracas sobre f podem ser impostas, com resultados análogos. 30.4.2 A Série de Fourier de Funções Periódicas de Peŕıodo T A expressão (30.57) apresenta a série de Fourier de uma função f integrável e periódica de peŕıodo 2π. Se f for integrável e T -periódica (com T > 0), as somas parciais de Fourier serão dadas para n ∈ N0 por Sn(f, x) := n∑ k=−n fk ei 2πk T x √ T com fk = ∫ T/2 −T/2 e−i 2πk T y √ T f(y) dy , (30.59) com lim n→∞ Sn(f, x) representando a série de Fourier de f , caso esse limite exista em algum sentido a ser precisado. E. 30.3 Exerćıcio. Obtenha (30.59) a partir de (30.57). Sugestão: se f é T -periódica, então F (x) := f ( T 2π x ) é 2π- periódica e a ela se aplica (30.57). 6 A série de Fourier de uma função T -periódica também pode ser expressa em termos de uma série de senos e co-senos. Para as somas parciais de Fourier, tem-se Sn(f, x) = A0 2 + n∑ m=1 [ Am cos ( 2mπ T x ) + Bm sen ( 2mπ T x )] , (30.60) com Am = 2 T ∫ T/2 −T/2 cos ( 2mπ T y ) f(y) dy , m ≥ 0 e Bm = 2 T ∫ T/2 −T/2 sen ( 2mπ T y ) f(y) dy , m ≥ 1 . (30.61) Essas expressões podem ser obtidas diretamente de (30.59) com uso da fórmula de Euler ei 2πk T x = cos ( 2πk T x ) + i sen ( 2πk T x ) , sendo que os coeficientes Am e Bm relacionam-se com os coeficientes fk por A0 = 2f0√ T , Am = fm + f−m√ T e Bm = i fm − f−m√ T , m ≥ 1 , JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1411/1730 do que obtemos também f0 = √ TA0 2 , fm = √ T 2 ( Am − iBm ) e f−m = √ T 2 ( Am + iBm ) , m ≥ 1 . E. 30.4 Exerćıcio. Obtenha as expressões acima. 6 As expressões (30.60)–(30.61) podem também ser obtidas através das relações de ortogonalidade das funções seno e co-seno: ∫ T/2 −T/2 cos ( 2nπ T y ) sen ( 2mπ T y ) dy = 0 , n, m ∈ N0 . (30.62) ∫ T/2 −T/2 cos ( 2nπ T y ) cos ( 2mπ T y ) dy =    T 2 δn, m , n, m ∈ N , T δ0, m , n = 0, m ∈ N0 , (30.63) ∫ T/2 −T/2 sen ( 2nπ T y ) sen ( 2mπ T y ) dy = T 2 δn, m , n, m ∈ N0 , (30.64) válidas para todo T > 0. Acima, N0 = {0, 1, 2, 3, 4, . . .} e N = {1, 2, 3, 4, . . .}. E. 30.5 Exerćıcio importante. Demonstre as relações de ortogonalidade (30.62)–(30.64). Para tal use, por exemplo, as bem-conhecidas identidades, conhecidas como fórmulas de prostaférese27 sen (a + b) = sen (a) cos(b) + sen (b) cos(a) , (30.65) cos(a + b) = cos(a) cos(b) − sen (a) sen (b) , (30.66) sen (a) cos(b) = 1 2 ( sen (a + b) + sen (a − b) ) , (30.67) cos(a) cos(b) = 1 2 ( cos(a + b) + cos(a − b) ) , (30.68) sen (a) sen (b) = 1 2 ( cos(a − b) − cos(a + b) ) , (30.69) válidas para todos a, b ∈ C. 6 E. 30.6 Exerćıcio. Seja f : R → C uma função T -periódica. Mostre que se f é real, então fk = f−k para todo k ∈ Z . Conclua disso que f é real, então sua série de Fourier é também real. Note que isso é evidente por (30.60)–(30.61). 6 30.4.3 Polinômios Trigonométricos e Funções Cont́ınuas e Periódicas • Seqüências delta de Dirac periódicas A definição que segue é naturalmente relacionada à definição de seqüência delta de Dirac à página 1387. 27Do grego “prosthesis” (“soma”) e “aphaeresis” (“subtração”). Nessa forma, essas relações foram apresentadas pela primeira vez por Johann Werner (“Vernerus”) (1468–1522), mas provavelmente eram conhecidas de muito antes. Elas podem ser facilmente demonstradas, mesmo para argumentos complexos, com uso da fórmula de Euler eiθ = cos θ + i sen θ, θ ∈ C. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1414/1730 As constantes Nm são dadas por Nm = 2π (2m)! 22m(m!)2 = 2π (2m − 1)!! 2mm! , (30.74) para todo m ∈ N. 2 Prova. É evidente que Km(x) ≥ 0 para todo m ∈ N, que Km(x) = Km(−x) para todo x e que cada Km é cont́ınua e 2π-periódica. Que ∫ π −π Km(x)dx = 1 é também evidente pela definição do fator de normalização Nm. Precisamos apenas provar a propriedade 4 da definição de seqüência delta de Dirac de peŕıodo 2π. A primeira coisa a fazer é obter uma estimativa para o fator de normalização Nm. Como Km(x) é uma função par, vale 1 = 2 ∫ π 0 Km(x)dx. Assim, usando o fato que 1 ≥ sen (x), vale 1 = 2 Nm ∫ π 0 ( 1 + cos(y) 2 )m dy ≥ 2 Nm ∫ π 0 ( 1 + cos(y) 2 )m sen (y) dy u=1+cos(y) = 2 2mNm ∫ 2 0 um du = 4 (m + 1)Nm , o que implica 1Nm ≤ m+1 4 . A segunda observação é que K ′m(x) = − m 2mNm (1 + cos(x)) m−1 sen (x) , que nos informa que Km é decrescente no intervalo [0, π]. Portanto, se 0 < δ ≤ π vale para todo x ∈ [δ, π] Km(x) ≤ Km(δ) = 1 Nm ( 1 + cos(δ) 2 )m ≤ (m + 1) 4 ( 1 + cos(δ) 2 )m . Logo, sup{Km(x), x ∈ [δ, π]} ≤ (m+1)4 ( 1+cos(δ) 2 )m e, como 1+cos(δ) < 2 para 0 < δ ≤ π, segue que lim m→∞ sup{Km(x), x ∈ [δ, π]} = 0. Isso implica que lim m→∞ ∫ π δ |Km(x)|dx = 0 e completa a demonstração que Km forma uma seqüência delta de Dirac 2π-periódica. Para provar (30.74), notamos que pelo binômio de Newton ( cos ( t 2 ))2m = 1 22m ( eit/2 + e−it/2 )2m = 1 22m 2m∑ p=0 ( 2m p ) ei(p−m)t . (30.75) Com isso, (30.74) segue facilmente das relações de ortogonalidade (30.53). Uma outra prova de (30.74) por uma mudança de variáveis e repetindo-se o procedimento de integração por partes pode ser encontrada em (12.87), página 556. Chegamos agora ao importante Teorema 30.9 (Teorema de Fejér) Se f : R → C é cont́ınua e 2π-periódica, então f pode ser aproximada unifor- memente em R por polinômios trigonométricos, ou seja, para todo ǫ > 0 existe um polinômio trigonométrico pǫ tal que ‖f − pǫ‖∞ < ǫ, onde ‖f − pǫ‖∞ = sup x∈R |f(x) − pǫ(x)|. 2 Esse teorema foi primeiramente demonstrado por Fejér28 em 1900 em uma forma ligeiramente diferente, da qual falaremos mais adiante. Conforme exposto na Seção 30.6.3, página 1438, o Teorema 30.9, acima, tem por implicação a convergência da série de Fourier de (30.55) para funções f ∈ L2([−π, π], dx), com a convergência se dando no sentido da norma de L2([−π, π], dx). Isso não necessariamente implica a validade de (30.55) para todo ponto x ∈ [−π, π] 28Lipót Fejér (1880–1959). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1415/1730 (convergência pontual). Em seguida apresentamos uma demonstração independente do Teorema de Fejér, mas adiante (Proposição 30.8, página 1416) provaremos que o mesmo é equivalente ao Teorema de Weierstrass, Teorema 30.3, página 1393. Prova do Teorema 30.9. Unindo o Teorema 30.8 à Proposição 30.7, conclúımos que a seqüência de funções cont́ınuas e 2π-periódicas definida por Em(f, x) := 1 Nm ∫ π −π ( cos ( x − y 2 ))2m f(y) dy , m ∈ N, aproxima uniformemente f em R. Por (30.75), segue que Em(f, x) = 2m∑ p=0 √ 2π 22mNm ( 2m p ) fp−me i(p−m)x , (30.76) onde fk := 1√ 2π ∫ π −π e−ikyf(y) dy , k ∈ Z , (30.77) são os coeficientes de Fourier de f . Com (30.74), obtemos Em(f, x) = m∑ p=−m (m!)2 (m − p)!(m + p)! fp eipx√ 2π . (30.78) As expressões (30.76) e (30.78) mostram que Em(f, x) é um polinômio trigonométrico. A afirmação a seguir é conseqüência do Teorema 30.9 e de (30.78). Corolário 30.3 Se f : R → C é cont́ınua e 2π-periódica, então f é univocamente determinada por seus coeficientes de Fourier fk := 1√ 2π ∫ π −π e−ikyf(y) dy, k ∈ Z. 2 Prova. Por (30.78) vemos que f pode ser recuperada a partir do conhecimento dos coeficientes fk. Também pela mesma expressão, vemos que se f e g são cont́ınuas, 2π-periódicas e têm os mesmos coeficientes de Fourier, então Em(f, x) = Em(g, x) para todo x ∈ R e todo m ∈ N. Assim, pelo Teorema 30.9, vale para todo x ∈ R que f(x) = lim m→∞ Em(f, x) = lim m→∞ Em(g, x) = g(x). • Comentários sobre convergência pontual. Teoremas de Du Bois-Reymond e Carleson O Teorema 30.9 afirma que f pode ser aproximada uniformemente por polinômios trigonométricos de peŕıodo 2π. Surpreendentemente, porém, isso não implica que a série de Fourier Sn(f, x) = ∑n k=−n fke ikx de uma função cont́ınua f seja convergente em todo ponto x. O estudante deve atentar para o fato que, por (30.57) e (30.78), Sm(f, x) e Em(f, x) são polinômios trigonométricos distintos. Assim, a aproximação de f(x) cont́ınua e 2π-periódica pela seqüência Em(f, x), implicada pelo Teorema 30.9, não necessariamente implica a aproximação de f(x) por sua série de Fourier Sm(f, x). De fato, em 1873 Du Bois-Reymond29 exibiu um exemplo de uma função cont́ınua e 2π-periódica (e, portanto, para a qual o Teorema 30.9 se aplica) cuja série de Fourier diverge em x = 0. Apesar de cont́ınua, a função de Du Bois- Reymond não é diferenciável em x = 0 (ou mesmo Hölder-cont́ınua). Esse comentário é importante pois, como veremos no Teorema 30.12, página 1420, continuidade e diferenciabilidade são suficientes para garantir a convergência pontual da série de Fourier. Os passos da construção de Du Bois-Reymond podem ser acompanhados na referência [112] ou em [105]. O leitor inte- ressado que tenha algum conhecimento de Teoria Quântica de Campos poderá deleitar-se em reconhecer que a construção de Du Bois-Reymond prenuncia certas idéias associadas a transformações de escala e de grupo de renormalização. 29Paul David Gustav Du Bois-Reymond (1831–1889). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1416/1730 O exemplo de Du Bois-Reymond pode ser aguçado ainda mais. Em 1966 Kahane30 e Katznelson31 provaram que: dado um conjunto de medida nula E em [−π, π], existe uma função f cont́ınua e 2π-periódica tal que supn∈N0 |Sn(f, x)| = ∞ para todo x ∈ E. Uma demonstração dessa afirmação pode ser encontrada em [105]32. O resultado mais importante sobre a questão da convergência pontual da série de Fourier de funções de quadrado integrável é devido a Carleson33: se f é uma função de quadrado integrável em [−π, π], sua série de Fourier converge quase em toda parte, ou seja, pode divergir apenas em um conjunto de medida nula. Como mencionamos, para que possamos garantir convergência da série de Fourier de uma função f em todo ponto x ∈ [−π, π] não basta requerer continuidade, sendo a adição da condição de diferenciabilidade suficiente para tal. A afirmação precisa será apresentada nas páginas que seguem (Teorema 30.12, página 1420). • O Teorema de Fejér e o Teorema de Weierstrass Os teoremas de Fejér e de Weierstrass afirmam que uma função cont́ınua pode ser uniformemente aproximada quer por polinômios quer por polinômios trigonométricos (se for também periódica). Talvez um tanto surpreendentemente esses dois teoremas são equivalentes. Proposição 30.8 O Teorema de de Weierstrass, Teorema 30.3, página 1393, e o Teorema de Fejér, Teorema 30.9, página 1414, são equivalentes. 2 Prova. Pelo Teorema de Fejér, Teorema 30.9, página 1414, os polinômios trigonométricos são densos (na topologia uniforme, i.e., na topologia da norma do supremo ‖·‖∞) no conjunto das funções cont́ınuas 2π-periódicas. Pela Proposição 30.6, página 1403, os monômios trigonométricos einx, n ∈ Z, podem ser aproximados uniformemente no intervalo [−π, π] por polinômios (mais especificamente, por seus polinômios de Taylor). Conclúımos disso que os polinômios são densos nas funções cont́ınuas no intervalo [−π, π]. Por uma translação, combinada a um re-escalonamento (operações que levam polinômios em polinômios, vide a discussão que antecede o Teorema 30.20, página 1452), isso prova que os polinômios são densos nas funções cont́ınuas em qualquer intervalo compacto [a, b] ⊂ R. Portanto o Teorema de Weierstrass (ao menos na versão do Teorema 30.3, página 1393) segue do Teorema de Fejér. A rećıproca é também verdadeira. Para prová-la seja f(θ) uma função cont́ınua e 2π-periódica definida no intervalo [−π, π]. Temos, naturalmente que f(−π) = f(π), devido à continuidade e à periodicidade. No retângulo fechado R = [−1, 1]2 ⊂ R2 defina-se a função F (x1, x2) = ρf(θ), sendo 1 ≤ x1 ≤ 1 e 1 ≤ x2 ≤ 1, com ρ = √ x21 + x 2 2 e θ = arctan(x2/x1), ou seja, x1 = ρ cos θ e x2 = ρ sen θ. É claro que F é cont́ınua e, pelo Teorema 30.5, página 1398, F pode ser uniformemente aproximada em R por polinômios em x1 e x2, ou seja, por polinômios em ρ cos θ e ρ sen θ. O ćırculo unitário ρ = 1 está inteiramente contido no retângulo fechado R e nele a função F é igual a f . Conclúımos disso que f pode ser uniformemente aproximada por polinômios em cos θ e sen θ, ou seja, por polinômios trigonométricos, provando que o Teorema de Fejér segue do de Weierstrass. 30.4.4 Convergência de Séries de Fourier • Os núcleos de Dirichlet Dado um polinômio trigonométrico p, vimos em (30.52)–(30.54) que podemos escrever p(x) = n∑ k=−n ( 1 2π ∫ π −π e−ikyp(y) dy ) eikx = ∫ π −π Dn(x − y) p(y) dy , onde, para cada n ∈ N0, definimos Dn(x) := 1 2π n∑ k=−n eikx . (30.79) 30Jean-Pierre Kahane (1926–). 31Yitzhak Katznelson (1934–). 32A referência original é: J-P Kahane and Y. Katznelson, “Sur les ensembles de divergence des séries trignométriques”, Studia Mathematica, 26 305-306, (1966). 33Lennart Axel Edvard Carleson (1923–). A referência original é: L. Carleson, “On convergence and growth of partial sums of Fourier series”. Acta Math., 116, 135-157 (1966). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1419/1730 Teorema 30.11 (Condição de Dini) Seja f : R → C integrável e 2π-periódica e seja x ∈ R tal que 1. Existem os dois limites laterais lim t→0+ f(x + t) e lim t→0− f(x + t), que denotamos por f(x+) e f(x−), respectivamente. 2. Existe κ > 0 tal que ∫ κ 0 |Df (x, y)| y dy < ∞ , (30.84) onde Df (x, y) := f(x + y) + f(x − y) − (f(x+) + f(x−)) . Então, lim n→∞ Sn(f, x) = f(x+) + f(x−) 2 . 2 Prova. Usando (30.50) podemos escrever Sn(f, x) = ∫ π −π Dn(y)f(x−y)dy. Como Dn é uma função par, a última integral pode também ser escrita como ∫ π −π Dn(−y)f(x − y)dy = ∫ π −π Dn(y)f(x + y)dy. Assim, podemos escrever, Sn(f, x) = 1 2 ∫ π −π Dn(y) ( f(x + y) + f(x − y) ) dy Usando também (30.81), obtemos Sn(f, x) − f(x+) + f(x−) 2 = 1 2 ∫ π −π Dn(y)Df (x, y) dy = ∫ π 0 Dn(y)Df (x, y) dy , (30.85) A última igualdade provém do fato que Df (x, y) = Df (x, −y). Para 0 < δ < π podemos escrever Sn(f, x) − f(x+) + f(x−) 2 = ∫ δ 0 Dn(y)Df (x, y) dy + ∫ π δ Dn(y)Df (x, y) dy . (30.86) Comecemos nossa análise pela primeira integral em (30.86). O integrando é Dn(y)Df (x, y) = 1 2π sen (( n + 12 ) y ) sen ( y 2 ) Df (x, y) = sen (( n + 1 2 ) y )[ y 2 π sen ( y 2 ) ] Df (x, y) y . A função y 2 π sen ( y2 ) é crescente em todo intervalo [0, π] (mostre isso!) e, portanto, limitada superiormente por π 2 π sen (π2 ) = 12 . Assim, naquele intervalo, |Dn(y)Df (x, y)| ≤ 12 |Df (x, y)| y . Logo, para primeira integral em (30.86) temos ∣∣∣∣∣ ∫ δ 0 Dn(y)Df (x, y) dy ∣∣∣∣∣ ≤ 1 2 ∫ δ 0 |Df (x, y)| y dy Escolhendo δ pequeno o suficiente podemos obter ∫ δ 0 |Df(x, y)| y dy ≤ ǫ em função da condição (30.84). Com esse δ assim fixado, passemos agora à segunda integral em (30.86). Usando (30.82), a mesma fica 1 2π ∫ π 0 einy χ[δ, π](y) ( eiy/2Df (x, y) 2i sen (y/2) ) dy − 1 2π ∫ π 0 e−iny χ[δ, π](y) ( e−iy/2Df (x, y) 2i sen (y/2) ) dy (30.87) onde χ[δ, π] é a função caracteŕıstica do intervalo [δ, π]: χ[δ, π](y) =    1, y ∈ [δ, π] , 0, y 6∈ [δ, π] . JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1420/1730 Agora, as funções χ[δ, π](y) ( e±iy/2Df (x, y) 2i sen (y/2) ) são integráveis (note que a singularidade de 1sen (y/2) em y = 0 é eliminada pelo fator χ[δ, π](y)). Assim, aplica-se o Lema de Riemann-Lebesgue, Teorema 30.10, e as integrais em (30.87) podem ser feitas menores que qualquer ǫ > 0 prescrito, tomando |n| grande o suficiente. Isso completa a demonstração. • Condições de convergência pontual de séries de Fourier Após o Teorema 30.11 a questão que naturalmente se coloca é saber para quais tipos de funções f a condição de Dini é satisfeita. Há duas classes de funções de maior interesse (especialmente no contexto de aplicações a equações diferenciais): as cont́ınuas e as cont́ınuas por partes. As proposições que seguem reúnem esses casos. Proposição 30.11 I. Suponha que f : R → C seja Hölder37-cont́ınua em um ponto x ∈ [−π, π], ou seja, satisfaça |f(x) − f(y)| ≤ α|x − y|β (30.88) para todo y em um intervalo [x− κ, x + κ], para algum κ > 0, algum α ≥ 0 e algum β > 0. Então, f satisfaz a condição de Dini (30.84) em x. II. Se f : R → C não for cont́ınua em x mas existirem os limites laterais lim t→0+ f(x + t) =: f(x+) e lim t→0− f(x + t) =: f(x−) e de sorte que existam constantes κ > 0, M+ ≥ 0 e M− ≥ 0 tais que ∣∣∣∣ f(x + y) − f(x+) y ∣∣∣∣ ≤ M+ e ∣∣∣∣ f(x − y) − f(x−) y ∣∣∣∣ ≤ M− (30.89) para todo 0 < y ≤ κ, então a condição de Dini (30.84) é satisfeita em x. 2 Prova. I. Por (30.88), f é cont́ınua em x e, portanto, Df (x, y) = f(x + y) + f(x − y) − 2f(x). Assim, para y ∈ [−κ, κ] valerá |Df (x, y)| = ∣∣∣ ( f(x + y) − f(x) ) + ( f(x − y) − f(x) )∣∣∣ ≤ ∣∣f(x + y) − f(x) ∣∣+ ∣∣f(x − y) − f(x) ∣∣ (30.88)≤ 2α|y|β . Logo, ∫ κ 0 |Df (x, y)| y dy ≤ 2α ∫ κ 0 yβ−1 dy = 2ακβ β < ∞ . II. Para todo y ∈ (0, κ], |Df (x, y)| y = ∣∣∣ ( f(x + y) − f(x+) ) + ( f(x − y) − f(x−) )∣∣∣ y ≤ ∣∣f(x + y) − f(x+) ∣∣ y + ∣∣f(x − y) − f(x−) ∣∣ y (30.89) ≤ M+ + M− , o que claramente implica a condição de Dini (30.84). Chegamos às conseqüências mais relevantes da Condição de Dini: Teorema 30.12 (Teorema de Fourier) A. Se f : R → C é cont́ınua, diferenciável para todo x ∈ R e 2π-periódica, então lim n→∞ Sn(f, x) = f(x) para todo x ∈ R, ou seja, a série de Fourier de f converge pontualmente a f . 37Otto Ludwig Hölder (1859–1937). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1421/1730 B. Se f : R → C é cont́ınua por partes e 2π-periódica e as derivadas laterais f ′(x+) := lim s→0+ f(x + s) − f(x+) s e f ′(x−) := lim s→0− f(x + s) − f(x−) s existirem para todo x ∈ R, então lim n→∞ Sn(f, x) = f(x+) + f(x−) 2 para todo x ∈ R. 2 Prova. A. Se f é cont́ınua e diferenciável em x, então f é Hölder-cont́ınua com β = 138 (justifique!). B. Se existem f ′(x±), como definidos acima, então valem as relações em (30.89) (justifique!). Que a série de Fourier de uma função cont́ınua por partes converge ao valor médio (f(x+) + f(x−))/2 foi sugerido pelo próprio Fourier, com base em diversos exemplos, em seu trabalho de 1822 “Théorie Analytique de la Chaleur” . A primeira demonstração correta foi obtida por Dirichlet em 1828. Antes de Dirichlet, Poisson39 e Cauchy40 apresentaram demonstrações falhas. A natureza não-trivial dos erros desses autores é discutida em [112]. • Inversão de integrais definidas com a série de Fourier Na Seção 30.1, página 1381, mencionamos o fato básico que se tivermos uma seqüência de funções fn que converge uniformemente a uma função f em um intervalo finito [a, b], então valerá lim n→∞ (∫ b a fn(x)dx ) = ∫ b a ( lim n→∞ fn(x) ) dx (se as integrais existirem), ou seja, podemos inverter a tomada do limite da seqüência pela integração. Um ponto muito interessante, e importante, sobre as séries de Fourier, é que, sobre condições adequadas, é posśıvel inverter a tomada do limite por integrais definidas em intervalos finitos, mesmo quando as mesmas séries não são uniformemente convergentes. Mas precisamente, mostraremos no que segue que as condições do Teorema de Fourier, Teorema 30.12, página 1420, são suficientes para garantir a possibilidade de se inverter a tomada do limite de séries de Fourier por integrais definidas em intervalos finitos. Teorema 30.13 Seja f : R → C uma função 2π-periódica satisfazendo as condições A ou B do Teorema de Fourier, Teorema 30.12. Seja Sn(f, x) sua série de Fourier: Sn(f, x) := n∑ k=−n fk eikx√ 2π , com fk := ∫ π −π e−ikx√ 2π f(x) dx . Então, para quaisquer a, b com −∞ < a ≤ b < ∞ vale ∫ b a f(x) dx = lim n→∞ ∫ b a Sn(f, x) dx, ou seja, ∫ b a f(x) dx = lim n→∞ n∑ k=−n fk ∫ b a eikx√ 2π dx = (b − a)f0√ 2π + lim n→∞ n∑ k=−n k 6=0 fk ( eikb − eika ) ik √ 2π . 2 Comentamos que o teorema acima pode ser generalizado de modo a abarcar não apenas as funções f que satisfaçam do Teorema de Fourier, mas também todas as funções f ∈ L2([−π, π], dx) (vide Teorema 30.15, página 1430). Nesse caso, a demonstração é ainda mais simples que a que apresentamos a seguir, mas os pré-requisitos para sua elaboração são mais avançados, pois faz-se uso da propriedade de completeza dos polinômios trigonométricos. Prova do Teorema 30.13. Seja a função F : R → C definida por F (s) := ∫ s 0 ( f(x) − f0√ 2π ) dx. Essa integral está bem definida pois f é cont́ınua ou cont́ınua por partes, com limites laterais finitos, pela hipótese que f satisfaz as condições A 38Ou seja, f é Lipschitz-cont́ınua. 39Siméon Denis Poisson (1781–1840). 40Augustin Louis Cauchy (1789–1857). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1424/1730 A função f̃ é ı́mpar (i.e., f̃(−x) = −f̃(x) para todo x ∈ R), 2L-periódica e, em função das propriedades supostas de continuidade e diferenciabilidade por partes da função f , satisfaz as condições do Teorema de Fourier, Teorema 30.12, página 1420. Justifique! Conclúımos daquele teorema e de (30.59) que para todo x ∈ R vale f̃(x+) + f̃(x−) 2 = lim n→∞ n∑ k=−n f̃k ei πk L x √ 2L , com f̃k = ∫ L −L e−i πk L y √ 2L f̃(y) dy . (30.91) Agora, é evidente pela definição de f̃ , e pelo fato de ser uma função ı́mpar, que f̃k = ∫ L −L e−i πk L y √ 2L f̃(y) dy = −i√ 2L ∫ L −L sen ( πk L y ) f̃(y) dy = −i √ 2 L ∫ L 0 sen ( πk L y ) f(y) dy . (30.92) Disso extrai-se também que f̃−k = −f̃k para todo k ∈ Z. Com isso, a primeira equação em (30.91) escreve-se f̃(x+) + f̃(x−) 2 = 1√ 2L ∞∑ k=1 f̃k ( ei πk L x − e−i πkL x ) = ∞∑ k=1 Ak sen ( πk L x ) , onde, para k ∈ N, Ak := i √ 2 L f̃k = 2 L ∫ L 0 sen ( πk L y ) f(y) dy . O interesse por (30.91) se dá para x ∈ [0, L], em cujo caso temos f̃(x+) =    f(0+) , se x = 0 , f(x+) , se x ∈ (−L, L) , −f(L−) , se x = L , e f̃(x−) =    −f(0+) , se x = 0 , f(x−) , se x ∈ (−L, L) , f(L−) , se x = L , de onde obtemos, para x ∈ [0, L], f̃(x+) + f̃(x−) 2 =    f(x+)+f(x−) 2 , se x ∈ (−L, L) , 0 , se x = 0 ou x = L . Isso provou a parte I. Parte II. Para a demonstração necessitamos considerar uma extensão 2L-periódica par da função f . Defina-se primei- ramente f1 : [−L, L] → C por f1(x) :=    f(x) , se x ∈ [0, L] , f(−x) , se x ∈ [−L, 0) , e defina-se f̃ : R → C por f̃(x) := f1 ( x mod 2L ) , x ∈ R, o que equivale a dizer que se y ∈ R é da forma y = x + 2kL com x ∈ [−L, L] e k ∈ Z, então f̃(y) = f1(x). A função f̃ é par (i.e., f̃(−x) = f̃(x) para todo x ∈ R), 2L-periódica e, em função das propriedades supostas de continuidade e diferenciabilidade por partes da função f , satisfaz as condições do Teorema de Fourier, Teorema 30.12, página 1420. Justifique! Conclúımos daquele teorema e de (30.59) que para todo x ∈ R vale f̃(x+) + f̃(x−) 2 = lim n→∞ n∑ k=−n f̃k ei πk L x √ 2L , com f̃k = ∫ L −L e−i πk L y √ 2L f̃(y) dy . (30.93) Agora, é evidente pela definição de f̃ , e pelo fato de ser uma função par, que f̃k = ∫ L −L e−i πk L y √ 2L f̃(y) dy = 1√ 2L ∫ L −L cos ( πk L y ) f̃(y) dy = √ 2 L ∫ L 0 cos ( πk L y ) f(y) dy . (30.94) JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1425/1730 Disso extrai-se também que f̃−k = f̃k para todo k ∈ Z. Com isso, a primeira equação em (30.93) escreve-se f̃(x+) + f̃(x−) 2 = f̃k√ 2L + 1√ 2L ∞∑ k=1 f̃k ( ei πk L x + e−i πk L x ) = ∞∑ k=0 Bk cos ( πk L x ) , onde B0 := f̃0√ 2L = 1 L ∫ L 0 f(y) dy , e onde, para k ∈ N, Bk := √ 2 L f̃k = 2 L ∫ L 0 cos ( πk L y ) f(y) dy . O interesse por (30.93) se dá para x ∈ [0, L], em cujo caso temos f̃(x+) =    f(0+) , se x = 0 , f(x+) , se x ∈ (−L, L) , f(L−) , se x = L , e f̃(x−) =    f(0+) , se x = 0 , f(x−) , se x ∈ (−L, L) , f(L−) , se x = L , de onde obtemos, para x ∈ [0, L], f̃(x+) + f̃(x−) 2 =    f(0+) , se x = 0 , f(x+)+f(x−) 2 , se x ∈ (−L, L) , f(L−) , se x = L . Isso provou a parte II. E. 30.7 Exerćıcio. Seja L > 0. Usando, por exemplo, as fórmulas de prostaférese (30.67)–(30.69), demonstre as relações seguintes relações: ∫ L 0 cos (mπ L y ) cos (nπ L y ) dy =    0 , se n 6= m , L , se n = m = 0 , L 2 , se n = m 6= 0 , m, n ∈ N0 , (30.95) ∫ L 0 sen (mπ L y ) sen (nπ L y ) dy = L 2 δm, n , m, n ∈ N , (30.96) ∫ L 0 cos (mπ L y ) sen (nπ L y ) dy =    0 , se n = m , L π n n2−m2 ( 1 − (−1)m+n ) , se n 6= m , m, n ∈ N0 . (30.97) A expressão (30.95) informa-nos que conjunto de funções { Nm cos ( mπ L y ) , m ∈ N0 } , com Nm = √ 2 L para m 6= 0 e N0 = √ 1 L , é um conjunto ortonormal em L 2 ( [0, L], dx ) . A expressão (30.96) informa-nos que conjunto de funções {√ 2 L sen ( mπ L y ) , m ∈ N } é um conjunto ortonormal em L2 ( [0, L], dx ) . De (30.97) vemos que as funções cos ( mπ L y ) , JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1426/1730 m ∈ N0, não são sempre ortogonais a todas as funções sen ( nπ L y ) , n ∈ N, no intervalo [0, L], pois o lado direito de (30.97) anula-se se e somente quando m + n for par. É interessante ao estudante comparar as relações (30.95)–(30.97), acima, com as relações (30.62)–(30.64), da página 1411. Tanto o conjunto de funções {√ 2 L sen ( mπ L y ) , m ∈ N } quanto o conjunto de funções { Nm cos ( mπ L y ) , m ∈ N0 } , com Nm = √ 2 L para m 6= 0 e N0 = √ 1 L , são conjuntos ortonormais completos em L 2 ( [0, L], dx ) , ou seja, compões bases ortonormais completas nesse espaço. 6 30.4.5 Revisitando a Aproximação Uniforme de Funções Cont́ınuas e Periódicas por Polinômios Trigonométricos • Somas de Cesàro Se am, m ∈ N é uma seqüência de números complexos a expressão lim n→∞ An, onde An é a seqüência das somas parciais An := n∑ m=0 am, caso o limite exista, define, como bem sabido, o que se denomina uma série, a série associada à seqüência am. Assim, uma série convergirá se e somente se o limite da seqüência formada pelas somas parciais acima convergir. Notacionalmente, uma série é também denotada por ∞∑ m=0 am, caso o limite lim n→∞ An = lim n→∞ n∑ m=0 am exista. A soma de Cesàro41 da seqüência am (também denominada série de Cesàro, ou média de Cesàro, associada à seqüência am), é definida por lim n→∞ 1 n + 1 n∑ m=0 Am = lim n→∞ 1 n + 1 n∑ m=0 m∑ p=0 ap . caso o limite exista. Como se vê, a série de Cesàro de uma seqüência am é formada pelo limite (caso exista) da média das somas parciais da seqüência am. É fácil demonstrar que se uma série converge a um valor a, então o limite de sua série de Cesàro também existe e também vale a. De fato, se Am converge a a, então para todo ǫ > 0 existe N(ǫ) tal que |Am−a| < ǫ para todo m > N(ǫ). Tomando n > N(ǫ), teremos 1 n + 1 n∑ m=0 Am − a = 1 n + 1 N(ǫ)∑ m=0 Am + 1 n + 1 n∑ m=N(ǫ)+1 Am − a = 1 n + 1 N(ǫ)∑ m=0 Am + 1 n + 1 n∑ m=N(ǫ)+1 (Am − a) + ( N(ǫ) + 1 n + 1 ) a . Para ǫ fixo, o termo 1 n + 1 N(ǫ)∑ m=0 Am vai a zero quando n → ∞, pois o número de termos somados é fixo. O termo ( N(ǫ)+1 n+1 ) a claramente também vai a zero quando n → ∞. Por fim, para a soma 1 n + 1 n∑ m=N(ǫ)+1 (Am − a) temos a majoração ∣∣∣∣∣∣ 1 n + 1 n∑ m=N(ǫ)+1 (Am − a) ∣∣∣∣∣∣ ≤ 1 n + 1 n∑ m=N(ǫ)+1 |Am − a| ≤ 1 n + 1 n∑ m=N(ǫ)+1 ǫ = n − N(ǫ) n + 1 ǫ < ǫ . 41Ernesto Cesàro (1859–1906). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1429/1730 mostrando que Fn(f, x) é a média de Cesàro das somas parciais de Fourier. A afirmação que toda função cont́ınua e 2π-periódica pode ser aproximada uniformemente pela média de Cesàro de suas somas de Fourier parciais é conhecida como Teorema de Fejér, resultado provado por aquele autor no ano de 1900. Naturalmente, isso diz que toda função cont́ınua e 2π-periódica pode ser aproximada uniformemente por um polinômio trigonométrico, fato que já estudamos sob a forma do Teorema 30.9, página 1414. A distinção entre o Teorema de Fejér e aquele teorema é o tipo de núcleo de Dirac usado em ambos os casos e o fato de o Teorema de Fejér trazer uma relação com as médias de Cesàro. 30.4.6 Séries de Fourier e o Espaço de Hilbert L2([−π, π], dx) • Completeza dos polinômios trigonométricos. Identidade de Parseval A teoria das séries de Fourier é intimamente ligada à teoria dos espaços de Hilbert, que desenvolvemos no Caṕıtulo 32, página 1537. Nesse contexto desempenha um papel fundamental o fato de as funções en(x) = einx√ 2π , n ∈ Z, formarem um conjunto ortonormal completo em L2([−π, π], dx) (para a definição da noção de conjunto ortonormal completo e suas e propriedades, vide página 1548 e seguintes). Esse é o conteúdo do seguinte teorema: Teorema 30.14 Seja H = L2([−π, π], dx) o espaço de Hilbert das funções de quadrado integrável em [−π, π] em relação à medida de Lebesgue dx e cujo produto escalar é 〈f, g〉 = ∫ [−π, π] f(x)g(x) dx, f, g ∈ H. Então, as funções en(x) = einx√ 2π , n ∈ Z, compõe um conjunto ortonormal completo em H. Assim, para todo g ∈ H vale g = ∞∑ n=−∞ 〈en, g〉 en (30.103) e ‖g‖2 = ∞∑ n=−∞ |〈en, g〉|2 , (30.104) sendo ‖g‖ := √ 〈g, g〉 a norma de g em H. A convergência da série em (30.103) se dá em relação à norma ‖ · ‖ de H, ou seja, tem-se lim N→∞ ∥∥∥∥∥g − N∑ n=−N 〈en, g〉 en ∥∥∥∥∥ = 0 . 2 A demonstração é apresentada na Seção 30.6.3, página 1438, como caso particular da Proposição 30.21, página 1440, e com uso de resultados do Caṕıtulo 32, página 1537. Vide comentários que sucedem o enunciado da Proposição 30.21. A identidade (30.104) é denominada identidade de Parseval44, que a deduziu em 1805. Se, por exemplo, g for uma função cont́ınua ou cont́ınua por partes em [−π, π] (situações essas encontradas em muitas aplicações da teoria das séries de Fourier, por exemplo, à solução de equações diferenciais), teremos g ∈ L2([−π, π], dx) e, portanto, g(x) = ∞∑ n=−∞ gn einx√ 2π com gn := ∫ π −π e−inx√ 2π g(x) dx , ∀n ∈ Z , com a série convergindo no sentido da norma de L2([−π, π], dx), sendo que pela identidade de Parseval valerá ∫ π −π |g(x)|2 dx = ∞∑ n=−∞ |gn|2 . Nos exerćıcios da Seção 30.7, página 1442, apresentamos alguns usos dessa identidade. 44Marc-Antoine Parseval de Chênes (1755–1836). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1430/1730 • Inversão de integrais definidas com a série de Fourier. Generalização para L2([−π, π], dx) Vamos agora apresentar um resultado que garante a possibilidade de inverter integrais de Lebesgue em intervalos compactos de uma função de L2([−π, π], dx) com sua série de Fourier, generalizando o Teorema 30.13, página 1421. Teorema 30.15 Seja f ∈ L2([−π, π], dx) e sejam fk := ∫ [−π, π] e−ikx√ 2π f(x)dx, k ∈ Z, seus coeficientes de Fourier. Então, para quaisquer a, b com [a, b] ⊂ [−π, π] vale ∫ [a, b] f dx = lim n→∞ n∑ k=−n fk ∫ b a eikx√ 2π dx = (b − a)f0√ 2π + lim n→∞ n∑ k=−n k 6=0 fk ( eikb − eika ) ik √ 2π , (30.105) a integração do lado esquerdo sendo entendida no sentido de Lebesgue. Se g : R → C for uma periodização de peŕıodo 2π de uma função f de L2([−π, π], dx), então ∫ [a, b] g dx é também dada pelo lado direito de (30.105), mas agora para qualquer intervalo [a, b] com −∞ < a ≤ b < ∞. 2 Prova. Pelo Teorema 30.14, página 1429, o conjunto en(x) = einx√ 2π , n ∈ Z, forma um conjunto ortonormal completo em L2([−π, π], dx) e podemos escrever f = lim n→∞ n∑ k=−n fk ek com a convergência se dando no sentido da norma de L2([−π, π], dx), onde fk := 〈ek, f〉 = ∫ [−π, π] e−ikx√ 2π f(x)dx para todo k ∈ Z. Seja χ[a, b] a função caracteŕıstica do intervalo [a, b] (ou seja, χ[a, b](x) = 1 e x ∈ [a, b] e χ[a, b](x) = 0 e x 6∈ [a, b]). É evidente que χ[a, b] ∈ L2([−π, π], dx) e que o produto escalar 〈χ[a, b], f〉 é igual à integral de Lebesgue de f em [a, b]: 〈χ[a, b], f〉 = ∫ [a, b] fdx. Logo, ∫ [a, b] f dx = 〈χ[a, b], f〉 = 〈 χ[a, b], lim n→∞ n∑ k=−n fk ek 〉 = lim n→∞ n∑ k=−n fk 〈 χ[a, b], ek 〉 = lim n→∞ n∑ k=−n fk ∫ b a eikx√ 2π dx = (b − a)f0√ 2π + lim n→∞ n∑ k=−n k 6=0 fk ( eikb − eika ) ik √ 2π , provando (30.105) para f ∈ L2([−π, π], dx). Na terceira igualdade acima usamos a continuidade e a linearidade do produto escalar. Seja agora g : R → C for uma periodização de peŕıodo 2π de uma função f de L2([−π, π], dx), e seja [a, b] um intervalo compacto de R. Podemos escrever [a, b] = ⋃ n∈Z ( [a, b] ∩ [nπ, (n + 2)π] ) , uma união disjunta finita (pois [a, b] é compacto) de conjuntos Borelianos (por serem intervalos fechados). Assim, ∫ [a, b] g dx = ∑ n∈Z ∫ An g dx com An := [a, b] ∩ [nπ, (n + 2)π], sendo a soma acima, ipso facto, finita. Em cada intervalo [nπ, (n + 2)π] a função g é o transladado de f . Assim, para cada n, devido à invariância translacional da medida de Lebesgue, ∫ An g dx = ∫ Bn f dx, com Bn sendo o conjunto An transladado de −(n + 1)π: Bn := [a − (n − 1)π, b − (n − 1)π] ∩ [−π, π]. Ao lado direito aplica-se agora (30.105) e disso segue facilmente a validade de (30.105) também para g. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1431/1730 30.5 O Teorema de Stone-Weierstrass A primeira versão do Teorema de Weierstrass, Teorema 30.3, acima, afirma que qualquer função cont́ınua f , real ou complexa, definida em um intervalo compacto [a, b] pode ser uniformemente aproximada por polinômios definidos nesse intervalo. Em muitas aplicações (como na demonstração do Teorema Espectral. Vide Seção 33.7, página 1653) estamos interessados em aproximar funções cont́ınuas definidas em conjuntos compactos outros que não simples intervalos, por exemplo, em conjuntos de Cantor (vide Seção 25.3, página 1133). Uma generalização do Teorema 30.3 se faz, portanto, necessária. Uma forte generalização daquele teorema foi obtida por Stone45 em 1937 e dedicamo-nos agora a apresentá-la. Se X é um espaço topológico compacto, denotamos por C(X, R) (ou por C(X, C)) o conjunto de todas as funções cont́ınuas em X assumindo valores em R (respectivamente, em C). É bastante claro que uma combinação linear complexa de funções continuas em X assumindo valores em C é novamente uma função cont́ınua assumindo valores em C, assim como é claro que o produto usual de duas funções cont́ınuas em X assumindo valores em C é novamente uma função cont́ınua em X assumindo valores em C. Isso significa que C(X, C) é uma álgebra complexa (por ser um espaço vetorial complexo) em relação ao produto usual de funções. Analogamente, C(X, R) é uma álgebra real em relação ao produto usual de funções. As álgebras C(X, R) e C(X, C) são álgebras Abelianas (pois o produto usual de funções é comutativo) e também são álgebras unitais, pois a função constante igual a 1 pertence a C(X, R) e a C(X, C) e age como elemento neutro da multiplicação. Denotamos a função constante igual a 1 também por 1. Que 1 é cont́ınua segue da observação que a pré-imagem de qualquer aberto em R ou C pela função constante ou é o conjunto vazio ou é todo X , que é aberto por definição. Sabemos pelo Corolário 21.1, página 1025, que os conjuntos C(X, R) e C(X, C) são completos na métrica uniforme d∞, definida por d∞(f, g) := sup x∈X {∣∣f(x), g(x) ∣∣, x ∈ X } para todas f, g ∈ C(X, R) ou C(X, C). Observe que ‖f − g‖∞ := d∞(f, g) é uma norma em C(X, R) ou em C(X, C). Tudo isso significa que C(X, R) e C(X, C) são álgebras de Banach (para a norma ‖ · ‖∞) Abelianas e unitais. Uma sub-álgebra B de C(X, R) (de C(X, C)) é um subespaço vetorial real de C(X, R) (complexo de C(X, C)) que é por si só uma álgebra com relação ao produto usual de funções. B é dita ser unital se 1 ∈ B. Dizemos que B separa pontos se para cada par x1, x2 ∈ X com x1 6= x2 existir uma função b ∈ B tal que b(x1) 6= b(x2). Se B é uma sub-álgebra complexa de C(X, C), dizemos que B é conjugada se a função complexo-conjugada b pertencer a B sempre que b ∈ B. Teorema 30.16 (Teorema de Stone-Weierstrass) I. Seja X compacto e B uma sub-álgebra de C(X, R) que seja unital e que separe pontos. Então, B = C(X, R), onde B é o fecho de B na topologia métrica definida pela norma ‖ ·‖∞. Assim, se c ∈ C(X, R) então para todo ǫ > 0 existe b ∈ B tal que sup x∈X |c(x) − b(x)| < ǫ. II. Seja X compacto e B uma sub-álgebra complexa de C(X, C) que seja unital, conjugada e que separe pontos. Então, B = C(X, C), onde B é o fecho de B na topologia métrica definida pela norma ‖ · ‖∞. Assim, se c ∈ C(X, C) então para todo ǫ > 0 existe b ∈ B tal que sup x∈X |c(x) − b(x)| < ǫ. 2 Depois de apresentarmos a demonstração desse importante teorema mostraremos como ele generaliza alguns resultados que provamos anteriormente. Prova do Teorema de Stone-Weierstrass. A parte II segue da parte I e por isso trataremos da parte I (o caso real) primeiro. Prova da parte I. O caso real. A primeira observação a fazer é que B é uma sub-álgebra de C(X, R). Isso se deve ao seguinte. Primeiramente do fato que B ⊂ C(X, R) e C(X, R) é completa e, portanto, fechada (Proposição 23.11, página 1101) segue que B ⊂ C(X, R) . (30.106) 45Marshall Harvey Stone (1903–1989). Para comentários sobre a gênese do Teorema de Stone-Weierstrass, vide M. Stone, “A reminiscence on the extension of the Weierstrass approximation theorem”, Historia Math. 3 (1976), 328. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1434/1730 e, portanto, elementos de C(X, R). Vamos denotar por BR o conjunto de todas as funções Re (b) ou Im (b) para todos os elementos b ∈ B. Como Im (b) = −Re (ib), podemos alternativamente definir BR := {Re (b), b ∈ B}. É evidente que BR ⊂ B e que BR ⊂ C(X, R). Se b1 e b2 são elementos de B e α, β ∈ R, teremos que αRe (b1) + βRe (b2) = Re (αb1 + βb2) ∈ BR. Além disso, Re (b1)Re (b1) = 1 2 ( Re (b1b2)+Re (b1b2) ) ∈ BR. Isso provou que BR é uma álgebra real. Naturalmente 1 ∈ BR, de modo que BR é também unital. Agora, se x1 e x2 são dois pontos distintos de X sabemos que existe b ∈ B tal que b(x1) 6= b(x2) pois, por hipótese, B separa pontos. Mas isso implica ou que Re (b)(x1) 6= Re (b)(x2) ou que Im (b)(x1) 6= Im (b)(x2) (ou ambos). Lembremos que Im (b)(x1) 6= Im (b)(x2) significa Re (ib)(x1) 6= Re (ib)(x2). Isso mostrou que BR também separa pontos. Como vemos, BR satisfaz as hipóteses da parte I e conclúımos que toda função de C(X, R) pode ser uniformemente aproximada por elementos de BR. Seja agora h ∈ C(X, C). Podemos escrever h = Re (h) + iIm (h), com Re (h) e Im (h) sendo funções reais e cont́ınuas e, portanto, elementos de C(X, R). Escolhamos ǫ > 0. Pela parte I e pelas considerações acima, existem, b1 e b2 ∈ BR tais que ∥∥Re (h) − b1 ∥∥ ∞ < ǫ/2 e∥∥Im (h) − b2 ∥∥ ∞ < ǫ/2. Logo, definindo b ∈ B por b = b1 + ib2, teremos ∥∥h − b ∥∥ ∞ = ∥∥∥ ( Re (h) − b1 ) + i ( Im (h) − b2 )∥∥∥ ∞ ≤ ‖Re (h) − b1‖∞ + ‖Im (h) − b2‖∞ < ǫ . Isso provou que todo elemento de C(X, C) é uniformemente aproximável por um elemento de B, ou seja, que C(X, C) ⊂ B. Com (30.113) isso completa a demonstração O seguinte teorema, devido a Kakutani46 e Krein47, possui hipóteses ligeiramente diferentes das do Teorema de Stone-Weierstrass para o caso real. Teorema 30.17 (Teorema de Kakutani-Krein) Seja X compacto e B um subconjunto de C(X, R) com as seguintes propriedades: 1. B é um espaço vetorial real, 2. B contém a unidade. 3. B separa pontos, 4. se f e g ∈ B então f ∧ g = min{f, g} e f ∨ g = max{f, g} (vide (30.107)) são também elementos de B. Então, B = C(X, R), onde B é o fecho de B na topologia métrica definida pela norma ‖ · ‖∞. Assim, se c ∈ C(X, R) então para todo ǫ > 0 existe b ∈ B tal que sup x∈X |c(x) − b(x)| < ǫ. 2 Prova. As hipóteses acima diferem das da parte I do Teorema 30.16 pois não supomos aqui que B forma uma álgebra real, mas apenas que seja um espaço linear real e um reticulado com as operações binárias f ∧ g = min{f, g} e f ∨ g = max{f, g}. Contudo, observando a demonstração da parte I do Teorema 30.16, notamos que a hipótese de B ser uma álgebra é usada apenas para justificar a existência de f ∧ g e de f ∨ g em B. Portanto, se assumirmos que tais f ∧ g = min{f, g} e f ∨ g = max{f, g} são elementos de B, o resto da demonstração segue sem modificações. • Generalizando o Teorema de Weierstrass para conjuntos compactos Se α 6= 0 o polinômio p(x) = αx, x ∈ R, é bijetor e, portanto, separa pontos. Essa simples observação mostra que se C ⊂ R é compacto, então a álgebra B de todos os polinômios em R restritos a C satisfaz as hipóteses do Teorema de Stone-Weierstrass, Teorema 30.16, página 1431. Conclúımos que uma das conseqüências do Teorema de Stone-Weierstrass é a seguinte generalização do Teorema de Weierstrass, Teorema 30.3, página 1393: Teorema 30.18 (Teorema de Weierstrass) Seja f uma função real ou complexa, cont́ınua em um conjunto compacto C ⊂ R. Então, f pode ser aproximada uniformemente em C por polinômios, ou seja, para todo ǫ > 0 existe um polinômio pǫ tal que ‖pǫ − f‖∞ = sup x∈C |pǫ(x) − f(x)| ≤ ǫ. 2 46Shizuo Kakutani (1911–2004). 47Mark Grigorievich Krein (1097–1989). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1435/1730 30.6 Completeza de Algumas Famı́lias de Funções Nesta seção o leitor será apresentado a algumas demonstrações da propriedade de completeza de algumas famı́lias de funções de maior interesse. Devido à natureza do problema, serão utilizados resultados da teoria de integração demonstrados e discutidos em outros caṕıtulos deste texto. De particular relevância são as noções de espaço de Hilbert e de conjunto ortogonal completo em espaços de Hilbert, discutidas no Caṕıtulo 32, página 1537, cuja leitura é imprescind́ıvel para a compreensão do que segue. Como conseqüência dos nossos esforços estabeleceremos a possibilidade de aproximar certas funções pertencentes a certos espaços de Hilbert por certos conjuntos completos de funções em tais espaços. 30.6.1 Completeza de Polinômios Ortogonais em Intervalos Compactos Para o tratamento de polinômios ortogonais em intervalos compactos o teorema a seguir, o qual é uma conseqüência do Teorema de Weierstrass (Teorema 30.3, página 1393), é de importância fundamental: Proposição 30.14 Seja [a, b] ⊂ R um intervalo fechado, com b > a, e seja r uma função positiva e integrável no intervalo [a, b], ou seja, tal que ∫ b a r(x)dx seja finita. Seja f uma função cont́ınua definida em [a, b]. Então, ∫ b a f(x)xn r(x) dx = 0 (30.114) é válida para todo n ∈ N0, se e somente se f ≡ 0 em [a, b]. 2 Prova. Precisamos provar que se ∫ b a f(x)x n r(x) dx = 0 para todo n e f é cont́ınua, então f é identicamente nula. Como |f | é cont́ınua em um intervalo compacto, |f | assume um máximo M nesse intervalo, com M = maxx∈[a, b] |f(x)| (Teorema 28.16, página 1264). Pelo Teorema de Weierstrass, Teorema 30.3, página 1393, existe para todo ǫ > 0 um polinômio p tal que |f(x) − p(x)| ≤ ǫ para todo x ∈ [a, b]. Com esse polinômio p, podemos escrever ∫ b a |f(x)|2 r(x) dx = ∫ b a f(x)p(x) r(x) dx + ∫ b a f(x) ( f(x) − p(x) ) r(x) dx . Agora, pela hipótese (30.114), ∫ b a f(x)p(x) r(x) dx = 0, pois p, como todo polinômio, pode ser escrito como uma com- binação linear finita dos monômios xn. Fora isso, ∣∣∣∣∣ ∫ b a f(x) ( f(x) − p(x) ) r(x) dx ∣∣∣∣∣ ≤ ∫ b a |f(x)| |f(x) − p(x)| r(x) dx ≤ MǫR , onde R := ∫ b a r(x)dx. Conclúımos que ∫ b a |f(x)|2 r(x) dx ≤ MǫR e como ǫ é arbitrário, isso implica ∫ b a |f(x)|2 r(x) dx = 0. Como f é cont́ınua isso implica que f é identicamente nula, como queŕıamos provar. A Proposição 30.14 afirma que a única função cont́ınua que é ortogonal a todos os polinômios é a função nula. Ortogonalidade aqui é entendida em relação ao produto escalar 〈f, g〉r := ∫ b a f(x)g(x) r(x)dx definido no espaço de Hilbert das funções de quadrado integrável em relação à medida r(x)dx, ou seja, que satisfazem ∫ b a |f(x)|2 r(x)dx < ∞ . Denotaremos esse espaço de Hilbert por L2([a, b], r(x)dx), como de praxe. É claro que as funções cont́ınuas definidas no intervalo [a, b] são todas de quadrado integrável e, portanto, são elementos do espaço de Hilbert L2([a, b], r(x)dx). Mas nem todas as funções de quadrado integrável são cont́ınuas. A afirmação da Proposição 30.14 pode, porém, ser estendida ao espaço L2([a, b], r(x)dx). Esse é o conteúdo da proposição que segue. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1436/1730 Proposição 30.15 Seja [a, b] ⊂ R um intervalo fechado, com b > a, e seja r uma função positiva e integrável no intervalo [a, b], ou seja, tal que ∫ b a r(x)dx seja finita. Seja 〈k, l〉r := ∫ b a k(x)l(x)r(x)dx o produto escalar definido por r e L2([a, b], r(x)dx) o correspondente espaço de Hilbert de funções de quadrado integrável. Então, para g ∈ L2([a, b], r(x)dx) a relação ∫ b a g(x) xn r(x) dx = 0 (30.115) é válida para todo n ∈ N0, se e somente se g = 0 quase em toda parte em [a, b]. 2 Prova. Defina-se G(x) := ∫ x a g(y)r(y)dy. G é cont́ınua e diferenciável com G′(x) = g(x)r(x) quase em toda parte. É claro que G(a) = 0 e que G(b) = ∫ b a g(y)r(y)dy = 0 por (30.115) (para o caso particular n = 0). Assim, integração por partes diz-nos que 0 (30.115) = ∫ b a g(x)xn r(x) dx = ∫ b a G′(x)xn dx = G(b)bn − G(a)an︸ ︷︷ ︸ =0 −n ∫ b a G(x)xn−1 dx . Portanto, conclúımos que ∫ b a G(x)x n−1 dx = 0 para todo n ≥ 1. Como G é cont́ınua, podemos aplicar a Proposição 30.14, agora para o caso r ≡ 1, para concluir que G é identicamente nula. Como G′(x) = g(x)r(x) quase em toda parte, isso implica que g é nula quase em toda parte. Seja agora uma famı́lia de polinômios pn(x) em [a, b] para todo n ∈ N0, sendo que cada polinômio pn tem grau n e sendo que os polinômios pn(x) sejam ortonormais em relação ao produto escalar definido por r, ou seja, satisfazem 〈pm, pn〉r = δm, n para todos m, n (uma tal famı́lia sempre pode ser obtida a partir de p0(x) := R−1/2 pelo procedimento de ortogonalização de Gram-Schmidt. Vide Seção 3.3, página 166). Como cada polinômios pm(x) tem grau m, cada monômio xn pode ser escrito como uma combinação linear finita de polinômios pm(x) com m ≤ n. É dáı evidente que a Proposição 30.15 equivale à Proposição 30.16 Seja [a, b] ⊂ R um intervalo fechado, com b > a, e seja r uma função positiva e integrável no intervalo [a, b], ou seja, tal que ∫ b a r(x)dx seja finita. Seja 〈k, l〉r := ∫ b a k(x)l(x)r(x)dx o produto escalar definido por r e L2([a, b], r(x)dx) o correspondente espaço de Hilbert de funções de quadrado integrável. Seja pn(x),com n ∈ N0 uma famı́lia de polinômios ortonormais em relação ao produto escalar 〈·, ·〉r, ou seja, os polinômios pn satisfazem 〈pm, pn〉r = δm, n para todos m, n. Então, para g ∈ L2([a, b], r(x)dx) a relação ∫ b a g(x) pn(x) r(x) dx = 0 (30.116) é válida para todo n ∈ N0, se e somente se g = 0 quase em toda parte em [a, b]. 2 De acordo com as definições do Caṕıtulo 32, página 1537, a Proposição 30.16 diz-nos que L2([a, b], r(x)dx) é um espaço de Hilbert separável e que a famı́lia de polinômios ortonormais pn forma um conjunto ortonormal completo em L2([a, b], r(x)dx) (vide página 1548). Pelos Teoremas 32.5 e 32.6, páginas 1550 e 1551, respectivamente, vale para todo g ∈ L2([a, b], r(x)dx) g(x) = ∞∑ n=0 〈pn, g〉r pn(x) e ‖g‖2r = ∞∑ n=0 |〈pn, g〉r| 2 , (30.117) sendo ‖g‖r := √ 〈g, g〉r a norma de g em L2([a, b], r(x)dx). A convergência da primeira série em (30.117) se dá em relação à norma ‖ · ‖r de L2([a, b], r(x)dx), ou seja, tem-se lim N→∞ ∥∥∥∥∥g − N∑ n=0 〈pn, g〉r pn ∥∥∥∥∥ r = 0 . JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1439/1730 Proposição 30.19 Seja r uma função integrável no intervalo [a, b] ⊂ [−π, π] (com a ≤ b) e positiva em (a, b), ou seja, tal que r(x) > 0 para todo x ∈ (a, b) e que ∫ b a r(x)dx seja finita. Seja f uma função cont́ınua e periódica de peŕıodo 2π definida em [−π, π]. Então, ∫ b a f(x) einx r(x) dx = 0 (30.119) é válida para todo n ∈ Z se e somente se f ≡ 0 em [a, b]. 2 Prova. Como |f | é cont́ınua em um intervalo compacto, |f | assume um máximo M nesse intervalo, com M = max x∈[−π, π] |f(x)|. Pelo Teorema 30.9, página 1414, existe para todo ǫ > 0 um polinômio trigonométrico p de peŕıodo 2π tal que |f(x) − p(x)| ≤ ǫ para todo x ∈ [−π, π]. Com esse polinômio trigonométrico p, podemos escrever ∫ b a |f(x)|2 r(x) dx = ∫ b a f(x)p(x) r(x) dx + ∫ b a f(x) ( f(x) − p(x) ) r(x) dx . Agora, pela hipótese (30.119), ∫ b a f(x)p(x) r(x) dx = 0, pois p, como todo polinômio trigonométrico, pode ser escrito como uma combinação linear finita dos monômios einx. Fora isso, ∣∣∣∣∣ ∫ b a f(x) ( f(x) − p(x) ) r(x) dx ∣∣∣∣∣ ≤ ∫ b a |f(x)| |f(x) − p(x)| r(x) dx ≤ MǫR , onde R := ∫ b a r(x)dx. Conclúımos que ∫ b a |f(x)|2 r(x) dx ≤ MǫR e como ǫ é arbitrário, isso implica ∫ b a |f(x)|2 r(x) dx = 0. Como f é cont́ınua e r(x) > 0 em (a, b), isso implica que f é identicamente nula em [a, b], como queŕıamos provar. A Proposição 30.19 afirma que a única função cont́ınua e periódica de peŕıodo 2π que é ortogonal a todos os po- linômios trigonométricos é a função nula. Ortogonalidade aqui é entendida em relação ao produto escalar 〈f, g〉r :=∫ b a f(x)g(x) r(x)dx definido no espaço de Hilbert L2([a, b], r(x)dx) das funções de quadrado integrável em [a, b] em relação à medida r(x)dx, ou seja, que satisfazem ∫ b a |f(x)|2 r(x)dx < ∞ . Denotaremos esse espaço de Hilbert por Hr. A afirmação da Proposição 30.19 pode ser estendida ao espaço Hr. Esse é o conteúdo da proposição que segue. Proposição 30.20 Seja r uma função integrável no intervalo [a, b] ⊂ [−π, π] (com a ≤ b) e positiva em (a, b), ou seja, tal que r(x) > 0 para todo x ∈ (a, b) e que ∫ b a r(x)dx seja finita. Seja 〈k, l〉r := ∫ π −π k(x)l(x)r(x)dx o produto escalar definido por r e Hr ≡ L2([a, b], r(x)dx) o correspondente espaço de Hilbert de funções de quadrado integrável em relaçãp à medida r(x)dx. Então, para g ∈ Hr, a relação ∫ b a g(x) einx r(x) dx = 0 (30.120) é válida para todo n ∈ Z se e somente se g = 0 quase em toda parte em [a, b]. 2 Prova. Defina-se G(x) := ∫ x a g(y)r(y)dy. G é cont́ınua e diferenciável com G′(x) = g(x)r(x) quase em toda parte. É claro que G(a) = 0 e que G(b) = ∫ b a g(y)r(y)dy = 0, por (30.120) (para o caso particular n = 0). Integração por partes diz-nos que 0 (30.120) = ∫ b a g(x) einx r(x) dx = ∫ b a G′(x) einx dx = (−1)n ( G(b)einb − G(a)eina ) − in ∫ b a G(x) einx dx . JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1440/1730 Como G(a) = G(b) = 0, conclúımos que ∫ b a G(x) einx dx = 0 para todo n 6= 0 . (30.121) Seja agora a extensão 2π-periódica de G a todo R definida no intervalo [−π, π] por G̃ :=    G(x) , se x ∈ [a, b] 0 , se x ∈ [−π, π] \ [a, b] . Como G anula-se em a e em b, G̃ é cont́ınua e 2π-periódica. Pela definição e por (30.121), vale ∫ π −π G̃(x) einx dx = 0 para todo n 6= 0 . (30.122) Denotando G0 := 1 2π ∫ π −π G̃(y) dy, e definindo H(x) := G̃(x) − G0, conclúımos de (30.122) que ∫ π −π H(x) einx dx = 0 , agora para todo n ∈ Z (lembrar que para n 6= 0, ∫ π −π G0 e inx dx = G0 ∫ π −π e inx dx = 0). Como H é cont́ınua e 2π-periódica, podemos aplicar a Proposição 30.19 (adotando, naquela Proposição, o caso r ≡ 1 e [a, b] = [−π, π]), para concluir que H é identicamente nula. Como 0 = H ′(x) = G′(x) = g(x)r(x) quase em toda parte em [a, b], isso implica que g é nula quase em toda parte em [a, b]. Uma famı́lia de polinômios trigonométricos peŕıodo 2π, pn(x), n ∈ Z, é dita ser normal se todo monômio eimx puder ser escrito como uma combinação linear finita de polinômios pn. Suponhamos que os polinômios trigonométricos de um conjunto de polinômios normais pn(x) seja também ortonormais em relação ao produto escalar definido por r, ou seja, satisfazem 〈pm, pn〉r = δm, n para todos m, n (uma tal famı́lia sempre pode ser obtida a partir de p0(x) := R−1/2 (com R := ∫ b a r(x)dx) pelo procedimento de ortogonalização de Gram-Schmidt. Vide Seção 3.3, página 166). Como cada monômio einx pode ser escrito como uma combinação linear finita de polinômios pm(x), é evidente que a Proposição 30.20 equivale à Proposição 30.21 Seja r uma função integrável no intervalo [a, b] ⊂ [−π, π] (com a ≤ b) e positiva em (a, b), ou seja, tal que r(x) > 0 para todo x ∈ (a, b) e que ∫ b a r(x)dx seja finita. Seja 〈k, l〉r := ∫ b a k(x)l(x)r(x)dx o produto escalar definido por r e Hr ≡ L2([a, b], r(x)dx) o correspondente espaço de Hilbert de funções de quadrado integrável em relação à medida r(x)dx. Seja pn(x), com n ∈ Z, uma famı́lia normal de polinômios ortonormais em relação ao produto escalar 〈·, ·〉r, ou seja, todo monômio eimx pode ser escrito como uma combinação linear finita de polinômios pn os polinômios pn satisfazem 〈pm, pn〉r = δm, n para todos m, n ∈ Z. Então, para g ∈ Hr, a relação ∫ b a g(x) pn(x) r(x) dx = 0 (30.123) é válida para todo n ∈ Z se e somente se g = 0 quase em toda parte em [a, b]. 2 De acordo com as definições do Caṕıtulo 32, página 1537, a Proposição 30.21 está dizendo-nos que Hr ≡ L2([a, b], r(x)dx) é um espaço de Hilbert separável e que a famı́lia normal de polinômios trigonométricos ortonormais pn forma um conjunto ortonormal completo em Hr (vide página 1548). Pelos Teoremas 32.5 e 32.6, páginas 1550 e 1551, respectivamente, vale para todo g ∈ Hr g(x) = ∞∑ n=−∞ 〈pn, g〉r pn(x) (30.124) e ‖g‖2r = ∞∑ n=−∞ |〈pn, g〉r| 2 , (30.125) JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1441/1730 sendo ‖g‖r := √ 〈g, g〉r a norma de g em Hr. A convergência da série em (30.124) se dá em relação à norma ‖ · ‖r de Hr, ou seja, tem-se lim N→∞ ∥∥∥∥∥g − N∑ n=−N 〈pn, g〉r pn ∥∥∥∥∥ r = 0 . Naturalmente o caso mais importante se dá com [a, b] = [−π, π] e r ≡ 1, onde a famı́lia en(x) = einx√ 2π , n ∈ Z, compõe, de acordo com nossos resultados de acima, um conjunto ortonormal completo em L2([−π, π], dx). Tal resultado é de fundamental importância para a teoria das séries de Fourier e o enunciado preciso foi antecipado na forma do Teorema 30.14, página 1429. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1444/1730 e que ∫ x 0 t2 sen ( t2 ) dt = −1 2 ( x cos ( x2 ) − C(x) ) . Sugestão: integração por partes. c. Considere a função f : R → R, periódica de peŕıodo 2π e definida de sorte que no intervalo [−π, π) tenhamos f(y) :=    0 , −π ≤ y ≤ 0 , √ y , 0 < y < π . Determine sua série de Fourier S(f, x) = ∞∑ k=−∞ fk eikx√ 2π , expressando os coeficientes de Fourier fk em termos das funções de Fresnel C e S. d. Expresse a série de Fourier obtida acima como uma série de senos e co-senos, ou seja, na forma S(f, x) = A0 2 + ∞∑ n=1 An cos(nx) + ∞∑ n=1 Bn sen (nx) . Escreva os coeficientes An, n ≥ 0 e Bn, n ≥ 1, em termos das funções de Fresnel C e S. e. Mostre que a função f , acima, não satisfaz as condições do Teorema de Fourier, Teorema 30.12, página 1420, mas satisfaz a condição de Dini (vide Teorema 30.11, página 1419), ou seja, existe κ > 0, pequeno o suficiente, tal que ∫ κ 0 |Df (x, y)| y dy < ∞ , onde Df (x, y) := f(x + y) + f(x − y) − f(x+) − f(x−). Explicite, com base nesse fato, a quais valores a série de Fourier de f deve convergir em cada ponto. f. Usando (30.126), obtenha o comportamento assintótico dos coeficientes de Fourier de f . 6 E. 30.19 Exerćıcio. Seja M > 0 e seja f a função periódica de peŕıodo 2M definida de forma que para −M ≤ x ≤ M tenhamos f(x) :=    M + x, para − M ≤ x ≤ 0 , M − x, para 0 ≤ x ≤ M . Faça um esboço do gráfico dessa função e determine sua expansão em série de Fourier. Usando o Teorema de Fourier e calculando a série no ponto x = 0, mostre que ∞∑ n=1 1 (2n − 1)2 = π2 8 . Você saberia como obter essa identidade por outros meios? 6 E. 30.20 Exerćıcio. Seja M > 0 e seja f a função periódica de peŕıodo 2M definida de forma que para −M ≤ x < M tenhamos f(x) = x2. Faça um esboço do gráfico dessa função e determine sua expansão em série de Fourier. Usando o Teorema de Fourier e calculando a série no ponto x = M , mostre que ∞∑ n=1 1 n2 = π2 6 . (30.127) Essa célebre identidade foi obtida por Euler em 1735. Essa expressão também pode ser obtida com uso dos chamados números de Bernoulli (definidos à página 544.). Vide expressão (12.47), página 546. 6 JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1445/1730 E. 30.21 Exerćıcio. Seja f a função periódica de peŕıodo 2π definida de forma que para 0 ≤ x < 2π tenhamos f(x) = ex/2π. a. Faça um esboço do gráfico dessa função e determine sua expansão em série de Fourier. b. Usando o Teorema de Fourier e calculando a série no ponto x = 2π, mostre que ∞∑ n=1 1 1 + 4π2n2 = 3 − e 4(e − 1) . (30.128) c. Usando o Teorema de Fourier e calculando a série no ponto x = π, mostre que ∞∑ n=1 (−1)n 1 + 4π2n2 = 1 2 ( √ e e − 1 − 1 ) . 6 E. 30.22 Exerćıcio-dirigido. Seja f a função periódica de peŕıodo 2π definida de forma que para −π ≤ x ≤ π tenhamos f(x) := cos(αx) , onde α ∈ R, α 6∈ Z. a. Determine a expansão em série de Fourier de f . b. Usando a expansão obtida, mostre que ∞∑ n=1 1 n2 − α2 = 1 2α ( 1 α − π cot(πα) ) . (30.129) Essa importante identidade vale para todo α não-inteiro. Ela é denominada fórmula da cotangente de Euler, ou expansão em frações parciais da função cotangente, e foi obtida pela primeira vez por Euler em 1749, usando outros métodos. Para uma outra elegante demonstração (devida a Herglotz51) de (30.129) , vide Exerćıcio E. 12.32, página 592. Para uma demonstração usando a chamada representação produto da função seno, vide Exerćıcio E. 5.4, página 206. c. Usando a identidade (30.129), mostre que ∞∑ n=1 1 4n2 − 1 = 1 2 . Sugestão. Tome α = 1/2. d. Usando a mesma identidade (30.129), mostre também que ∞∑ n=1 1 16n2 − 1 = 4 − π 8 . Sugestão. Tome α = 1/4. e. Usando a identidade (30.129), mostre que para β ∈ R, β 6= 0, ∞∑ n=1 1 n2 + β2 = 1 2β ( π coth(πβ) − 1 β ) . (30.130) e obtenha disso que 1 2a tanh(a/2) = ∞∑ n=−∞ 1 a2 + (2πn)2 , (30.131) com a ∈ R, a 6= 0. Sugestão. Tome α = iβ na identidade (30.129). O que justifica podermos fazer isso? 51Gustav Ferdinand Maria Herglotz (1881–1953). JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1446/1730 f. Reobtenha a identidade (30.128) tomando para tal β = (2π)−1. g. Usando os fatos acima, mostre que, para β não-inteiro, ∞∑ n=1 n2 n4 − β4 = π 4β (coth(πβ) − cot(πβ)) . Sugestão. Explore o fato que 1 n2 − β2 + 1 n2 + β2 = 2n2 n4 − β4 . h. Mostre que, para β não-inteiro, ∞∑ n=1 1 n4 − β4 = 1 2β3 ( 1 β − π 2 (coth(πβ) + cot(πβ)) ) . Sugestão. Explore o fato que 1 n2 − β2 − 1 n2 + β2 = 2β2 n4 − β4 . 6 E. 30.23 Exerćıcio. Para a > 0, fixo, seja ga a função cont́ınua e periódica de peŕıodo 1 que no intervalo 0 ≤ x < 1 vale ga(x) = cosh ( a ( x − 1 2 )) . (30.132) Determine sua série de Fourier e obtenha ga(x) = 2a senh (a 2 ) ∞∑ m=−∞ e2πimx a2 + (2πm)2 . (30.133) No Exerćıcio E. 31.19, página 1482, a identidade (30.133) é obtida a partir da chamada fórmula de soma de Poisson. Compare também (30.133)–(30.132) com os resultados do Exerćıcio E. 30.22, página 1445. 6 E. 30.24 Exerćıcio. Seja M > 0 e seja f a função periódica de peŕıodo 2M definida de forma que para −M ≤ x ≤ M tenhamos f(x) := x2 − M 2 3 . a. Mostre que sua expansão em série de Fourier é dada por 4M2 π2 ∞∑ n=1 (−1)n n2 cos (nπx M ) . b. Aplicando a identidade de Parseval para essa expansão mostre que ∞∑ n=1 1 n4 = π4 90 . Essa célebre identidade foi obtida por Euler em 1735 e também pode ser obtida com uso dos chamados números de Bernoulli (definidos à página 544.). Vide expressão (12.47), página 546. c. Esta última identidade pode ser usada para determinar o valor de π. Com o uso, por exemplo, de uma calculadora estime a série da esquerda calculando a soma dos seus, digamos, 10 primeiros termos e verifique se a aproximação é boa. 6 JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1449/1730 Apêndices 30.A Prova do Teorema de Weierstrass Usando Polinômios de Bernstein Nesta seção demonstraremos o Teorema de Weierstrass, Teorema 30.3, página 1393, fazendo uso dos chamados polinômios de Bernstein. • Polinômios de Bernstein Para cada n ∈ N0, os chamados polinômios de Bernstein52 de grau n são definidos por B [0] 0 (x) := 1 , B [n] p (x) := ( n p ) xp(1 − x)n−p , n > 0 , 0 ≤ p ≤ n , p ∈ N0 . (30.A.1) O fato importante estabelecido na proposição que segue diz respeito à independência linear dos n+1 polinômios B [n] p (x), 0 ≤ p ≤ n para cada n ≥ 0. Proposição 30.22 Para n > 0 as ráızes de B [n] p (x) são 0, 1, ou ambas, sendo que B [n] p (x) tem um zero de ordem p em x = 0 e um zero de ordem n − p em x = 1. Para cada n, os n + 1 polinômios B [n] p (x), com 0 ≤ p ≤ n, são linearmente independentes. 2 Prova. As afirmações sobre as ráızes são evidentes e não requerem demonstração. Passemos à prova da independência linear. Para n = 0 não há o que provar, pois B [0] 0 (x) 6= 0. Seja então n > 0. Vamos supor que existam constantes αp, 0 ≤ p ≤ n, com n∑ p=0 αpB [n] p (x) = 0 . (30.A.2) Como B [n] 0 (0) 6= 0 e B [n] p (0) = 0 se p > 0, tomar x = 0 em (30.A.2) fornece α0 = 0, de modo que (30.A.2) reduz-se a n∑ p=1 αpB [n] p (x) = 0 . (30.A.3) Tomando a primeira derivada dessa expressão, calculando-a em x = 0 e lembrando que cada B [n] p (x) tem um zero de ordem p em x = 0, obtemos α1 = 0. Prosseguindo dessa forma, obtém-se após n + 1 passos que αp = 0 para todo 0 ≤ p ≤ n. A proposição acima permite afirmar que para cada n, os polinômios B [n] p , com 0 ≤ p ≤ n, formam uma base no espaço de polinômios de grau n, ou seja, que todo polinômio de grau n pode ser escrito na forma n∑ p=0 θpB [n] p (x), onde θp, 0 ≤ p ≤ n, são constantes. Essa é a chamada forma de Bernstein, ou representação de Bernstein, de polinômios de grau n. • Um resultados preliminar O resultado a seguir é um tanto técnico, mas será utilizado adiante em uma demonstração importante. Lema 30.2 Sejam os polinômios de Bernstein definidos em (30.A.1). Então, para cada n ∈ N0 vale a seguinte identi- dade: n∑ p=0 (p − nx)2 B[n]p (x) = nx(1 − x) . (30.A.4) 52Sergi Natanovich Bernstein (1880–1968). Bernstein introduziu os polinômios que levam seu nome em trabalho de 1911 sobre o Teorema de Weierstrass e interpolações polinomiais. JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1450/1730 2 Prova. Pelo binômio de Newton, vale (x + y)n = n∑ p=0 ( n p ) xpyn−p (30.A.5) para todo n ∈ N0 e todos x, y ∈ R. Para provar (30.A.4), apliquemos o operador diferencial Dx := x 2 ∂ 2 ∂x2 + x(1 − 2nx) ∂ ∂x + n2x2 a ambos os lados de (30.A.5). Para o lado esquerdo de (30.A.5), temos Dx ( (x + y)n ) = nx [ y + nx ( 1 − (x + y) )2] (x + y)n−2 (verifique!) e para o lado direito de (30.A.5), temos Dx ( n∑ p=0 ( n p ) xpyn−p ) = n∑ p=0 (p − nx)2 ( n p ) xpyn−p (verifique!). Igualando as expressões acima, obtemos a identidade nx [ y + nx ( 1 − (x + y) )2] (x + y)n−2 = n∑ p=0 (p − nx)2 ( n p ) xpyn−p . Tomando nesta expressão y = 1 − x, obtemos nx(1 − x) = n∑ p=0 (p − nx)2 ( n p ) xp(1 − x)n−p = n∑ p=0 (p − nx)2 B[n]p (x) , como queŕıamos provar. • Outras propriedades básicas dos polinômios de Bernstein A proposição que segue estabelece mais alguns fatos básicos sobre os polinômios de Bernstein B [n] p (x). O estudante deve observar que alguns dos fatos listados abaixo permitem perceber que os polinômios de Bernstein B [n] p (x) assemelham- se, em um certo sentido, a seqüências delta de Dirac. Proposição 30.23 Os polinômios de Bernstein B [n] p têm as seguintes propriedades: 1. B [n] p (x) ≥ 0 para todo x ∈ [0, 1]. 2. Para todo n ≥ 0 vale n∑ p=0 B[n]p (x) = 1 . (30.A.6) 3. Para n > 0 cada polinômio B [n] p (x) tem no intervalo [0, 1] um máximo absoluto em x = p n . 4. Para todo δ > 0 e todo n > 0 vale a desigualdade n∑ p=0 | p n −x|>δ B[n]p (x) ≤ 1 4δ2 n . (30.A.7) 2 JCABarata. Curso de F́ısica-Matemática Versão de 19 de março de 2010. Caṕıtulo 30 1451/1730 Prova. O item 1 é evidente. Tomando-se y = 1 − x, o binômio de Newton (30.A.5) fica 1 = n∑ p=0 ( n p ) xp(1 − x)n−p = n∑ p=0 B[n]p (x) , provando (30.A.6) e o item 2. O item 3 prova-se facilmente calculando a derivada de B [n] p (x). Passemos à prova do item 4. Se para algum δ > 0 vale | pn − x| > δ, então n2δ2 < (p − nx)2, Logo, n∑ p=0 | p n −x|>δ B[n]p (x) = 1 n2δ2 n∑ p=0 | p n −x|>δ ( n2δ2 ) B[n]p (x) < 1 n2δ2 n∑ p=0 | p n −x|>δ (p − nx)2B[n]p (x) ≤ 1 n2δ2 n∑ p=0 (p − nx)2B[n]p (x) (30.A.4) = x(1 − x) nδ2 ≤ 1 4nδ2 , completando a prova. Na última desigualdade usamos o fato que a função x(1 − x) tem um máximo absoluto em toda reta real para x = 1/2, quando vale 1/4. • Prova do Teorema de Weierstrass no intervalo [0, 1] Passemos agora à demonstração do Teorema de Weierstrass, Teorema 30.3, página 1393, no intervalo [0, 1] usando polinômios de Bernstein. Teorema 30.19 Seja uma função cont́ınua f : [0, 1] → C. Então, os polinômios de grau n b [n] f (x) := n∑ p=0 f ( p n ) B[n]p (x) = n∑ p=0 f ( p n ) (n p ) xp(1 − x)n−p , ditos aproximantes de Bernstein da função f , aproximam uniformemente f no intervalo [0, 1], ou seja, para todo ǫ > 0 existe N(ǫ) tal que ∥∥∥f − b[n]f ∥∥∥ ∞ := sup x∈[0, 1] ∣∣∣f(x) − b[n]f (x) ∣∣∣ ≤ ǫ para todo n ≥ N(ǫ). 2 Prova. Usando (30.A.6), podemos escrever f(x) − b[n]f (x) = n∑ p=0 [ f(x) − f ( p n )] B[n]p (x) , implicando ∣∣∣f(x) − b[n]f (x) ∣∣∣ ≤ n∑ p=0 ∣∣∣f(x) − f ( p n )∣∣∣ B[n]p (x) . (30.A.8) Por ser cont́ınua, f é uniformemente cont́ınua no intervalo compacto [0, 1] (Teorema 28.12, página 1261), ou seja, Para todo ǫ > 0 existe δ ≡ δ(ǫ) tal que |f(x) − f(y)| < ǫ/2 sempre que |x − y| < δ. Assim, fixando ǫ > 0 teremos que∣∣f(x) − f ( p n )∣∣ < ǫ/2 sempre que ∣∣x − pn ∣∣ < δ.
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