Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

Os negros no brasil (1888-1988) : cem anos de luta e libertação, Notas de estudo de Políticas Públicas

RESUMO Esse trabalho,publicado no http://gppusp.blogspot.com/ se propõe a investigar a evolução da cidadania entre a parcela afro-descendente da população brasileira. Para tanto, procuramos trazer à tona a realidade do movimento negro desde seus primórdios até a época a Constituição de 1988, estendendo-nos também em parte até os dias atuais. Nesse processo, focaremos e evolução e as diversa formas que assumiu o movimento negro no decorrer do século XX, bem como a situação do afro-brasileiro n

Tipologia: Notas de estudo

Antes de 2010
Em oferta
30 Pontos
Discount

Oferta por tempo limitado


Compartilhado em 20/10/2009

ildeu-basilio-4
ildeu-basilio-4 🇧🇷

5

(1)

3 documentos

1 / 41

Documentos relacionados


Pré-visualização parcial do texto

Baixe Os negros no brasil (1888-1988) : cem anos de luta e libertação e outras Notas de estudo em PDF para Políticas Públicas, somente na Docsity! UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE ARTES, CIÊNCIAS E HUMANIDADES OS NEGROS NO BRASIL (1888-1988): CEM ANOS DE LUTA E LIBERTAÇÃO GUILHERME GONÇALVES CAPOVILLA ILDEU BASÍLIO PEREIRA LEONARDO SPICACCI CAMPOS RICARDO AURÉLIO DOS SANTOS SÃO PAULO 2008 UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE ARTES, CIÊNCIAS E HUMANIDADES OS NEGROS NO BRASIL (1888-1988): CEM ANOS DE LUTA E LIBERTAÇÃO GUILHERME GONÇALVES CAPOVILLA ILDEU BASÍLIO PEREIRA LEONARDO SPICACCI CAMPOS RICARDO AURÉLIO DOS SANTOS Trabalho referente à disciplina Introdução ao Estudo de Políticas Públicas II, do 2º semes- tre do curso de Gestão de Políticas Públicas da EACH/USP, para avaliação pela Profª.Drª. Marta Maria Assumpção Rodri- gues. SÃO PAULO 2008 1 INTRODUÇÃO A conquista da liberdade Alfred Marshall define o conceito de "cidadania" como, basicamente, o a- cesso a três tipos de direitos: civis, políticos e sociais. Paralelamente a esses três direitos, podem-se colocar as três formas de liberdade identificadas por Norberto Bobbio em Teoria Geral da Política: liberdade negativa, política e positiva. Pode- se, desse modo, observar como os conceitos de cidadania e liberdade são insepa- ráveis. Ao primeiro tipo de direito identificado por Marshall, os direitos civis, corres- ponderia a liberdade negativa, que é o direito de não ser impedido. Estão incluídos nessa categoria o direito (ou a liberdade) de ir e vir, a liberdade de expressão, o direito à propriedade e à vida, diretamente derivados dos modelos jusnaturalistas. Entre o segundo tipo em ambos, a relação está clara apenas pelo nome e corres- ponde à liberdade de participar de se candidatar a cargos públicos e, é claro, es- colher seus representantes. Por último, pode-se dizer sem sombra de dúvida que os direitos sociais correspondem à liberdade positiva, representada pelo direito ao trabalho digno e justamente remunerado, a habitação, saúde e, como enfatiza bastante Marshall, educação, que é considerada por ele a única forma de estabe- lecer a igualdade e a oportunidade de desempenho efetivo da cidadania. É inegá- vel que isso é nada mais do que uma forma de estabelecer a liberdade: o homem que tem maior participação nos negócios públicos e tem condições de fazer esco- lhas cada vez mais racionais é também mais livre. Nesse sentido, é inegável que o homem que exerce de forma mais plena sua cidadania é também mais livre. Observando a história brasileira, pode-se estabelecer com sucesso essa re- lação íntima entre liberdade e cidadania. Nosso país vem sendo, historicamente, bastante problemático nessa questão. Como José Murilo de Carvalho bem obser- va em Cidadania no Brasil, o maior empecilho para a concretização da cidadania entre o povo brasileiro foi o regime escravocrata, que marcou por mais de três sé- culos nosso modo de produção e até hoje, no século XXI, nossas relações sociais, embora, claro, de modo diferente. Isso é, aliás, um de nossos pressupostos bási- 2 cos nesse trabalho: a escravidão do Brasil deixou profundas cicatrizes na nossa sociedade, cicatrizes essas que estão ainda relativamente pouco superadas, o que é evidenciado de forma bem clara na manifestação cotidiana (porém velada) do racismo e, sobretudo, da desigualdade social. Infelizmente, pode-se ainda dizer (embora com algumas ressalvas) que a pobreza no Brasil tem cor. Infelizmente, no entanto, a promulgação da Lei Áurea pela princesa Isabel em 1888, ainda é vista como um evento que instaurou a liberdade dos afro- brasileiros. Como já fica claro a partir da leitura dos parágrafos anteriores, qual- quer concepção mais aprofundada de liberdade permite entender que esse evento teve muito menos de libertador do que possa parecer. Afinal, não seria de se es- perar que o escravo, visto como uma mercadoria humana, se tornasse, após uma assinatura, um cidadão com pleno atendimento de seus direitos sociais. Do mes- mo modo, as exigências do sistema eleitoral brasileiro no período impediam a par- ticipação da grande maioria dos afro-descendentes no pleito (uma vez que grande parte era analfabeta e/ou estava muito longe de ter a renda necessária para ter direito ao voto). O acesso aos direitos sociais, dentre estes, é aquele que mais se mostra atualmente como longe do ideal. As estatísticas provam isso de forma cla- ra. Não foram, no entanto, nulos todos os progressos alcançados pelos afro- brasileiros desde a promulgação da Lei Áurea. Por esse motivo, decidimos mudar o antigo nome do trabalho - "cem anos de pseudo-libertação", que agora enten- demos como um equívoco. Ao invés de ignorarmos, aqui, todas as conquistas da população negra durante os cem (na verdade, cento e um) anos de que tratamos nesse trabalho, decidimos ampliar nosso entendimento de conquista da liberdade. A chave para isso está na relação estabelecida ente a liberdade e cidadania, da qual falamos no início dessa introdução. Do mesmo modo que a cidadania é uma conquista incremental, a liberdade, estando intimamente ligada a ela, também o é. Ao dizermos "cem anos de luta e libertação" conseguimos dar o devido valor ao protagonismo do negro na sociedade brasileira (que o outro título parecia ignorar, dando a ele um papel meramente passivo), além de enfatizarmos o caráter dessa 3 transição, que não ocorre de uma hora para outra, pela assinatura de uma lei, mas é um processo contínuo, apesar de instável. Uma dificuldade que encontramos aqui, e acreditamos ser comum em qual- quer pesquisa nessa linha, é com relação à definição do que é ser "negro" no nos- so país. Como será tratado mais adiante, a relação entre raças no Brasil não é caracterizada pela dicotomia da realidade norte-americana. As relações de identi- ficação e discriminação tornam-se mais complexas e difíceis de identificar num povo como o brasileiro, marcado pela miscigenação, que, no entanto, não eliminou o racismo, que ainda hoje se encontra tão presente nas relações interpessoais. De qualquer modo, por meio desse trabalho pretendemos oferecer uma visão geral das conquistas do movimento negro, bem como da trajetória da popu- lação afro-descendente no Brasil. Obviamente, foram necessários cortes nessa história. No entanto, acreditamos ter, a partir daqui, ter permitido uma análise glo- bal da conquista da cidadania pela população afro-brasileira, até a Constituição de 1988, que, finalmente considerou a discriminação racial um crime e instituiu a o- brigação do Estado no oferecimento dos direitos sociais. Apesar de todo o avanço que isso significa para a história das relações raciais no Brasil, é claro que a sim- ples inclusão dessas questões nessa Constituição não significa (e, como vimos, não significou) o fim dessa história. Acreditar que a libertação é, na verdade, um processo, é também enxergar que essa luta está longe do final no nosso país. E conhecer a trajetória dessa luta é fundamental para que demos passos seguros à frente. 6 rama social. Não obstante a pressão inglesa pela abolição da escravidão, nossa primeira carta constitucional, outorgada, de 1824 manteve-a inalterada. O fim da escravidão no Brasil foi um processo lento, tamanho era o enrai- zamento desta instituição na sociedade. Diferentemente do que ocorria nos EUA, onde a escravidão se concentrava no sul, no Brasil ela estava disseminada em todo o território, inclusive nas cidades. Negros libertos tinham escravos. No estra- nho mundo da escravidão brasileira, até mesmo escravo – que não tinha persona- lidade jurídica - podia ser proprietário de escravos (Cáceres; 1999 p. 48. Carvalho; 2003 p. 48). Em 1831, por conta de pressão inglesa, foi votada uma lei que considerava o tráfico negreiro como pirataria. Todavia, na prática o tráfico continuou sem gran- des alterações. Na década seguinte intensifica-se a pressão inglesa e em 1850 é votada a lei Eusébio de Queiroz que extingue definitivamente o tráfico negreiro no Brasil. Após a guerra civil Americana e o conseqüente fim da escravidão naquele país, esta se torna uma instituição internacionalmente condenada. No Brasil após a guerra do Paraguai, onde a escravidão revelara-se motivo de constrangimento ao país, o tema abolição ganha força entre as camadas populares, principalmente a classe média. Em 1871, é votada a Lei do Ventre Livre, numa tentativa de conciliar inte- resses abolicionistas e escravistas visando adiar as discussões sobre o fim da es- cravidão. No entanto, esta lei só fez aumentar o sentimento abolicionista, que ga- nha as ruas. Em 1885 é votada a lei do sexagenário, considerada pelos abolicio- nistas, como uma piada, pois esta dizia que todos os negros com mais de 60 anos deveriam ser libertos, mas precisariam permanecer mais cinco anos fornecendo serviços ao seu senhor. A esta idade o negro já era considerado improdutivo, re- sultando apenas em gastos para o senhor. Com efeito, a lei não tinha outro senti- do senão livrar o proprietário de gastos com escravos improdutivos. Em 1888, en- fim é votada a Lei Áurea e abolida a escravidão no Brasil. É pertinente ressaltar que, no momento da abolição, a mão de obra escrava já era quantitativamente inferior à assalariada e em 1887 representava apenas 5% 7 da população total do país. Porém, o Brasil foi o último Estado de tradição cristã e ocidental a libertar seus escravos. Abolida a escravidão era necessária a implementação de políticas voltadas à inserção dos ex-escravos a sociedade, políticas que auxiliariam na construção da Nação, o que, em verdade, não ocorreu. Libertos, os escravos foram relegados a sua própria sorte. Estima-se que apenas 0,9% dos quase 800 mil escravos libertados pela lei Áurea sabiam ler (Cáceres; 99). Não houve, por parte do governo, nenhum tipo de política voltada à universalização do ensino no país, tampouco foi distribuído ter- ras aos ex-escravos. Dessa forma, passado a euforia da libertação, a maior parte dos negros ou voltaram às fazendas, para trabalhar por salário indigno, ou foram às cidades para desempenhar os piores tipos de trabalhos e, em muitos casos, para aumentar o número de desempregados e de mendigos destas. Nas regiões onde havia dinamismo econômico foi incentivada a ida de imigrantes, principal- mente italianos. Aos negros, restou a marginalização social. 8 2. Liberdade para quê? Finda a escravidão os ex-escravos emergiram no sistema de trabalho livre sem qualquer proteção do Estado, foram submetidos à competição por empregos sem preparo algum para tal. À época da escravidão muitos proprietários ficaram ressentidos do império por este não tê-los indenizado, mas e os ex-agentes do trabalho naquele sistema, não eram estes merecedores de uma reparação pelos maus tratos sofridos? Certamente que a resposta a esta questão é afirmativa, mas quando se argumenta que os negros e mulatos libertos pela Lei Áurea de 1888 deveriam ter sido assistidos pelo Estado não é nesta linha que segue a argumen- tação. O porquê é simples: uma forma de auxílio que garantisse aos filhos da Áfri- ca sua inserção de fato na sociedade que se forjava era algo necessário para ga- rantir o sucesso desta, ou seja, mais que assistencialismo, a função de tal ação era estratégica para o próprio desenvolvimento do Estado. A Inglaterra quando pressionou-nos para o fim do tráfico negreiro e para o fim da prática escravagista, não o fez por pura caridade aos negros, ou humanis- mo. Seus interesses eram claramente econômicos, importava a esta a formação de uma classe trabalhadora livre, apta a adquirir seus produtos, independente- mente de sua cor. É nesta mesma linha que afirmamos que uma distribuição de terras aos negros – o que convenhamos na sociedade brasileira daquela época era simplesmente impossível -, bem como a disseminação do ensino básico e pro- fissional além de outras medidas básicas eram mais que necessárias. Não obstan- te, nada disso ocorreu. Ao contrário, quando o negro deixou de ser parte importan- te no processo produtivo, este passou a não mais estar ao foco do Estado, como nos diz Florestan Fernandes em seu O Negro na Emergência da Sociedade de Classes: A preocupação pelo destino do escravo mantivera-se em foco enquanto se ligou a ele o futuro da lavoura. Ela aparece nos vários projetos que visaram regular, legalmente, a transição do trabalho escravo para o trabalho livre, desde 1823 até a assinatura da Lei Áu- rea, a 13 de maio de 1888. Como o expediente para manter os escravos no trabalho, dis- semina-se entre os senhores na década de 80 e, de maneira exacerbada, a partir do mo- 11 processo que iria tornar o negro cidadão não fora em seu início modelado por me- didas de caráter legal. Nas lavouras, além do ressentimento dos fazendeiros os negros ainda ti- nham que enfrentar a concorrência dos imigrantes, mais preparados. Nas cidades os empregos a que tiveram acesso sempre foram aqueles em que se exigia menor preparo e que conseqüentemente eram pessimamente remunerados. Muitíssimo pequeno era o número de negros proprietários e aqueles poucos que o eram (em geral pequenos lotes de terra) não cogitavam usá-las de um modo capitalista co- mo faziam os imigrantes e seus descendentes. No estado de São Paulo, principalmente na capital paulista, a importância da mão-de-obra negra decai muito, após a chegada dos imigrantes e nas primei- ras décadas do século XX. De fato, nesta cidade os negros permanecem à mar- gem do surto comercial e industrial que transformaram a capital paulista numa me- trópole. No final do século XIX e início do XX, a participação dos negros e mulatos na composição da população da cidade de São Paulo, também, diminui. Para al- guns esta redução, alem de ser resultado do crescimento desproporcional do nú- mero de imigrantes, é proveniente da não adaptação destes as características do planalto paulista já que uma parcela grande dos negros deixou a cidade e o esta- do e retornaram para o nordeste onde originalmente haviam sido introduzidas. Roger Bastides em suas investigações sociológicas a este respeito, no entanto, conclui que o real motivo do “déficit negro” provinha das deploráveis condições de vida enfrentada nos “cortiços” da cidade, portanto a falta de vitalidade da popula- ção negra seria fruto da miséria que atingira uma grande parcela desta população (Fernandes & Bastides; p.59 – 60; 1979). 12 3. A formação da consciência racial A identidade racial nunca foi e não é, em nenhum lugar do mundo, uma questão simples de ser resolvida, sendo até mesmo o próprio conceito de raça contestável. Para que cheguemos a uma compreensão mais lúcida desse concei- to, é fundamental, antes de tudo, a percepção de que "raça" e "etnia" são classifi- cações arbitrárias e mal demarcadas, que, na maioria das vezes, não são expres- sadas com clareza. Segundo FISCHER (1986), a etnia seria "uma coisa reinven- tada e reinterpretada a cada geração por cada indivíduo (...) não é algo simples- mente transmitido de uma geração para outra, ensinado e aprendido; é uma coisa dinâmica, muitas vezes reprimida ou evitada sem sucesso" (in HANCHARD, 2001, p. 99). Seguindo esse pensamento, HANCHARD (2001) classifica a identificação racial em três tipos. O mais elementar deles, base para os dois outros, seria a semelhança fra- ca, que se baseia principalmente em uma disposição de compartilhar de um de- terminado grupo, devido a características supostamente objetivas que seriam e iguais entre ele e os demais membros daquele grupo. É a que, historicamente, mais se manifestou no afro-brasileiro, que se vê como negro essencialmente com base na cor da pele, no que se chama "percepção da raça". Esse tipo de identifi- cação é considerado fraco pelo fato de que, por depender da escolha individual, pode desaparecer a qualquer momento, subordinada por outras identidades, reli- giosas, econômicas, ideológicas ou geográficas. A diferença com relação aos de- mais é, em geral, o principal fator que permite a formação dessa identificação. No caso brasileiro, isso se mostra claro quando se observa a oposição estabelecida não entre brancos e negros, mas, principalmente, entre brancos e não-brancos, embora de maneira pouco pronunciada. Mais uma vez, é necessário destacar a ausência de uma classificação dicotômica clara, como nos Estados Unidos, com relação à cor da pele, resultado do processo de miscigenação que caracterizou a formação do povo brasileiro. 13 O segundo tipo de identificação racial é a semelhança forte, que se utiliza da percepção iniciada pela semelhança fraca para unir um grupo com o fim de alcançar objetivos concretos. Conquistar no negro a percepção desse tipo de se- melhança - que pode ser chamado de "consciência racial" propriamente dita - foi o maior desafio para a constituição de um movimento negro forte e unificado no pa- ís. Quando há semelhança forte, as divergências das demais identidades dos indi- víduos são desconsideradas por um momento, até que os objetivos sejam alcan- çados. É o tipo de identificação típico de épocas de conflito, como o apartheid na África do Sul e que tende a desaparecer, ou pelo menos ser enfraquecido, com o fim desse. O terceiro tipo de identificação é o mais complexo, formado da união dos dois tipos anteriores, reunidos de forma que um não predomina sobre o outro. HANCHARD dá o exemplo de um operário negro, que costuma carregar duas i- dentificações principais - a baseada na classe e na cor - sem que uma predomine sobre a outra. Esse tipo de classificação da semelhança ajuda a entender uma característica marcante do movimento negro no Brasil, que é o fato de que, como observa SANTOS, "... a solidariedade racial só aparece no contexto político depois de atendidos os critérios de compatibilidade idológica" (apud HANCHARD, 2001, p. 105). Isso porém, será tratado mais adiante. Por ora, é importante destacar a relatividade dessas semelhanças, como mostra HANCHARD: "As semelhanças fracas e fortes, portanto, não são fixas nem "dadas" num sentido primordial, mas construídas, re- construídas e até desconstruídas, em face das preocupa- ções individuais ou coletivas. Coexistem também com outras formas de semelhança (...). Nenhum desses (...) indivíduos funciona apenas numa esfera "negra", mas, simultaneamen- te, em múltiplas arenas" (p. 117) Num nível pessoal, HANCHARD analisa a conquista da identificação racial em duas camadas: a interna, baseada nos sentimentos gerados pelas experiên- cias pessoais, como o rancor com relação ao grupo antagônico, a alegria de per- tencer a um grupo ou a humilhação observada em uma determinada situação; e a 16 desse modo a FNB foi muito afetada. Getúlio Vargas cooptava os negros e sub- vertia o movimento negro através do corporativismo que, no caso, da Frente Ne- gra Brasileira era baseado em grupos associativos, e do clientelismo, além de e- xistir a coerção direta que era utilizada quando a situação tornava-se mais séria. O objetivo de Vargas era transformar as relações com o grupo político e relações com grupo social. Com o agravamento da situação desfavorável as associações brasileiras e a repressão subversiva feita as organizações, enfraqueceram a FNB. Isso fez com que houvesse uma tentativa de restaurar a entidade, alterando a nomenclatura da instituição para União Negra Brasileira, mas a censura acabou com os meios da instituição pondo um fim nela, em 1938 ano em que se comemoraram 50 da aboli- ção da escravatura. Portanto, pôde-se ver que a FNB foi uma instituição que procurou socializar o negro, porém sem levar em conta suas raízes culturais e se apoiando em um modelo elitista que tinha como base o pensamento de um partido político fascista. Isso mostra o quão incoerente era a instituição, ao procurar melhores condições de vida do negro e ao se apoiar em um pensamento com tendências xenófobas. 17 5. O Teatro Experimental do Negro O Teatro Experimental do Negro (TEN) foi criado em 1940, no Rio de Janei- ro após o lançamento do livro Casa-Grande e Senzala de Gilberto Freire (defensor da “democracia racial”). O Teatro possuía uma formulação moderna e positiva que ressaltava os costumes folclóricos e popularescos da cultura negra. Além disso, ele permitia a formação e afirmação artística do negro, dando-lhes a oportunidade de expressão, ou seja, o TEN era considerado por Abdias do Nascimento como um instrumento expressão da negritude, cujo o maior valor era a generosidade para com os sofrimento dos negros. Seu principal objetivo, como disse Abdias do Nascimento, era: “O Teatro experimental do Negro não é, apesar de seu no- me, apenas uma entidade com objetivos artísticos (...) inspi- rou-se na necessidade de uma organização social para pes- soas de cor, tendo em mente a elevação de seu nível cultu- ral e seus valores individuais” (HANCHARD; 2001, p. 129). Ou seja, o TEN retoma as raízes culturais e identitárias do negro brasileiro como o candomblé, a capoeira e o samba (volta-se para o continente africano, incorporando esses temas às peças teatrais) e, principalmente, é retratada a luta pela identidade em contraposição a “sociedade branca” ou burguesa. Há um uso da cultura como instrumento legítimo na luta anti-racista, que rompe, por sua vez, com a estética dos moldes arcaicos europeus e norte-americanos. Porém essa transformação só é capaz, se existir a participação do negro nos eventos culturais, no caso, no público do teatro brasileiro. Para que assim a- conteça uma modificação na realidade em prol de sua pessoa, o que o valoriza socialmente, pois ele adquiriu educação e cultura, passando a divulgar seus valo- res e divulgar suas origens. Toda essa transformação de uma característica “pré- letrada”, ou seja, uma característica que está de acordo com os valores do “bran- co” (elite), procura uma harmonia e uma homogeneidade social. 18 A “democracia racial” tão almejada, que busca essa harmonia, ainda é dis- farçada e injusta. Portanto, o sentimento de que não existe preconceito no Brasil, por ser uma miscigenação de etnias, é disfarçado, pois as pessoas ainda têm pensamentos arraigados de uma cultura escravocrata o que impede a existência de uma “democracia racial” justa. Hoje o “branco” possui mais consciência sobre a condição histórico-cultural do negro brasileiro, e o mesmo resguarda condições que permitem que o negro seja mais negro, que ele aceite sua etnia e pare de procurar copiar os moldes ar- caicos. Tendo em vista essas ações do “branco”, pode se dizer que a negritude equivale , inicialmente, a um produto intelectualístico que criou caminhos para a consciência revolucionária da condição do negro, que busca a reivindicação de seu passado e luta pela preservação de sua herança cultural, além de exigir que a “sociedade branca” se desvincule dos arcaísmo escravocrata que permearam a história. 21 até então. A pouca quantidade de grupos socialistas nesses movimentos, como havia sido na FNB, torna isso muito claro. Além disso, a esquerda representada em partidos políticos, normalmente ortodoxos, tendeu a ignorar as questões raciais, tornando-a subordinada à luta de classes. Assim, na prática, não havia grande diferença entre esses grupos e a di- reita conservadora no que tange a essa questão, o que pode ser explicado pelo fato de ambas serem formadas predominantemente por brancos, que não sentiam a discriminação racial de forma muito forte no seu cotidiano. Apesar de tudo isso, foi nesse período que foi instituído um dos maiores avanços da luta dos negros no Brasil: a aprovação da Lei Afonso Arinos, em 1951. Essa, no entanto, não foi um resultado direto da luta dos grupos nacionais, mas de uma crise diplomática gerada quando uma bailarina negra norte-americana foi im- pedida de se hospedar em um hotel na cidade de São Paulo. A Lei foi a primeira no país a tratar da discriminação racial, instituindo como punição o pagamento de uma multa. O golpe militar de 64 representou uma interrupção no curso dos movimen- tos sociais do país, submetendo-os à clandestinidade. Foi o caso do movimento negro, que ressurgiria publicamente no início da década de 70, com uma cara to- talmente nova. 22 7. O afro-brasileiro na ditadura militar e na redemocratização A dinâmica dos movimentos negros que ressurgiram na década de 70, no declínio do período "linha dura" da ditadura militar brasileira, foi bastante diferente da que se verificou no capítulo anterior. Diretamente relacionado ao aumento do acesso do negro ao ensino superior, seja no Brasil ou no exterior (no exílio) houve o crescimento da esquerda entre os círculos afro-brasileiros, do qual a caracterís- tica mais marcante foi a negação das idéias de ascensão social nos moldes capi- talistas e baseado nos valores da classe dominante. O debate sobre a questão da raça foi tratado de forma mais profunda e esta não foi relegada a um segundo pla- no. Pelo contrário: predominava na esquerda a inspiração em movimentos de in- surreição não-brancos pelo Terceiro Mundo. Por mais que o período da "linha dura" já estivesse para trás, não se pode falar em liberdade absoluta de expressão política. Qualquer movimento político não classificado na oposição Arena-MDB era visto com desconfiança pelo Estado e tratado como criminoso. Há, inclusive, evidências de que líderes do movimento negro durante a ditadura militar foram investigados e perseguidos por autoridades do governo. A face mais interessante da realidade do afro-brasileiro nesse período é a que se manifestou através dos bailes do Black Soul, surgidos na década de 50, sobretudo no Rio de Janeiro, como uma resposta "puramente" negra à apropria- ção que as elites tinham realizado de elementos da cultura negra como o samba e a umbanda. Por mais que o destino dessa forma de expressão tenha seguido o mesmo caminho das outras duas depois de algum tempo (tendo sido o pai de ou- tras manifestações musicais, como o funk e o rap), é inegável a importância desse movimento na criação de uma identidade negra entre a população afro-brasileira. Era por meio da música, portanto, que o movimento negro conseguia de forma mais efetiva aproximar-se das massas e politizá-las. Embora normalmente não houvesse entre os membros mais atuantes do black soul e o movimento negro propriamente dito, havia grande empatia entre um e outro. Além disso, os bailes tornavam-se oportunidades enormes para a panfle- 23 tagem e a divulgação das atividades políticas do movimento. A politização foi ain- da mais favorecida a partir do momento em que a música nos bailes passou a ser acompanhada por imagens de telão, que mostravam imagens da luta e dos sofri- mentos dos negros americanos, o que levava a uma identificação muito forte dos brasileiros com eles. Essa identificação ficava ainda mais forte à medida que o afro-brasileiro procurava reproduzir os estilos de roupa e penteado daqueles artis- tas que via aparecendo nos filmes - o que, muitas vezes, gerava conflitos familia- res com pais consevadores, que tratava a questão da raça como um tabu. É importante lembrar que essa fase de predomínio do Black Soul coincidiu com uma fase ainda bastante violenta da ditadura militar (1969-1975). Aí, mais uma vez, a cultura negra mostrou-se como uma forma fundamental de expressão no movimento. Era só através dessa provocação indireta que os afro-brasileiros con- seguiam mexer com a ordem social estabelecida e o ideal de união nacional, que deveriam ser mantidos de qualquer maneira pelo governo mlitar. As elites, assim como as autoridades, viam no Black Soul uma tentativa de quebrar essa harmonia e instaurar a segregação racial no país, que seria uma ameaça à identidade na- cional. Apesar disso, os bailes do Black Soul rapidamente se insiriram na econo- mia do lazer e do turismo no Rio de Janeiro, sendo uma grande fonte de renda para muitas pessoas, grandes empresários que muito pouco tinham de relações com o movimento negro. A absurda declaração a seguir, de Monsieur Lima, um carioca branco, proprietário de uma das boates black mostra como os bailes pode- riam ser apropriados, também, como forma de controle social: "Não fosse por es- ses bailes, que é que as massas de pessoas fariam nos sábados e domingos? Como iriam se divertir? Se não tivessem isso, garanto que haveria um grande au- mento dos assaltos nos fins de semana por essas pessoas que não teriam o que fazer (...) o governo deveria incentivar isso [os bailes]" (in HARCHAND, 2001, p. 140). Na década de 70, o Brasil também viu o surgimento de outras organizações de valorização do povo afro-brasileiro, com o surgimento de vários intelectuais negros no Rio, em São Paulo, Salvador, Brasília e no Recife. No Rio, as organiza- 26 8. O negro brasileiro na Constituição de 1988 A mobilização para o grande debate sobre a situação do negro no Brasil, com vista para a ANC, deu-se desde de 1985. O movimento negro, começou a organizar encontros em nível municipal e estadual visando mobilizar a sociedade para a questão do negro. Um dos mais importantes aconteceu em Belo Horizonte, Minas Gerais, foi o Primeiro Encontro Estadual “O Negro e a Constituinte”, envol- vendo entidades negras, associações de bairros, igreja, e representantes de 40 municípios. O documento gerado traz propostas para diversas áreas, tais como educação, saúde, trabalho, relações sociais no campo, cultura negra e até sobre sistema tributário. Tomou-se o cuidado de não direcionar somente para os negros, mas à to- dos os brasileiros, para evitar uma “guetorização”, expondo o Brasil como pais formado por várias etnias e raças. No decorrer do ano de 1986, houve vários encontros semelhantes. Neste ano ocorreram eleições, a participação de movimentos negros foram intensos, não com o objetivo de eleger representantes negros, mas de esclarecer a população de importância da eleição de deputados estaduais e ainda mais importante, a elei- ção de constituintes comprometidos com a causa negra, sendo a mais conhecida Benedita da Silva, umas das maiores defensoras do Artigo 5, parágrafo 42 da se- ção II, sobre um “trecho que transforma os atos de discriminação racial em crimes passiveis de prisão” (Hanchard, 2001). A Convenção Nacional "O Negro e a Constituinte", que aconteceu em Bra- sília, em agosto 1986, produziu um documento sintetizando os Encontros Regio- nais ocorridos em várias Unidades da Federação. Participaram da Convenção 16 estados, que representam 63 entidades, "compreendendo movimento negro, gru- pos sociais, partidos políticos e cidadãos interessados na causa". Destaca-se nes- te documento, direitos e garantias individuais, violência policial, condições de vida e saúde, mulher, menor, educação, cultura, trabalho, questão da terra e relações internacionais. Estes itens sugeriam redação para a futura Constituição. 27 Todo o esforço foi coroado com a instalação da Assembléia Nacional Cons- tituinte, em fevereiro de 1987. Os movimentos negros, por meios de articulações, buscam garantir espaço, para tanto chegam a manter plantões permanentes junto ao Congresso Nacional. O fruto deste trabalho foi a criação de uma subcomissão dos Negros, Populações Indígenas, Pessoas Deficientes e Minorias, um reconhe- cimento público, por parte dos constituintes sobre a necessidade do debate sofre o movimento negro e suas questões, sinalizados nos diversos encontros ocorridos no país, desde 1985. Apesar do intenso movimento dos negros no período pré-constituinte de 1988, houve poucas conquistas, entre elas as mais importantes são a criminaliza- ção do racismo pela Lei 7.716, que entre outras coisas define o racismo como cri- me imprescritível e inafiançável, e o Artigo 68 da Constituição, sobre regulamenta- ção das terras dos quilombolas. "Isso fez parte de um processo de democratização. Era para fazer com que a escravatura – algo terminado – fosse finali- zada com a cessão de terra para os que lidaram com ela du- rante anos, mas isso não acontece até hoje.” A janela de oportunidade proporcionada pela constituinte de 1988 possibili- tou um momento raro paro repensar a questão dos negros no Brasil. Envolveu atores sociais negros, sindicatos, partidos, movimentos populares, etc. Com o ob- jetivo de construir um projeto nacional de inserção e valorização dos negros, com entidades fortes apoiadas por vários movimentos negros espalhados por todo terri- tório nacional. Este movimento influenciou os mais diferentes atores, entre eles parlamentares, partidos políticos, servidores públicos nos Estados e municípios, resultando nas primeiras políticas públicas mais consistentes para a questão racial no Brasil. Mas mesmo com todo o empenho dos movimentos negros, uma empreitada desta natureza, com essas dimensões, tende a ser tensa e conflituosa, seja com busca de coalizões como o Estado, seja com setores organizados da sociedade civil. Ela envolve interesses de classe, raça, de gênero, de status e de poder, e a 28 principal razão desses conflitos é que o racismo e a discriminação agem em favor das elites deste país. 31 população negra no Brasil atualmente perfaz 37% do total, somado aos que se declaram pardos, 36%, temos um país menos branco e mais pardo. E daí? Em que vai melhorar a vida dos negros? Antes de continuar, um adendo. Negro, preto, afro-brasileiro? Como devo chamar esta parcela da população? Extraindo um trecho que saiu no CER-FSP leio na página 2 o seguinte: “O termo negro, não utilizado pelo IBGE, representou 7% das respostas espontâneas, percentual superior aos 4% que se declaram pre- tos dessa maneira" Desculpa, ficar fazendo citação, mas acho interessante dar publicidade a isto, continuando a citação, na mesma página 2 "Questionada sobre a sua cor pela reportagem, disse: "Sou negra". Quando apresenta às opções do IBGE, disse ser "preta". E agora, que termo adoto? O oficial do IBGE ou negro? Como trabalhar a questão do racismo, se temos dificuldade até em nominá-lo? Isto posto, voltamos ao texto, que falava da importância dos movimentos negros. Durante as discussões e pesquisas, achamos na era pré-Vargas um parti- do focado na questão dos negros, a Frente Negra Brasileira. O Partido da Frente Negra Brasileira, nascido em 1936 e cassado por Var- gas em 1937, como todos os demais. Originário do movimento negro paulista Frente Negra (História do negro brasileiro). "Na década de 1930, o movimento negro deu um salto qualitativo, com a fundação, em 1931, em São Paulo, da Fren- te Negra Brasileira (FNB), considerada a sucessora do Centro Cívico Palmares, de 1926. Estas foram as primeiras organizações negras com reivindicações políticas mais deliberadas. Na primeira metade do século XX, a FNB foi a mais importante entidade negra do país. Com "delegações" – espécie de filiais – e grupos homô- nimos em diversos estados (Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Per- nambuco, Rio Grande do Sul e Bahia), arregimentou milhares de "pessoas de cor", conseguindo converter o Movimento Negro Brasileiro em movimento de mas- sa. Pelas estimativas de um de seus dirigentes, a FNB chegou a superar os 20 mil associados. A entidade desenvolveu um considerável nível de organização, mantendo escola, grupo musical e teatral, time de futebol, departamento jurídico, 32 além de oferecer serviço médico e odontológico, cursos de formação política, de artes e ofícios, assim como publicar um jornal, o A Voz da Raça" (Movimento ne- gro brasileiro). E depois disto, qual foi o outro partido das causas negras. Como seria a his- tória do negro hoje, caso este partido tivesse durado tempo suficiente para politi- zar uma boa parcela dos negros? Imaginem, se na época este partido tivesse ga- nhado as massas e posto em prática suas políticas, teríamos, então, uma história de mais de 70 anos de negros inseridos na vida política deste país. Isto me traz uma dúvida, quando tivemos o primeiro deputado, senador negro, ministro, minis- tro do supremo, quando tivemos negro nestas posições? A Lei Afonso Arinos, de 1951, só surgiu 17 anos após o fim da FNB, ainda assim por conta de um incidente com uma estadunidense. Apesar de todo o ra- cismo, velado, conseguimos criar leis que de certa forma procurava reparar algu- mas injustiças. De certa forma, pois ainda assim era uma lei muito restrita, veja este trecho: "A Lei Afonso Arinos era sem alcance e inútil como instru- mento punitivo ou inibitório, mas revelava os mecanismos utilizados pelas elites para mascarar o racismo estrutural e institucional, que se alastrava como meio de inibir o acesso e a permanência no trabalho e na educação para a popula- ção negra." Por falar em injustiças, a grande discussão atual, envolve a reintegração do negro na sociedade, o que tem gerado grande debate, alguns defendem a neces- sidade de criar cota para negros e desta forma “facilitar” seu ingresso nas univer- sidades públicas. Outros dizem que isto pode acabar agravando o preconceito, gerando um país dividido por raças. Antônio Risério (O Biscoito Fino e a massa; A frente negra), um crítico das leis de cotas acredita que isto vai agravar o nosso racismo, tornando-o um racismo bicolor. Possivelmente, importando políticas estadunidenses, poderemos importar também seus problemas. Será engraçado, pois, neste país bicolor, onde é que 33 encaixaremos os mestiços? Teremos uma massa de vira-latas excluídos, algo como 36% de pardos. Bom, então seu Risério, seremos um país bicolor? E onde estará os mestiços, vão formar uma facção a parte? Mas se são 36%, serão maio- ria, como ficam as cotas? Ainda mais agora com o radicalismo dos parlamentares no Congresso Na- cional, querendo instituir uma cota de 50% em universidades federais e escolas técnicas. Concordamos com a necessidade da inclusão, mas não apenas para os negros, também para outra grande parcela de brasileiros que estão nas camadas mais baixas. Ora, é necessário, sim, incentivar esta política de cotas, só que ao invés de fazer da forma com esta sendo proposta, parcelas para negros, será mui- to mais eficiente fazer cota para pobres, pois conforme, de novo o CER FSP, (a- cho que vamos colar este caderno aqui), como dizia conforme o CER FSP, página 4, entre os 10% mais pobres, (População atual: 186.690.583 habitantes ,2008 (fonte: IBGE) logo 10% = 18,5 milhões), 68% são pretos ou pardos, ou seja temos aí uns 12,5 milhões de pretos/pardos entre os 10% mais pobres. Em nossa opinião, é mais eficiente fazer uma promoção para os 10% mais pobres do que fazer políticas públicas para uma parcela da população, com base na cor da pele. Sem falar do estigma que fica no meio acadêmico, algo como ter que ouvir de colegas, "só entrou porque é preto". "Negros e negras não são discriminados porque são pobres, são pobres porque são discriminados" (Pactos narcísicos no racismo) é o que diz Maria Apa- recida Silva Bento. Sabe, é uma frase que fez a gente discutir, e não chegamos a um consenso. Ainda não digerimos esta frase, não sabemos o que quer dizer. Preto/Negro rico não sofre racismo em seu convívio social? Preto/Negro pobre não sofre ra- cismo em seu meio? Sofre, pois durante pesquisas para este trabalho coletamos diversos depoimentos sobre preconceitos sofridos por negros, sejam eles ricos ou pobres. Preconceito e racismo são a mesma coisa? Pela definição dos dicionários, não. Pois preconceito pressupõe opinião formada antecipadamente, sem maior ponderação ou conhecimentos dos fatos, já racismo é a superioridade de uma ra- 36 MARSHALL, T.H. Cidadania, classe social e status. Rio de Janeiro: Zahar Edito- res, 1967. MOURA, Clóvis in Terra Brasileira. Disponível em: <http://www.terrabrasileira.net/folclore/origem/africana/frente.htm>. Acesso em: 22 nov. 08. MOURA, Clóvis. Rebelião escrava no Brasil. São Paulo: Vozes, 1987. Movimento negro das denúncias do racismo à prática de políticas públicas <http://74.125.45.132/searchq=cache:P5nP0UVNiEkJ:www.periodicos.ufsc.br/inde x.php/politica/article/viewPDFInterstitial/1980/1729+1988+constituinte+movimentos +negros&hl=pt-BR&ct=clnk&cd=8&gl=br> Acesso em: 12 nov. 08. NABUCO, Joaquim. O Abolicionismo. Disponível em: Portal Domínio Público <http://www.dominiopublico.gov.br>. Acessado em: 29/09/08. Caderno especial Racismo. Jornal Folha de S. Paulo. 23 de novembro de 2008. 37 ANEXO
Docsity logo



Copyright © 2024 Ladybird Srl - Via Leonardo da Vinci 16, 10126, Torino, Italy - VAT 10816460017 - All rights reserved