Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

Comentário de Calvino Sobre Obadias, Notas de estudo de Teologia

Comentário de Calvino Sobre Obadias

Tipologia: Notas de estudo

2010

Compartilhado em 19/05/2010

presbiteriana-fundamentalista-7
presbiteriana-fundamentalista-7 🇧🇷

4.6

(16)

37 documentos

Pré-visualização parcial do texto

Baixe Comentário de Calvino Sobre Obadias e outras Notas de estudo em PDF para Teologia, somente na Docsity! Comentário sobre END e. VI João Calvino Texto extraído e traduzido da primeira versão inglesa de 1816 Commentary on the Twelve Minor Prophets. Volume Second: Joel, Amos and Obadiah Tradução: Vanderson Moura da Silva Capa: Raniere Maciel Menezes 5 www.monergismo.com precisamos aplicar muito labor. É-nos bastante conhecer que essa profecia foi acrescentada a outras para que os israelitas sentissem-se assegurados de que, conquanto seus parentes, os idumeus, prosperassem por um tempo, todavia, esses não escapariam da mão divina, mas em breve seriam obrigados a prestar contas de sua crueldade, visto como sem causa estiveram em violenta paixão contra o atribulado e aflito povo de Deus. Ora, nosso Profeta no final revela que Deus se tornaria o vingador de tal crueldade, a qual os idumeus haviam exercido; pois, ainda que castigasse seu próprio povo, ele, todavia, não esqueceu sua aliança gratuita. Vamos agora às palavras. 6 www.monergismo.com COMENTÁRIOS SOBRE O PROFETA OBADIAS Obadias 1 1. A visão de Obadias: Assim diz o SENHOR Deus com respeito a Edom: 4 “Ouvimos uma notícia da parte do Senhor, e enviou-se às nações um mensageiro, dizendo: 'Levantai-vos, e levantemo-nos contra ela para o combate'”. 1. Visio Obadiae. Sic Dominus Jehova contra Edom, Rumorem audivimus a Jehova, et legatus ad gentes missus est, Surgite et surgamus contra eam ad proelium. O prefácio de Obadias é que ele não trazia nada humano, mas somente declarava a visão que lhe foi apresentada de cima. Deveras conhecemos que era só Deus quem tinha de ser sempre ouvido na Igreja, tal como agora ele exige ser ouvido: no entanto, enviou seus profetas e, posteriormente, os apóstolos: sim, mandou seu Filho unigênito, a quem ele estabeleceu sobre nós para ser nosso único e soberano Mestre. Obadias então, ao dizer que era uma visão, dizia a mesma coisa que se declarasse que não entregava de maneira presuntiva seus próprios sonhos, ou o que ele conjecturou ou descobriu pela razão humana, mas que aduzia apenas a um oráculo celestial: pois /wzj, chazon, como observamos em outras partes, era uma visão, pela qual Deus se revelava aos Profetas dele. Ele então adiciona: Assim diz Jeová. Aqui está uma expressão mais completa da mesma declaração. Desse modo, vemos que o Profeta, a fim de que a doutrina que apresentava não recebesse suspeitas, fazia de Deus o autor. Pois que fé pode ser posta nos homens, os quais sabemos ser vãos e falsos, a não ser até o ponto em que sejam regidos pelo Espírito de Deus e enviados por Ele? Então, visto que o Profeta tão cuidadosamente nos ensina que o que ele declarou lhe foi entregue por Deus, podemos daí aprender aquilo a que me referi há pouco — que os Profetas outrora falavam assim para que somente Deus fosse ouvido entre o povo. Em seguida, diz: Um rumor ouvimos. Alguns vertem-no, uma palavra, ou uma doutrina. Huwmc, shmu'ah, é propriamente uma audiência, e é derivado do verbo que o Profeta acrescenta no fim. Uma audiência nós ouvimos, então; assim é traduzido literalmente. Contudo, acham alguns que o que foi ensinado é enfatizado, como se dissesse: “O Senhor revelou isso a mim e aos outros Profetas”; conforme o que Isaías diz (Is 53.1): ‘Quem creu na nossa audiência?’ O termo é o mesmo, e ele fala da palavra ou doutrina de Deus. Mas é provável que ele aluda aqui àqueles rumores desordenados que normalmente precedem as guerras e calamidades. Nós ouvimos então um rumor. O verbo em Jeremias não está no plural, wnumc shama'nu, mas wtumc huwmc shmu'ah shama'ti, ‘Eu ouvi,’ diz Jeremias, ‘uma audiência.’ Porém, nosso Profeta usa o plural: 'Nós ouvimos uma audiência.' Entretanto, o sentido é o mesmo; pois Jeremias diz que ouvira boatos; e o Profeta aqui acrescenta outros a si próprio: “Esse rumor se espalhou, porém, é do Senhor: é certo que tal notícia foi ouvida até pelos profanos e desprezadores de Deus.” Mas o Profeta revela que guerras não são suscitadas por acaso, mas pela secreta influência divina, como se dissesse: “Quando um tumulto surge, não pensemos que seu início seja oriundo da terra, mas Deus mesmo é o autor.” 4 A Septuaginta verte as palavras, “para Edom” — Ταδε λεγει κυριος ὁ Θεὁς τη Ιδουµαὁα — “Assim diz o Senhor Deus à Iduméia”; o que é uma tradução exata do original, que é <wdal — “para Edom”. Era uma mensagem de Deus para aquele povo. Não podemos concluir daí que essa profecia foi enviada a eles por Obadias? A eles se dirige amiúde de forma pessoal: e isso parece favorecer uma semelhante suposição. É sem dúvida verdade que l prefixado a uma palavra depois do verbo, dizer ou falar, é freqüentemente vertida de, ou concernente; porém, também é traduzida como para, significando que a alocução é feita à pessoa. (N. do E. inglês.) 7 www.monergismo.com Apreendemos agora, pois, o desígnio do Profeta: malgrado falar do rumor de guerras, ele, não obstante, mostra que o acaso ou acidente não governa em tais comoções, mas sim a influência oculta de Deus. Nós ouvimos de Jeová, ele diz, e um mensageiro, ou, um embaixador às nações foi enviado 5 , Levantai-vos, e subamos contra ela para a batalha. Em Jeremias é: ‘Reuni-vos, vinde e subi contra ela para a peleja'. O Profeta revela aqui, não tenho dúvida, de onde o rumor que acabara de mencionar provinha; pois estavam ora incitando-se um ao outro, de fato, para destruir aquela terra. Se alguém tivesse formado opinião segundo a sabedoria humana, teria dito que os assírios eram a causa por que a guerra era trazida sobre os idumeus, seja porque eles os tinha achado inconstantes ou até pérfidos, seja porque tinham inventado um pretexto quando não havia razão alguma para fazer guerra. Porém, o Profeta aqui volta sua mente para o alto e reconhece Deus como a causa dessa guerra, pois que intentava esse punir a crueldade daquele povo, a qual exercera para com os próprios parentes, os israelitas; e, simultaneamente, encoraja outros também, para que compreendessem que era totalmente dirigidos pelo conselho oculto de Deus, que os assírios, amigos, de súbito viraram inimigos, que uma guerra estava totalmente conflagrada contra os idumeus em um tempo em que esses estavam folgados, sem qualquer receio, sem qualquer apreensão do perigo. Segue-se — Obadias 2-4 2. Eis que te fiz pequeno entre as nações. Tu és mui desprezado. 3. O orgulho do teu coração enganou-te, tu que moras nas fendas do rochedo, cuja habitação é alta, dizendo no teu coração: 'Quem me fará descer à terra?' 4. Ainda que te remontes como águia, e coloques teu ninho entre as estrelas, de lá te derribarei, diz o SENHOR. 2. Ecce parvum posui te inter gentes, contemptus tu valde. 3. Superbia cordis tui decepit te, qui habitas in scissuras petrae (vel, rupis;) excelsa habitatio ejus, dicens in corde suo, Quis detrahet me in terram? 4. Si exaltaveris quasi aquila, etsi inter nubes posueris nidum suum, inde ego detraham te, dicit Jehova. Jeremias utiliza quase as mesmas palavras; mas o sentido da expressão é ambíguo quando diz: 'Eis, pequeno te formei'. A mim parece provável que o Profeta exprobra os idumeus, pois que se tornaram arrogantes, por assim dizer, contra a vontade de Deus, e em oposição a ela, embora estivessem, entrementes, confinados às vielas das montanhas. É dito noutra parte (Ml 1.2): 'Jacó e Esaú não eram irmãos?' “Contudo, eu vos dei a herança prometida a vosso pai Abraão; eu transferi os idumeus para o monte Seir”. Ora, é menos tolerável quando alguém está cheio de orgulho e sua condição não é tão honrosa. Portanto, acho que os idumeus são aqui condenados porque se vangloriaram muito, arrogando a si próprios mais do que era direito, embora fossem desprezíveis, embora seu estado fosse inferior e humilde, pois habitavam no monte Seir. Todavia, pensam outros que a punição, a qual pairava sobre eles, é aqui anunciada: Eis, pequeno te fiz entre as nações, e Jeremias diz, e abjeto entre os homens; ele omite as duas palavras, tu e sobremodo; diz apenas: 'e abjeto entre os homens'. Porém, quanto à essência, mal há diferença. Então, se entendermos que aquela nação era orgulhosa sem razão, o sentido fica patente, isto é, que eles, como os gigantes, 5 Ou as duas linhas podem ser assim traduzidas: Um rumor ouvimos de Jeová, E um mensageiro às nações ele enviou. O verbo, enviar, está na voz ativa aqui; e assim está vertido na Septuaginta. Está de fato na passiva na passagem correspondente em Jeremias; mas há vários outros casos de variedade nas expressões usadas pelos dois Profetas, conquanto haja no sentido uma concordância material. (N. do E. inglês.) 10 www.monergismo.com SEPTUAGÉSIMA DISSERTAÇÃO Observamos em nossa Dissertação de ontem que de nada aproveita aos ímpios instalarem suas fortalezas contra o juízo de Deus, como se pudessem escapar ilesos da mão dele; pois, como esse tem o céu e a terra sob seu controle, pode, sempre que lhe aprazar, derribar todos os que ora desdenham de seu poder e, por conseguinte, mofam dos Profetas ou reputam como nada as ameaças deles. Essa passagem, então, tem que ser cuidadosamente observada, uma vez que Deus declara que está em seu poder arriar das próprias nuvens aqueles que assim se elevam, pensando estar alçados acima de todos os perigos. O Profeta agora diz — Obadias 5 5. Caso chegassem a ti ladrões, ou assaltantes de noite (como estás destruído!) não furtariam o quanto lhes bastassem? Caso chegassem a ti vindimadores, não deixariam ao menos algumas uvas? 5. An fures venerunt ad te? An praedones nocturni? Quomodo in silentium redactus es? (vel, quomodo consumptus es?) annon furati essent sufficientiam suam? An vindemiatores ad te venerunt? Annon reliquissent racemos? O Profeta revela nesse versículo que a calamidade com a qual Deus estava decidido a afligir os idumeus não seria leve, pois nada seria deixado entre eles; e amplia o que diz através de uma comparação. Quando alguém é roubado de seu patrimônio por ladrões, lastima que o que ele havia adquirido por muito labor ao longo da vida foi, em um momento, tirado: e, quando alguém despende labor e custas no cultivo de sua vinha e outro toma seus frutos, queixa-se de sua grande desventura, que perdera sua propriedade e grande trabalho ao cultivar seu vinhedo, enquanto outrem devora aqueles. Porém, o Profeta declara que Deus não seria contentado com tal espécie de castigo no tocante aos idumeus. Por esse motivo ele diz: Ladrões ou salteadores noturnos vieram a ti? Eles, sem dúvida, furtaram, tirando o que julgavam suficiente para si; mas agora nada te será deixado. Em suma, o Profeta sugere que os assírios não seriam como ladrões ou assaltantes da noite, os quais furtiva e secretamente retiram o que vem às suas mãos; mas quer dizer que os idumeus seriam tão esbulhados que suas casas seriam deixadas totalmente vazias, declarando que os assírios espoliariam-nos como ladrões ou salteadores noturnos, os quais estão habituados a proceder com irrefreada liberdade; pois ninguém ousa resistir a eles, ou mesmo dizer uma palavra contra eles. Esse saque, então, diz o Profeta, não será de uma espécie ordinária; porém, os inimigos torná-los- iam inteiramente destituídos. O objetivo em vista é o mesmo quando ele diz: Vindimadeiros chegaram a ti? Para se assegurarem, eles comumente deixam alguns cachos; contudo, os assírios não deixarão sequer uma uva: eles partirão tão carregados de rapina que tu serás deixado vazio. Mas tudo isso, como vos lembramos, foi dito a fim de aliviar ou mitigar a tristeza dos fiéis, os quais se consideravam então mui miseráveis, visto que somente eles foram pilhados pelos inimigos; pois viam que seus vizinhos estavam morando em segurança, e até se tornando participantes do saque. A condição deles era mui infeliz e degradada. Destarte o Profeta, para moderar esse amargo pesar, diz que os idumeus não seriam espoliados de um modo comum, pois nem um fio de cabelo lhes seria deixado. Eis a significação da passagem. Mas alguns consideram o verbo htymdn nidmeitah como significando “tu estás reduzidos ao silêncio”; pois o verbo <yd dum ou hmd damah quer dizer ficar silencioso, e dão esta interpretação: “Como tu não te esforçaste ao menos para enfrentar teus inimigos?” Pois entendem 11 www.monergismo.com “estar silencioso” na acepção de ficar parado, visto que hmd damah com freqüência é empregado assim nas Escrituras: “Como então ficastes silencioso?” Porém, ele fala do tempo futuro no pretérito, como se Deus já houvesse infligido punição aos idumeus, para que a fé no vaticínio ficasse mais certa: tu foste reduzido ao silêncio, isto é, como pudeste tu permanecer quieto ao ver teus inimigos esbulhando com tanta violência – como então foste reduzido ao silêncio? Dizem outros: Como tu foste consumido? Pois hmd damah freqüentemente denota destruir. Contudo, esse ponto não tem grande importância; pois o Profeta quer dizer que isto não pode ser atribuído ao acaso, que inimigos destruiriam toda a terra de Edom, pois a cruel investida não seria de modo algum de tipo ordinário: então, como os idumeus julgavam que de todos os lados estavam cerradas as entradas aos inimigos, já que residiam nos cumes das montanhas, conforme o que eu já disse, e que estavam muitíssimo seguros em seus recessos e rochas elevadas, o Profeta aqui apresenta como algo espantoso o juízo divino que ainda os alcançaria. Prossigamos — Obadias 6 6. Como estão devastados os bens de Esaú! Como são vasculhados os seus tesouros ocultados! 6. Quomodo quaesita sunt Esau, pervestigata abscondita ejus? Ele confirma a frase anterior — que os idumeus debalde confiavam que seus haveres estariam a salvo por terem recônditos ocultos e profundos. Mesmo quando um país é saqueado pelos inimigos, os conquistadores não ousam ir a locais de perigo; quando há vielas, evitam-nas, pois acham que há algum mal intento. Dessarte esses, receando os lugares escondidos, pilham apenas aqueles que estão abertos, sempre refletindo bastante sobre se o avanço deles está seguro: mas a Iduméia, como dissemos, tinha recessos ocultos, pois suas rochas eram quase inacessíveis, e havia muita facilidade ali para esconder e ocultar seus tesouros. Porém, o Profeta diz que tudo isso seria inútil: e, para que mais eficazmente os estimulasse, fala com espanto, como de algo incrível: Como são exploradas as coisas de Esaú, e exaustivamente revistados seus lugares ocultos! Quem podia ter imaginado isso? Porque eles podiam ter ocultado seus tesouros em rochas e cavernas, e daí rechaçado a seus inimigos. Mas todas as suas tentativas seriam em vão: como tal era possível? Aqui, então, ele desperta as mentes dos homens, para que reconhecessem o juízo de Deus; e, ao mesmo tempo, ri com desdém da vã confiança com a qual os idumeus estavam inchados; além do que, fortalece as mentes dos piedosos, para que não duvidassem de que Deus realizaria o que declara, pois ele pode de fato penetrar até no mais fundo. Em resumo, o Profeta sugere que os fiéis não agiam com sabedoria se medissem a vingança de Deus, a qual pairava sobre os idumeus, por seu próprio entendimento ou pelo que comumente acontece; pois o Senhor faria uma busca cabal, de modo que nenhum esconderijo escaparia à sua visão; e então todos os tesouros deles ficariam expostos como presas aos seus inimigos. Aprendemos, por conseguinte, que, assim como os homens debalde procuram esconderijos para si para que fiquem a salvo de perigos, também debalde ocultam suas riquezas; pois a mão divina pode penetrar além do mar, da terra, do céu e do local mais profundo. Nada pois nos resta que não sempre oferecer a nós próprios e as nossas coisas todas a Deus. Se ele nos proteger sob suas asas, estaremos seguros em meio a incontáveis perigos; porém, caso pensemos que os subterfúgios ser- nos-ão de algum proveito, ludibriaremos a nós próprios. O Profeta agora adiciona — Obadias 7,8 7. Todos os teus aliados te enviam até a fronteira: os que estavam em paz contigo enganaram-te, e prevaleceram contra ti; os que 7. Usque ad terminum expulerunt te omnes viri foederis tui; deceperunt te, praevaluerunt tibi, viri pacifici tui (viri pacis tuae;) viri panis 12 www.monergismo.com comem teu pão colocaram uma rede debaixo de ti; não há inteligência nele. 8. E não sucederá naquele dia, diz o Senhor, que aniquilarei os homens sábios de Edom, e o discernimento do monte de Esaú? tui posuerunt vulnus sub te: nulla est intelligentia in eo. 8. Annon in die illa, dicit Jehova, perdam sapientes ex Edom? Et intelligentiam e monte Esau? (hoc est, e monte Seir.) Aqui o Profeta expressa a maneira pela qual Deus puniria os idumeus: ao confiar em suas alianças, eles menosprezavam a Deus, como já tínhamos observado. O Profeta ora revela que está no poder de Deus transformar as mentes dos homens, de modo que aqueles que eram amigos ficassem repentinamente inflamados de fúria e partissem para destruir os idumeus. Visto pois que não apenas considerassem os assírios como um escudo, mas também uma defesa contra o próprio Deus, o Profeta declara aqui que, quando fosse do propósito divino castigá-los, não haveria necessidade de mandar chamar de longe agentes ou instrumentos para executar a vingança daquele; pois Deus armaria os próprios assírios e os caldeus, na medida em que pode mudar os corações dos homens como lhe agradar. Percebemos agora o que o Profeta quis dizer: pois ele aqui tira e sacode a vã confiança dos idumeus, para que não se endurecessem por estarem fortalecidos por acordos e por possuírem amigos poderosos, pois o Senhor transformaria esses em inimigos. À tua fronteira, ele diz, eles te conduzirão. jlv shalach é propriamente expedir ou jogar fora; alguns vertem-no, eles seguiram; como se o Profeta aqui falasse das nações vizinhas, e segundo o parecer deles o sentido é: “Por mais que teus vizinhos gostem de ti, todavia, não demonstrarão coisa alguma desse amor, porém, seguir-te-ão com lágrimas fingidas quando teus inimigos te levarem embora em cativeiro”. Contudo, esta é uma explicação forçada, que não corresponde ao contexto. O Profeta então descreve aqui, não duvido, a mudança, tal como ocorreria, para que os idumeus soubessem que confiavam debalde em seu poder e defesas. Os homens de teu pacto, diz, expulsaram-te; como se dissesse: “Veja o que tu ganhaste em sofregamente buscar a amizade daqueles que, todavia, serão teus inimigos; permaneceste tu quieto em tuas fendas, teria sido muito melhor para ti: porém, agora tu correste para a Assíria e a Caldéia, e tal será a causa de tua ruína. Por isso, os homens de tua aliança banir-te-ão para a fronteira: mas, se tu não tivesse tido nenhuma amizade ou comércio com eles, poderias ter vivido em segurança em teus recônditos, ninguém teria te desalojado: justa, então, foi a recompensa de tua ambição, por haverem assim recorrido aos assírios e caldeus”. Dando continuidade ao mesmo assunto, o Profeta diz: Enganaram-te os homens de tua paz — amigos e confederados; pois os hebreus denominam de homens de paz aqueles que estão ligados por alguma espécie de aliança. Então, os homens de tua paz, ou seja, aqueles em que pensaste poder ter fé, e de quem dependias; estes te trapacearam, precisamente esses prevaleceram contra ti, oprimindo-te através da astúcia e da traição. Os homens do teu pão puseram sob ti uma chaga: os homens de pão eram aqueles que eram hóspedes ou amigos. Alguns dão esta tradução: “Quem come teu pão”; e é uma interpretação admissível, pois os assírios e caldeus, visto serem insaciáveis, haviam tomado despojo dos idumeus; pois todos de quem buscassem ter amizade deviam lhes trazer alguns presentes. Dado pois que vendiam desse modo a amizade deles, o Profeta corretamente chama de os homens do pão aqueles cuja riqueza e bens devoravam. Se então tomarmos os homens de pão nessa acepção, há uma probabilidade no sentido. Mas podemos dar uma outra interpretação, como se ele houvesse dito que eles eram convidados e amigos: estes pois cravaram debaixo de ti uma ferida, isto é, eles foram a tua destruição, e isso mediante logro e artimanhas ocultas. Quando alguém ataca outro abertamente, aquele que é atacado pode evitar o golpe; porém, o Profeta diz que os assírios e caldeus seriam pérfidos para com os idumeus, para os conquistar através da aleivosia. Prepararão eles então uma ferida sob ti, como ao se esconder uma adaga entre a cama e o lençol quando uma pessoa pretende ir dormir. Assim também ele diz que um ferimento está colocado debaixo, quando um amigo fingido se oculta, para que ele mais facilmente machuque quem ele ataca cavilosa e maliciosamente. Ele finalmente conclui, desta maneira: Não há inteligência nele. Aqui o Profeta, sem dúvida, 15 www.monergismo.com aterrorizados, a fim de que do monte de Esaú seja cada um exterminado pelo morticínio. Theman, ut excidatur vir e monte Esau prae occisione (vel, quia excidetur; /uml enim postest duobis modis exponi.) O Profeta, após haver falado de uma das formas da vingança de Deus, adiciona uma outra: aquela pela qual esse arruinaria todo o poder que houvesse na Iduméia: e, desse modo, revela que a coragem e a força dos homens, bem como seu entendimento, estão na mão de Deus. Então, assim como este dissipa e destrói, sempre que lhe apraz, toda sabedoria que haja nos homens, assim também debilita e quebranta seus corações: em uma palavra, priva-os de todo vigor, de modo que fracassam e são reduzidos a nada. Se aqueles que se orgulham de seu poder e conselhos ponderassem sobre isso corretamente, aprenderiam finalmente a se submeter a Deus em verdadeira humildade. Porém, esta verdade é algo em que o mundo não pode ser levado a crer: não obstante, Deus nos mostra aqui, como em uma figura, que, por mais que os homens prosperem por um tempo, eles desvanecer-se-ão de imediato caso ele não os sustente e não corrobore seus dons neles, mantendo-os em sua inteireza; e, em especial, aquela fumaça vazia é tudo que aparenta ser o entendimento e a força nos homens, 12 uma vez que o Senhor pode facilmente retirar ambos, sempre que lhe agradar. Portanto, devemos observar cuidadosamente o que ele diz aqui: Sucumbirão teus bravos, ó Temã. Acham alguns que um país em particular está indicado aqui, pois Temã é o sul, isto é, em relação à Judéia. Mas como Temã, sabemos, era um dos netos de Esaú (Gn 36.15) e como parte da Arábia era chamada por esse nome, é mais provável que o Profeta volte seu discurso aqui para a Iduméia. Porém, quanto à palavra Temã, trata-se de uma parte tomada pelo todo. Pois cortado, diz, será o homem: ao dizer, cortado o homem, significa que tudo de um homem seria destruído. Como? pela carnificina 13 . Mas ltq katel denota uma matança na qual ninguém permanece vivo. Por conseguinte, percebemos o que o Profeta quer dizer: que todos os idumeus ficariam tão destruídos que tudo cairia, pois não haveria coração nem força para resistir. Segue-se então — Obadias 10,11 10. Devido à violência perpetrada contra teu irmão Jacó, cobrir-te-á a vergonha, e serás exterminado para sempre. 11. No dia em que tu estiveste do outro lado, no dia em que os estrangeiros levaram ao cativeiro o seu exército, e os estranhos entraram por seus portões, e deitaram sortes sobre Jerusalém, tu mesmo eras como um deles. 10. Propter oppressionem fratris tui Jacob, operiet te opprobrium, et excideris in perpetuum. 11. Die quo stabas ex opposito, die quo alieni auferebant substantiam ejus, et extranei ingressi sunt portas ejus, et super Jerusalem miserunt sortem, etiam tu quasi unus ex illis. Aqui o Profeta expõe o porquê Deus procederia tão severa e terrivelmente com os idumeus. Tivesse ele simplesmente profetizado a destruição deles teria sido uma coisa importante, uma vez que os judeus, com isso, teriam sabido que a ruína daqueles não era por acaso, mas pelo flagelo divino; teriam sabido que eles mesmos, juntos com os outros, eram castigados por Deus, e isso lhes teria sido uma profícua instrução: contudo, o que os levava à consolação maior era ouvir que eram tão queridos por Deus que ele se encarregaria da defesa das ofensas contra eles e os vingaria, tendo 12 Alusão a Tiago 4.14 (N. do T.) 13 Essa palavra tem sido deslocada para o versículo seguinte por alguns críticos, mas, ao que nos parece, não com razões bastantes, vez que nada há no contexto que demande semelhante alteração. (N. do E. inglês.) 16 www.monergismo.com consideração pela segurança desses. Portanto, quando ouviram que Deus, por os ter amado, puniria os idumeus, era-lhes, sem dúvida, um conforto inestimável em suas calamidades. A esse assunto o Profeta vai agora. Pela injusta opressão de teu irmão Jacó, etc. A palavra smj chamas, violência, tem de ser compreendida passivamente, como se ele dissesse: “Vê, como tu agiste para com teu irmão Jacó”. E ele o chama de irmão dele, não por causa da honra; ao contrário, chama-o com o fito de declarar de forma mais completa a crueldade dos idumeus; pois a consangüinidade não tivera nenhum efeito para os impedir de se enfurecerem contra os próprios irmãos e, no modo de dizer, contra as próprias entranhas. Conseqüentemente, era prova de desumanidade bárbara os idumeus, olvidando a natureza comum com aqueles, houvessem ficado tão inflamados contra seus irmãos; pois, como é bem conhecido, tinham descendido do mesmo pai comum, Abraão, bem como Isaque, tendo o símbolo da circuncisão. Os idumeus deveras professavam ser os descendentes de Abraão e o povo peculiar de Deus. Dado então que esse celebrara seu pacto com o pai comum deles, Isaque, e dado que igualmente preservavam a circuncisão, a qual era o selo de tal concerto, como acontecera de os idumeus se conduzirem tão cruelmente para com seus irmãos? Daí vermos que o nome do irmão nesta oração – pela opressão de teu irmão Jacó – é mencionado com a finalidade de intensificar o crime deles. Então, diz ele, como tu foste tão violento contra teu irmão, cobrir-te-á o vitupério, e para sempre serás cortado. Sugere que a calamidade não seria apenas por um tempo, como no caso de Israel, mas que o Senhor executaria uma punição tal que provaria que os idumeus estavam alheados dele; pois Deus, ao castigar sua Igreja, sempre observa certos limites, visto que jamais esquece sua aliança. Ele de fato prova que os idumeus não eram seu povo, por mais que falsamente se jactassem de serem os filhos de Abraão, invocando o sinal da circuncisão: não era então de se espantar que a circuncisão deles, a qual haviam impiamente profanado, tornou-se sem valor. Mas ele, posteriormente, desenvolve mais completa e amplamente a mesma coisa. No dia, diz, em que ficaste do lado oposto. Porém, os idumeus podiam ter feito esta objeção: “Por que tu nos acusa de haver oprimido violentamente o nosso irmão? Pois não fomos a causa de serem eles destruídos: tinham esses uma querela com os assírios, labutamos para proteger o nosso interesse no meio desses distúrbios; procuramos a paz com os assírios e, se a necessidade assim nos compeliu, tal não deve ser imputado a nós como crime ou culpa”. Dessa maneira, os idumeus podiam ter se defendido: contudo, o Profeta dissipa todos os pretextos do tipo ao dizer: No dia em que tu ficaste do lado oposto, no dia em que estranhos roubaram seus bens, e forasteiros entraram por seu portões, e lançaram sortes sobre Jerusalém – não estavas tu ali? Tu mesmo eras como um deles. Agora isso é enfaticamente introduzido – Precisamente tu ou, também tu; (Tu etiam) pois o Profeta exibe isso aqui como um presságio odioso: “Não era de se admirar que os assírios e caldeus derramassem o sangue de teus irmãos, pois eram inimigos, eram estrangeiros, eram um povo distante; mas tu, que eras do mesmo sangue, tu, a quem o vínculo da religião devia ter contido, e mais, exatamente tu, que devias, pela própria alegação de vizinhança, ou ter ajudado teus irmãos, ou no mínimo expressar a eles condolências – sim, tu foste tão cruel que foste com um de seus inimigos: seguramente isso não pode de jeito algum ser tolerado”. Percebemos agora o que o Profeta quis dizer ao falar no dia em que tu ficaste do lado oposto: é então, por assim dizer, uma explicação da sentença anterior, para que os idumeus não dessem uma falsa desculpa objetando que não haviam sido violentos contra os irmãos deles. Foi de fato a pior opressão quando se colocaram em oposição a eles; ainda que não estivessem armados, tiveram prazer em um tão lúgubre espetáculo; ademais, não somente foram espectadores ociosos da calamidade de seus irmãos, mas também, por assim dizer, uma parte de seus inimigos. “Não foste tu como um deles?” Não prosseguirei mais por ora. 17 www.monergismo.com ORAÇÃO Conceda, Todo-Poderoso Deus, que, como tu outrora nos recebeste sob tua proteção, e prometeste que nossa salvação seria tão querida por ti que, seja o que for que Satanás e o mundo todo tramassem, todavia, guardar-nos-ia a salvo e seguros – ó, permita que, sendo dotados de perseverança, permaneçamos dentro de nossos limites, não sendo levados para cá e para acolá, seja por astúcia, seja por conselhos ímpios; mas apraza a ti nos guardar em genuína integridade, para que, estando protegidos por teu amparo, descubramos, por experiência, ser real o que tu declaraste em tua palavra, que aqueles que te invocam em verdade sempre conhecerão que lhes é propício; e, porquanto já nos abriste um acesso a ti na pessoa de teu Filho unigênito, ó outorgue que nós, as ovelhas, confiemos nele como nosso pastor, resignadamente continuando debaixo de sua proteção até que sejamos afastados de todos os perigos para aquele repouso eterno, o qual obtiveste para nós pelo sangue de teu Filho Jesus Cristo. Amém. 20 www.monergismo.com todas as saídas. Alguns fornecem a seguinte explanação, mas é por demais frígida: Tu não devias ficar de pé pelo despedaçamento de teus irmãos, isto é, tu não devias permanecer parado, mas lutar para estender uma mão ajudadora aos aflitos; mas isso, como eu disse, é demasiadamente frígido e forçado. Tu não devias então ficar na saída das estradas para destruir. Percebemos agora o que o Profeta tinha em vista; destruir, ele diz, e a quem eles destruíram? Precisamente aqueles que já haviam escapado. Expressamente, então, é assinalada aqui a crueldade a que eu aludi, que os idumeus não se contentaram com a ruína da cidade e a grande carnificina que fora perpetrada; porém, caso alguém tivesse furtivamente escapado, eles ocupavam as saídas das estradas para que não pudessem fugir: e a mesma coisa se quer dizer quando acrescenta que eram atraiçoados ou detidos todos os que tinham permanecido vivos no dia da aflição. Compreendemos agora sentido dado pelo Profeta: que os idumeus não podiam reclamar que Deus foi severo demais quando ele os reduzisse a nada, pois que haviam dado exemplo de extrema crueldade para com seus próprios irmãos, em um período em que seus flagelos deviam ter obliterado todo ódio e toda inimizade antiga, como normalmente se dá mesmo com um homem o mais alheio em relação ao outro. Continuemos — Obadias 15 15. Pois que o dia do Senhor está próximo, sobre todas as nações. Como tu fizeste, assim se fará contigo: tuas ações recairão sobre a tua própria cabeça. 15. Quia propinquus dies Jehovae super omnes gentes; sicut fecisti fiet tibi; merces tua revertetur in caput tuum. Ao dizer que o dia de Jeová estava perto sobre todas as nações, pode-se considerar o Profeta como raciocinando do maior para o menor: “Se Deus não poupará as outras nações, como conseguirás tu escapar de sua mão?” De maneira semelhante fala Jeremias no capítulo 49, (Jr 49.12), dirigindo-se aos idumeus nestas palavras: ‘Eis, beberão do cálice os que não foram por julgamento condenados a beber; e tu não provarás? Por beber tu beberá até as próprias escórias'. Ele revela então que os idumeus mereciam uma vingança dobrada; pois, se realmente fossem comparados com os assírios e caldeus, o delito dos segundos pareceria pequeno: os caldeus podiam pretextar algumas causas pela guerra, eles eram forasteiros, eram, em suma, inimigos professos; porém, os idumeus eram vizinhos e parentes. O mesmo também podia se dizer de outras nações. Porém, as palavras podem ser explicadas de uma maneira mais simples, qual seja, que Deus não somente tomaria vingança sobre uma ou duas nações, mas sobre todas. “Vede”, ele diz, “uma mudança ocorrerá, não somente em uma área remota, mas no mundo inteiro. Desse modo, o Senhor demonstrará que é o juiz de toda terra. Segue-se daí que os idumeus também devem prestar contas, pois Deus resolveu executar juízo sobre todas as nações; nem uma só delas que seja será ignorada”. Eis, então, próximo está o dia de Jeová. Dissemos que a época em que Obadias profetizou nos é desconhecida. Mas não é de se maravilhar que declare que perto está o dia de Jeová; pois o Senhor não se apressa segundo a maneira dos homens; mas, paralelamente, conhece suas estações, e isso sempre se realiza, para que, quando os ímpios se julgarem estar em descanso, a súbita destruição então os acometa. Ele tira esta conclusão: Como tu fizeste, também será feito contigo. Entretanto, parece haver aqui uma comparação implícita entre o castigo do povo eleito e a punição que será infligida a outras nações. Quando os idumeus viram que o reino de Israel e Judá estava calcado sob o pé, imaginaram que os filhos de Abraão eram punidos daquela forma por haverem desprezado os seus Profetas, pois que se tornaram imorais e perversos ao extremo. Assim, eximiam a si e a outros do castigo. Ora, o Profeta declara que Deus fora o juiz de seu povo, mas que esse é também o juiz do mundo inteiro, e que isso se evidenciaria rapidamente. Portanto, quando ele disse que próximo estava o dia de Jeová, ele, não tenho dúvida, levara em consideração a punição da Igreja, como já falei; como se dissesse: 21 www.monergismo.com “Assim como Deus se provou ser alguém que com justiça pune os pecados relativos a Israel e Judá, assim também no final se assentará em seu tribunal para julgar todas as nações; logo, ninguém escapará do castigo. Todos, pois, em suas diferentes condições, serão constrangidos a prestar contas de suas ações, uma vez que o Senhor não poupará ninguém: e, embora comece com sua Igreja e com sua casa, todavia, virá em seguida o tempo azado para tomar vingança, quando estenderá sua mão para castigar todas as nações pagãs”. Tal me parece ser o real significado. Corretamente, então, conclui: Como então tu fizeste, ser-te-á feito: “Não penseis que ficareis impunes por haverdes ido contra teu irmão. Era intenção de Deus exibir um exemplo de sua severidade para com outros enquanto te poupava: mas tu abusaste de sua paciência, pois podias ter permanecido quieto em casa: o Senhor então te recompensará”. E acrescenta no fim: Teu pago recairá, ou retornará sobre a tua própria cabeça. Aqui o Profeta anuncia o que Cristo também diz: ‘Com a medida com que alguém medir será retribuída a ele,’ (Mt 7.2.) Essa sentença é digna de nota: pois, quando Deus deixa o inocente ao arbítrio dos ímpios, estes acham que podem fazer o que desejam impunemente, como se fossem os verdugos dele. Como, pois, eles ficam insolentes assim quando o Senhor os poupa, prestemos atenção ao que o Profeta diz aqui: que um galardão está preparado para cada um e que, seja qual for a crueldade que os ímpios pratiquem, ela voltará sobre suas próprias cabeças. Segue-se — Obadias 16 16. Porque, como vós bebestes no meu santo monte, assim beberão continuamente todas as nações; beberão e sorverão, e serão como se nunca tivessem existido. 16. Quia sicuti bibistis super montem sanctum meum, bibent omnes gentes jugiter, bibent (inquam) et sorbebunt; et erunt quasi non sint. Aqui Obadias vai mais além, dizendo que Deus vingaria os agravos feitos à sua Igreja. A declaração do último versículo era genérica: “Eis, sobre todas as nações o dia de Jeová está perto; como pois tu fizeste, Deus retribuirá a ti”; mas agora ele revela que isso se daria porque Deus resolveu defender seus servos (clientes — clientes;) e, visto terem sido cruelmente tratados, tornar- se-ia ele o vingador de suas injúrias: Como então tu bebeste sobre a minha santa montanha etc. O Profeta, não duvido, tomando uma parte pelo todo incluiu no termo beber seus triunfos e alegrias. Assim como vós então regozijastes sobre meu monte santo, também todas as nações beberão e continuarão sua imoderação; elas sorverão, de modo que absolutamente perecerão. Porém, parece- me que o Profeta inegavelmente adiciona aqui uma prova da avareza delas. Ele antes acusara concisamente os idumeus de terem tirado parte do despojo, junto com as nações estrangeiras, enquanto os miseráveis judeus eram saqueados. De igual forma, diz, vós bebestes, em sinal de êxito e regozijo. Vós então bebereis vinho em minha santa montanha: agora beberão todas as nações. Este último beber deve ser tomado em sentido diferente do primeiro. Qual, pois? Beberão, e sorverão, ou seja: “Elas consumirão toda vossa riqueza”. E em seguida acrescenta: E beberão elas continuamente; e serão como se não houvessem sido, isto é, não cessarão de comer e beber até consumir tudo que esteja entre vós. Ele então sugere que os idumeus, que se tinham enriquecido com a rapina de seus irmãos, e que também fizeram festas em sinal de júbilo na montanha santa, seriam doravante o alimento de outros, pois todas as nações beberão, e os sorverão. Beber aqui, então, é o mesmo que consumir. Segue-se, (pois estou sob a necessidade de terminar essa profecia hoje, e o tempo me permitirá, espero) — Obadias 17 17. Contudo, sobre o monte Sião haverá livramento, e ele será sagrado; e a casa de Jacó 17. Et in monte Sion erit evasio, et erit sanctitas (nempe mons ipse;) et possidebit 22 www.monergismo.com possuirá as suas herdades! domus Jacob possessiones suas (alii vertunt, eos a quibus possidebantur. O Profeta aqui promete libertação aos judeus, pois outras consolações não teriam sido de grande importância não tivessem eles – que no momento estavam perecendo – alguma esperança de serem uma hora restaurados à segurança. Certamente os judeus podiam ter objetado, dizendo: “O que é isso para nós, mesmo que o Senhor vingue as injúrias feitas a nós? Caso os idumeus sejam destruídos por nossa causa, que proveito teremos? No entretempo, somos destruídos, não tendo esperança alguma de livramento”. O Profeta vai aqui de encontro a tal objeção, e diz: No monte Sião haverá escapatória. Então, conquanto os idumeus houvessem tentado interceptar todas as saídas, como foi antes citado, todavia, Deus promete aqui que haveria uma saída no monte Sião: não diz, do monte Sião, mas na própria montanha. O que isso significa? Precisamente que Deus restauraria aqueles que podiam então parecer estar perdidos. Obadias então promete, de modo claro, que haveria uma restauração da Igreja. Contudo, somos ensinados nesse ponto que a punição, pela qual o Senhor castiga seu povo pelos pecados, é sempre por um período. Todas as vezes, pois, que Deus fere sua Igreja, simultaneamente, o remédio é preparado; pois não pretende nem permite que seu povo seja de todo perdido. Podemos saber disso pelas palavras do Profeta quando esse diz que haveria escapatória em Sião. E isto não era conforto ordinário para os judeus conhecerem: até na extrema decadência deles restar-lhes-ia ali alguma esperança de remição, e que o povo (que na ocasião podia aparentar estar extinto), não obstante, seria salvo e preservado com vida, como se ressurgisse dos mortos. Ele diz que o monte Sião seria santidade ou santo, pelo que quer dizer que Deus seria cioso de seu concerto. Como então elegera esse o monte Sião como o local onde seria adorado, o Profeta dá a entender que o nome divino não estava lá envolvido de forma presumida ou vã. Visto como Deus escolhera esse monte para si, ele era santo; já que se diz ter Deus profanado a terra e o templo quando os abandonou e os entregou nas mãos dos inimigos. Assim também agora, quando o Profeta diz que o monte Sião seria santo, é o mesmo que se houvesse dito que Deus teria zelo por essa montanha porque outrora a consagrara para si mesmo, designando-a para ser a sua habitação. A causa, pois, é aqui colocada no lugar de seu efeito. Ele dissera que os judeus sobreviveriam, por mais que estivessem como os perdidos e mortos por algum tempo – e como se daria tal coisa? A razão é esta: o monte Sião será santo. Foi uma terrível profanação do monte Sião quando o templo foi destruído, quando os santos vasos foram roubados pelos babilônios, quando, em suma, os inimigos manifestaram toda sorte de insolência lá. Mas quando o Senhor restaurou o povo, quando o altar foi novamente erigido e os sacrifícios oferecidos, então o monte Sião recuperou sua santidade, isto é, Deus manifestou que a graça de sua eleição não fora abolida, pois outra vez santificara o monte Sião, planejando assim que fosse preservado a salvo. Santo pois será o monte Sião. Caso alguém estivesse disposto a rebuscar mais as palavras do Profeta, poderia dizer que, obviamente, é na maneira de nossa salvação que se pensa quando se diz que Deus nos santifica ou governa pelo Espírito dele: porém, o Profeta, não tenho dúvidas, atentava aqui simplesmente à eleição divina. E a casa de Jacó possuirá de novo suas possessões, isto é, seja o que for que Deus haja dado como herança aos filhos de Abraão, restaurar-lhes-á quando voltarem do exílio. Se alguém preferir entender possessões como sendo aquelas de Edom, eu não objeto. No entanto, acho que o real significado dado pelo Profeta é que, quando os filhos de Israel retornassem do desterro, Deus lhes restauraria o antigo país, para que possuíssem tudo o que havia sido prometido ao pai Abraão. Ele quer dizer por possessões deles, pois, a terra toda, a qual veio à posse do povo eleito por quinhão, como foi prometido a Abraão. Segue-se — Obadias 18 25 www.monergismo.com provável que se aluda aqui ao monte Gileade, o qual não era muito distante da tribo de Benjamin, antes, uma cidade ou algum lugar longe daquela parte, não incluído em sua porção, é indicado. Em seguida adiciona: E os migrantes dessa vasta multidão dos filhos de Israel etc. Há aqui obscuridade nas palavras. Por Canaã os hebreus querem que seja tanto os ilírios quanto os germanos, bem como os gauleses; pois dizem que os emigrantes, os quais ficarão dispersos na Gália, na Alemanha e nesses regiões longínquas, possuirão as cidades do sul. Ora, por Zarefate eles compreendem a Espanha. Sabemos, porém, como eu disse em outra parte, que os judeus são mui afoitos em suas glosas: pois não se envergonham de brincar e misturar coisas frívolas, e asseveram isso como se fosse evidente pela história e facilmente descoberto. Dessa forma, tagarelam acerca de coisas desconhecidas a eles, e isso o fazem destituídos de razão ou discernimento. O Profeta, não duvido, quer dizer aqui que todos aqueles territórios que foram anteriormente prometidos aos filhos de Abraão entrariam na posse desses quando o Senhor enviasse seu Cristo, não somente para restaurar o que havia caído, mas também para fazer com que o estado do povo fosse bendito de todas as maneiras. A significação do todo, pois, é esta – que os judeus não só recuperariam o que haviam perdido, mas o que até então não lhes fora dado a possuir: tudo isso o Senhor conferiria a eles quando Cristo chegasse. Segue-se — Obadias 21 21. E salvadores subirão ao monte Sião para julgar a montanha de Esaú; então o reino será do Senhor. 21. Et ascendent servatores in montem Sion, ad judicandum montem Esau; et erit Jehovae regnum. Aqui o Profeta diz que existem na mão de Deus ministros, o labor dos quais ele emprega para preservar seu povo. Ele se refere aqui, não tenho dúvidas, à história dos juízes. Deveras conhecemos que o povo de Israel foi amiudadas vezes tão atribulado que seu livramento era quase inacreditável; e que, não obstante, também foram libertados de modo tal que tornava patente que a mão divina aparecera do céu. Então, já que isso era bem conhecido dos judeus, o Profeta aqui os lembra que Deus ainda tinha em suas mãos redentores a qualquer hora que lhe agradasse congregar seu povo. Deus então mandará protetores, exatamente como fez outrora a vossos pais. Eles de fato haviam, por experiência, descoberto ser verdade o que o Profeta diz aqui, não somente uma, mas mais de dez vezes. Isso, pois, deve ter servido em muito para confirmar essa profecia. Então, ascenderão os que julgarão o monte de Esaú – os quais, estando dotados do poder de Deus e da autoridade dele, executarão juízo sobre o monte Seir e sobre a nação inteira, desforrando a crueldade que Edom exercera para com os filhos de Abraão. Contudo, essa passagem demonstra que Cristo não veio para ser ministro de nossa emancipação e salvação de maneira comum, mas que se tornou nosso salvador de um jeito especial; de modo que continua sozinho nesse papel: e isso é um mui forte argumento contra os judeus. Eles confessam que o Messias seria o Redentor de seu povo, mas atribuem tal ofício a ele de uma maneira genérica, como o fazem a Davi e aos outros reis. Porém, fica com certeza óbvio por esse trecho que o Messias não seria da classe vulgar, pois salvadores estariam sob ele como seus ministros. Isto os judeus não ousam negar, conquanto rosnem: pois seria absurdo que ele fosse do número deles. Visto então que ele foi enviado para ser Redentor e Salvador de uma forma diferente da dos outros, segue-se que não é apenas homem, mas o Autor da salvação. Seria realmente fácil replicar: “Por que nos fala de muitos redentores? Não esperas tu por um Salvador? Se Deus delega esse mister a muitos em igual medida, por que há tantas promessas gloriosas no tocante ao Messias? Por que somos sempre lembrados dele apenas? Por que somente ele é-nos apresentado como o fundamento de nossa salvação?” Daí fica manifesto, decerto, que Cristo tem de ser distinguido de todos os outros, e esses outros são salvadores debaixo da autoridade dele; e os tais eram os apóstolos e todos os assemelhados no presente, cujo trabalho e ministério Deus emprega para 26 www.monergismo.com defender e sustentar sua Igreja. Ele ora acrescenta: De Jeová será o reino. Mas, dado ser certo que era intenção de Deus reger entre seu povo depois de os haver restaurado de nenhum outro modo que não pelo poder de Cristo, o Profeta, ao dizer que o reino de Cristo seria o de Jeová, quer dizer que esse reino seria em realidade divino, e mais ilustre do que se houvesse empregado o labor de homens. Mas duas coisas devem ser aqui observadas por nós: que Deus mesmo verdadeiramente governa na pessoa de Cristo, e que é o legítimo modo de dirigir a Igreja que só Deus presida, detendo sozinho o poder principal. Segue-se, portanto, que, quando Deus não aparece como o único Rei todas as coisas ficam em confusão, sem ordem alguma. Ora, Deus não é chamado de Rei à maneira de distinção vazia: mas somente é reputado como Rei de verdade quando todos se submetem a ele, quando todos são governados por sua palavra; em suma, quando todas as criaturas ficam silentes em sua presença. A Deus, pois, pertence o reino. Por este motivo, vemos que a Igreja não tem existência onde a palavra de Deus não prevalece em sua autoridade quanto a reprimir tudo que haja de grandeza nos homens, trazendo-os sob a canga, a fim de que todos dependam apenas de Deus, para que a ele atentem e ele os tenha em sujeição a si próprio. ORAÇÃO Conceda, Todo-Poderoso Deus, que, visto estarmos tão dispersos em nossa peregrinação neste mundo que até um espetáculo medonho é-nos apresentado aos nossos olhos, quando vemos tua Igreja tão miseravelmente despedaçada, ó permita que, estando dotadas com o poder real de teu Espírito, e congregados em um, cultivemos a bondade fraternal entre nós para que cada um se esforce em ajudar ao outro, mantendo, paralelamente, nossos olhos fixos em Cristo Jesus; e, embora duras pelejas nos aguardem, todavia, estejamos sob seu cuidado e proteção, exercendo assim a paciência, para que, havendo terminado nossa batalha, desfrutemos no fim aquele bendito repouso que tu prometeste a nós, o qual está guardado para nós no céu, o qual também nos adquiriste pelo sangue de Cristo, teu Filho e único Senhor. Amém. Fim dos Comentários sobre Obadias. 27 www.monergismo.com UMA TRADUÇÃO DA VERSÃO DE CALVINO DAS PROFECIAS DE OBADIAS 1. A visão de Obadias: Assim diz o Senhor Jeová contra Edom: Um rumor ouvimos de Jeová, E um mensageiro às nações foi enviado: “Levantai-vos, e subamos contra ela à batalha.” 2. Eis, pequeno te pus entre as nações, Desprezado grandemente eras tu: 3. A arrogância de teu coração te ludibriou, Tu que habitas nas fendas da rocha: “Quem me fará descer ao solo?” 4. Se tu te elevares alto como a águia, E se entre as nuvens estabeleceres teu ninho, De lá te arriarei, diz Jeová. 5. Ladrões vieram a ti, ou assaltantes da noite? Como tu foste reduzido ao silêncio? Não roubaram o que lhes bastava? Vindimadores vieram a ti? Não deixaram eles alguns cachos? 6. Quão exploradas estão as coisas de Esaú, E exaustivamente vasculhados seus locais ocultos! 7. À fronteira eles te levaram, Todos os homens da tua confederação; Enganaram-te, prevaleceram contra ti, eles, Os homens que estavam em paz contigo; Os homens que comiam teu pão Puseram uma ferida debaixo de ti – Não há nele entendimento! 8. Não vou naquele dia, diz Jeová, Destruir os sábios de Edom, E o entendimento do monte de Esaú? Sim, sucumbidos ficarão teus valentes, ó Temã, 9. De modo que serão cortados todos os homens, Do monte de Esaú pela carnificina. 10. Por causa da opressão de teu irmão Jacó, Cobrir-te-á o vitupério, E tu serás cortado para sempre. 11. No dia em que tu ficaste do outro lado, No dia em que forasteiros tomaram suas posses, E estrangeiros entraram por seus portões, E sobre Jerusalém lançaram sortes, Tu mesmo era como um deles. 12. Mas tu não devias ver como espectador o dia do teu irmão, No dia de sua alienação; Nem regozijares sobre os filhos de Judá, No dia da destruição deles; Nem com tua boca falar coisas presunçosas, No dia do pesar; 13. Nem devias entrar pelo portão do meu povo, No dia da destruição dele; Nem contemplá-lo, tu em especial, em sua aflição, No dia de sua destruição; Nem estender tua mão à sua riqueza, No dia de sua destruição: 14. Nem devias te postar nas saídas, Para destruir aqueles que estavam escapando; Tampouco entregar seus remanescentes no dia da angústia. 15. Visto que perto está o dia de Jeová sobre todas as nações, Como tu fizeste, será feito a ti, Teu galardão voltará sobre tua própria cabeça; 16. Pois como bebestes sobre meu monte santo, Beberão todas as nações continuamente; Elas beberão e sorverão tudo; E serão como se nunca tivessem sido. 17. Mas no monte Sião haverá livramento, E Sião será santidade; E possuirá a casa de Jacó as próprias posses: 18. A casa de Jacó será também uma labareda, E a casa de José, uma chama, E a casa de Esaú será palha; E ateados serão entre eles, e os consumirão; E nenhum resto haverá à casa de Esaú; Pois assim Jeová falou. 30 www.monergismo.com •qrp •ltq •c •jlv •Huwmc •wtumc huwmc •wnumc •itxlpt Índice de Palavras e Locuções Latinas •clientes •Tu etiam 31 www.monergismo.com SOBRE O AUTOR Um dos principais nomes da Reforma Protestante, João Calvino (1509-1564) nasceu em Noyon (França). Tendo em comum com o alemão Martinho Lutero o fato de também ter sido seminarista na juventude, deu prosseguimento à obra desse, ensinando a doutrina e a aplicação da justificação pela fé somente em Cristo, como revelada nas Escrituras Sagradas, empenhando-se em aplicar o ensino bíblico a todas as áreas da vida; não obstante, o sistema teológico chamado calvinismo é mais estruturado que o luteranismo. Calvino estabeleceu-se em Genebra (Suíça), já que na França do rei Francisco I não eram tolerados não-católicos. A igreja que ele pastoreava ali veio a se tornar um centro da Reforma, a ponto de John Knox dizer que ela foi “a mais perfeita escola de Cristo desde os dias dos apóstolos”. Os Sermões sobre Jó, os Comentários da Bíblia e as Institutas constituem o grande monumento do seu pensamento teológico.
Docsity logo



Copyright © 2024 Ladybird Srl - Via Leonardo da Vinci 16, 10126, Torino, Italy - VAT 10816460017 - All rights reserved